ISSN 1982 - 0283 VULNERABILIDADE SOCIAL E EDUCAÇÃO Ano XX Boletim 19 - Novembro 2010 Sumário Vulnerabilidade social e educação Apresentação da série ................................................................................................. 3 Rosa Helena Mendonça Proposta da série ...................................................................................................... 5 Martina Ahlert Texto 1 - Educação e pobreza Educação e pobreza: provocações ao debate ............................................................ 11 Jane Margareth de Castro Texto 2 - Intersetorialidade e vulnerabilidade Vulnerabilidade, intersetorialidade e educação.......................................................... 15 Cynthia Paes de Carvalho e Patrícia Monteiro Lacerda Texto 3 - Compartilhando experiências....................................................................... Daniela Peixoto Ramos 22 Vulnerabilidade social e educação APRESENTAÇÃO DA SÉRIE O menino Tonho mexendo no lixo achou um sonho e pôs-se a sonhar. (…) O sonho era duro e estava mofado. E ele desistiu de sonhar acordado1. Como garantir a todas as crianças o direito como a intersetorialidade na gestão das po- de sonhar? De que forma a educação, sendo líticas educacionais, a relação entre a escola ela mesma um direito constitucional, “pode e a família e, ainda, apresenta iniciativas de ser ferramenta de combate à desigualdade acompanhamento dos alunos em situação social”? Essa é uma das questões presentes de vulnerabilidade. na série Vulnerabilidade social e educação, que a TV Escola apresenta, por meio do pro- Tanto nos textos que compõem esta publica- grama Salto para o Futuro. ção como nos programas televisivos, buscase entender de que forma variáveis como Ao trazer para o centro do debate “as tra- renda, gênero e raça dificultam o acesso, a mas da relação complexa entre pobreza e permanência e o sucesso dos alunos na es- educação no Brasil” e o “reconhecimento cola, em nosso país. da vulnerabilidade social como fenômeno de múltiplas dimensões”, a série, que conta Acreditamos que a temática, por sua urgên- com a consultoria da antropóloga Martina cia e relevância, contribuirá para a reflexão Ahlert (DAN-UnB), problematiza questões de professores, gestores e demais envolvidos 1 Desistência. In: DINORAH, Maria. Barco de sucata. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1986. 3 nos cotidianos das escolas, considerando o que, como o poema em epígrafe retrata, significado social da instituição escolar na crianças não sejam impedidas de sonhar promoção de uma sociedade equânime em com uma realidade mais justa. Rosa Helena Mendonça2 4 2 Supervisora pedagógica do programa Salto para o Futuro/TV ESCOLA (MEC). Vulnerabilidade social e educação PropOSTA DA SÉRIE Martina Ahlert1 A relação entre educação e pobreza perpas- plexa entre pobreza e educação no Brasil. sa diversos debates que educadores e gestores públicos têm se colocado ao pensar A complexidade desta relação provém das re- a educação no Brasil: Quais são os impactos alidades com as quais lidamos: as trajetórias da vulnerabilidade social na trajetória escolar de crianças e adolescentes provenientes de de um aluno? A educação pode ser ferramen- famílias em situação de vulnerabilidade so- ta de combate à desigualdade social? Em que cial. Por um lado, partimos do pressuposto medida reproduzimos a desigualdade na – e a de que “há uma estreita relação entre desi- partir da – escola? As perguntas são comple- gualdades sociais e as diferenças de acesso e xas e extrapolam a competência da escola, sucesso no sistema escolar” (Barbosa, 2009) dos responsáveis e familiares dos alunos ou – de maneira que a variável ‘renda’, hoje, é da gestão pública, quando cada uma destas a mais impactante no acesso e na perma- instituições é pensada isoladamente. nência dos alunos na escola no Brasil2 (em relação às variáveis gênero e raça, segundo Todos nós temos refletido sobre estas ques- os dados da Pnad, 2008). Por outro lado, con- tões a partir de experiências empíricas de cordamos que as experiências de vulnerabili- trabalho, de discussões com os colegas, de dade social são multifacetadas, assim como resultados de pesquisas e programas que re- são as experiências de vida dos alunos. metem a essas temáticas. Esta série do programa Salto Para o Futuro é um convite para Neste sentido, um dos desafios ao tratar da pensarmos juntos as tramas da relação com- relação entre educação e pobreza é partir do 1 Mestre em Antropologia Social pela Universidade Federal de Santa Catarina. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade de Brasília (DAN-UnB). Consultora da série. 2 Se, por exemplo, lançarmos mão dos dados da Pnad 2008 sobre os anos de escolaridade de pessoas de 25 anos (os 25% mais ricos e os 25% mais pobres da população brasileira) podemos indicar uma diferença significativa: os 25% mais ricos, em 2007, tinham como média 12 anos de escolaridade; por sua vez, para o grupo dos mais pobres os anos de estudo caem pela metade. Os dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios) podem ser encontrados no site: www.ibge.gov.br 5 acesso universal à educação – de fazer valer ta sua complexidade, a consequência é o direito de aprender a todos e todas – mas, desenhar estratégias de intervenção também, para além disso, pensar estratégias capazes de abranger distintos setores específicas e particulares que se relacionam das políticas públicas, remetendo à atu- com o contexto social com o qual estamos ação conjunta e necessária de diversos lidando. É um desafio para as escolas na me- programas e iniciativas sociais (Bronzo, dida em que todas estas questões ingressam 2007, p. 9). no ambiente escolar, colocando em questão metodologias de ensino e práticas unifor- Ao potencializar o atendimento de famílias mes de trabalho. vulneráveis a partir da intersetorialidade busca-se, ainda, fortalecer o papel da esco- O reconhecimento da vulnerabilidade social la. Sabemos que a escola é o espaço onde como fenômeno de múltiplas dimensões aparecem muitos dos fatores de vulnerabi- coloca no centro do debate três elementos: lidade trazidos pelos alunos, o que constitui a intersetorialidade na gestão das políticas a escola como um local de escuta e conhe- educacionais, a relação entre a escola e a cimento das experiências de vida dos mes- família (ou o contexto social no qual está mos. Estes fatores vêm à tona na escola por- inserida a escola) e