Robson Perez Oliveira Junior Resumo Diante de um país

Propaganda
DESENVOLVIMENTISMO, DESIGUALDADE E CONSERVADORISMO
Robson Perez Oliveira Junior
Resumo
Diante de um país caracterizado pela pluralidade cultural e marcante
desigualdade
social, os processos de desenvolvimento
recorrem à
necessidade da realização de pactos nacionais com as elites, historicamente
baseados
em
orientações
conservadoras.
Assim
foi
com
o
desenvolvimentismo que propiciou a industrialização do Brasil e dessa forma
também será avaliada as políticas públicas do governo do PT, especialmente
a implantada na gestão do Presidente Lula, que convergiram em políticas
públicas do Estado brasileiro no combate à miséria, ancorado no crédito,
expansão do consumo e distribuição de renda: o social-desenvolvimentismo.
A análise das políticas sociais na gestão Lula, continuadas na gestão Dilma
Rousself, é o objeto da análise, em uma conjuntura de crise política e
enfraquecimento do social-desenvolvimentismo, no caso, estes diante das
variáveis que correspondem: ao posicionamento conservador de alguns órgão
midiáticos, impactos das políticas de austeridade fiscal e as manifestações
ocorridas contra o governo federal em ocorridas 2015 .
Palavras-Chave: desigualdade social, desenvolvimentismo, políticas sociais,
austeridade fiscal.
Introdução
A política desenvolvimentista aplicada no Brasil é marcada por ciclos,
projetos de desenvolvimento nacional, levados a cabo por setores
conservadores nos campos político e econômico. Nesse contexto, a
desigualdade social surge como um fenômeno que ajuda a garantir a
manutenção dessa ordem, diante das contínuas acomodações sociais, no
âmbito do embate entre as classes, mudando pouco as tradicionais relações
de poder. Florestan Fernandes indica que as sociedades subdesenvolvidas,
periféricas ao capitalismo, como a brasileira, possuem restritas elites que se
modernizam e transformam os processo de atualização histórica e
civilizacional em mudanças fundamentalmente políticas e patrimonialista.
Dessa forma, as mudanças de ciclo capitaneadas pela elite brasileira ganham
sentido a partir de três aspectos, de acordo com Florestan Fernandes (2008,
p.104):
"a) por dependerem ou resultarem de mecanismos de ação
grupal que traduzem as posições relativas dos grupos na
estrutura de poder da sociedade nacional; b) por exprimirem a
natureza e o grau de poder alcançado por determinados
grupos tanto na universalização de seus interesses, ideologias
e valores sociais quanto no controle dos processos que afetam
socialmente, de modo direto ou indireto, a manifestação
daqueles interesses ideologias e valores sociais; c) por
indicarem em que sentido e dentro de que limites a
organização da sociedade absorve, protege e expande,
institucionalmente, as condições que são essenciais para o
seu equilíbrio interno."
Nessa perspectiva, o combate à miséria durante os anos de 2003 a 2014
e os resultados conseguidos com essas políticas trazem novos desafios que
inauguram a necessidade de se pensar em um novo ciclo de desenvolvimento,
uma ampliação e fortalecimento do social-desenvolvimentismo. iniciado pela
gestão do presidente Lula. Na política, a disputa gira em torno em quem vai
comandar esse novo ciclo. Do ponto da clara necessidade de superação do
subdesenvolvimento brasileiro, políticas de caráter mais progressistas estão
sendo colocadas em cheque por forças políticas de caráter mais conservador,
estas vindo das forças que tradicionalmente já ocupam o poder político, mas
também com considerável apreciação popular e ancoradas em preceitos
neoliberais, especialmente no que se refere ao fortalecimentos de políticas de
austeridade fiscal para a manutenção da confiança e da saúde econômica do
Brasil no mercado financeiro mundial, bastante apregoadas pelos principais
veículos de comunicação do Brasil.
