De olho nos “icebergs”

Propaganda
OPINIÃO
De olho nos
“icebergs”
8
sofia da PEC 241, que pode ser aperfeiçoada, mas
não afrouxada, sem o que a instabilidade fiscal continuará a pressionar a taxa de juros.
Com o fraco desempenho registrado em praticamente toda a economia mundial em 2016 e
mais o recorde negativo no crescimento brasileiro
que emplacou o terceiro ano, não me parece que
a redução de nossas reservas internacionais seja
necessária nem a melhor solução para os nossos
problemas. Implicará em reduzir o “seguro” que
elas representam, quando a probabilidade de “catástrofe” é ainda assustadora. O problema do Tesouro Nacional não é excesso de dólares. É a escassez de reais!
A venda de dólares físicos no mercado introduziria mais incerteza sobre o nível adequado da taxa
cambial, aumentaria a necessidade de intervenção
com os swaps, reduzindo ainda mais as expectativas de crescimento. Isso imporia um custo ainda
maior para a realização do ajuste fiscal. É preciso
insistir: sem a aprovação das medidas que corrijam
a instabilidade fiscal, ela continuará a pressionar a
taxa de juros.
Ao contrário, sua aprovação (combinada com
as expectativas de queda da inflação para 5% em
2017 e retorno à meta em 2018) induzirá a uma redução sustentável da taxa de juros real, que terá
para o Tesouro o mesmo efeito que a “venda” física de parte das reservas e estimulará, ainda, a
sustentação de uma taxa de câmbio adequada.
Somar-se-ão dois efeitos fundamentais para a
recuperação da produção industrial, sem a qual
o crescimento saudável não voltará: 1) a queda da
taxa de juros real; e 2) a manutenção de uma taxa
de câmbio real competitiva.
ANTONIO DELFIM NETTO
Marcelo Correa
A discussão sobre o “nível ótimo” das reservas internacionais
do Brasil é um diversionismo que desvia o foco das reformas
infraconstitucionais que deveremos fazer depois que tivermos
criado as condições necessárias para controle dos gastos públicos e consolidado a expectativa que a relação Dívida Bruta/PIB
convergirá para a estabilidade num horizonte razoável.
No primeiro semestre de 2008 (um pouco antes da “surpresa” criada pela catástrofe do Lehman Brothers), houve
discussões vigorosas sobre o nível de nossas reservas, que
ressurgiram em 2011/2012, quando um número significativo
de analistas, que até então achava que elas eram excessivas,
reconheceu que, sem as reservas, as consequências da evolução interna e externa poderiam ser muito mais graves num
futuro próximo.
Neste final de 2016 (novembro), nossas reservas internacionais somavam algo como 380 bilhões de dólares, o que
provavelmente poderia ser considerado acima do “nível ótimo”, se as condições de pressão e temperatura da economia
no Brasil e nos seus parceiros externos fossem normais, o que
obviamente está longe, muito longe, de ser verdade.
Pelo contrário, a confusão produzida pelas políticas monetárias do Federal Reserve, do Banco Central Europeu, do Banco Central do Japão e tutti quanti sugerem que eles navegam
num mar desconhecido, sem bússola e com céu encoberto.
Tudo indica que a economia mundial vai continuar patinando
nos próximos dois ou três anos, com sorte se não enfrentar algum iceberg ainda não suspeitado.
O custo anual para carregar a reserva é igual à diferença
entre a taxa de juros da dívida interna que a financia e a taxa
de juros em dólar que a remunera, multiplicado pelo seu nível
médio no ano, somado aos resultados (positivos e negativos)
das operações de swaps liquidados no período. É um custo
muito elevado (qualquer coisa próxima a 2,5% do PIB) não
apenas porque o nível da reserva parece exagerado, mas, também, porque a diferença entre a taxa de juros interna de seu
financiamento (uma das maiores do mundo) e a taxa externa
que a remunera (e vive namorando o espectro negativo) é extremamente exagerada na direção oposta.
O efeito de uma redução de 20% no nível da dívida com relação ao seu custo é o mesmo de uma redução de 20% entre
as taxas de juros, algo que estará ao alcance de nossas mãos
com a aprovação do conjunto de medidas que respeite a filo-
Professor emérito da Faculdade
de Economia, Administração
e Contabilidade (FEA-USP),
ex-ministro da Fazenda, da
Agricultura e do Planejamento.
NOVEMBRO | DEZEMBRO 2016
Download