Materiais Elétricos - Universidade Federal do Piauí

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE
CENTRO DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ELÉTRICA
LABORATÓRIO DE ALTA TENSÃO
Materiais Elétricos
Capítulo 1 - Campos Em Meios Materiais Propriedades Elétricas
Washington Neves
Junho, 2001
Capítulo 1
Campos Em Meios Materiais - Propriedades Elétricas
1.1 Introdução
O estudo das propriedades dos materiais tem contribuído para a introdução de novos
dispositivos usados em engenharia elétrica. O desenvolvimento tecnológico da indústria
eletro-eletrônica está fortemente ligado ao avanço da ciência dos materiais. Para evidenciar o
desenvolvimento dessa área, podemos citar: diodos lasers e fibras óticas – utilizados na
transmissão e recepção de sinais; as ligas amorfas - usadas em núcleos de transformadores de
alto rendimento; varistores à base de óxido de zinco – utilizados em pára-raios de
subestações; materiais poliméricos – utilizados em cadeias de isoladores, etc. Para o
entendimento das propriedades dos materiais é necessário o estudo de tópicos como: física do
estado sólido; física de gases e física moderna.
Pretende-se neste capítulo, fazer uma breve revisão sobre campos elétricos em meios
materiais e uma breve introdução a perdas em dielétricos. Deve-se enfatizar que muitas vezes
é conveniente a utilização de modelos, em escala atômica, que justifiquem as grandezas reais
medidas.
1.2 Modelos
O comportamento físico de um material pode ser caracterizado por grandezas
macroscópicas, quantidades mensuráveis, como condutividade elétrica, condutividade
térmica, permeabilidade magnética, permissividade elétrica, etc. Em geral, essas grandezas
são funções de parâmetros externos como temperatura, pressão e freqüência do campo
aplicado. O estudo das grandezas macroscópicas tem levado a conclusões importantes a
respeito da microestrutura do material (estrutura atômica do material).
Os materiais são compostos por átomos e os átomos de núcleos e elétrons. No estudo de
materiais muitas vezes torna-se conveniente à adoção de modelos apropriados, em escala
atômica, que representem o comportamento do material em escala macroscópica. A
introdução de modelos teve grande desenvolvimento através dos trabalhos de Faraday, Lord
Kelvin, Maxwell e J. J. Thomson no século passado. Em tese, os modelos não precisam
corresponder à realidade em termos microscópicos, mas sua utilização está condicionada a
uma eficiente aproximação da realidade macroscópica, sendo uma ferramenta muito
importante para o entendimento dos fenômenos que ocorrem na natureza. Por exemplo, em
eletricidade não existe carga estática, porém modelos adotados em eletrostática têm
contribuído muito para o entendimento de campos elétricos em meios materiais ao longo dos
anos. Além disso, modelos diferentes podem reproduzir a mesma realidade.
1.3 Conceitos Básicos de Eletrostática
Existem cinco grandezas em física, que servem de ponto de partida para a definição de
todas as outras grandezas utilizadas em física e engenharia: massa, comprimento, tempo,
carga, temperatura. Essas cinco grandezas são intuitivas e portanto consideradas indefiníveis.
Por exemplo, a temperatura é associada com a sensação de “quente” ou “frio” sem a
preocupação de dar uma definição precisa desses termos.
As cargas elétricas são as fontes de todos os campos eletromagnéticos. A unidade de
carga é o Coulomb (C). O elétron tem carga negativa de aproximadamente e = -1.6 x 10-19 C,
conhecida como carga elementar. A carga é quantizada e se conserva, ou seja, o excesso de
1
cargas num objeto é múltiplo da carga elementar e a carga líquida de um sistema isolado se
mantem constante.
Em alguns materiais, a carga flui facilmente, em outros não. Quanto à condução de
eletricidade, costuma-se dividir os materiais em três categorias:
•
Condutores – ex. prata, cobre, alumínio, ferro, metais em geral.
•
semi-condutores – ex. silício e germânio (utilizados na indústria eletro-eletrônica na
fabricação de diodos, transistores, tiristores, etc.), SiC e ZnO (utilizados em
dispositivos de proteção de equipamentos contra surtos atmosféricos).
•
dielétricos – ex. ar nas condições normais de temperatura e pressão (CNTP), ar
comprimido, vácuo, SF6, papel, tântalo, borracha, óleo mineral, madeira, porcelana,
vidro, plásticos, etc.
