FACULDADE ASSIS GURGACZ FAG CURSO DE MEDICINA AVALIAÇÃO II Células-Tronco e Aspectos Bioéticos Trabalho realizado na disciplina de Direito Aplicado à Área Médica, referente ao 6º Período 3º Ano, ministrada pelo Professor Eduardo Hoffmann. Acadêmicas: Ana Paula Sakr Hubie Dayanne Alba Chiumento Isadora Benvenutti Kalinowski Larissa Sokol Rotta Paula Bragato Futagami CASCAVEL – PARANÁ OUTUBRO DE 2011 SUMÁRIO INTRODUÇÃO .............................................................................................................................................. 3 CÉLULAS-TRONCO: CONTEXTO ATUAL E ASPECTOS BIOÉTICOS ...................................................... 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................................ 12 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 13 2 INTRODUÇÃO Células-Tronco são células não diferenciadas ou não especializadas, que possuem duas características específicas: a auto-renovação, que é a capacidade que elas possuem de se criar novas células não diferenciadas por meio da divisão celular, e o potencial de diferenciação que é o poder que essas células tem de se diferenciarem em outras células de diversos tecidos do organismo quando sob a presença de certos fatores estimuladores ou induzidas por condições fisiológicas favoráveis à transformação. De acordo com o potencial de diferenciação, as células-tronco podem ser classificadas em três níveis diferentes: células totipotentes, pluripotentes e multipotentes. Tipos de células-tronco: Totipotentes: podem se diferenciar em todas as células do corpo e dar origem placenta e seus anexos. São capazes de originar um organismo completo. Pluripotentes: podem se diferenciar em todas as células do corpo, porém não podem originar a placenta. Podem formar células dos três folhetos embrionários (ectoderme, mesoderme e endoderme) que originarão todos os tecidos do organismo. Diferentemente das totipotentes, estas células não são capazes de gerar um indivíduo, pois não conseguem formar a placenta e seus anexos. Estas são as chamadas células-tronco embrionárias que são extraídas dos embriões e utilizadas em pesquisas. Multipotentes: podem dar origem a apenas um número limitado de células especializadas do organismo. Como exemplo, podemos citar as células-tronco hematopoiéticas que originam as células do sangue e as células-tronco neurais do cérebro. São encontradas em vários locais do corpo e realizam a renovação celular, pois formam células dos tecidos de que são originárias. Células-tronco embrionárias: Células-tronco embrionárias são células pluripotentes encontradas em embriões que podem se transformar em qualquer outra célula do corpo. São essas células que permitem que o embrião cresça e se torne um organismo formado. Quando o embrião se torna um blastocisto, o que ocorre aproximadamente 5 dias após a fertilização ele possui cerca de 100 células, separadas numa camada externa que formará a placenta e alguns órgãos e a camada interna que formará os tecidos do corpo, e é nesta última camada que são encontradas as células-tronco embrionárias que são as utilizadas em pesquisas. Células-tronco adultas: Células-tronco adultas são células multipotentes. São denominadas adultas, por serem mais especializadas que as embrionárias e darem origem apenas a alguns tipos específicos de células. Podem ser encontradas em tecidos maduros de crianças e adultos. Estas células podem ser encontradas em diversos tecidos do organismo, como na medula óssea, sangue, fígado, cordão umbilical, placenta, e alguns outros. 3 CÉLULAS-TRONCO: CONTEXTO ATUAL E ASPECTOS BIOÉTICOS As implicações éticas no que diz respeito à utilização de células-tronco têm sido questionadas e amplamente debatidas. No que se refere à obtenção e ao uso das células-tronco adultas, não há, eticamente, representação de problemas, pois trata-se de um procedimento equiparável aos transplantes autólogos, no qual retiram-se as células-tronco do próprio paciente e injetam-se as mesmas no local em que o tecido visa ser reparado. Dissímil é o caso das células-tronco embrionárias, as quais só podem ser obtidas mediante manipulação de embriões, portanto, este processo interfere em princípios de existência humana. Contudo, segundo Marcelo Morales (2007), o fato de se obter células‐tronco adultas, absolutamente não infirma a utilização de células‐tronco embrionárias. Ademais, é importante ressaltar que apenas as células-tronco embrionárias são consideradas totipotentes, ou seja, com capacidade de regenerarem os tecidos de qualquer parte do corpo, o que não vem a ocorrer com as multipotentes – no caso as células-tronco adultas –, as quais, em estágio mais avançado de diferenciação são capazes de substituir apenas alguns tipos de tecidos. Frente às premissas