as iniciativas de acom- que interferem na permanência de alunos panhamento da frequência dos alunos em vulneráveis, bem como no seu aprendizado. situação de vulnerabilidade. O primeiro des- Daí a relevância de que a escola esteja aten- tes elementos, a intersetorialidade, é uma ta aos mesmos. Contudo, sabemos também estratégia de gestão que dialoga diretamen- que a escola sente-se sobrecarregada ao ter te com a visão multifacetada da pobreza, que lidar com todos os problemas que a al- concebendo-a não apenas economicamente, cançam. Neste sentido, uma das intenções mas também como formada por fatores cul- desta série do programa Salto para o Futuro turais, sociais, familiares, intergeracionais e é apontar para a intersetorialidade ao des- individuais. A intersetorialidade é um olhar tacar uma rede de proteção social que pode baseado na integralidade e, desta forma, no estar articulada com as escolas no acompa- enfrentamento coletivo da pobreza, pela ar- nhamento dos alunos em situações de vul- ticulação de redes entre diferentes serviços, nerabilidade. órgãos governamentais e não-governamentais (Bronzo e Veiga, 2005; Bronzo, 2007): Dito isto, somos levados ao segundo elemento mencionado acima: a relação entre a Portanto, para fazer frente à problemá- escola e a família (a comunidade ou o con- tica da pobreza crônica levando em con- texto). A UNESCO e o Ministério da Educa- 6 ção publicaram, no ano de 2009, um relató- ral de transferência condicionada de renda rio composto de um conjunto de subsídios – há uma conjugação da política de assistên- tratando da interação entre escola e famí- cia social com as políticas de educação e de lia. Quando se pensa sobre esta interação, saúde. A partir desta iniciativa, o Ministério um dos questionamentos possíveis trata da da Educação acompanha nominalmente a função da escola quando ela se remete ao frequência e a permanência na escola de contexto no qual se localiza. Versando sobre cerca de 16 milhões de alunos em situação esta preocupação, o relatório acima citado de vulnerabilidade em todo o Brasil3. destaca que “aproximar-se da vida de cada um dos alunos é uma forma de conhecer, O acompanhamento da frequência destes reconhecer e utilizar as lições da realidade alunos é antes um ponto de partida do que a favor de sua aprendizagem” (Castro e Re- um ponto de chegada: ele nos coloca diante gattieri, p. 59). Um olhar atento à realidade de discussões importantes, relativas à qua- social da qual provém o aluno, neste senti- lidade do ensino, à permanência na escola do, se conjuga com as preocupações peda- e ao aprendizado. Qualificar estas consta- gógicas da escola. tações, contudo, não pode ser um pretexto para nos imobilizarmos. Deve ser, sobretudo, Por um lado, notamos que a escola não um incentivo para reconhecermos os novos pode mais se distanciar do contexto social desafios que esta situação traz para gesto- no qual vivem seus alunos, transformando res e escolas. Estamos diante de uma nova preocupações tidas como exteriores à esco- situação no Brasil: o aumento do acesso e la em preocupações das próprias escolas. da permanência dos alunos em situação de Por outro lado, podemos notar outro mo- vulnerabilidade ao ambiente escolar (Castro vimento importante: nas políticas públicas e Regattieri, 2009). Este cenário sugere que a e sociais de combate à pobreza no Brasil, inter-relação das variáveis ‘pobreza ‘ e ‘edu- a educação tem sido concebida como fun- cação’ sejam pauta de nossas agendas como damental. Hoje, por exemplo, no Programa gestores, educadores e pesquisadores. Bolsa Família – programa do Governo Fede- 3 Este dado remete às crianças e adolescentes de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família. Para mais informações, ver texto 3 desta série. 7 Textos da série Vulnerabilidade social e Educação4 Esta série tem como proposta pensar as tramas da relação complexa entre pobreza e educação no Brasil. A complexidade desta relação provém das realidades com as quais lidam professores e gestores: as trajetórias de crianças e adolescentes provenientes de famílias em situação de vulnerabilidade social. Ao tratar da relação entre educação e pobreza, o desafio é assegurar o direito de acesso universal à educação, propondo estratégias específicas e particulares relacionadas ao nosso contexto social. O reconhecimento da vulnerabilidade social como fenômeno de múltiplas dimensões coloca no centro do debate três elementos: a intersetorialidade na gestão das políticas educacionais, a relação entre a escola e a família (ou o contexto social no qual está inserida a escola) e iniciativas de acompanhamento da frequência dos alunos em situação de vulnerabilidade. Texto 1: Educação e pobreza Educação e pobreza: provocações ao debate O primeiro texto da série pretende contextualizar as discussões sobre educação e pobreza pensando no acesso e nas trajetórias escolares de alunos provenientes de contextos de vulnerabilidade social. A educação tem papel central na reprodução das desigualdades sociais, visto que alunos oriundos de diferentes situações socioeconômicas têm acesso e permanência desiguais no sistema escolar (menor acesso, mais baixa permanência e acesso a escolas de menor qualidade). Além disso, muitos destes alunos obtêm resultados educacionais que os habilitam à inserção desigual nas diversas esferas sociais, em especial, no mercado de trabalho. Este cenário nos faz pensar na necessidade de mudanças no sistema educacional. Estas mudanças devem garantir tanto o acesso à escola quanto a permanência na escola e a educação de boa qualidade aos grupos mais vulneráveis, a fim de evitar que a desigualdade social se conjugue aos processos de desigualdade educacional (Gentili, 2009). 4 Estes textos são complementares à série Educação e Pobreza, com veiculação no programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC) de 22/11/2010 a 26/11/2010. 