A maioria dos materiais é ou condutor ou dielétrico. Nos condutores, os elétrons mais
distantes do núcleo de cada átomo são fracamente ligados a seus átomos particulares e estão
praticamente livres para percorrer o material. Nos materiais dielétricos, os elétrons estão
fortemente ligados a seus átomos, e a condução só é possível na presença de campos elétricos
elevados. Os semicondutores estão numa categoria intermediária, não são tão bons condutores
como os metais, mas são melhores condutores que os materiais dielétricos. A condutividade
dos semicondutores pode ser controlada pela adição de impurezas em concentrações
apropriadas.
Existem várias formas em que objetos podem adquirir carga líquida. Por exemplo:
1. Atrito entre objetos – Ao se esfregar dois objetos, os elétrons de maior energia fluirão
do objeto em que estavam para o outro. Esse efeito pode ser verificado no cotidiano.
Após pentear o cabelo, a pessoa pode verificar que o pente atrai pequenos pedaços de
papel, indicando que o pente, ao ser friccionado com o cabelo, adquiriu uma carga
líquida. Outros exemplos: atritando vidro com sêda, o vidro fica com carga positiva;
atritando um bastão de PVC com uma peça de lã, o bastão adquire carga negativa.
2.
Contato de um objeto carregado com um objeto condutor neutro – Se um objeto
carregado tocar um condutor, uma parte da carga é transferida entre objeto e condutor,
carregando o condutor com carga de mesmo sinal da carga do objeto.
3. Carga obtida por indução – Considere a situação em que um objeto com carga líquida
positiva é colocado próximo a um condutor, sem tocá-lo. Se o condutor for aterrado1,
cargas negativas fluirão da terra para o condutor. Quando a conexão para a terra é
removida, o condutor terá carga de sinal oposto a do objeto.
4. Carga obtida por radiação (efeito fotoelétrico) – Condutores podem ficar carregados
ao receberem luz de uma fonte luminosa. Se fótons do feixe luminoso tiverem energia
suficiente, podem arrancar elétrons do condutor deixando-o com carga líquida
positiva. Este fenômeno é conhecido como efeito fotoelétrico.
1
Quando um objeto é conectado a terra por um fio condutor, diz-se que o bjeto está aterrado. A conexão feita
proporciona o fluxo de cargas livres do objeto conectado para a terra ou da terra para o objeto conectado.
2
A seguir serão estudados campos produzidos por distribuições de cargas estacionárias
começando pela lei de Coulomb, definição de campo elétrico, lei de Gauss, potencial escalar
elétrico e capacitância.
1.3.1 Lei de Coulomb
Embora tenha sido estabelecido que a carga elétrica é uma grandeza fundamental,
indefinível, pode-se dar uma definição precisa da quantidade de carga em termos dos
conceitos da força que age entre corpos carregados. Em 1785, um engenheiro francês, Charles
Coulomb, conseguiu medir forças que atuam entre duas cargas separadas por uma distância
R12 no vácuo (Figura 1.1).
→
Q1
Q2
R12
[x1, y1, z1]
→
F
[x2, y2, z2]
→
→
R2
R1
[0,0,0]
Figura 1.1: Lei de Coulomb para cargas puntuais.
O resultado é conhecido como lei de Coulomb e é dada por:
F=
Q1 Q2
4 π ε 0 R122
N
em que ε0 é a permissividade do vácuo e ε0 ≅ 8.854 x 10-12 F/m. Na forma vetorial, a
equação acima pode ser reescrita como:
→
→
Q1 Q2
F=
a R12
2
4 π ε 0 R12
(1.1)
→
O vetor unitário
a R12 pode ser facilmente determinado no sistema de coordenadas
retangulares. Por exemplo, se Q1 estiver localizado em [x1, y1, z1] e Q2 em [x2, y2, z2], o vetor
que aponta na direção de Q1 para Q2 será dado por:
→
→
→
→
→
→
R12 = R2 − R1 = ( x 2 − x1 ) a x + ( y 2 − y1 ) a y + ( z2 − z1 ) a z .
Onde
→
ax
(1.2)
→
→
, a y e a z são vetores unitários na direção dos eixos x, y e z respectivamente. O
→
→
vetor unitário a R12 pode ser obtido normalizando-se R 12 para o comprimento unitário:
→
a R12
Onde
→
R
= 12 .
R12
(1.3)
R12 = ( x2 − x1 ) 2 + ( y2 − y1 ) 2 + ( z2 − z1 ) 2
3
(1.4)
Exemplo 1 - Força entre cargas puntuais
Considere um par de cargas puntuais no espaço livre (Figura 1.2). Q1 , de -300µC , está
localizada em [ 2,4,5] m. A carga Q2 , de 10 µC , está localizada em [1,1,3] m. Determine a
força em Q1 exercida por Q2 .