Esses fenômenos geralmente estão alinhados em campos ligados ao
espectro político de centro a extrema direita. Elas representam um contraponto
ao governo federal
e são variáveis fundamentais para a análise de
deterioração de um projeto político de desenvolvimento, que mesmo
fortemente baseado na ampliação do consumo, sob aumento da distribuição
de renda e aumento do crédito, tem contornos sociais, que amenizou a ainda
aguda desigualdade social no Brasil. Houve um aparato de políticas públicas
que possibilitam o rompimento do ciclo da misera, um pressuposto para o
combate efetivo à miséria. Em relação aos programas sociais que foram
colocados em prática durante o período estudado, os que financiam ou
subsidiam cursos universitários para alunos oriundos das escola públicas ou
de baixa renda ( como o PROUNI e o Fies), a frente de construção de casas
populares (Minha Casa Minha Vida), o Bolsa Família e os programas
específicos de combate a fome, como o Fome Zero e o Aquisição de Alimentos
são analisados aqui, dentro do conjunto de políticas públicas analisadas como
essenciais, como base fundamental para o social desenvolvimentismo
fomentado a partir de 2003 e também como principais variáveis que compõem
a frente de rompimento do ciclo da miséria no Brasil, especialmente o problema
fome.
Os investimentos necessários para a consolidação dessas políticas
públicas foi facilitado por uma ortodoxia econômica que foi marcante durante
os primeiros anos do governo Lula. Aos poucos, essa marca deu lugar a uma
transição paulatina para uma economia cada vez mais fundamentada na
expansão do mercado consumidor interno, mediante ajuste de distribuição de
renda e aumento do crédito. Nessa linha, um aparato que começa a dar forma
a um estado de bem estar social, ainda insipiente no Brasil. O super ciclo das
commodities verificado durante o período em analise dinamizou a economia
brasileira, especialmente até o ano de 2008, e ajudou a subsidiar as políticas
públicas que marcaram o período.
Os fenômenos sociais que hoje tentam dar um novo sentido ao
desenvolvimento brasileiro, especialmente no combate às políticas públicas e
papel do estado mais proeminente, possuem um sentido histórico, pois essa
postura tem recorrência nas mudanças de ciclo de desenvolvimento no Brasil,
exercida sob pressão conservadora e sob o pano de fundo da manutenção das
desigualdades sociais como instrumento de persistência da liderança do
desenvolvimento nacional sob as rédeas das tradicionais forças políticas
brasileiras. Trazendo como exemplo a vertiginosa urbanização no período do
processo de industrialização brasileira, Florestan Fernandes em "Sociedade
de Classes e Subdesenvolvimento" indica que este processo rompeu a
tradicional forma de exerce poder dessa elite. Fim de um ciclo bastante
arraigado a uma economia rural, agora urbana e modernizada, ainda sob
bases tradicionais de poder, apresentava uma elite em crise com a mudança
de desenvolvimento e a caracteriza da seguinte forma: "Os mesmo agentes
humanos que se revelaram capazes de absorver o progresso até o ponto de
provocarem uma crise de crescimento tão profunda na sociedade brasileira
mostram-se tímidos e desorientados diante das escolhas e das realizações que
precisam ser feitas na nova cena histórica" (FLORESTAN, 2001, p. 104).
Justifica-se dessa forma a contenção estratégica a partir da aplicação de
políticas conservadoras para enfrentar a complexa situação histórico-social
nas mudanças desenvolvimentistas.
A desigualdade social então deve ser entendida como componente de
uma estrutura social, não partindo de um pressuposto da desigualdade ser
uma condição, uma etapa a ser completa para a projeção de um
desenvolvimento econômico e social similar aos países do centro do
capitalismo; o problema é estrutural. Aqui, a desigualdade é tratada na
perspectiva do resultado de uma estrutura econômica desde o inicio periférica
ao capitalismo, fundada em relações de trabalho precárias. Sendo assim, esse
fenômeno social possui uma função no sistema vigente, perpassa diversos
níveis das relações sociais, torna-se base fundamental da dinâmica
econômica, ainda periférica ao capitalismo agora globalizado.
O caso brasileiro da desigualdade social é um fenômeno que permite,
ao longo das atualizações históricas e civilizacionais, a manutenção da
liderança de pequena parcela da população sob os ciclos de desenvolvimento
no Brasil, umbilicalmente ligada aos interesses estrangeiros. Já no início do
século XXI, percebe-se que a sociedade brasileira encontra-se em um
momento de inflexão, uma nova dinâmica social e econômica, nova projeção
internacional do Brasil, a entrada de mais recursos econômicos que podem
possibilitar a criação de bases para novas estratégias de política de
desenvolvimento para as próximas décadas. Nesse início de século, o debate
nacional engaja-se na fundação dos novos pilares do desenvolvimento
econômico e social, agora angariada em contexto politico democrático,
exigindo ainda mais consenso entre os setores sociais, marcado pela histórica
desigualdade social e do autoritarismo nos momentos de maior polaridade
politica, nos momentos de inflexão do desenvolvimento nacional.