anteriormente citadas, a utilização de células-tronco embrionárias possui extrema importância no avanço científico e tecnológico, tendo, ao que tudo indica, enorme valor terapêutico. Isto, portanto, têm como base a possibilidade de se definir o tratamento de doenças como Leucemias, Doença de Parkinson e Doença de Alzheimer, representado uma perspectiva alentadora no sentido de melhorar a qualidade e prolongar o tempo de vida de muitos indivíduos. Todavia, apesar da manipulação de células-tronco embrionárias consistir em uma terapia genética que vem progredindo há anos, considera-se que as possíveis aplicações da técnica, bem como a utilização da mesma, são dificilmente previsíveis. Existem, ainda, alguns pontos de vista que consideram a terapia com células-tronco como possíveis remédios contra patologias, como a doença de Alzheimer, por exemplo. Sendo assim, a polêmica inclui, também, a preocupação de que a utilização destas novas técnicas possa levar, progressivamente, a uma desumanização, com dano irreparável ao respeito à vida. Entretanto, a principal discussão ética decorre devido a utilização de células‐tronco de pré‐embriões produzidos mediante reprodução assistida, seja pela fertilização "in vitro", ou com as técnicas emergentes de clonagem terapêutica. Com isto, esta questão inclui, inevitavelmente, a delimitação do instante em que se inicia a vida, nestes casos, atribuída a um conjunto de células embrionárias, uma vez que a retirada de células‐tronco leva à morte destes pré-embriões. E é justamente o início da vida humana – intra-uterino – um pontos mais controversos entre religiosos, críticos e estudiosos, pois busca-se saber se o embrião tem vida ou não. 4 A vida pode ter o seu início considerado em diversos estágios do desenvolvimento, ou durante a sua concepção, como mostra a tabela abaixo: Tempo decorrido 0min Critério Característica Celular Fecundação ( fusão de gametas) 12 a 24 horas Genotípico estrutural Divisional Fecundação (fusão dos pró-núcleos) 6 a 7 dias Suporte materno Implantação uterina 14 dias Individualização 20 dias Neural Células do indivíduo diferenciadas das células dos anexos Formação da notocorda Cardíaco Início dos batimentos cardíacos 6 semanas Fenotípico 7 semanas Sensações Aparência humana e formação de órgãos rudimentares Respostas reflexas à dor e à pressão 8 semanas Encefálico( EEG) 10 semanas Atividade Registro de ondas eletroencefalográficas (tronco cerebral) Movimentos espontâneos 12 semanas Neocortical Estrutura cerebral completa 12 a 16 semanas 20 semanas Movimentação Movimentos do feto percebidos pela mãe Viabilidade extra-uterina Respiratório Probabilidade de 10% para sobrevida fora do útero Viabilidade pulmonar 28 semanas Autoconsciência Padrão sono-vigília 28 a 30 semanas Perceptivo visual Reabertura dos olhos Nascimento Gestação a termo ou parto em outro período 2 dias 3 a 4 semanas 24 a 28 semanas 40 semanas Primeira divisão celular Segundo Goldim (2007), “a vida humana não começa a cada reprodução. Ela é continua, pois o fenômeno vital se mantém, não sendo nem extinto nem restabelecido, prossegue. A vida de um novo indivíduo é que tem início.” 5 Entre os cientistas, existem hipóteses de que um embrião só pode ser considerado vivo após o nascimento. Ainda sem ter como dar uma resposta definitiva e exata sobre o início da vida, a maioria destes se apóia na lógica para chegar a uma solução prática para a discussão ética, estabelecendo o marco inicial da vida após os 14 primeiros dias da concepção, quando começa a formação do sistema nervoso. Em relação à religião, o Catolicismo prega a consideração do início da vida a partir da concepção. Boccato (2007) preconiza que a vida pode-se iniciar de três formas: no inicio da terceira semana, pela gastrulação em que se originam os três folhetos germinativos, por volta do 21 ou 22º dia em que iniciam-se os batimentos cardíacos ou na 23ª semana em que o feto é capaz de sentir dor. Segundo a Doutora Anna Giuli, Bióloga Molecular e Professora de Bioética na Faculdade de Medicina da Universidade Católica do Sagrado Coração (2009), afirma que o individuo inicia o seu ciclo vital no momento da penetração do espermatozóide no ovócito. A fusão dos gametas representa uma constituição de uma nova individualidade biológica, qualitativamente diferente dos gametas que a geraram. Giuli preconiza que o embrião humano precoce é um indivíduo em ato com a identidade própria da espécie humana à qual pertence, e consequentemente devem ser reconhecidos seus direitos de “sujeito humano” e a sua vida deve ser plenamente respeitada e protegida. Outro grande dilema quando se discute células-tronco é a questão do aborto. O Código Civil Brasileiro de 2002 estabelece em seu art. 2º que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. E