→
→
Q1
Q2
R21
F 21
[x1, y1, z1]
[x2, y2, z2]
→
→
R1
R2
[0,0,0]
Figura 1.2: Par de cargas puntuais.
Solução:
→
→
→
→
→
→
→
→
→
R21 = R1 − R2 = ( x1 − x 2 ) a x + ( y1 − y 2 ) a y + ( z1 − z 2 ) a z = a x + 3 a y + 2 a z
e
R21 = ( x1 − x 2 ) 2 + ( y1 − y 2 ) 2 + ( z1 − z 2 ) 2 = 12 + 32 + 2 2 = 14 .
Logo,
→
→
→
a R 21
→
→
→
→
→
ax + 3a y + 2 az
R
= 21 =
≅ 0,27 a x + 0,80 a y + 0,53 a z .
R21
14
→
Assim, F21 será dado por:
→
→
→
→
Q1 Q2
( −300x10 −6 ).(10x10 −6 ) →
. a R21 = − 0,52 a x − 1,55 a y − 1,03 a z
F21 =
a R21 =
2
4π ε 0 .14
4 π ε 0 R12
→
N.
Para um sistema de cargas (Figura 1.3), pode-se determinar a força que atua em cada uma
delas.
→
R1
Q1
→
q
→
R2
Q2
F
→
R3
Q3
→
R4
Q4
→
RN
QN
Figura 1.3: Superposição de forças.
A superposição de forças atuando numa carga q devido a várias cargas puntuais Q1,
Q2,..., QN é dada por:
N
→
→
qQi
F=∑
.
a
(1.5)
Ri
2
i =1 4πε 0 Ri
4
→
Onde Ri é a distância entre as cargas Qi e q, e a Ri é o vetor unitário apontando de Qi para q.
A força eletrostática é talvez a força mais importante da natureza, ela é a força que
mantém juntas as moléculas das substâncias.
1.3.2 Campo Elétrico
Considere uma carga Q imóvel no espaço vazio. O campo elétrico produzido pela carga
Q em um ponto do espaço é definido em termos da força elétrica que age numa carga de
prova Qp colocada naquele ponto (Figura 1.4). Assim, um campo elétrico existe se uma carga
de prova em repouso, colocada no ponto desejado, sofrer a ação de uma força elétrica.
→
Q
Qp
Rp
→
F
Figura 1.4: Campo elétrico gerado por Q.
→
F=
QQ p
4π ε 0 R p2
→
aRp
Na Figura 1.4, diz-se que a carga Qp está dentro de um campo de forças gerado por Q.
Define-se então o vetor campo elétrico, devido a carga puntual Q, como a força exercida em
uma carga de prova positiva por unidade de carga de acordo com a equação abaixo:
→
F
.
E=
Qp
→
Na forma vetorial, tem-se:
→
E=
 N V kV 
,
,

.
 C m cm 
→
Q
a
R
4πε 0 R p2 p
(1.6)
De uma maneira geral, o vetor campo elétrico produzido por uma distribuição de cargas
qualquer é dado por:
→
F
E = lim Q p →0
.
Qp
Qp deve ser infinitamente pequena de modo que sua presença não afete a distribuição original
de cargas.
Faraday e Maxwell melhoraram o significado físico do campo elétrico através da
representação gráfica de linhas de forças, ou linhas de fluxo elétrico.Em qualquer ponto, o
vetor campo elétrico é tangente a linha de fluxo que passa no ponto considerado. A densidade
de linhas de fluxo é uma indicação da amplitude do campo na região. O campo elétrico devido
a uma carga puntual tem direção radial. Para uma carga positiva Q, pode-se imaginar linhas
de fluxo na direção radial partindo da carga (Figura 1.5). Para uma carga negativa, as linhas
de fluxo elétrico terminariam na carga.
→
5
Q
Figura 1.5: Linhas de fluxo elétrico geradas por uma carga puntual.
As regras para o esboço de linhas de fluxo para qualquer distribuição de cargas são as
seguintes:
1. As linhas devem começar nas cargas positivas e terminar nas cargas negativas, ou no
infinito no caso da carga líquida no espaço ser diferente de zero;
2. O número de linhas que parte de uma carga positiva ou chega a uma carga negativa é
proporcional a amplitude da carga.