O Altas da Exclusão Social no Brasil, uma compilação de dados feita
por vários autores a respeito das mudanças na desigualdade social ocorridas
durante os primeiros dez anos de desenvolvimento social e econômico.
Lançado em 2014, o estudo evidencia o ainda crônico subdesenvolvimento do
Brasil, porém destaca o aumento geral do IDH nos municípios brasileiros, como
também a diminuição das desigualdades regionais, diminuição no índice de
pobreza e exclusão social, aumento da escolaridade e do emprego formal. São
resultados que ajudam a entender quais foram os desdobramentos das
políticas econômicas focadas em criação de empregos e distribuição de renda
que trouxeram ao Brasil uma nova frente de combate as desigualdades sociais.
Levando-se em consideração as desigualdades regionais ainda
marcantes, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, segundo esse
estudo, verificou-se que em 2010 o Índice de Exclusão Social (IES) 1 foi de
0,63 no Brasil. Em síntese, a caracterização do Índice de Exclusão Social esta
ligado, além das sete variáveis que a compõe á condição do individuo
"específica ou holística de não estar exposta ao risco da violência, ao não ser,
ao não estar, ao não realizar, ao não criar, ao não saber e ao não ter". Quanto
mais próximo de zero for o índice, maior o grau de exclusão. Os pesquisadores
que realizaram o "Atlas da Exclusão Social do Brasil", ao avaliarem os índices
1
Segundo o Atlas da Desigualdade Volume I, para composição do índice de Exclusão Social
parte-se: de exposição ao risco de vida pela presença da violência; do ser enquanto
condição de autorreconhecimento da própria personalidade; de estar pertencendo
socialmente (família, vizinhança, grupal); de realizar tarefas e ocupações com posição social;
do criar, assumindo iniciativas e compreendendo o próprio mundo em que vive; do saber com
acesso à informação e capacidade cultural; e do ter rendimento que insere ao padrão de
consumo aceitável social e economicamente.
de exclusão social utilizam as sete variáveis fundamentais para compor o
índice geral que, quando analisadas, evidenciam alguns aspectos básicos que
qualificam as políticas públicas aplicadas pelo governo federal, principalmente
nesses três pontos: diminuição da pobreza (política de distribuição de renda,
especialmente a partir do aumento do salário mínimo, políticas de transferência
de renda e concessão facilitada de crédito), aumento do índice de empregos
formais (diminuição gradual do desemprego a níveis próximos a situação de
pelo emprego) e aumento da escolaridade e alfabetização.
Essas conquistas sociais diminuíram as desigualdades sociais no Brasil
e retiram o pais do mapa da fome, segundo levantamento de resultados
realizada pela ONU2. Dessas políticas públicas, a gestão da economia com
foco na criação de empregos e distribuição de renda, foi, gradativamente,
construindo um caráter mais interventor da gestão estatal, garantindo a
construção de um conjunto de politicas que caracterizam o social
desenvolvimentismo. Em relação a essa tendência, há forças de oposição,
ideológicas e políticas, que não compactuam com esse nível de administração
macroeconômica. Um prisma de análise a partir do neoliberalismo e da
necessidade do ajuste fiscal (garantindo maior competitividade, produtividade
e maiores lucros para o capital) em si, vai de encontro as políticas econômicas
intervencionistas e a toques mais keynesianos.
A capacidade do Estado em ter caixa para bancar essas e futuras
políticas públicas de amplitude passa pelo equilibro das contas do governo. O
Estado necessita garantir uma política fiscal mais equilibrada que, no caso
brasileiro, representa uma profunda mudança estrutural na cobrança de
impostos sob grandes fortunas, capital financeiro e ajuste das alíquotas de
imposto de renda para a aparcela mais rica da população, afim de garantir
recursos para as políticas sociais. É necessário arrecadar para garantir ao
Estado capacidade de investimento e criação do estado de bem-estar-social
de fato. Nessa lógica, no ano de 2015, constata-se, principalmente pela
debilidade politica e econômica do Brasil, um forte desequilibro das contas
2
Houve no Brasil queda de 82,1% no número de pessoas subalimentadas no período de
2002 a 2014. A queda é a maior entre seis nações mais populosas e também é superior a
média da América Latina, 43,1% http://www.fao.org/hunger/en/
públicas. Politicamente, a saída mais angariada vem se apresentando na
necessidade de diminuir os gastos sociais para aumento da produtividade e
competitividade da economia brasileira.