8 Texto 2: Intersetorialidade e vulnerabilidade O segundo texto da série compreende a vulnerabilidade como composta de múltiplas dimensões. Há um reconhecimento cada vez maior entre gestores e pesquisadores da gestão pública de que fenômenos multifacetados necessitam de respostas intersetoriais, a partir da articulação das diversas instâncias e atores. Reconhecendo a complexidade das experiências dos alunos que envolvem situações diferentes de vulnerabilidade, o segundo texto esboça um cenário do sistema de garantia de direitos e de proteção social às crianças e adolescentes. Uma das considerações que norteiam esta abordagem é pensar quais são as possibilidades de diálogo que estão ao alcance das escolas e que funcionam como suporte ao lidar com os problemas sociais trazidos pelos alunos. Além disso, pretende explorar quais são as articulações possíveis de serem pensadas pelos gestores municipais para integralizar o atendimento às famílias vulneráveis. Texto 3: Compartilhando experiências O terceiro texto da série apresenta iniciativas de acompanhamento da frequência dos alunos provenientes de famílias vulneráveis. O acompanhamento da frequência, nesta perspectiva, busca combater a evasão escolar e o abandono, além de incentivar o percurso educacional regular. O Ministério da Educação, por intermédio da DEAVE (Diretoria de Estudos e Acompanhamento das Vulnerabilidades Educacionais) constituiu, para acompanhamento da frequência dos alunos beneficiários do Programa Bolsa Família, uma rede de atores formada por operadores municipais, coordenadores estaduais e diretores responsáveis pelo acompanhamento da frequência e pela informação dos motivos de ausência dos alunos na escola. Este texto da série privilegia o compartilhamento das informações acerca destas experiências, enfocando as dificuldades e as iniciativas positivas que se desdobram, pelo Brasil, nas atividades de acompanhamento da presença e permanência de alunos na escola. O acompanhamento da frequência permite uma análise articulada com questões sobre a relação escola-família, sobre a articulação entre escolas e outras instituições pertencentes à rede de proteção social e, desta forma, sobre situações de vulnerabilidade. Os textos 1, 2 e 3 também são referenciais para as discussões do PGM 4: Outros olhares sobre Vulnerabilidade social e educação e do PGM 5: Vulnerabilidade social e educação em debate. 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS GENTILI, Pablo. O Direito à Educação a as dinâmicas de exclusão na América Latina. Re- BARBOSA, Maria Lígia. Desigualdade e desempenho: uma introdução à sociologia da es- vista Educação Sociedade, Campinas, v. 30, n. 109, set./dez. 2009, p. 1.059-1.079. cola brasileira. Belo Horizonte: Editora Argvmentvm, 2009. GOLDEMBERG, José. O repensar da educação no Brasil. In.: Estudos Avançados, v.7, n.18, p. BRONZO, Carla; VEIGA, Laura da. Desafios, 65-137, 1993. possibilidades e limites de programas locais de combate à pobreza e à exclusão: as ini- JACCOUD, Luciana. Pobres, pobreza e cida- ciativas das cidades de São Paulo e de Belo dania no Brasil: os desafios recentes da pro- Horizonte. In: X Congreso Internacional del dução social. Brasília: IPEA, 2008. Disponível CLAD: la Reforma del Estado y de la Adminis- em tración Pública, Santiago, Chile, 18 - 21 Oct. mds/37M.pdf http://www.ipc-undp.org/publications/ 2005. SCHWARTZMAN, Simon. Políticas de renda e BRONZO, Carla. Intersetorialidade como as Prioridades da Educação no Brasil. Dispo- princípio e prática nas políticas públicas: nível em: www.iets.org.br/article.php3?id_ar- reflexões a partir do tema do enfrentamen- ticle=751. to da pobreza. In: XII Congreso do CLAD Centro Latinoamericano de Administracion SILVA, Maria de Salete; ALCÂNTARA, Pedro para el Desarrollo. Santo Domingo. Anais do Ivo. O Direito de Aprender: Potencializar CLAD, 2007. CASTRO, Jane Margareth. RE- avanços e reduzir desigualdades. Brasília: GATTIERI, Marilza (orgs.). Interação escola- UNICEF, 2009. família: subsídios para práticas escolares. Brasília: UNESCO, MEC, 2009. 10 texto 1 Educação e pobreza Educação e pobreza: provocações ao debate Jane Margareth de Castro1 A Constituição de 1988 determina que a edu- A inegável expansão do acesso à escola cação é direito social básico de todos os ci- não correspondeu, contudo, a uma efeti- dadãos Consolida, assim, um amplo processo de lutas iniciado com a urbanização acelerada do país a partir da década de 1950. Além disso, a Carta Magna estabelece va brasileiros. percentuais mínimos de investi- democratização da educação nem à Os altos índices de repetência e evasão, evidenciados pelos sistemas oficiais de avaliação da educação básica, são fatores de exclusão produzidos pela própria escola. oferta de uma educação de qualidade, elementos essen- ciais para garantir tanto a permanência quanto a conclusão da educação básica na idade adequada. O sistema educacio- mento na área, por nal, ao mesmo tem- parte dos governos po em que inclui, federal, estadual e municipal, exigindo de exclui parcela significativa das crianças e todos os níveis e esferas de governo propos- dos adolescentes da escola. Os altos índices tas e projetos para que esse direito se torne de repetência e evasão, evidenciados pelos efetivo, de fato. Assim, se 16% das crianças sistemas oficiais de avaliação da educação de 7 a 14 anos estavam fora da escola em básica, são fatores de exclusão produzidos 1988, esse índice caiu para 4% uma década pela própria escola. Este é o grande desafio depois. Considerando apenas o Ensino Mé- que as escolas e sistemas de ensino enfren- dio, as matrículas aumentaram cerca de tam até hoje. 57% no período de 1994 a 1999. 1 Psicóloga, pós-graduada em psicologia experimental e gestão de políticas públicas. Trabalha com consultoria, pesquisa e diagnóstico na área de educação. 11 Muitos estudos demonstram uma forte cor- riar de uma região para outra, de um esta- relação entre desigualdades educacionais do para outro, ou até de um bairro a outro e desigualdades de renda e de condições numa mesma cidade. De modo simplificado, de vida. Estudo realizado pelo Instituto de pobreza pode ser definida como a situação Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA) so- em que a criança, o jovem ou a família não bre desigualdades na educação mostra que têm condições de efetivo acesso aos serviços os indicadores educacionais são piores na e bens construídos pela sociedade – como, população rural e nas regiões mais pobres saúde, educação, lazer, habitação, cultura – em todas as etapas nem de participação da educação básica. ativa na vida política Esse estudo evidencia uma relação de mão dupla: sem solucionar os problemas educacionais não se diminuirá a exclusão; e sem solucionar os O sistema educacional – em todos os níveis, até o interior da escola – tem instrumentos que podem contribuir para a melhoria e superação da exclusão. do país. Apreender as múltiplas e diversificadas dimensões da pobreza pode ajudar os educadores a compreenderem