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Dias FS et al • Estimativa da incidência de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV)
ARTIGO ORIGINAL / ARTICULO ORIGINAL
Estimativa da incidência de pneumonia associada à
ventilação mecânica (PAV)
Estimated incidence of ventilator-associated pneumonia (VAP)
Fernando Silva Dias1
Carlos Brites2
Pollyana Anicio Magalhães3
Carlos Ernesto Ferreira Starling4
Pedro Garcia Garbes-Netto5
Financiamentos: este trabalho foi
desenvolvido com financiamento da
empresa farmacêutica Sanofi do Brasil
Rev Panam Infectol 2014;16(2):100-107
Recebido em 17/7/2012
Aprovado em 11/8/2012
Médico. Hospital São Lucas. Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS
2
Médico. Hospital Espanhol. Salvador, BA
3
Enfermeira. Infection Control. Belo Horizonte, MG
4
Médico. Infection Control. Belo Horizonte, MG
5
Médico. Sanofi-Pasteur
1
100
RESUMO
A PAV é definida como aquela que ocorre 48 horas depois
que um paciente é intubado e recebe ventilação mecânica (VM) e
representa uma infecção grave e frequente nas Unidades de Terapia
Intensiva (UTIs) em todo o mundo. Objetivo: estimar a incidência de
PAV entre as populações de risco e descrever os fatores relacionados
à PAV em pacientes sob VM por ≥48 horas e ≤7 dias. Método: este
foi um estudo epidemiológico, prospectivo e observacional numa
população de pacientes adultos que recebem VM em três UTIs
brasileiras. Resultados: de um total de 100 pacientes triados, 92
foram incluídos neste estudo que ocorreu entre 13 de maio de
2011 a 8 de novembro de 2011. Os pacientes foram seguidos por
um período médio de 14,6 dias. A média de idade foi 69,5 anos,
com mediana de 74,5 anos. Quarenta e quatro pacientes (47,8%)
eram do sexo masculino. O diagnóstico de PAV foi feito em 30
pacientes (32,6%). Os seguintes fatores foram encontrados entre
pacientes com PAV: antibioticoterapia nos últimos 90 dias antes do
recrutamento, hospitalização atual ≥5 dias antes do recrutamento,
altas taxas de resistência antimicrobiana na comunidade ou no
hospital, hospitalização prévia ≥2 dias nos últimos três meses
antes do recrutamento e procedimento dialítico crônico nos últimos
30 dias antes do recrutamento. Conclusão: apesar das medidas
de prevenção, foi observada uma incidência de 5,2 casos/1.000
pacientes-dia. Os fatores relacionados à PAV neste estudo estão em
conformidade com a literatura internacional.
Descritores: Pneumonia associada à ventilação mecânica;
Estudos de coortes; Incidência
Rev Panam Infectol 2014;16(2):100-107
ABSTRACT
VAP is a pneumonia that occurs 48 hours after
patient intubation and receiving mechanical
ventilation (MV), and it represents a severe and
common infection in intensive care units (ICUs)
around the world. Objective: to estimate the
incidence of VAP among the population at risk
and to describe the factors associated with VAP
in patients on MV for ≥48 hours and ≤7 days.
Method: this was an epidemiological, prospective
and observational study in adults receiving MV in
3 ICUs in Brazil. Results: out of a total of 100
patients screened, 92 were included in this study
that occurred between 13 May and 8 November
2011. Patients were monitored for a mean period
of 14.6 days. The mean age was 69.5, with a
median of 74.5. Forty-four patients (47.8 %)
were male. VAP was diagnosed in 30 patients
(32.6 %). The following factors were found
among the patients with VAP: antibiotic therapy
in the last 90 days prior to recruitment, current
hospitalization ≥5 days before recruitment, high
rates of antimicrobial resistance in the community
or in the hospital, previous hospitalization ≥2
days in the last 3 months before the recruitment
and chronic dialysis procedure in the 30 days
before recruitment. Conclusion: despite preventive
measures, an incidence of 5.2 cases/1000 patientdays was observed. Factors associated with VAP in
this study are in accordance with the international
literature
Keywords: Pneumonia, ventilator-associated; Cohort studies; Epidemiology INTRODUÇÃO
A pneumonia associada à ventilação mecânica
(PAV) é definida como aquela que ocorre após
48 horas depois que um paciente é intubado e
recebe ventilação mecânica (VM), representando
uma infecção grave e freqüente em unidades de
tratamento intensivo (UTI) em todo o mundo(1).