As políticas recessivas que vem sendo adotas para o combate a crise,
pautadas pela agenda neoliberal, aprofunda a crise econômica e desarticula
as políticas sociais e consolidação de novas bases para o aprofundamento do
social desenvolvimentismo. Grandes órgãos da imprensa nacional realizam,
de forma aberta e sistemática, oposição política ao governo federal, também
pautados pela agenda do discurso neoliberal, difundindo nas orientações
publicadas em editorais um papel menor do Estado na condução macro
econômica, mais desregulação do mercado financeiro e maior rigidez no ajuste
das contas do governo, evitando-se os "gatos sociais" .
Os movimentos
populares de oposição que vem realizando importantes manifestações
espontâneas nas principais cidades brasileiras, também compõem o conjunto
de variáveis que forma um importante contraponto a persistência do modelo
econômico e social do período em análise: início em 2003 até meados de
2013.
Diante das dificuldades econômicas e das variáveis mencionadas
anteriormente, pretende-se entender as desarticulações das políticas sociais
que vem ocorrendo com o ajuste fiscal recessivo e como isso afeta o caráter
desenvolvimentista das políticas econômicas e sociais iniciais em 2003. Dentro
da conjuntura atual de crise, a ausência de um novo pacto com os principais
setores da sociedade, em especial um pacto que renove o caráter
desenvolvimentista da estratégia de governo e garanta um próximo ciclo de
desenvolvimento
inclusivo,
é
confrontado
pelas
principais
forças
conservadoras, históricas no posicionamento reacionário que, como alerta
Florestan Fernandes: Mudança social de caráter estrutural e controle do poder
por círculos sociais conservadores são entidades que se excluem. O simples
fato de uma sociedade comportar indefinidamente essa já é, em si mesmo, um
índice relevante de que a mudança estrutural conta com limitada viabilidade"
(FLORESTAN, 2008 p. 112).
Conservadorismo e mudança estrutural.
O tradicionalismo latente na vida politica brasileira e no processo dito
modernizador, este a certa elite restrita, evidencia a constituição de uma
estrutura social embasa na manutenção de privilégios. Isso faz parte da raiz
da sociedade brasileira. Nossos desenvolvimentos políticos, mudanças
institucionais
de
impacto
foram
sempre
capitaneados
por
setores
conservadores, mesmo estes sendo em alguns casos vanguardistas.
Historicamente, mesmo esses grupos mais a frente, são provenientes dos
principais ciclos conservadores. Há atualizações históricas e civilizacionais
guiadas por esse setores, mas não há ruptura com a desigualdade social e
com a cultura do patrimonialismo. Há uma constante acomodação de
interesses, hora mais progressistas, hora mais conservadora, mas sempre
dentro de um limite politico que permita a manutenção de privilégios dos
setores conservadores que dominam a política brasileira.
Esses núcleos sociais durante o processo de modernização do país e
sua conformação atual, incorporou as relações capitalistas e democráticas,
fomentando a ordem social competitiva e igualde jurídica entre os cidadãos.
Porém, o tradicionalismo que compõe nossa raiz social, possibilitou
deformações e normas que perpassa as relações sociais das mais complexas
as mais triviais. Deformações e normas definidos e projetados no contexto da
dominação tradicionalista, puramente conservadora e patrimonialista. Há um
custo social para esse fenômeno, persistente na sociedade brasileira. Segundo
Florestan Fernandes esse desenvolvimento propiciou a extrema concentração
de renda por esses ciclos sociais conservadores e a perpetuação de técnicas
sociais incompatíveis com uma sociedade de classes, indicando a atuação
desses da seguinte maneira Florestan (2008, p. 106):
"1) a exercer pressões negativas, ultra egoísticas e
obscurantista sobre grupos mais ou menos empenhados em
aproveitar
construtivamente
as
alternativas viáveis de
aceleração da mudança social; 2) a degradar os efeitos
políticos da igualdade jurídica e a restringir o impacto da livre
competição fora da área econômica; 3) a proscrever o conflito
como mecanismo de acomodação de interesses e de relação
intergrupal."