melhor o processo sociais, de exclusão origina- não será possível me- do pela evasão, repe- problemas lhorar os resultados escolares. tência e pela falta de acesso à escolarização. A expansão do acesso à escola propôs um Seria ingênuo pensar que as políticas pú- difícil desafio às equipes escolares: propi- blicas de educação são o único ou princi- ciar que crianças e jovens de famílias po- pal fator de mudança social e de inclusão bres, muitas em situação de vulnerabilida- educacional. O quadro de exclusão exige de social, sejam incluídos no universo dos que a educação faça parte de uma política conhecimentos historicamente elaborados. articulada de desenvolvimento do municí- Ou seja, o sistema educacional passou a li- pio, do estado, da região e da nação. Isto, dar, em seu interior e com cada vez maior contudo, não justifica qualquer imobilismo, intensidade, com desigualdades sociais pro- pois uma parte também pode impulsionar o venientes da pobreza. todo. Não podemos nos conformar com as condições sociais e individuais dos nossos No entanto, a própria definição de pobreza alunos de forma que estas características não é simples, pela multiplicidade e ampli- justifiquem o fracasso escolar. Pobreza não tude de situações a que se aplica. Pode va- significa insucesso escolar. O sistema edu- 12 cacional – em todos os níveis, até o interior condição social e econômica serem da escola – tem instrumentos que podem fatores que contribuem decisivamen- contribuir para a melhoria e superação da te para as desigualdades de acesso à exclusão. educação, de oportunidades de aprendizagem e interferem na relação entre De acordo com o Art.2º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, a educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Não se atinge esse objetivo amplo e democrático sem um projeto de atuação adequado. Daí a importância de a escola avaliar seu projeto pedagógico, sua prática, sua forma de atuar e os resultados que está obtendo. • Que referências a escola tem usado na construção de seu projeto pedagógico e das suas metodologias de ensino? • Os conteúdos têm significado no presente e para o futuro de seus alunos? • professores e alunos? • Quais são os conhecimentos e informações que devem ser revistos, adquiridos e que motivem os professores a avaliarem suas práticas pedagógicas? • Sabemos que o apoio e a valorização da família são fatores importantes no sucesso escolar dos alunos. Como a escola vem lidando com esta questão? Estas questões desafiantes são referência não só para o projeto pedagógico, mas também para a prática em sala de aula e para a avaliação da aprendizagem. Uma das conclusões de um recente estudo elaborado pela UNESCO em parceria com o Ministério da Educação indica que não podemos persistir em práticas homogêneas que desconsiderem as diferenças dos alunos e obriguem todos a se conformar a um modelo de aluno esperado. As metodologias são interessantes e Além de não ser desejável, isso não é possível. estimulam o pensamento e a desco- As diferenças linguísticas, culturais, étnicas, berta? econômicas, físicas, etc. não podem ser con- • A escola conhece seus educandos, sabe com quem e em que condições eles vivem moram, conhece seu contexto de vida? • A escola está atenta para o fato de as desigualdades de cor, raça, gênero e vertidas em desigualdades de desempenho e de oportunidades. Isto significa pensar em projetos político-pedagógicos, políticas e programas que contemplem todos e cada um dos alunos – o que não impede que se pense em atendimentos e serviços diferenciados de acordo com suas necessidades (CASTRO e REGATTIERI, 2009). 13 No entanto, sabe-se que a oferta de uma INEP - Censo Escolar 2005. educação de qualidade não é responsabilidade somente das políticas educacionais, pois LÓPEZ, N. Equidad educativa y desigualdad o sucesso na aprendizagem e a superação da social – desafios de La educación em El nue- exclusão educacional extrapolam as compe- vo escenario latinoamericano. IIPE/UNES- tências da educação. O desafio está em criar CO; Buenos Aires, 2004 condições para que nossas crianças e jovens tenham garantido o direito fundamental LÓPEZ, N. (coord.). De relaciones, actores y de terem uma educação de qualidade que teritorios: hacia nuevas políticas em torno lhes permita terem acesso a outros direitos a La educación em Americalatina. López, N. como saúde, trabalho, lazer, habitação, etc. Buenos Aires: IIPE/UNESCO, 2009. LUFT, H. M. O paradoxal papel da escola: Referências bibliográficas BARROS, Ricardo Paes de, Mirela de Carvalho, e Samuel Franco. Pobreza, desigualdade e crescimento no Brasil: Fatos, inter-relações e recomendações para uma política social mais efetiva no combate à pobreza. IPEA/ IETS, 2005. promete incluir, excluindo. In: BONETI, L.W. Educação, exclusão e cidadania. Ijuí: EdUnijuí, 2000. RIBAS, Rafael Perez e GOLGHER, André Braz. Vulnerabilidade à pobreza no Brasil: medindo risco e condicionalidade a partir da função de consumo das famílias. Trabalho apresen- CASTRO, Jane Margareth e REGATTIERI, Ma- tado no XV Encontro Nacional de Estudos rilza (org.). Interação Escola Família: subsí- Populacionais, ABEP, realizado em Caxambu, dios para práticas escolares. Brasília: UNES- MG, de 18 a 22 de setembro de 2006. CO/MEC, 2009. IPEA. Brasil: o estado de uma nação. Cap. III DUBET, Françoise. A escola e a exclusão – Cadernos de Pesquisa, n. 119, p. 29-45, julho 2003. IBGE – JOVENS FORA DA ESCOLA – Estudo sobre jovens e adultos fora da escola, a partir de dados da pesquisa sobre padrões de vida. PPV, 1996/1997. - Pobreza e exclusão social. p. 85-112, 2006. 14 texto 2 Intersetorialidade e vulnerabilidade Vulnerabilidade, intersetorialidade e educação Cynthia Paes de Carvalho 1e Patrícia Monteiro Lacerda2 André3 tem faltado a muitas aulas e quase nunca traz os deveres de casa. Ele tem 11 anos e está matriculado no 2º ano do Ensino Fundamental da escola perto de sua casa numa favela da periferia da capital. Ele tem dois irmãos menores, um está na pré-escola e o outro numa creche comunitária. Depois que seus pais se separaram, a mãe de André começou a beber e tem ficado cada vez mais difícil conseguir faxinas. O pai de André se mudou depois da separação, formou nova família em outra cidade e não fez mais contato. 