A PAV é uma infecção potencialmente fatal, cuja
prevalência foi estimada como sendo entre 10
a 20% para os pacientes recebendo ventilação
mecânica(2-3). A PAV está associada a uma morbidez
considerável, incluindo o prolongamento da estadia
na UTI, prolongamento da necessidade de receber
VM e aumento do custo da hospitalização(4-5).
Entre os fatores de risco mais frequentes
estão: (a) utilização prévia de antibióticos,
(b) imunossupressão, (c) resultado positivo de
cultura de aspirado endotraqueal (ae), (d) tempo
de VM, (e) doença neurológica em coma grave,
(f) doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e
(g) presença de traqueostomia e falhas técnicas
associadas a cuidados assistenciais(9). Vários
estudos e autores correlacionam a mortalidade pela
PAV com o momento de início e a adequação da
antibioticoterapia(6-7). Os riscos para a ocorrência
de PAV incluem reanimação cardiopulmonar (RCP),
sedação contínua(8), traqueostomia, múltiplos
acessos vasculares centrais, reintubação e uso
de antiácidos(6), podendo ser reduzidos com
administração precoce de terapia antibiótica
adequada(7,9). A antibioticoterapia iniciada de
forma adequada ao patógeno causador da infecção
e o mais próximo possível do início dos sintomas
se correlaciona com um melhor prognóstico. Tal
conhecimento, associado à deficiência de métodos
propedêuticos adequados leva ao uso empírico
precoce de antibioticoterapia de largo espectro
e consequentemente a seleção de patógenos
altamente resistentes nas UTIs de todo o mundo(9).
Neste trabalho, apresentamos os resultados
de um estudo epidemiológico observacional,
multicêntrico, prospectivo, destinado a avaliar a
incidência de PAV e os fatores relacionados em
pacientes adultos (≥18 anos) recebendo VM em
UTIs de três hospitais brasileiros. Foram avaliados
pacientes internados na UTI, que começaram a
receber VM num período ≥48 horas e ≤7 dias (no
momento da inclusão no estudo). Os pacientes
foram acompanhados por até 30 dias depois de
sua inclusão no estudo e nenhuma intervenção
epidemiológica foi realizada durante o período que
pudesse interferir nas observações. Os objetivos
deste estudo são: 1) estimar a incidência de PAV
(em dias de VM) entre as populações de risco e
2) descrever os fatores relacionados à PAV em
pacientes sob VM por ≥ 48 horas e ≤ 7 dias.
MÉTODOS
Este estudo foi realizado entre 2º trimestre de
2011 e o 4º trimestre de 2011, nas seguintes
instituições: 1) Hospital Vera Cruz, em Belo
Horizonte, 2) Hospital Espanhol, em Salvador e
3) Hospital São Lucas da PUCRS. As rotinas e
protocolos assistenciais das UTIs participantes
foram mantidos ao longo de todo o estudo.
O protocolo do estudo foi submetido e
aprovado pelo Comitê de Ética (CEP) de todas
as instituições participantes. Foram incluídos
os pacientes que atenderam a todos os critérios
descritos a seguir: 1) maior de 18 anos no dia
da inclusão e 2) intubado e recebendo ventilação
mecânica por ≥48 horas e ≤7 dias e 3) ter um
TCLE assinado pelo representante do paciente [e
101
Dias FS et al • Estimativa da incidência de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV)
por testemunha(s) independente(s), caso exigido
pelas recomendações do Comitê de Ética local.
Um indivíduo que apresentasse qualquer dos
critérios a seguir seria excluído: 1) traqueostomia
prévia a inclusão ou 2) diagnóstico prévio de PAV.