3. Não há cruzamento de linhas de fluxo, elas se interceptam apenas em cargas puntuais.
4. Em um condutor, a carga líquida se concentra em sua superfície. No equilíbrio
eletrostático, o campo elétrico médio no interior de um condutor ou casca condutora de
superfície fechada, é nulo. Assim, do ponto de vista macroscópico, não há linhas de
fluxo no interior de condutores, i.e., as linhas de fluxo não atravessam condutores.
Como as linhas de fluxo começam e terminam em cargas elétricas, as cargas positivas
estão localizadas na superfície em que as linhas saem enquanto que as cargas negativas
estão localizadas na face do condutor em que as linhas de fluxo chegam.
5. Em um condutor, quando o equilíbrio eletrostático é atingido, as linhas de fluxo são
normais à sua superfície. Se não fosse assim haveria o deslocamento de cargas ao longo
da superfície do condutor.
1.3.3 Lei de Gauss - Fluxo e Densidade de Fluxo Elétrico
Foi mostrado anteriormente que o campo elétrico devido a uma carga puntual no vácuo é:
→
E=
→
Q
a .
2 Rp
4πε 0 R p
Se o meio em que a carga está localizada não for o vácuo, ε 0 deverá ser substituído por ε , a
permissividade do meio:
ε = ε 0ε r .
6
ε r é a permissividade relativa ou constante dielétrica relativa do meio. Ela tem valor unitário
paro o vácuo, cerca de 80 para a água e em alguns dielétricos pode atingir valores acima de
1000. Devido à permissividade relativa, o campo elétrico depende do meio para qualquer
distribuição de cargas. Se o campo elétrico for multiplicado pela permissividade, tem-se como
resultado um novo campo vetorial, denominado de densidade de fluxo elétrico, que depende
apenas das cargas livres.
→
→
D= ε E .
Para uma carga puntual localizada no vácuo:
→
D=
Q →
aR .
4π R p2 p
O fluxo elétrico é uma medida do número de linhas de fluxo que atravessam uma superfície.
O fluxo total que atravessa uma superfície fechada que envolve uma carga líquida Q pode ser
obtido pela lei de Gauss:
→ →
φ = ∫ D .d s = Q .
(1.7)
s
→
A superfície S é chamada de superfície gaussiana. ds é um elemento de área de S e ds é um
vetor normal à essa superfície. No caso de uma carga puntual, para uma esfera imaginária de
raio R, centrada na carga Q tem-se:
D=
φ
Q
=
.
2
4πR
4πR 2
(1.8)
A lei de Gauss é bastante aplicada para resolver problemas de campos em situações onde
→
→
existe simetria. O interesse é normalmente determinar D ou E partindo da expressão
→ →
→
Q = ∫sD. d s . No entanto, para retirar D do interior da integral é conveniente escolher uma
superfície gaussiana que satisfaça as condições abaixo:
→
1 - D é em qualquer ponto ou normal ou tangencial à superfície gaussiana
→ →
→ →
D . d s = Dds ou D . d s = 0.
→ →
2 - Na porção da superfície onde D . d s não for zero, D deve ser constante.
Exemplo 2 - Campo devido a uma distribuição linear de cargas.
O condutor filamentar da figura abaixo tem densidade linear uniforme ρl C/m. Determine
a densidade de fluxo e o campo elétrico no espaço.
7
→
D
→
→
D
ds
→
r
ds
L
ρl ( C / m)
Figura 1.6: Campo devido a uma distribuição linear de cargas.
Solução: Note que se a superfície gaussiana for um cilindro fictício de raio r e comprimento L
(linha tracejada) com centro na linha de cargas, a densidade de fluxo e o campo elétrico
podem ser facilmente determinados pela lei de Gauss. Assim,
Q =φ =
∫
∫
→ →
D . d s = D . ds = D .2πrL
s
ou
D=
s
ρ
Q
= l
2πrL 2πr
O campo elétrico será então:
E=
C / m2
D
ρl
=
N /C
ε 0 2πε 0r
1.3.4 - Potencial Elétrico
Considere uma carga de prova Qp deslocando-se de uma distância dl, contra o campo
→
elétrico E da Figura 1.7.
→
E
Qp
dl
Figura 1.7: Carga deslocando-se dentro de um campo elétrico.