Atualmente, diante de uma crise política em que os pactos com as elites
para construção de um consenso que permitia uma mínima governabilidade
em um sistema presidencialista de coalisão, nota-se um esgarçamento das
relações. Uma elite disposta a utilizar o conflito como forma de acomodação
dos embates entre as classes, sempre em um orientação conservadora,
percebe-se que uma conjunção de fatores que permitam a retomada do
crescimento econômico e inclusão social (envolvendo construção de
governabilidade e definição de estratégia de desenvolvimento) descampa para
um viés conservador e de ruptura com o social desenvolvimentismo, diante da
crise atual. A atuação conservadora foca-se, hoje, na desconstrução
institucional das políticas sociais; revisão de leis que permitam, por exemplo,
mudanças nos programas sociais, corte de benefícios, criação de tributo que
incide mais sob pobres e a classe média, de acordo com os tramites
necessários para um ajuste fiscal recessivo. Em um contexto de um
desenvolvimentismo construído sob crescimento econômico e inclusão social
embasados em distribuição de renda (aumento da massa de consumidores e
disponibilidade de crédito facilitado) leis como a do Salário Mínimo 3 e a
inclusão do Bolsa Família na Lei Orgânica da Assistência Social 4 podem ser
consideradas como conquistas progressistas em uma estrutura historicamente
conservadora.
A institucionalização de algumas das bases tão fundamentais até o
presente para o combate à miséria no País e a sustentação do social
desenvolvimentismo ajuda a estruturar o combate ao subdesenvolvimento
brasileiro e abrir precedente para construção paulatina de um sistema sólido e
amplo de bem estar social, pois " O fluxo da mudança social só se torna
estrutural e dinamicamente significativo quando ele se exprime através de
3
O Salário Mínimo é reajustado com base na correção da inflação, medida pelo Índice
Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de um ano antes, mais a variação do Produto
Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores. Lei sancionada por Dilma Rousself em 2011 e
válida até 2019. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12382.htm
4 O Bolsa Família foi, primeiramente, instituído como Medida Provisória 132/2003 e se
transformou em janeiro de 2004 na Lei 10836/04.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.836.htm
inovações
que
podem
ser
absorvidas,
difundidas
e
conservadas
institucionalmente".(FLORESTAN.2006, pag. 112).
Levando-se em conta a estrutura social historicamente conservadora e
as mudanças sociais provenientes das políticas públicas empregadas no
combate à pobreza, é possível verificar que houve uma redefinição das
contradições sociais no Brasil. Nesse fato, os apoios que serviram a essa
mudança, especialmente o pacto nacional lançado por Lula com as principais
lideranças políticas para a promoção de um desenvolvimentismo com
contornos sociais, hoje encontra-se sob crise, em um momento de inflexão. O
modelo de inclusão embasado na expansão da massa de consumidores,
distribuição de renda e facilidade de acesso ao crédito esgotou-se. Esse
modelo não mais possibilita a sustentação da saúde econômica e dos avanços
sociais necessários, pois entende-se nesse trabalho o atual momento histórico
no mesmo sentido sugerido por Alexandre de Freitas Barbosa (2014, p. 137):
"Parte-se da hipótese de que o governo Lula teria redefinido
as contradições da sociedade brasileira, trazendo assim uma
inflexão histórica, diferentemente do ocorrido nos anos 1990.
Por inflexão, sugere-se um novo compasso na evolução das
estruturas sociais, políticas e econômicas, cujo sentido não
está dado a priori, pois depende do mosaico de possibilidades
do presente na as lenta transformação em futuro".