o art.128 do atual Código Penal Brasileiro afirma que não se pune aborto praticado por médico, em duas situações: se não há outro meio de salvar a vida da gestante, ou se a gravidez resulta de estupro. Se referente a outra situação, no Brasil o aborto é considerado crime, do tipo crime contra a vida, pelo Código Penal. A lei prevê que o aborto não é punido quando “houver seguros motivos para prover que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de doença grave ou malformação congênita, e for realizado nas primeiras 24 semanas de gravidez…” Aborto é considerado crime pelo ato do infanticídio no art. 123., onde matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após (sob pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos pelos abortos provocados pela gestante ou com seu consentimento). Art. 124. - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Aborto provocado por terceiro Art. 125. - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos. Art. 126. - Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. 6 Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. Art. 127. - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte. Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico se: I - não há outro meio de salvar a vida ou preservar a saúde da gestante; II - a gravidez resulta de violação da liberdade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida; III - há fundada probabilidade, atestada por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais. Parágrafo 1o. Nos casos dos incisos II e III e da segunda parte do inciso I, o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro; Parágrafo 2o. No caso do inciso III, o aborto depende, também, da não oposição justificada do cônjuge ou companheiro. Logo pela Constituição Federal de 1988, seu artigo 5º, caput, dispõe: Art. 5º. “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...” Portanto, deve-se considerar o direito à vida, à integridade física e moral, e à privacidade: “É o direito de não ter interrompido o processo vital senão pela morte espontânea e inevitável...” Dignidade da pessoa humana é o “direito de ter direitos”. Constitui-se em um direito que possibilita a reivindicação de todos os demais direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, conferidos a todos de modo igual. Alguém existe enquanto pessoa, somente quando reconhecido por outras pessoas. (Barchifontaine, 2004) Historicamente, os direitos à personalidade do feto são colocados em um patamar inferior ao das pessoas juridicamente consideradas, conforme artigo 2º do Código Civil, de modo que devem prevalecer somente quando não em conflito com direitos individuais dos "já nascidos". Portanto, é muito difícil definir quando o feto passa a ser considerado pessoa, ou se somente será quando nascer, mas é importante ressaltar que cada indivíduo possui uma constituição genética 7 característica, influenciada por fatores ambientais, sociais, culturais e pessoais, assim não podemos dizer que o individuo se reduz apenas a identidade genética a qual possui. Proteção ao Embrião A questão da ética é muito enfatizada quando o assunto é utilização de células-tronco embrionárias para fins terapêuticos. Ao se tratar de Biodireito, deve-se pensar em uma relação harmônica entre os princípios constitucionais e os avanços genéticos, pois somente desta forma será possível buscar os avanços desejados nos estudos biotecnológicos, contudo, sem ferir a Lei. A grande discussão ética que cerca a utilização de células-tronco embrionárias está ligada ao fato de que essas células são extraídas de embriões; e, há uma grande preocupação em proteger o embrião, no entanto deve-se levar em consideração os benefícios desta técnica e a constitucionalidade dos estudos com essas mesmas células. Tal problema gerou uma polêmica que envolve medicina, religião, ética, princípios morais, entre outros. A Igreja Católica e parte da Igreja Evangélica consideram a destruição de embriões equivalente ao aborto. O papa João Paulo II definiu o uso de embriões de apenas uma semana como "um atentado ao respeito absoluto da vida". Em contrapartida, o Ministério da Saúde alega que a não é possível a Lei ser inconstitucional, pois a Constituição Federal, em momento algum, faz menção sobre embriões que ainda não se fixaram no útero, sendo que a Lei Biossegurança é a única regulamentação sobre este assunto. Outro argumento é que os códigos Penal e Civil tratam somente de gestação, ou seja, embrião dentro do útero. Fazendo uma análise dos países ao redor do mundo e sua posição em relação ao estudo com células tronco embrionárias, pode se destacar: que Portugal, Alemanha, Dinamarca, Espanha, Finlândia e França proíbem o uso de células-tronco embrionárias; em contrapartida, na