O trabalho realizado por Qp ao percorrer uma distância dl, no sentido contrário ao campo, é
dado por:
→ →
→
→
d W = F . dl = − Qp E . dl
Para a carga Qp deslocando-se de um ponto B para um ponto A, tem-se:
W =
∫
A→
B
8
→
F . dl
→
A
→
W = − ∫ Q p E . dl .
ou
B
A diferença de potencial entre os pontos A e B é definida como o trabalho realizado por
→
uma fonte externa para trazer uma carga unitária de B até A, dentro do campo elétrico E .
Assim,
A→ →
W
= − ∫ E . dl
(1.9)
V AB = V A − V B =
B
Qp
Exemplo 3 - Potencial elétrico devido a uma esfera uniformemente carregada
Considere uma esfera condutora com carga total Q uniformemente distribuída em sua
superfície, como mostrado na Figura 1.8. Determine o campo elétrico dentro e fora da esfera.
Determine também a diferença de potencial entre os pontos A e B.
Q
R
A
B
ra
rb
Figura 1.8: Casca esférica uniformemente carregada.
Solução: o campo elétrico poder ser obtido facilmente através da utilização da lei de Gauss.
Assim,
• traçando-se uma superfície gaussiana concêntrica à esfera e no seu interior, vê-se que o
campo elétrico para r<R é nulo2;
• para r ≥ R , tem-se:
D=
φ
Q
=
2
4π r
4π r 2
e
E=
Q
.
4πε 0 r 2
Note que o campo elétrico na região fora da esfera é idêntico ao campo produzido por
uma carga puntual de mesmo valor localizada no centro da esfera. Mais ainda, qualquer
distribuição simétrica de carga, cuja carga total seja Q, colocada dentro de uma esfera fictícia,
produzirá o mesmo campo elétrico fora da esfera. Ou seja, para um observador fora da esfera,
todas essas fontes de carga são equivalentes.
2
Se as cargas tiverem liberdade de movimento e houver campo no interior do condutor, haverá aceleração das
cargas para a superfície. Quando o equilíbrio eletrostático for atingido, o campo elétrico no interior do condutor
será nulo. O potencial no interior da esfera será constante.
9
O potencial elétrico VAB pode ser obtido por:
A→
→
V AB = − ∫ E . dl =
B
V AB = −
ou
∫
ra
rb
∫
B→
A
→
E . dl
Q
Q
Q
dr =
.
−
2
4
πε
r
4
πε
4πε 0 r
0 a
0 rb
1.3.5 Capacitância
Todo condutor elétrico pode ser carregado, adquirindo um potencial que logicamente
dependerá da carga no condutor, como foi mostrado na seção anterior. A relação entre a carga
no condutor e o potencial elétrico adquirido por ele é conhecido como capacitância.
Considere a Figura 1.9.
Condutor A (carga +Q)
E
E
E
E
Meio de permissividade
ε0
E
Condutor B
(carga -Q)
Figura 1.9: Capacitância entre condutores.
De uma forma geral, a capacitância entre os condutores A e B é dada por:
Q
C=
,
V AB
ou
→
→
∫ D . ds
C=
.
− ∫ E . dl
S
A→
→
(1.10)
B
1.3.6 Capacitores com Dielétricos - Polarização (Visão Macroscópica)
Um dielétrico é um material não condutor como papel, borracha, ou vidro. Quando um
material dielétrico é inserido entre as placas de um capacitor, sua capacitância aumenta. Se o
dielétrico preencher completamente o espaço entre as placas, a capacitância cresce por um
fator εr, chamado de permissividade relativa ou constante dielétrica.
O seguinte experimento pode ser feito para ilustrar o efeito de um dielétrico em um
capacitor (Figura 1.10).
10
-Q0
+Q0
-Q0
+Q0
dielétrico
V0
V
a) capacitor sem dielétrico entre as placas.
b) capacitor com dielétrico.
Figura 1.10: Mudança na capacitância de um capacitor de placas paralelas.
Considere um capacitor de placas paralelas de carga Q0 e capacitância C0 na ausência de
um dielétrico. A diferença de potencial, medida por um voltímetro ideal conectado entre as
placas do capacitor é V0= Q0/ C0 (Figura 1.10a) . Se um dielétrico for colocado entre as
placas, a indicação do voltímetro decresce de um fator εr para um valor Vd =V0/εr. Como Vd
<V0, tem-se que εr>1. A mudança do potencial nas placas se deve à presença de cargas
induzidas na superfície do dielétrico, como explicado mais tarde.
Como a carga nas placas do capacitor não mudou, conclui-se que a capacitância deve ter
um novo valor
Q
Q0
(1.11)
Cd = 0 =
= ε r C0 .