15 Desde os anos 60, estudos internacionais4 peitam os muros da escola e perseguem os trouxeram evidências empíricas irrecusá- alunos em situação social mais vulnerável veis, do ponto de vista estatístico, sobre a nos pátios e nas salas de aula. Desde então, forte associação entre origem social e de- diversas pesquisas5 desestabilizaram o dis- sempenho escolar dos alunos. Esta correla- curso da escola meritocrática, mostrando a ção também foi comprovada em inúmeros escola não como promessa de equalização estudos nacionais (Barbosa, 2009), deixando de oportunidades e superação de distâncias claro que os fatores extraescolares não res- sociais, mas como um mecanismo de repro- 1 Pesquisadora e professora do Departamento de Educação da PUC-Rio. 2 Mestre e Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Pesquisadora colaboradora do SOCED (Grupo de Sociologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) e professora do curso de especialização Educação e Inclusão da mesma universidade. 3 Nome fictício. 4 Pesquisa longitudinal do I.N.E.D. na França (1962-1972), o Relatório Coleman nos Estados Unidos (1966), o Plowden Report na Inglaterra (1967), entre outros. 5 Destacam-se os livros: Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado, de Althusser (1970); A Reprodução, de Bourdieu e Passeron (1970); A Escola Capitalista na França, de Baudelot e Establet (1971) e A Escola na América Capitalista, de Bowles e Gintis (1976). dução social, na medida em que convertia Foram instituídos novos mecanismos de in- desigualdades sociais em desigualdades tervenção tanto nas famílias quanto nos sis- educacionais. temas de ensino, como Conselhos Tutelares e Procuradorias da Infância e da Juventude, Enquanto na Europa e nos EUA as teses da para garantir os direitos da população em reprodução social pela escola repercutiam idade de escolarização obrigatória. Na es- e abalavam a visão mais utópica e emanci- teira destas transformações, fortaleceu-se a padora do sistema educacional, no Brasil, doutrina da proteção integral que entende a essa discussão era condição peculiar da superposta a uma criança e do adoles- agenda de luta pela universalização do acesso à escola. Os dados populacionais indicavam que entre nós, a segregação social era ainda mais perversa6, já que até a década de 90, um A Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e Adolescente de 1990 e a Lei de Diretrizes e Bases de 1996 reconfiguraram as responsabilidades do Estado, da família e da comunidade. cente como pessoas em desenvolvimento, cujos direitos devem ser garantidos e efetivados atra- vés de uma Rede de Proteção Integral. A proteção integral supõe a articulação grande contingente dos serviços públi- de meninos e meni- cos – estatais ou não nas das camadas populares estava fora da – endereçados ao cumprimento dos direi- escola. Essa realidade mobilizou uma grande tos sociais (saúde, educação e assistência) coalizão de forças em favor da garantia do de crianças e adolescentes, principalmente acesso à escolarização para todos e ajudou aqueles que se encontram em situação de a criar marcos legais para garantir direitos vulnerabilidade, ou seja, tem como requisito para crianças e adolescentes e, em especial, a lógica da intersetorialidade. o direito à educação de qualidade. A Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e Ado- O presente texto pretende refletir sobre as lescente de 1990 e a Lei de Diretrizes e Bases articulações possíveis e necessárias para de 1996 reconfiguraram as responsabilida- integralizar o atendimento às famílias vul- des do Estado, da família e da comunidade. neráveis e as possibilidades de diálogo que 6 Até o início da década de 80, cerca de 30% das nossas crianças em idade escolar não tinham acesso à escola (Oliveira & Araújo, 2005). 16 estão ao alcance das escolas para dar supor- aproveitar estas oportunidades. Nesse senti- te aos alunos que vivem problemas sociais do, o conceito de vulnerabilidade focaliza a mais agudos provenientes destas famílias. debilidade ou a força dos ativos que indivíduos ou famílias dispõem para enfrentar os Vulnerabilidade riscos existentes no entorno e, de maneira mais abrangente, as condições do local de Castel (1998), entre outros autores, identifica residência das pessoas, o que implica a pos- uma correlação profunda entre o lugar ocu- sibilidade de degradação parcial ou total de pado pelo indivíduo na divisão social do tra- bem-estar ou de condição de sobrevivência balho (trabalho no mercado formal, trabalho com dignidade. A ideia de vulnerabilidade precário sem carteira assinada, eventual), remeteria, portanto, a uma condição de mo- sua participação em redes de sociabilidade radia e trabalho que não apenas é precária, e seu acesso aos sistemas de proteção social como também fragiliza a capacidade de con- disponíveis em dada sociedade (educação, trolar as forças que determinam esta condi- saúde, seguridade social, etc.). O conceito de ção de vida e combater seus efeitos sobre o vulnerabilidade procura caracterizar a situa- próprio bem-estar. ção de indivíduos ou grupos sociais expostos a condições de risco potencial de perda de O fato de a análise enfocar os “ativos” e não seu bem-estar social, que geralmente está os “passivos” das pessoas ou famílias chama associada à sua inserção precária no mer- a atenção para a importância de um conjun- cado de trabalho e à fragilidade de acesso a to de atributos que se considera necessários possíveis suportes ou oportunidades sociais, para a identificação e o aproveitamento efe- o que, por sua vez, dificulta ainda mais sua tivo das oportunidades existentes, enfatizan- capacidade de enfrentar e superar sua con- do a dinâmica de formação de diversos tipos dição de risco social e o potencial destes ris- de capital (conhecimentos, informações, re- cos deteriorarem ainda mais sua condição lações sociais, etc.), potencialmente mobili- de sobrevivência e trazerem consequências záveis, e as relações entre eles, assim como importantes para sua vida (Kaztman, 2000). os processos de perda ou desgaste destes A vulnerabilidade, segundo o autor, pode ser ativos (quando uma família se vê impelida entendida como uma condição resultante de a mudar de domicílio por não poder mais uma defasagem ou falta de sincronia entre pagar o aluguel, por exemplo) ou de outros os requerimentos de acesso às estruturas fatores limitantes que impedem o acesso às de oportunidades oferecidas pelo mercado, oportunidades sociais (rede pública de edu- pelo Estado e pela sociedade e os ativos ou cação, saúde, assistência, etc.). O grau de condições dos domicílios que permitiriam capacidade