As análises e resultados que estão presentes no "Atlas da Exclusão
Social no Brasil" evidencia que as mudanças ocorridas nas contradições
sociais a partir de 2003 inaugura uma nova dinâmica para o combate ao
subdesenvolvimento. Não se deve considerar o combate contra a fome ou
mesmo as políticas sociais que amenizam as desigualdades e são baseadas
na distribuição de renda como conquistas passadas ou que os problemas que
essas políticas atuam estejam superados. Como já mencionado, a luta do
conservadorismo concentra-se em neutralizar ou eliminar os apoios legais a
estas políticas, de acordo com ideais ou ideologias provenientes desses
grupos. Hoje, a necessidade esta em um novo pacto nacional para a promoção
do desenvolvimento que leve em consideração as conquistas realizadas e as
coloquem dentro de um aparato de políticas públicas que precisam ser
ampliadas, em vista do rompimento do ciclo da miséria e a necessidade de
novas políticas sociais.
A continuação e aprofundamento do social desenvolvimentismo,
aponta hoje na maior valorização do ensino público e produção tecnológica,
combate a violência urbana (em 2010, esse índice foi 36,5% superior em
comparação com o Índice Nacional de Exclusão Social) e um plano de
infraestrutura que de fato torne o Brasil um país de economia competitiva no
mercado internacional, como também um projeto macroeconômico que
coloque de fato o problema da desigualdade social no centro da estratégia
estatal.
Mídia e seu papel na desconstrução do social desenvolvimentismo
No processo de modernização da América Latina e a emergência das
democracias no continente, fica claro o papel fundamental dos meios de
comunicação no debate político. A consolidação de espaços públicos para
debate na democracia é um daqueles pré-requisitos que fundamenta o mínimo
de institucionalidade e respaldo à um sistema democrático. Nas democracias
do Ocidente, verifica-se a necessidade da livre imprensa, essa sendo esfera
pública primordial. A mídia não é o único espaço público com força política nas
democracias, porém isso pode variar nas diversas situações e na América
Latina os meio de comunicação são, por excelência, um espaço público
destacado. Há no Brasil considerável concentração da mídia, são oligopólios
familiares. Há dados que mostram que seis famílias controlam 70% dos meios
de comunicação no Brasil e em relação a TV Aberta 263 do total de 332
emissoras estão em poder de apenas cinco empresas de comunicação,
segundo o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC):
"São os meios de comunicação de massa que ocupariam, desde os primórdios
da constituição de uma sociedade urbana na América Latina, o lugar das
mediações sociais, estabelecendo uma nova diagramação de espaços e
intercâmbios urbanos" (CANCLINI, 1990. p 49).
No ano de 2010, a presidente da Associação Nacional de Jornais e
executiva do grupo Folha de São Paulo, Maria Judith Brito, de fato posicionou
o núcleo duro do oligopólio de comunicação do Brasil na disputa política,
formalmente, em discurso realizado na Associação mencionada:
"A liberdade de imprensa é um bem maior que não deve ser
limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre a
questão da responsabilidade dos meios de comunicação e,
obviamente, esses meios de comunicação estão fazendo de
fato a posição oposicionista deste país, já que a oposição está
profundamente fragilizada. E esse papel de oposição, de
investigação, sem dúvida nenhuma incomoda sobremaneira o
governo."
Os principais órgãos de imprensa do Brasil estão representados nessa
Associação. É revelador o posicionamento citado, pois expressa a importância
e força política dos principais meios de comunicação no Brasil. O controle de
parte significativa da esfera pública nacional por esses grupos é de tal monta
que se incumbem de um papel social que não lhes pertencem . Se colocaram
como forças políticas opositoras, interditando uma suposta imparcialidade ou
o mínimo de porosidade de seu conteúdo jornalístico à opiniões refratárias a
seus
editorias oposicionistas, pois arvoraram-se em realizar política
abertamente e de forma não equilibrada. A impressa brasileira durante as
gestões do PT na presidência da República realiza papel de oposição política
e não de meio de comunicação e espaço de debate público. Desde de então,
representa formalmente e de forma sistemática as principais variáveis que vão
de encontro a um projeto político que possui no social desenvolvimentismo
principal balizador desses governos.
Diante do momento de inflexão história que a politica brasileira enfrenta
e a necessidade de repactuação e reconstrução de um novo ciclo de
desenvolvimento, a imprensa como esfera pública, torna-se um espaço
enviesado e ajuda a aprofundar as incertezas políticas. Dessa forma "não se
espera, obviamente, que, nesse espaço público assenhorado pela mídia,
argumentos racionais sejam esgrimidos, questões substantivas sejam levadas
a debate e posições doutrinárias e ideológicas claras e diferenciadas venham
à tona" (AVRITZER E COSTA, 2006 p. 71).