Para determinar se os pacientes foram colonizados
com Pa, os resultados das culturas de vigilância
do aspirado endotraqueal (AE) foram aceitos como
sendo a avaliação inicial caso fossem parte dos
cuidados de rotina administrados ao paciente. Os
resultados de culturas de AE posteriores (caso
fizessem parte dos cuidados rotineiros) puderam
ser registrados por um período de acompanhamento
de, no máximo, 30 dias para os pacientes com
resultados negativos para Pa na avaliação inicial,
ou que não coletaram uma amostra de AE para
avaliação inicial.
O diagnóstico clínico da PAV foi feito com
base na utilização de um ou mais dos seguintes
métodos padrão: AE, lavado broncoalveolar (LBA),
lavado broncoalveolar cego (mini-BAL) ou o
escovado protegido (EP). Todos os pacientes que
atenderam aos critérios de inclusão deste estudo
foram recrutados e avaliados durante um período
de 30 dias em relação aos seguintes possíveis
desfechos:
• Desenvolvimento de PAV;
• Extubação e alta da UTI;
• Óbito durante a hospitalização;
• Colonização por Pa, mas sem doença ativa;
• PAV causada por outro organismo;
• Ausência de PAV identificada por todo o período de estudo;
• Descontinuação do estudo;
• Extubado e reintubado;
• Alta da UTI com reinternação posterior.
Se o paciente foi extubado e então reintubado,
mas não recebeu alta da UTI, o acompanhamento
dos desfechos acima se manteve sem interrupção
durante o período de 30 dias, iniciado com a
inclusão original no estudo. Se o paciente foi
extubado e recebeu alta da UTI, mas precisou ser
reinternado dentro de 48 horas da alta, ou caso
tenha sido extubado, mas continuou internado na
UTI, o acompanhamento dos desfechos acima foi
mantido para esses pacientes durante o período de
30 dias iniciado com a inclusão original do estudo.
Embora não exista um padrão rígido para
definição de caso e para a metodologia de vigilância
para a PAV, desenvolvemos uma definição de caso
com base nas definições pré-existentes e a partir
de discussões com especialistas. Para fins de
avaliação neste estudo, PAV foi definida naqueles
pacientes que apresentaram uma combinação dos
102
seguintes critérios clínicos e radiográficos, que
resultou na obtenção de uma cultura de secreção
respiratória positiva.
Sinais clínicos e radiográficos que incluem pelo
menos um dos itens a seguir:
• Febre de >38oc;
• Leucopenia (<4.000 leucócitos/mm3) ou leucocitose (≥12.000 leucócitos/mm3);
• Nova ocorrência de escarro purulento ou mudanças nas características do escarro;
• Aumento das secreções respiratórias ou aumento da necessidade de sucção;
• Piora da troca gasosa ou aumento da
necessidade de oxigênio; e duas* ou mais
radiografias do tórax em série com pelo menos
um dos itens a seguir:
• Infiltrado novo ou progressivo e persistente;
• Consolidação pulmonar.
*Para aqueles pacientes sem doença pulmonar
ou cardíaca primária (ou seja, síndrome da
angústia respiratória, displasia broncopulmonar,
edema pulmonar ou doença pulmonar obstrutiva
crônica), era aceitável apenas uma radiografia
definitiva do tórax.
Para os pacientes que atenderam aos critérios
clínicos e radiográficos acima, mas para os quais
não se obteve uma cultura das vias respiratórias
inferiores ou para os quais foi obtida uma amostra
inadequada, um caso foi considerado como
“possível” quando:
• Foi obtido um AE cujo resultado é positivo;
• Cultura quantitativa >105cfu/ml;
• Cultura semiquantitativa positiva, tendo um
crescimento pelo menos “moderado” ou “+2”,
ou equivalente.
O mesmo critério se aplicou a pacientes que
receberam antibióticos antipseudomonas nas 72
horas anteriores e a cultura profunda das vias
respiratórias mostrou resultado negativo.
Este é um estudo exploratório de observação e não
há hipóteses com poder estatístico. Noventa e cinco
pacientes foram incluídos neste estudo.