de resposta às adversidades ou 17 riscos dependerá, obviamente, da diversi- pobreza, por meio da transferência direta de dade de recursos a serem mobilizados (uma renda à família; 2) reforço ao exercício de di- família ampliada que possa oferecer abrigo reitos sociais básicos nas áreas de Saúde e quando se perde a casa numa enchente, Educação, condicionando a continuidade do transporte gratuito para a escola, etc.), além benefício à frequência escolar das crianças e da flexibilidade para a sua utilização. aos check-ups médicos regulares de crianças e de mulheres grávidas, que deve contribuir Diversos estudiosos de estratégias de redu- para que as famílias consigam romper o ci- ção da pobreza urbana, além de destacar o clo da pobreza entre gerações; 3) coordena- caráter dinâmico desse enfoque, valorizam ção de programas complementares, que têm especialmente a importância dos recursos por objetivo o desenvolvimento das famílias, materiais e simbólicos das famílias na ca- como, por exemplo: programas de geração pacidade de responder a crises. Isto signifi- de trabalho e renda, de alfabetização de adul- ca que os ativos familiares, mais do que a tos, de fornecimento de registro civil e de- posse ou não de bens materiais, abrangem mais documentos, o Programa de Erradica- os conhecimentos e experiências culturais, ção do Trabalho Infantil (PETI) e o Programa bem como traços mais subjetivos, como o de Atendimento Integral às Famílias (PAIF), desenvolvimento dos sentimentos de incer- desenvolvido nos Centros de Referência de teza e insegurança em relação à sua capaci- Assistência Social (CRAS). Ou seja, a ideia é dade de mobilidade social ascendente. “dar o peixe” e também “ensinar a pescar”... Como se pode perceber no desenho do Bolsa Os estudos de vulnerabilidade que estão na Família, o acesso à educação (tanto dos adul- base do desenho das políticas sociais mais tos, como das crianças e jovens) é privilegia- recentes de redução da pobreza, como os do como perspectiva de ruptura do “ciclo da programas de transferência de renda para pobreza” entre as gerações, constituindo-se grupos sociais considerados em situação no caso das crianças em uma das “condicio- de extrema pobreza, a exemplo do Bolsa Fa- nalidades” do programa. mília no Brasil, costumam enfatizar o grupo familiar e não apenas o indivíduo como unidade de análise e foco de intervenção. Como o nome indica, o programa incide sobre famílias e sua perspectiva é articular três dimensões consideradas essenciais à superação da situação de vulnerabilidade e pobreza: 1) promoção do alívio imediato da Intersetorialidade O exemplo do Programa Bolsa Família retrata mudanças no pensamento político internacional e nacional, que apontam a intersetorialidade (enquanto relação entre diferentes agentes sociais públicos e privados) como 18 medida possível e necessária de potenciali- fessores e gestores – precisa estar atenta às zar e integralizar o atendimento aos grupos faltas e, caso a família esteja inscrita no Bol- vulneráveis no Brasil. A ação intersetorial sa Família, informá-las ao órgão municipal implica uma visão integrada dos problemas que monitora as condicionalidades do bene- sociais e de suas soluções, numa perspec- fício. A equipe do Posto de Saúde precisa se tiva integrada e integradora de recursos e articular com a escola de André, as institui- agentes sociais que podem ser acessados ções que atendem a seus irmãos menores, e por uma população que ocupa determinado a equipe do CRAS para buscar perspectivas território (Junqueira, 2004). Busca-se assim de trabalho para a mãe... Todas essas arti- otimizar os recursos através da busca de culações dão trabalho, implicam conheci- soluções integradas, articulando saberes e mento mútuo e compreensão das responsa- experiências no planejamento, realização e bilidades e competências de cada um para avaliação de ações para alcançar efeito si- alcançar um atendimento integral a André e nérgico em situações complexas, visando ao à sua família. Nessa perspectiva, a articula- desenvolvimento social e superando a ex- ção entre setores sociais supõe uma decisão clusão social: a complexidade da realidade política e profissional de cada um dos agen- social exige um olhar que não se esgota no tes em prol de objetivos comuns. Além de âmbito de uma única política social (op. cit., compartilhar objetivos, é preciso viabilizar p. 27). Essa forma de atuar impõe mudan- as relações de colaboração através de víncu- ças nas práticas e na cultura organizacional los interpessoais e interinstitucionais – esta- das instituições envolvidas, impondo novos belecendo momentos de troca e avaliação, desafios aos diferentes agentes e gestores, canais de comunicação e fluxos de decisão enfrentando não poucas vezes resistências. coordenados –, preservando as diferenças e Afinal, além de nem todos compreenderem as especificidades de cada componente que e aceitarem essa perspectiva de ação social, contribui da sua maneira na construção de frequentemente cada organização tem difi- uma política que preserve os princípios da culdades de “dar conta” do seu pedaço de cidadania, da liberdade e da justiça. responsabilidade: podem faltar professores na escola, médicos no Posto de Saúde, ocupações dignas que possam garantir a sobre- Educação vivência das famílias na região para encami- Retomando nosso ponto de partida. Sabe- nhar as pessoas desempregadas... mos que a escola não está apartada dos seus contextos sociais e que fatores extraescola- No caso do estudante André, relatado no res atravessam e ajudam a definir os resulta- início do texto, a escola – através dos pro- dos da educação escolar. Diversas pesquisas 19 têm demonstrado que há escolas e redes de aprendizagem. No caso das redes municipais ensino que conseguem possibilitar a apren- de educação, dentre os fatores que promo- dizagem mesmo dos alunos oriundos de vem a aprendizagem dos alunos se encon- contextos sociais vulneráveis – promovendo tram as parcerias intersetoriais articuladas o que consideramos equidade (Albernaz et em torno do direito de aprender. al., 2002). A busca dos fatores intraescolares e intraeducacionais (relativos às redes de Uma observação importante do mergulho no ensino) que favoreceriam a equidade resul- interior dos sistemas de ensino que os estu- tou em estudos so- dos de Efeito Escola bre o chamado “efei- e Efeito Rede trazem to-escola” (Bressoux, 2003) e “efeito-rede” (UNICEF, 2009). Neste