Na construção da comunicação por esses meios, verifica-se desde de
meados de 2013, uma campanha pelo apoio à austeridade fiscal e
preocupação com a dívida pública, que, segundo esses meios, é consequência
das políticas sociais assistencialistas. Toda essa defesa é permeada por
críticas constantes à instituições políticas (partidos, congresso, executivo,
etc.), agências, empresas e políticas públicas. Isso representa no conteúdo
desses veículos uma sistemática desqualificação da política e do Estado.
Somente esse aspecto de oposição política já evidencia a densidade do viés
oposicionista nesta esfera pública, evidenciando a dificuldade no debate de
aprofundamento da intervenção estatal em qualquer projeto que tenha como
foco a criação de um estado de bem estar social e uma gestão da economia
que tenha os problemas sociais como foco.
Em artigo publicado pelo Manchetômetro5, em relação a uma análise a
respeito do posicionamento dos candidatos e da mídia sob economia durante
as eleições de 2014, fica claro o sentido da crítica na condução e disputa
ideológica de modelos econômicos, mídia e oposição compartilham a seguinte
análise6:
"Ao mesmo tempo em que criticam o baixo crescimento
também criticam a inflação, supostamente excessiva, que por
sua vez seria reflexo de um excesso de demanda, tendo um
suposto descontrole fiscal como seu componente central.
Consistentemente, propõe-se um ajuste fiscal por corte de
gastos, uma vez que a carga tributária já estaria alta demais".
O ajuste fiscal recessivo de fato se tornou realidade em 2015 e a
questão da carga tributária, mais onerosa sob os mais pobres e a classe média,
continua, para a parcela mais rica da população, ainda baixa. Dessa forma, se
verifica que o ajuste para equilibrar as contas públicas partiu de cortes em
programas sociais e ministérios (como Educação, Saúde e Desenvolvimento
5
O Manchetômetro é um website de acompanhamento diário da cobertura da política e da
economia na grande mídia, especificamente nos jornais Folha de S. Paulo, O Globo e Estado
de S. Paulo, e no Jornal Nacional, da TV Globo. O Manchetômetro é produzido pelo
Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP).
http://www.manchetometro.com.br/
6 Artigo "Crise Econômica" escrito por Carlos Pinkusfeld e publicado no Manchetômetro em
08/07/2014 http://www.manchetometro.com.br/artigos/crise-economica/
Social, principalmente), primordiais como alicerces para a continuação de uma
política de desenvolvimento orientada para a superação de problemas sociais.
Ajuste Fiscal e políticas sociais
O governo federal em 2015 cedeu à receita do ajuste fiscal, como fator
fundamental de equilíbrio econômico, especialmente na esfera de corte de
gatos, aumento dos juros, restrição de crédito e diminuição de beneficio
sociais, um ajuste recessivo com desdobramentos previsíveis: desaceleração
econômica, desemprego e alta inflação. Desde de o início da crise econômica
mundial, em meados 2008, a União Europeia vem recebendo um ajuste fiscal
sem precedentes, levado a cabo por uma tríade conhecida como Troika (Fundo
Monetário Internacional, Banco Central Europeu, Comissão Europeia). Lá, o
endividamento público de alguns países do bloco europeu chegou a níveis
alarmantes, acima da taxa de 100% em relação ao PIB e a solução encontrada
foi aplicação de políticas neoliberais, aplicação de um desmonte do sistema de
bem estar social europeu para a diminuição dos gastos públicos. Depois de
sete anos de crise é a vez do Brasil, em um proporção ainda bem menor, de
aplicação dessa receita para um ajuste de contas.