Os aspirados respiratórios do tubo endotraqueal
foram coletados pela equipe do estudo, caso fizessem
parte do padrão de cuidados rotineiros. Os sintomas,
diagnósticos e resultados de exames laboratoriais
também foram documentados para os pacientes
que posteriormente tiveram diagnosticado PAV. O
prontuário do paciente foi analisado e um formulário
de relatório de caso (CRF) preenchido eletronicamente
para determinar os fatores relacionados à PAV. A
coleta de dados para este estudo incluiu os dados
Rev Panam Infectol 2014;16(2):100-107
demográficos, desfechos do paciente, fatores
relacionados, comorbidades, resultados de exames
laboratoriais microbiológicos e situação atual,
coletados na última avaliação de acompanhamento
dentro da janela de trinta dias.
Foram utilizadas estatísticas descritivas e não
foram testadas hipóteses. As variáveis categóricas
selecionadas foram resumidas por contagens de
frequência e/ou proporções e as variáveis contínuas
selecionadas foram resumidas por número de sujeitos
de pesquisa, média e desvio padrão.
RESULTADOS
De um total de 100 pacientes que passaram pela
triagem, 92 pacientes foram incluídos neste estudo que
ocorreu entre 13 de maio de 2011 a 8 de novembro de
2011 em três instituições. Os pacientes foram seguidos
por um período médio de 14,6 dias (DP: 8,6 dias;
mediana de 12,5 dias, de 2 a 32 dias), equivalendo a
1.339 pacientes-dia. A média de idade dos pacientes
recrutados foi 69,5 anos (DP: 17,7 anos), com mediana
de 74,5 anos (de 23 a 99 anos). Quarenta e quatro
pacientes (47,8%) eram do sexo masculino.
Tabela 1. Fatores relacionados à pneumonia associada à ventilação mecânica
Total=92
%
Terapia antimicrobiana nos últimos 90 dias antes do recrutamento
69
75,0
Hospitalização atual de 5 dias ou mais antes do recrutamento
61
66,3
Altas taxas de resistência antimicrobiana na comunidade ou no hospital.
38
41,3
Hospitalização prévia por 2 ou mais dias nos últimos 3 meses antes do recrutamento
31
33,7
Residência numa casa de atendimento à saúde de longa permanência
2
2,2
Tratamento de infusão domiciliar (incluindo antimicrobianos)
2
2,2
Procedimento dialítico crônico nos últimos 30 dias antes do recrutamento
5
5,4
Cuidados domiciliares à feridas
2
2,2
Familiar portador de germe multi-resistente
-
-
Tratamento ou doença imunocomprometedora
18
19,6
Outros
13
14,1
5
5,4
Total=92
%
7
7,6
Neoplasia Sólida
16
17,4
Diabetes Mellitus
32
34,8
Cardiopatias
53
57,6
Neoplasia Hematological
1
1,1
Imunosuppressão
6
6,5
Transplante
-
-
74
80,4
4
4,3
Nenhum
Tabela 2. Comorbidades presentes
Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC)
Outras
Nenhuma
103
Dias FS et al • Estimativa da incidência de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV)
Tabela 3. Medidas de prevenção da PAV durante a ventilação mecânica
Total=92
%
Elevação da cabeceira
92
100,0
Interrupção diária ou redução da sedação
65
70,7
Protocolo padrão para redução dos parâmetros ventilatórios
79
85,9
Profilaxia de doença úlcero-péptica
90
97,8
Profilaxia de trombose venosa profunda
79
85,9
Descontaminação seletiva do tubo digestivo
1
1,1
Aspiração continua de secreções subglóticas
15
16,3
Descontaminação da orofaringe
56
60,9
Outras
39
42,4
Tabela 4. Métodos diagnósticos usados para o
diagnóstico de PAV
TOTAL (N=92)
M=92
%
Diagnóstico de PAV
30
33.0
Diagnóstico clínico
29
31.5
Diagnóstico radiológico
13
14.1
Cultura sentinela de aspirado endotraqual*
43
46.7
Diagnóstico microbiológicos
27
29.3
Lavado broncoalveolar (bal)
2
2.2
16
17.4
Escovado protegido (psb)
-
-
Aspirado endotraqueal (eta)
9
9.8
Mini-bal
*Cultura sentinela de aspirado endotraqueal obtida no início do
estudo (três dias antes ou imediatamente após a inclusão no
estudo).