Vd V0 / ε r
entre as placas. Embora a análise tenha sido feita para um capacitor de placas paralelas, a
equação (1.11) também se aplica a um capacitor qualquer contendo dielétricos lineares,
homogêneos e isotrópicos. Para esses capacitores, a capacitância depende apenas da
geometria dos condutores e do meio dielétrico.
A capacitância de um capacitor de placas paralelas preenchido com um dielétrico pode
ser expressa por:
ε ε A
Cd = r 0 ,
(1.12)
d
onde A é a área das placas e d a distância entre as placas. Na prática, o menor valor de d é
limitado por descargas elétricas que poderiam ocorrer através do dielétrico. Para qualquer
separação d, a máxima tensão que pode ser aplicada no capacitor sem provocar descargas
depende da rigidez dielétrica (valor máximo da intensidade de campo elétrico suportável pelo
dielétrico sem a ocorrência de ruptura) do material entre as placas, que para o ar nas
condições normais de temperatura e pressão, é de aproximadamente 30 kV/cm. Se o campo
aplicado exceder a rigidez dielétrica do material, surgirão descargas que levarão à perfuração
do dielétrico. A maioria dos materiais isolantes têm rigidez dielétrica e permissividade
relativa superiores às do ar, como mostrado na Tabela 1. A utilização de dielétricos em
capacitores apresenta as seguintes vantagens:
• o aumento da capacitância do capacitor;
• o aumento da máxima tensão de operação do capacitor;
• serve de suporte mecânico entre as placas condutoras.
11
Tabela 1 - Constante dielétrica e rigidez dielétrica de alguns materiais à temperatura ambiente
Material ou meio
Constante dielétrica
Rigidez dielétrica (kV/cm)
(Permissividade relativa) εr
Vácuo
1.00000
∞
Ar seco
1,00059
30
Baquelite
4,90000
240
Quartzo
3,78000
80
Vidro pirex
5,60000
140
Papel
3,70000
160
Água
80,00000
80
Teflon
2,10000
600
Óleo isolante
2,50000
150
Para o capacitor de placas paralelas com dielétrico entre as placas tem-se: Ed < Eo indicando a
presença de cargas induzidas na superfície do dielétrico. O campo no dielétrico pode ser
calculado levando em conta a contribuição da carga nas placas e as cargas induzidas na
superfície do dielétrico. Logo,
→
→
→
E d = E 0 + Ei
→
(1.13)
→
Em que E 0 é o campo devido apenas à carga nas placas e E i o campo gerado pelas cargas
induzidas na superfície do dielétrico. De (1.11), tem-se:
Q
Q0 . d
Vd = 0 =
.
Cd ε r ε 0 A
Como Ed =Vd/d e E0=V0/d, tem-se:
Q0
Q0
Ed =
e E0 =
.
ε rε 0A
ε0A
Pode-se escrever (1.13) na forma:
Q
q
(1.14)
Ed = 0 − i ,
ε0A ε0A
onde qi representa as cargas induzidas na superfície do dielétrico como mostrado na Figura
1.11.
+qi
-qi
+++
+Q0
++ - -Q0
+
++Figura 1.11: Cargas induzidas na superfície do dielétrico.
Q0/A é a densidade de fluxo D devido à carga nas placas se desprezarmos o efeito das bordas
e qi/A é a densidade de fluxo P devido ao efeito de polarização do dielétrico. Para o capacitor
de placas paralelas, a equação 1.14 pode ser reescrita como:
D = ε 0 Ed + P .
De uma maneira geral, para um dielétrico linear e isotrópico, pode-se relacionar a densidade
de fluxo nas placas de um capacitor com o campo macroscópico no dielétrico na forma
12
→
D=ε
→
0
→
E+ P.
(1.15)
A densidade de fluxo é uma função linear do campo elétrico
→
→
D=ε 0 ε r E
(1.16)
De 1.15 e 1.16, tem-se
→
→
P = ε 0 (ε r − 1) E
(C / m2 )
(1.17)
→
P é definido como Polarização e é conhecido também como momento de dipolo por unidade
de volume. Para dielétricos lineares, a polarização é proporcional ao campo elétrico aplicado
ao dielétrico. Na dedução da equação 1.17 nada foi dito a respeito do estado físico do
dielétrico, assim ela é válida para sólidos, líquidos e gases. Se tornará evidente que εr é uma
grandeza macroscópica que depende da estrutura atômica do material.