O governo federal apresentou em 2015 um orçamento com um déficit
R$ 30 bilhões ao Congresso Nacional. Em plena crise política e institucional, a
solução de buscar mais receitas foi substituída pelo corte em ministérios
chaves para a manutenção do social desenvolvimentismo. Dados do Ministério
do Planejamento indicam cortes significativos em 2015 e 2016 para esses
ministérios fundamentais, segue tabela abaixo:
Ministério
Desenvolvimento Social
Educação
Saúde
Corte 2015
13,5%
14,4%
37,8%
Corte 2016
12,9%
13,3%
35,9%
Dados do Ministério do Planejamento 2015/2016
Mesmo depois de quase cinco anos de queda contínua na relação dívida
pública e PIB e atualmente esta apresentar relação de 46%, aplica-se o ajuste
para conter a dívida sob cortes em programas sociais. Os cortes centraram-se
em programas sociais fundamentais para o combate as desigualdades. De
acordo com o Ministério do Planejamento o Orçamento9 o ajuste fiscal em
2015 logrou as seguintes cifras: Pronatec (redução de R$ 2,487 bilhão no
orçamento), redução de 75% nas vagas para o Fies (de 731 mil vagas para a
oferta em 2015 de 313 mil vagas), o Minha Casa Minha Vida esta, desde de
fevereiro, com contratações suspensas e o programa Aquisição de Alimentos
teve orçamento reduzido de R$ 1 bilhão para R$ 647 milhões. Em relação as
regras do salário mínimo, fundamental na política de distribuição de renda e o
Bolsa Família, ainda não foram alvos de cortes de orçamento.
Conclusão
Desde da era Vargas com o nacional desenvolvimentismo, o Estado foi
fundamental para garantir a existência de instituições e políticas sociais
sólidas, como também garantir um foco para o desenvolvimento econômico.
Em um país fortemente embaso sob relações sociais conservadoras, desiguais
e elitistas, as estratégias desenvolvimentistas foram fundamentais para
garantir um mínimo de unidade nacional em prol da resolução de conflitos ou
problemas de ordem conjuntural em cada época.
Dessa forma, atualmente, percebe-se uma ausência de algo próximo a
um pacto ou mesmo uma solidariedade nacional que enxergue no combate
incisivo as nossas desigualdades sociais e histórico subdesenvolvimento,
como um foco de convergência
para aplicação de ações políticas.
Historicamente, nossos momentos de inflexão políticas foram resolvidos com
autoritarismo, em doses autocráticas diversificadas, mas sempre com
resoluções que não angariavam as demandas de mudanças estruturais de
fato. Hoje, discutimos o papel do Estado no Brasil sob um regime democrático
e sob políticas sociais que já mostraram os resultados positivos. O Brasil entrou
no século XXI com suas contradições sociais modificadas, menos injustas. Há
criticas a respeito da forma como foi realizado o processo de inclusão,
especialmente no fomento à expansão de um mercado consumidor, a alocação
de 40 milhões de brasileiros sob a classe média, mas a não expansão ou
melhora dos serviços públicos, formamos consumidores nesse processo e não
indivíduos com mais direitos e cidadania. Porém, é preciso pensar o
subdesenvolvimento brasileiro como um problema que precisa ser enfrentado
com ação direta do Estado, de forma estratégia e a longo prazo, pois é
estrutural. O Brasil saiu do mapa da miséria mundial, tornou-se referência no
combate a pobreza na ONU e hoje recebemos delegações de nações do
mundo inteiro para aprender a expertise e tecnologia por trás dos programas
sociais.
O que foi construído de política social a partir de 2003 não consolidou
reformas essenciais (como as reformas política, da imprensa e fiscal) que
poderiam dar maior sustentação ao social desenvolvimentismo nessa
conjuntura atual de superação de um ciclo de desenvolvimento e construção
de um próximo. Dessa forma, fica claro que passar por essas reformas é
fundamental para a profundar as políticas sociais e garantir de fato um estado
de bem estar social para os brasileiros. O que, por exemplo, "O Atlas da
Exclusão Social" nos permitir entender é a necessidade de criar e reorientar as
ações do Estado para o combate a violência urbana, garantir educação pública
de ponta, produção tecnológica e inovação, como também investimentos
maciços em infraestrutura e serviços públicos para dar suporte a um novo ciclo
de crescimento econômico e desenvolvimento. Daí, a atual política de ajuste
fiscal recessivo aliada a uma guinada política conservadora e neoliberal torna
a sustentação de desenvolvimento econômico voltado aos desafios sociais
insipiente. Essa nova reorientação do Estado brasileiro para voltar ao combate
do subdesenvolvimento encontra-se hoje ameaçada por um projeto de gestão
macroeconômica neoliberal e pelas ações das estruturas e atores sociais que
representam o conservadorismo brasileiro histórico.
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