Diversos fatores foram detectados nesta população,
conforme a tabela 1. De forma semelhante, diversas
comorbidades foram identificadas na população
avaliada, conforme a tabela 2. A maioria dos pacientes
(80,4%) recebeu intubação das vias aéreas entre 2 e
4 dias antes do recrutamento.
Diversas medidas preventivas foram usadas
enquanto estes pacientes estavam sob ventilação
mecânica, conforme e tabela 3. A maioria dos
pacientes (49 pacientes ou 53,3%) não possuía uma
104
cultura sentinela do aspirado traqueal, mas entre os
31 pacientes que a possuíam, a coleta ocorreu em
foi feita em prazo inferior a 3 dias após a intubação.
De um modo geral, as principais causas de
descontinuação do estudo foram: óbito (48,9%) e
alta/transferência (37%).
O diagnóstico de PAV foi feito em 30 pacientes
(32,6%). As principais características da população
do estudo estão resumidas na figura 1. Os métodos
diagnósticos usados para definir o diagnóstico de PAV
nesses 30 pacientes são mostrados na tabela 4. Dos
30 pacientes com diagnóstico de PAV, o diagnóstico
de PAV-Pa foi alcançado em sete pacientes, entre
os quais somente um foi perdido para seguimento
(transferência para outro hospital). Os seguintes
fatores foram encontrados entre pacientes com PAV:
• Ventilação mecânica por ≥48 horas a ≤7 dias,
quando da época da inclusão;
• Terapia antimicrobiana nos últimos 90 dias
antes do recrutamento;
• Hospitalização atual de 5 dias ou mais antes
do recrutamento;
• Altas taxas de resistência antimicrobiana na
comunidade ou no hospital;
• Hospitalização prévia por 2 ou mais dias nos
últimos 3 meses antes do recrutamento
e
procedimento dialítico crônico nos últimos 30
dias antes do recrutamento.
DISCUSSÃO
A PAV é uma das principais complicações da VM,
implicando em prolongamento no tempo de internação
na UTI e no hospital(6,10), na morbimortalidade(7,10) e
na utilização de recursos(11).
Rev Panam Infectol 2014;16(2):100-107
100: Pacientes triados
8 Falhas de triagem
92: Pacientes incluídos
30: Pacientes com diagnóstico de PAV
7: Pacientes com diagnóstico de PAV-Pa
29 pacientes com diagnóstico clínicoa
13 pacientes com diagnóstico radiológicob
12 pacientes com diagnósticos clínico- radiológico
3 pacientes com culturas de secreções das vias aéreas inferiores positivas para Pa
2 pacientes com aspirados endotraqueais positivos para Pa
1 paciente com PAV no início do estudo (aspirados endotraqueais obtidos por
suspeita no início do estudo e outro aspirado endotraqueal posterior positivo para Pa)
1 paciente com hemocultura positiva para Pa
Figura 1. Diagnóstico de PAV e PAV-Pa de acordo com a rotina de cada centro
Os principais achados de nosso estudo apontam
o tratamento antibiótico nos últimos 90 dias, o
tempo de hospitalização superior a 5 dias e o perfil
de resistência bacteriana como os principais fatores
relacionados à PAV. As comorbidades mais frequentes
na população de pacientes avaliados foram: presença
de cardiopatia, diabetes melitus e neoplasia sólida.
Nos pacientes com PAV-Pa os fatores descritos foram
semelhantes aqueles relacionados na literatura,
sendo o tratamento antibiótico nos últimos 90 dias
em 100%, o tempo de hospitalização superior há 5
dias em 71,4% e o perfil de resistência bacteriana
local em 57,1% dos casos.