caminho, identificou-se que determinados processos de gestão educacional, de administração Sabemos que a escola não está apartada dos seus contextos sociais e que fatores extraescolares atravessam e ajudam a definir os resultados da educação escolar. é que o conhecimento das condições de vida dos alunos, o relacionamento com outros serviços sociais e a participação na rede de proteção integral de crianças escolar e de inter- e adolescentes são venção aspectos fundamen- pedagógica aumentavam as chances de sucesso escolar tais das práticas que promovem aprendiza- mesmo dos alunos em situação de vulnera- gem com equidade. Nesse sentido, a escola bilidade. – ao reconhecer as condições de vulnerabilidade que afetam seus alunos e encaminhá- Dois estudos coordenados pelo UNICEF e los e as suas famílias aos serviços públicos pelo MEC abordam esse tema, baseando-se que podem apoiá-los – desenvolve melhores em resultados da Prova Brasil. Ao nível da chances de realizar sua função específica de escola, estes estudos indicaram que a edu- promover sucesso escolar. cação deve ser contextualizada, ou seja, o aluno deve ter seus contextos de vida social Nessa perspectiva, a educação escolar e os e cultural conhecidos e respeitados para sistemas ou redes de ensino podem atuar aprender, que o professor é central, mas não como “nós” importantes da rede de prote- pode ser o responsável isolado pela apren- ção social, colaborando para superar e não dizagem dos alunos e que nenhuma práti- apenas reproduzir as desigualdades sociais. ca isolada pode gerar condições efetivas de Cabe ainda lembrar que escolas são um dos 20 equipamentos públicos mais presentes nos BRESSOUX, P. As pesquisas sobre o efeito-es- mais diferentes espaços sociais, âncora pri- cola e o efeito-professor. Educação em Revis- vilegiada da garantia do atendimento públi- ta, Belo Horizonte: n. 38, p. 17-88, dez. 2003. co aos direitos sociais da população, o que realça sua responsabilidade social. CASTEL, R. Metamorfoses da questão social. Petrópolis: Vozes, 1998. Finalmente, sabendo que as intervenções em escala micro são mais eficazes em contextos em que são apoiadas por políticas sociais de natureza macro, que criam condições de base mais propícias à superação da situação de pobreza, no longo prazo a redução das CUNHA, J. M. P. et al. A vulnerabilidade social no contexto metropolitano: o caso de Campinas. Trabalho apresentado no XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais, ABEP, Caxambu / MG – Brasil, 2004. desigualdades que assolam nosso país de- JUNQUEIRA, L. A. P. A gestão intersetorial pende também da eficácia da escola e sua das políticas sociais e o terceiro setor. Revis- articulação com os demais serviços sociais. ta Saúde e Sociedade, v. 13, nº. 1, São Paulo, jan./abr. 2004. Referências KAZTMAN, R. (coord.) Activos y estructura de ALBERNAZ, A.; FERREIRA, F.; FRANCO, C. oportunidades. Estudios sobre las raíces de la Qualidade e eqüidade no ensino fundamen- vulnerabilidad social en Uruguay. Uruguay: tal brasileiro. Pesquisa e Planejamento Econô- PNUD-Uruguay e CEPAL-Oficina de Montevi- mico, Rio de Janeiro, v. 32, n. 3, 2002. deo, 1999. ALVES, F., FRANCO, C., RIBEIRO, L. C. Q. Se- OLIVEIRA, R. P. & ARAUJO, G. C. Qualidade gregação residencial e desigualdades escolar do ensino: uma nova dimensão da luta pelo no Rio de Janeiro. In: RIBEIRO, L. C. de Q. & direito à educação. Revista Brasileira de Edu- KAZTMAN, R. (orgs.) A cidade contra a esco- cação, n. 28, 2005, p. 5-23. la? Segregação urbana e desigualdades educacionais em grandes cidades da América Latina. Rio de Janeiro: Letra Capital/FAPERJ; Montevidéu, Uruguai: IPPES, 2008. BARBOSA, M. L. de O. Desigualdade e Desempenho: uma introdução à sociologia da escola brasileira. Rio de Janeiro: ARGVMENTVM, 2009. UNICEF. Aprova Brasil: o direito de aprender – boas práticas em escolas públicas avaliadas pela Prova Brasil, 2007. UNICEF. Redes de Aprendizagem: boas práticas de municípios que garantem o direito de aprender, 2009. 21 texto 3 Compartilhando experiências Daniela Peixoto Ramos 1 Introdução teria sido institucionalizado, de acordo com princípios intersetoriais. Outra intenção era Este terceiro texto tratará de alguns dos principais resultados de pesquisas avaliativas, promovidas pela SECAD/MEC, a respeito da implementação do acompanhamento da frequência escolar dos alunos beneficiários do Programa Bolsa Família. O texto aborda a necessidade de pensar a relação entre educação e pobreza por meio da investigação sobre as percepções de atores da política educacional a este respeito e da tentativa de conhecer os diversos cenários subnacionais de acompanhamento da frequência escolar de alunos em situação de vulnerabilidade. Buscou-se investigar a qualidade da gestão deste acompanhamento escolar e os resultados que ele tem gerado, tanto no âmbito das administrações locais quanto nas escolas. Portanto, uma preocupação fundamental das avaliações levadas a cabo era a de compreender em que me- a de identificar as percepções de alguns dos principais envolvidos no acompanhamento – secretários de educação, coordenadores estaduais da frequência escolar, operadores municipais máster, diretores escolares, professores e alunos – a respeito das mudanças geradas por esse acompanhamento sobre o trajeto educacional dos alunos. Ao longo deste processo avaliativo, foram identificadas fragilidades institucionais que sinalizam a necessidade de intervenção para correção de rumos, mas também muitas referências positivas que necessitam ser divulgadas, a fim de que o Ministério da Educação continue desempenhando seu papel de indutor e propositor de políticas que visam reduzir desigualdades educacionais. 1. Avaliação de políticas públicas – uma prática em consolidação dida este acompanhamento, que tem sido A avaliação de políticas públicas – objeto estimulado e coordenado em nível federal, deste texto da série do Salto para o Futuro 1 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade de Brasília e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. 