Bélgica, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Suécia e União Européia não há legislação específica que aborde o assunto. Hoje, países como os Estados Unidos, Escócia, Inglaterra, Japão, Nova Zelândia e Canadá são líderes nessa corrida tecnologia. E, nesse contexto, vale salientar que o Brasil possui a Lei da Biossegurança, aprovada e já regulamentada. No Brasil: Em 24 de março de 2005, o então Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou, o a Lei nº 11.105. Esta lei regulamenta os incisos II, IV e V do § 1 do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados (OGM) e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), dispõe sobre a Política o Nacional de Biossegurança (PNB), revoga a Lei n 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória o o o o o o o o o n 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5 , 6 , 7 , 8 , 9 , 10 e 16 da Lei n 10.814, de 15 de dezembro de 2003. 8 A Lei de Biossegurança abrange vários temas diferentes, dentre eles: a pesquisa e a fiscalização dos organismos geneticamente modificados (OGM); a utilização de células-tronco embrionárias para fins de pesquisa e terapia; o papel, a estrutura, as competências e o poder da CTNBio; e ainda a formação do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) bem como sua organização. Como essa Lei englobou vários temas distintos, ocorreu uma “confusão” legislativa, afinal, os assuntos abordados pela Lei englobam desde transgênicos, até células-tronco. Na Lei de Biossegurança, não foram estabelecidos os critérios que irão orientar a realização de pesquisas, nem delimitados os critérios objetivos ao trabalho da CTNBio. A regulamentação da Lei de Biossegurança ocorreu em 23 de novembro de 2005, pelo decreto 5.591, publicado no Diário Oficial da União. A regulamentação tem 95 artigos. Segundo decreto, a CTNBio terá 27 membros, e as decisões serão tomadas com votos favoráveis da maioria absoluta de seus integrantes, exceto nos processos de liberação comercial de organismos geneticamente modificados e derivados. Segundo o art. 5º da Lei de Biossegurança: “Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições: I – sejam embriões inviáveis; ou II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento. § 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores. § 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa. § 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.” Destacando, a Lei de Biossegurança veda a clonagem humana e a produção de embriões somente para a retirada de células-tronco, (com o objetivo terapêutico), sendo assim, só é permitido o uso de embriões que seriam - necessariamente - descartados por clínicas de fertilização. O artigo 5° da Constituição Brasileira de 1988 consagra o direito à vida, sendo, portanto, o mais importante de todos os direitos e garantias fundamentais. É dever do Estado assegurar, a todos, o duplo sentido de vida: direito de viver dignamente, à continuar vivo. O texto constitucional protege todas as formas de vida, inclusive a uterina. Ocorre que células-tronco clonadas terapeuticamente são criadas “in vitro”, ou seja, cultivadas em laboratório, diferenciando a clonagem terapêutica da clonagem reprodutiva. 9 As 63 academias de ciência do mundo (que se posicionam contra clonagem reprodutiva) defendem as pesquisas com células embrionárias para fins terapêuticos. Essas pesquisas estão liberadas na maior parte dos países da Europa, além do Canadá, Austrália, Japão e Israel, conforme supracitado. A fundamentação dessas academias consiste em: 90% dos embriões gerados em clínicas de fertilização e que são inseridos em um útero (mesmo nas melhores condições) não geram vida. E, é clara, a injustiça de se permitir à morte de uma criança ou um jovem afetado por uma doença letal para preservar um embrião que será descartado. Pensando assim, permitindo o uso de células-tronco embrionárias de forma terapêutica não é pôr fim da vida de embriões, mas sim dar a chance de (re)criar vida, através da regeneração de tecidos. Sabe-se que devem e existem Leis de proteção ao embrião, mas em nossa Lei Maior também está assegurado o direito à vida, e utilizando células-tronco embrionárias tem-se uma “nova” tentativa de viver. Segundo afirma a Dra. Mayana Zatz, professora-titular de Genética Humana e Médica do Departamento de Biologia do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP). No Brasil, dias depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter anunciado a regulamentação da Lei de Biossegurança, o Procurador-Geral da República, Cláudio Fonteles, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) um parecer favorável à ação direta de inconstitucionalidade (ADIN) para suprimir o artigo 5º da Lei que permite o uso de células-tronco de