Inúmeros estudos epidemiológicos descrevem
uma série de fatores de risco para PAV. Rello et al
identificaram as manobras de RCP como o principal
fator de risco, seguido do uso contínuo de sedação(8).
Embora os autores não tenham encontrado uma
explicação plausível para a associação de RCP e PAV,
a sedação contínua associa-se ao prolongamento do
tempo de VM(12) e sua interrupção diária após 48
horas reduz o tempo de VM e internação na UTI(13),
o que diminui o tempo de exposição à IOT e à VM.
A realização de traqueostomia também é apontada
como fator de risco para PAV(6), associação que não
foi possível ser avaliada em nossos pacientes, visto
que este era um critério de exclusão. Em estudo
brasileiro prévio(14), os principais fatores de risco
para PAV foram o tempo de VM superior a 6 dias, a
presença de traqueostomia e o uso de três ou mais
antibióticos.
Especificamente como fatores de risco para PAV-Pa,
são identificados a DPOC, o uso de corticosteróides,
longo tempo de VM e uso prévio de antibióticos(15). Em
um grupo de 72 pacientes com PAV, a Pa foi isolada
em 22 (26%), sendo os fatores de risco identificados
através de análise usando regressão logística, a
presença de DPOC, VM por mais de 8 dias e uso
prévio de antibióticos(16). Em estudo multicêntrico,
retrospectivo, baseado em um banco de dados, Parker
et al (17) identificaram como fatores de risco para PAVPa a idade avançada, a presença de comorbidades, um
maior tempo de internação em UTI e de VM, além do
uso de mais antibióticos nos dias prévios. Em nosso
estudo, o uso prévio de antibióticos foi o principal fator
de risco de PAV-Pa, estando presente em 100% dos
pacientes, seguido do tempo de hospitalização prévio
e do perfil de resistência bacteriano. Some-se a isso, o
fato de que o grupo estudado tinha uma idade média
de 69,5 anos, temos um perfil de pacientes idosos,
com infecção prévia, internados por um longo período
em um ambiente de elevada resistência aos antibióticos,
como suscetíveis à PAV-Pa.
As principais comorbidades encontradas foram:
presença de cardiopatia, diabetes mellitus e
neoplasia sólida. No estudo de Parker et al (17), a
doença cardiovascular esteve presente em 25,3%
dos casos de PAV-Pa ou por germe multirresistente
e em nossa série ocorreu em 57,6%. Rocha et al
(14)
, tiveram uma incidência de diabetes mellitus
e DPOC de 14,2% e 1,1%, respectivamtne. Em
nosso estudo, esta incidência foi de 34,8% e
7,6%, respectivamente. Em comparação com outros
estudos, a presença destas comorbidades foi mais
frequente em nossos pacientes.
A prevenção é de fundamental importância
para a redução da PAV. Existem vários protocolos
de prevenção, com a maioria indicando medidas
semelhantes. As medidas de prevenção da PAV
podem ser agrupadas em farmacológicas e não
105
Dias FS et al • Estimativa da incidência de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV)
farmacológicas(18). Neste estudo, a única medida
preventiva adotada em 100% dos casos foi a elevação
da cabeceira, embora não tenha sido estabelecido
que o nível de elevação do leito devesse ser de 45º,
como é recomendado(18). Sabe-se que a elevação da
cabeceira entre 15º e 30º não é suficiente para a
prevenção de PAV(19), enquanto que outros autores
questionam a sua validade(20). A segunda medida
de prevenção de PAV mais frequente foi a profilaxia
da úlcera péptica, atingindo 97,8% dos casos. A
recomendação atual é que esta medida seja adotada
somente em pacientes de alto risco, como aqueles
com necessidade de VM por mais de 48 horas ou
com coagulopatia(21). Como a VM por mais de 48
horas era um critério para entrar no estudo, os
pacientes tinham indicação para esta medida. A
terceira medida de prevenção de PAV mais frequente
foi a existência de protocolos para descontinuação da
VM, adotada em 85,9% dos casos estudados. Esta
conduta está relacionada a outras como a suspensão
diária e a titulação da sedação após 48 horas(14),
a preferência pela VM não invasiva(18,22) ou pela
IOT(18) e a realização de traqueostomia precoce(22).