1.3.7 Permissividade Relativa Complexa - Perdas em Dielétricos em Campos Alternados
Considere um capacitor ideal, cujo dielétrico é o vácuo, alimentado por uma fonte de
freqüência ω (Figura 1.12).
i(t)
Cd
v(t)
Figura 1.12: Fonte senoidal alimentando capacitor ideal.
A carga q(t) nas placas do capacitor pode ser expressa como função do potencial nas
placas. Assim,
q (t ) = C0 v(t ) .
Para uma fonte v(t ) = Vm cosω t , a corrente no capacitor é:
i (t ) =
dq
dv
= C0
= −ω C0 Vm sen ω t .
dt
dt
Os fasores de corrente I e tensão V estão relacionados de acordo com a equação:
I = j ω C0 V .
Imagine agora que o capacitor seja preenchido por um dielétrico ideal (sem perdas). Sua
capacitância aumentará para C=C0. εr´, onde εr´ é a permissividade relativa do meio e é um
real puro. A representação fasorial da tensão e corrente no capacitor ideal é mostrado na
Figura 1.13, em que
I = j ω C0ε ′r V
.
I
V
Figura 1.13: Diagrama fasorial para tensão e corrente no capacitor ideal.
13
(1.18)
Porém, capacitores reais apresentam perdas quando submetidos a uma diferença de
potencial de forma de onda qualquer. Para a forma de onda senoidal, a corrente no capacitor
real está adiantada da tensão por um ângulo um pouco menor que 900, ou seja, a corrente
apresenta uma parte real além da corrente de carga do capacitor (parte imaginária). A parte
real da corrente se deve à condução no dielétrico, perdas devido ao movimento de dipolos e
íons, e perdas causadas por microdescargas internas (descargas parciais).
I
componente de perdas
δ - ângulo de perdas
δ
φ
V
Figura 1.13: Diagrama fasorial para tensão e corrente no capacitor real.
Para incluir o efeito das perdas no dielétrico quando submetido a campos alternados introduzse a permissividade relativa complexa εr* . A relação entre os fasores de tensão e corrente
pode ser expressa de forma similar a equação 1.18:
I = jω C 0 ε r* V .
Como o ângulo entre I e V é menor que 900 é conveniente escrever
ε *r = ε r' − jε r'′ ,
(1.19)
(1.20)
em que εr´ e εr’’ são grandezas reais e positivas. εr´ é conhecida como permissividade relativa
estática do meio dielétrico. Substituido 1.20 em 1.21 tem-se:
(
ou ainda
I = jω C 0 ε r' − jε r'′ V ,
)
(1.21)
(
)
(1.22)
I = ω C 0 ε r'′ + jω C 0 ε r' V ,
Para uma avaliação das perdas dielétricas é muito comum se fazer uma análise
simplificada representando capacitores reais, em cada freqüência, por um circuito equivalente
série ou paralelo contendo um capacitor ideal e um resistor (Figura 1.14)3.
3
Note que para um sinal senoidal, em cada freqüência existe um circuito serie que reproduz a mesma
impedância equivalente do circuito paralelo. Os circuito não são equivalentes para f=0 ou quando f→∞: para
f=0, o circuito paralelo se reduz a uma resistência pura e o série a uma capacitância; quando f→∞ o circuito
paralelo se reduz a uma capacitância e o série a uma resistência.
14
capacitor real
i(t)
v(t)
i(t)
Rs
Cp
Rp
v(t)
Cs
(a)
(b)
Figura 1.14: Circuitos equivalentes de um capacitor real.
Note que no circuito da Figura 1.14a, os fasores de corrente I
relacionados pela equação:
 1

+ jω C p V
I =
R

 p

que tem a mesma forma da equação 1.22 em que
Rp =
1
ω C 0 ε r'′
e tensão V estão
(1.23)
C p =C 0 ε r' .
e
Pode-se mostrar que para o circuito paralelo
tan δ =
V / Rp
ωC p V
=
1
.
ωR pC p
Note ainda que
tan δ =
ε 'r′
ε 'r
.
(1.24)
Em qualquer dos circuitos usados para representar um capacitor real linear, a potência
total dissipada no capacitor (perdas) pode ser obtida por:
Perdas = V ⋅ I ⋅ cosφ
(1.25)
em que φ é o ângulo entre os fasores de tensão V e de corrente I , segundo a Figura 1.13.
