1.º Gene: INOVAÇÃO - José António Rousseau

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ADN da Distribuição
1.º Gene:
INOVAÇÃO
JOSÉ ANTÓNIO
ROUSSEAU,
Docente, consultor
e especialista em
Distribuição Moderna
www.rousseau.com.pt
“
“A distribuição
demonstrou que
todo o produto é
um serviço e que
qualquer serviço é
um produto”
G
ary Hammel afirmou que “o século XXI favorecerá a
adaptação e a inovação contínua”, mas, para o sector da
distribuição, o século XXI começou logo em 1906, com
uma ideia de Clarence Saunders, que mais tarde, em 1927,
um descendente de irlandeses chamado Michael Cullen materializaria
através da abolição daquela instituição chamada balcão, permitindo
aos próprios clientes a escolha livre dos produtos que desejavam e inventando assim um sistema de compras, novo e revolucionário, designado por livre serviço.
O que é a inovação? Converter a necessidade em procura, afirmava
Peter Drucker. Parece fácil, descobrir o que as pessoas querem e darlhes isso. Mas às vezes esse “isso” não é suficiente, porque as pessoas
ou ainda não sabem bem o que querem ou querem mais do mesmo,
e essa situação é contrária à inovação. Henry Ford apercebeu-se bem
deste fenómeno quando confidenciou que, se tivesse perguntado, na
época, aos seus clientes o que eles queriam, teria obtido como resposta:
um cavalo mais rápido!
Por isto é que as actuais técnicas de estudos de mercado podem ainda
ser úteis mas dificilmente conduzirão à inovação, e só as ideias verdadeiramente disruptivas ou revolucionárias serão capazes de mudar o
paradigma das coisas instituídas. De facto, para ser criativo e gerar inovação, é necessário receber a desordem de braços abertos e perceber que
a complexidade é a fonte mais confiável das oportunidades criativas.
Inovação também pode ser definida como “uma ideia bem executada”.
E foi isso que Michael Cullen fez há quase cem anos, e é isso que
as empresas de distribuição fazem todos os dias. A distribuição tem
sabido sempre cultivar uma espécie de engenharia das experiências,
aprendendo a antecipar-se às necessidades dos consumidores, praticando a experimentação e a espontaneidade nas suas lojas como se de
laboratórios se tratasse.
A inovação não é algo que possa ser ligado e desligado, pelo que a crise
económica que hoje atravessamos não deve constituir razão para suspender a inovação, mas, pelo contrário, deveremos é perguntar porquê
e como poderemos ser ainda mais inovadores. E a resposta é simples
de dar mas difícil de executar: através da sustentinovação, isto é, de conseguir fazer mais com menos, centrar a inovação no ser humano, aplicar um marketing de valores, abrir os olhos e saber ver.
Inovar é a chave para nos defendermos dos famigerados “cisnes negros” (Taleb, 2009), metáfora da gestão a que a realidade tem vindo
a dar crescente evidência e razão. Tim Brow apresentou recentemente
um mapa de iniciativas de inovação que nos ajuda a perceber como
funciona a inovação.
A distribuição nos seus diferentes formatos está cheia de inovações
incrementais e evolucionárias, como, por exemplo, o estranho e espartano conceito discount ou o sofisticado conceito gourmet, mas também
revolucionárias, tais como o já referido livre serviço, o quase centenário
carrinho de supermercado, as embalagens de móveis planas e rectangulares do Ingvar Kamprad ou o código de barras e a leitura óptica.
Quando, em 1963, dois simples comerciantes franceses, chamados
Dennis Defforey e Marcel Fournier, juntaram, debaixo do mesmo tecto, sortidos alimentares e não alimentares, expostos numa loja gigante
de 2500 m2 e parque de estacionamento gratuito, aplicando promoções agressivas e preços baixos, estavam a inventar o hipermercado,
uma inovação que mudou a face do retalho e do consumo mundial.
Mesmo hoje, as empresas de distribuição encontram-se entre aquelas
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que mais e melhor inovam. A Groupon, por exemplo, inovou integrando a Web com o mundo real das experiências de compra, mudando o comportamento do consumidor, democratizando ainda mais
a compra e criando um novo modelo de negócio que já deu origem a
mais de 500 cópias em todo o mundo. A Marks & Spencer tornou-se
um exemplo pelo seu trabalho inovador em prol da sustentabilidade,
através de acções pioneiras de redução de resíduos de embalagem e diminuição da factura energética. Nesta área da sustentabilidade, a IKEA
é também uma empresa incontornável, pela busca e implementação de
soluções inovadoras em matéria de consumo de energia e de resíduos,
tendo criado na Suécia a venda electrónica de mobiliário usado para a
sua redução como resíduos. A Amazon é líder mundial do comércio
electrónico e do desenvolvimento do livro digital, inovação de excepção que irá mudar totalmente o mercado do livro e da edição, e a actividade da eBay no âmbito do comércio móvel irá mudar radicalmente
os processos do comércio de hoje.
A distribuição demonstrou que todo o produto é um serviço e que
qualquer serviço é um produto. A distribuição não pensa, olha, parafraseando Wittgenstein. E olha para os seus clientes porque qualquer
processo de inovação começa com a observação, e só assim se pode
gerar valor acrescentado que seja perceptível e valorizado pelos consumidores.
Não concordo naturalmente que a distribuição retalhista se esteja a tornar na derradeira actividade da raça humana, como afirmava Koolhaus
de uma forma manifestamente exagerada, mas subscrevo a opinião de
que o espectáculo de consumo em que a actividade retalhista se tornou
é um espelho da cultura dos nossos dias (Simon, 1992).
Ao longo dos últimos 50 anos, a distribuição tem sido capaz de abordar de forma holística a inovação, identificando os problemas ou
oportunidades que exigem a busca de soluções (intuição), gerando os
processos de desenvolvimento e teste das nossas ideias (idealização) e
conseguindo fazer o caminho que vai da ideia à sua prática (implementação).
A Whole Foods, por exemplo, organiza os colaboradores das suas lojas em pequenas equipas para testar as melhores formas de atender os
clientes e incentivar a partilha de novas ideias, nomeadamente através
de mostruários de produtos frescos, amostras grátis, abundante informação sobre a preparação dos alimentos, chegando ao ponto de permitir que os próprios clientes cozinhem na loja.
Claro que, por vezes, por melhor que seja a ideia, existem restrições
que as condicionam, como sejam a sua exequibilidade, a possibilidade
real de ser aplicada; a sua viabilidade, a capacidade de se integrar num
modelo de negócio sustentável; e a sua necessidade, ou seja, a sua
apetência para satisfazer as aspirações dos consumidores.
Por tudo isto, inovar é sempre mais fácil em equipa. Não é verdade
que todos somos mais inteligentes que cada um de nós? E sempre com
optimismo e confiança, predicados que não faltam à distribuição moderna, que faz da resiliência e capacidade de vencer as dificuldades uma
cultura muito própria e um valor muito seu.
Mas, no futuro, a inovação não será apenas das empresas, porque também os consumidores projectarão para si o que desejam e necessitam,
pelo que serão igualmente factores activos de inovação. Não serão mais
consumidores passivos mas participativos no processo de criação e de
inovação, o qual, no fundo, é um processo eterno sem princípio nem
fim.
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