embriões para fins de pesquisas e terapias. A referida Ação Direta de Inconstitucionalidade recebeu o nº. 3.510. Inconformado, o ProcuradorGeral da República, Dr. Cláudio Lemos Fonteles, argumentou afirmando que a vida humana aconteceria a partir da fecundação, desenvolvendo-se continuamente; que o zigoto já seria um ser humano embrionário; que seria no momento da fecundação que a mulher engravida, acolhendo o zigoto em um ambiente adequado ao seu normal desenvolvimento; e ainda, que a pesquisa com células-tronco adultas seria mais objetiva e promissora do que a pesquisa com células-tronco embrionário. Posicionando-se a favor, pela constitucionalização do referido artigo, o Ministro Relator da ADIN, Min. Carlos Ayres Britto, entende que a vida somente teria início após o nascimento. Para ele: "Vida humana é o fenômeno que transcorre entre o nascimento e a morte cerebral. No embrião o que se tem é uma vida vegetativa que se antecipa ao cérebro". No dia 29 de maio de 2008, por seis votos a cinco, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou as pesquisas com células-tronco embrionárias, tornando constitucional o do art. 5º da Lei de Biossegurança. Ainda segundo o STF, as pesquisas com células-tronco embrionárias não violam a dignidade da pessoa humana, nem o direito à vida, conforme afirmava o procurador-geral da República Claudio Fonteles em o ação direta de inconstitucionalidade (ADI n 3.510). A Ministra Cármen Lúcia ressaltou que as pesquisas com células-tronco embrionárias não podem substituir as pesquisas com células-tronco adultas. O Ministro Joaquim Barbosa ainda salientou que proibir as pesquisas (com células-tronco embrionárias) seria “dar as costas para o desenvolvimento científico”. Segundo o Ministro Marco Aurélio, “desperdiçar estes embriões é um gesto de egoísmo e cegueira, uma vez que podiam ser utilizados na cura de doenças”. Os Ministros que opinaram de maneira diferente não se manifestaram de forma adversa às pesquisas, apesar disso, sugeriram mudanças, dentre elas, impor mais rigor na fiscalização para que não 10 haja prejuízo para os embriões viáveis. Afirmando a opinião do Ministro, o Advogado-Geral da União – José Antonio Dias Toffoli – declarou que já existe um órgão fiscalizador, o CONEP (Conselho Nacional, de Ética em Pesquisa), vinculado ao Ministério da Saúde, que autoriza, ou não, as pesquisas na área. A argumentação vencedora para tornar a Lei constitucional sustentou que para existir vida humana é necessário que o embrião seja implantado no útero humano. Provou-se que a ofensa à dignidade da pessoa humana exige a existência da pessoa humana, contudo, o embrião não é pessoa. Desse modo, as pesquisas com células-tronco embrionárias são autorizadas no Brasil, embora, com certas condições que auxiliam para uma política segura e transparentes para as referidas pesquisas no Brasil. 11 CONSIDERAÇÕES FINAIS Aspectos Bioéticos: Hodiernamente, não há um conceito claro e universal de início da vida humana, e ainda se discute quando o embrião ou feto passa a ser considerado pessoa ou se só será pessoa após o nascimento com vida. No futuro, talvez próximo, os transplantes de órgãos deverão ser substituídos pelo uso das células-tronco. Tanto as embrionárias, quanto as adultas, quando inseridas no organismo, podem reconstruir tecidos e órgãos normais tornando viável a bioengenharia. Aspectos Jurídicos: A discussão acerca da utilização de células tronco embrionárias no Brasil foi, desde o princípio, eivada de complexidade e antagonismos, sendo necessário mais de três anos para que o assunto amadurecesse na consciência das pessoas, em especial daqueles que tinham o poder de decidir se as disposições contidas na Lei de Biossegurança eram constitucionais ou não. Os votos emitidos pelo STF conseguiram demonstrar a improcedência da ADI n° 3510 valendose, essencialmente, da tese de que o embrião fertilizado in vitro, embora apresente traços de humanidade, é humano em grau inferior a uma pessoa já nascida, esta sim sujeito de direitos; que para haver vida é necessário haver um processo em movimento, o qual não existe nesses embriões, fadados ao lixo se a ação humana não os introduzir em um útero; que as pesquisas possuem guarida constitucional, pois se relacionam com o direito básico à saúde e com o dever do Estado de propiciar meios que impulsionem o desenvolvimento científico. Enfim, aduziu o STF, que em casos como este a questão do direito à vida digna deve considerar o interesse coletivo e não somente o individual, uma vez que estão envolvidos níveis de dignidade diferentes. 12 REFERÊNCIAS FAGOT-LARGEAUL, Anne. Embriões, células-tronco e terapias celulares: questões filosóficas e antropológicas. 2004. MORALES, Marcelo M. 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