Isto é equivalente a dizer que:
Perdas = V ⋅ I ⋅ senδ
(1.26)
Como δ é um ângulo bastante pequeno, podemos escrever:
Perdas = V ⋅ I ⋅ sen δ ≅ V ⋅ I ⋅ δ ≅ V ⋅ I ⋅ tan δ
(1.27)
e portanto tan δ é uma indicação de perdas no dielétrico. Os parâmetros dos circuitos série são
diferentes dos parâmetros do circuito paralelo. Observe que tan δ é independente do circuito
circuito equivalente utilizado.
15
Exercícios
1. Uma carga de Q coulombs está distribuída uniformemente sobre a superfície de uma esfera
de raio R metros, no vácuo. Encontre a densidade de fluxo D, o campo elétrico E e o
potencial elétrico V como uma função da distância r do centro da esfera para 0≤ r ≤ ∞;
assumir V(∞)=0.
2. Uma carga de Q coulombs está distribuída uniformemente no volume de uma esfera de raio
R metros, no vácuo. Encontre a densidade de fluxo D, o campo elétrico E e o potencial
elétrico V como uma função da distância r do centro da esfera para 0≤ r ≤ ∞; assumir
V(∞)=0.
3. Considere um cabo coaxial de raio interno R1 e externo R2. O espaço entre eles é
preenchido com um dielétrico de permissividade relativa εr. A diferença de potencial
aplicada entre os condutores é V volts. Encontre a capacitância por unidade de
comprimento do cabo. Se o potencial for aumentado indefinidamente, em que local do
dielétrico provavelmente se iniciaria o processo de ruptura. Qual dever ser a relação R2/R1
para que o campo elétrico no condutor interno seja mínimo. Justifique.
4. Encontre a capacitância C de uma esfera condutora isolada de R metros. A esfera tem
carga de Q Coulombs e está localizada no vácuo. Assumir V(∞)=0.
5. Dois dielétricos de permissividades ∈1=5∈0 e ∈2=4∈0 são colocados dentro de um
capacitor de placas paralelas submetido a 10 V entre seus terminais, conforme a Figura 1.
Admita que os dielétricos tenham a mesma rigidez dielétrica.
a) Obtenha o campo elétrico em cada dielétrico;
b) Ao se aumentar indefinidamente a tensão entre as placas, que dielétrico provavelmente
será perfurado primeiro?
6. Repetir o problema 5 considerando o arranjo da Figura 2.
∈1
1 mm
∈2
1 mm
∈1
∈2
1 mm
Figura 2
Figura 1
7- Uma amostra de dielétrico sólido de constante dielétrica εr = 4.0, mostrada na Figura 3 a
seguir, apresenta uma cavidade de espessura 0.1 mm, comprimento 1 mm e largura 10 mm.
A amostra tem espessura de 1mm, largura de 10 mm e 10 cm de comprimento. As partes
superior e inferior da amostra são submetidas a uma diferença de potencial com taxa de
crescimento muito baixa (quase DC). Admita que a cavidade seja preenchida por ar com
rigidez dielétrica de 30 kV/cm. Encontre a tensão entre as partes superior e inferior da
amostra em que uma descarga interna possa ocorrer (admita que o campo elétrico dentro e
fora da cavidade seja uniforme).
16
10 m m
1 mm
0 .1 m m .
1 mm
Figura 3
8 - Um capacitor operando em 60 Hz, pode ser representado por um circuito RC paralelo onde
R=400 MΩ e C=13.26 ηF. A parte real da constante dielétrica do material entre as placas
e’ 2.1. Obtenha a tangente de perdas do dielétrico e a parte imaginária da constande
dielétrica.
9 - Para um capacitor operando em 60 Hz, o valor de pico da corrente é 1 mA quando o valor
rms da tensão senoidal nos terminais é de 100V. A parte real da constante dielétrica do
material entre placas e’ 2.1 e sua tangente de perdas tan δ = 5x10-4.
Apresente dois circuitos equivalentes para o capacitor com perdas, determine o valor de
cada componente assim como a potência dissipada no volume do dielétrico.
10 - Aplica-se uma tensão V(t)=V0 cos ωt volts a um condensador de placas paralelas
contendo um dielétrico entre elas. A uma frequência angular ω, o dielétrico é caracterizado
por uma constante dielétrica complexa ε r* = ε r' − jε r'' A área das placas é 10 cm2 e a
distancia entre elas 1 mm. Despreze o efeito de bordas.
a) Obtenha analiticamente a corrente no capacitor;
b) Mostre que o capacitor pode ser representado por um circuito R-C paralelo e
determine os componentes do circuito;
c) Os parâmetros do circuito são independentes da frequência ?
d) Esboçar curva de tangente de perdas do dielétrico versus frequência.
17
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