A interrupção diária da sedação foi adotada em
70,7% dos pacientes, evidenciando que ainda nem
todos que estão submetidos à VM após 48 horas, são
tratados de acordo com as recomendações baseadas
em evidências. A VM não invasiva reduz a incidência
de PAV sendo uma alternativa para pacientes com
insuficiência respiratória que apresentem edema
pulmonar cardiogênico e DPOC, enquanto que a IOT
cursa com menor incidência de sinusite do que a
intubação naso-traqueal(22).
Outras medidas de prevenção de PAV adotadas
foram a descontaminação seletiva do trato
gastrointestinal (TGI), a aspiração contínua e a
descontaminação da orofaringe. A colonização do
trato respiratório alto é um requisito importante para
a ocorrência de PAV. A descontaminação seletiva do
TGI combina a descontaminação da orofaringe e do
estômago, além do uso de antibióticos sistêmicos(18).
O cuidado oral em pacientes críticos submetidos
à VM, como parte de um protocolo de prevenção
de PAV, foi capaz de reduzir sua incidência em
89,7%(23). Tanto o uso de clorexidina isolada como
associada à colistina, na higiene oral de pacientes
sob VM pode reduzir a incidência de PAV(24). A
descontaminação da orofaringe ocorreu em 60,9%
e a descontaminação seletiva do TGI em apenas
1,1%, mostrando que esta última prática ainda
não é utilizada em larga escala nos pacientes com
risco de PAV. A aspiração subglótica de secreções
foi utilizada em percentual inferior a 20%, embora
seja considerada uma medida simples e capaz de
106
prevenir a ocorrência de PAV(21). Por fim, evidências
atuais apontam que os programas de educação
da equipe assistencial sejam o melhor caminho
para a prevenção da PAV(25), medida que deve ser
encorajada em toda UTI.
O diagnóstico de pneumonia em pacientes críticos
é bastante difícil(26), especialmente o diagnóstico
de PAV, visto não haver uma manifestação clínica
específica que indique sua ocorrência(4). Usualmente,
os critérios empregados para o diagnóstico de PAV
incluem novo infiltrado no RX de tórax associado a
dois ou mais dos seguintes achados: febre acima
de 38°C, leucocitose ou leucopenia e secreção
purulenta pelo tubo endotraqueal(27). Os critérios de
PAV empregados em nosso estudo incluíam somente
um achado clínico e um novo infiltrado radiológico,
o que pode representar maior sensibilidade e menor
especificidade(28). Entretanto, eram necessários dois
RX de tórax em sequência confirmando os achados
sugestivos de pneumonia. Desse modo, houve a
confirmação de que o novo infiltrado associado a
manifestação clínica, avaliado em dois momentos
era indicativo de infecção. Em função da nossa
proposta diagnóstica, o critério mais utilizado para
o diagnóstico de PAV foi o microbiológico, sendo
definidor em 76% dos casos, seguido pela clínica e
pelos achados radiológicos.
Em conclusão, apesar das medidas de prevenção
amplamente utilizadas, foram observados 30 casos de
PAV e incidência de PAV de 5,2 casos/1000 pacientesdia. Os seguintes fatores foram encontrados entre
pacientes com PAV e PAV-Pa que exigiram ventilação
mecânica por ≥48 horas a ≤7 dias, quando da época
da inclusão: terapia antimicrobiana nos últimos 90
dias antes do recrutamento; hospitalização atual de
5 dias ou mais antes do recrutamento; altas taxas
de resistência antimicrobiana na comunidade ou
no hospital; hospitalização prévia por 2 ou mais
dias nos últimos 3 meses antes do recrutamento e
procedimento dialítico crônico nos últimos 30 dias
antes do recrutamento.
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Correspondênca:
Pedro Garcia Garbes-Netto
Universidade Federal Fluminense. Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo. São Paulo. SP.
Av. Major Sylvio de Magalhães Padilha, 5200.
Jardim Morumbi. São Paulo – SP. 05693-000.
Brasil.
E-mail: [email protected]
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