22 Vulnerabilidade Social e Educação – pode ser A SECAD, a partir da DEAVE (Diretoria de Es- definida como um processo de coleta e aná- tudos e Acompanhamento das Vulnerabili- lise sistemáticas de informações sobre in- dades Educacionais) promoveu uma série sumos, processos e resultados de uma ação de pesquisas das quais se esperava que pu- governamental, com base em critérios de dessem gerar subsídios para a melhoria da eficiência, eficácia e efetividade, de forma a gestão do acompanhamento da frequência gerar recomendações para aperfeiçoar a ges- escolar e, consequentemente, efeitos posi- tão. A avaliação é, portanto, um instrumen- tivos para o público-alvo, que atinge hoje to de promoção da governança democrática, aproximadamente 17 milhões de alunos que contribui para tornar mais transparen- (32% do total de alunos da Educação Básica em todo o Brasil). tes as relações entre Estado e sociedade e para assegurar que o Estado seja capaz de responder adequadamente às demandas sociais, tando implemenintervenções ajustadas à resolução dos problemas Em termos metodológicos, as avaliações, cujos resultados são discutidos neste texto, envolveram a realização de trabalho de campo em municípios do Brasil inteiro. Nestas avaliações, privilegiou-se o uso de métodos qualitativos, caracterizados pela valorização das percepções e interpretações feitas pelos atores a respeito dos bens e serviços O públicos que cons- Governo Federal e os tituem o objeto da diagnosticados. governos estaduais e municipais têm se pre- avaliação. O uso destes métodos pressupõe, ocupado cada vez mais em submeter suas segundo Deslandes (2006, p. 5), que o suces- ações à avaliação, de forma a se poder re- so de uma intervenção depende dos signifi- visar, de forma cuidadosa e criteriosa, pro- cados atribuídos a ela pelos sujeitos sociais, cessos que não geram os retornos desejados. os quais variam conforme a inserção cultu- Como afirma Rua (s.d., p. 2), a avaliação é ral, social e econômica destes sujeitos. Por- “decisiva para o processo de aprendizagem tanto, a avaliação qualitativa procura com- institucional” pois, por meio dela, as insti- preender como se combinam expectativas tuições adquirem ganhos de racionalidade e e necessidades de beneficiários, gestores, de conhecimento e aprimoram o desenho de políticos e outros atores com os serviços suas ações. oferecidos por elas. 23 2.As avaliações do acompanhamento tigar percepções sobre distinção entre bene- da frequência escolar – caracteriza- ficiários e não beneficiários em termos de ção geral vulnerabilidade e indicadores educacionais relativos à frequência à escola, ao abandono/ Em termos metodológicos, as avaliações, evasão e ao desempenho escolar. Atenção cujos resultados são discutidos neste tex- especial foi dirigida a comunidades quilom- to, envolveram a realização de trabalho de bolas e indígenas, por meio da contratação campo em municípios do Brasil inteiro. Ini- de consultores específicos para pesquisar cialmente, ainda em 2009, foi enviado for- algumas dessas comunidades e investigar mulário eletrônico a todos os chamados suas especificidades e a relação delas com “operadores municipais máster” (atores encarregados de promover, em nível municipal, a gestão da condicionalidade de educação do Programa Bolsa Família) e, em seguida, realizada pesquisa telefônica o acompanhamen- Se é na escola que a avaliação adquire materialidade, é na vida cotidiana de professores, estudantes e suas famílias que ela deposita seus desdobramentos. to da frequência. Foram empregadas técnicas de pes- quisa diversas, tais como questionários semiestruturados, entrevistas em profundidade com determinados atores, em amostra nacional grupos focais com de municípios, com outros, observação os seguintes objetivos: investigar o grau de in loco, diários de campo, instrumento de padronização dos processos de acompanha- completamento de frases2 e análise de do- mento da frequência, identificando gargalos cumentos. e inovações, em especial no que se refere à articulação intersetorial entre as áreas en- Em termos gerais, as avaliações se distingui- volvidas (educação, assistência social e saú- ram por privilegiar eixos temáticos distintos, de); verificar o perfil dos operadores muni- que determinaram seu escopo metodológico cipais e sua qualificação para a função, bem e amostral. Em uma delas, que teve foco na como sua articulação com as escolas; inves- gestão do acompanhamento da frequência, 2 Trata-se de um instrumento composto por 19 frases a serem completadas livremente, aplicado antes do início dos grupos focais, a alunos beneficiários e não beneficiários, com o intuito de captar percepções subjetivas a respeito de temas como: escola, educação, futuro e Programa Bolsa Família. Exemplos de frases: Meus professores...; O Bolsa Família...; Meus colegas...; Quando não consigo aprender...; Aqui na escola...; O que eu mais quero...). 24 os objetivos eram: (i) avaliar o nível de insti- referências positivas para os próximos perí- tucionalização deste acompanhamento, com odos. ênfase na implementação de uma de suas principais dimensões – a intersetorialidade – no âmbito da gestão da educação tanto nas secretarias de educação quanto nas escolas; e (ii) identificar fragilidades institucionais e obstáculos à intersetorialidade e demandas/ necessidades de capacitação. No caso de outra avaliação, centrada nas escolas, o eixo temático priorizado foi o de vulnerabilidade e seus objetivos foram: (i) avaliar os resultados do acompanhamento da frequência escolar entre alunos e diretores/professores/secretários escolares); (ii) captar percepções de atores escolares sobre a vulnerabilidade do público beneficiário; (iii) mapear estratégias pensadas pelas escolas para atender ao público beneficiário, incluindo encaminhamentos dados às situações de baixa frequência ou não-frequência dos alunos. A decisão pelo direcionamento das avaliações a cada um destes enfoques se deveu ao entendimento de que estas são as dimensões constituintes da ação de acompanhamento da frequência escolar que necessitam ser priorizadas, conjugado à lacuna informacional a respeito delas. O acompanhamento é percebido, no âmbito da SECAD, como resultado da implementação de quatro fatores que, em conjunto, são responsáveis pelos altos índices de informação da frequência3: o sistema de informação criado pelo MEC, a rede de parcerias estaduais e municipais, o monitoramento do acompanhamento pelo Governo Federal, a cada período, por meio de indicadores e as capacitações promovidas periodicamente. Todos estes fatores deveriam contribuir para apoiar a institucionalização desta ação nos demais níveis de governo. No Houve, ainda, a pesquisa centrada na cap- entanto, havia a necessidade de investigar tação de referências positivas, cujo objetivo até que ponto esta institucionalização está foi o de identificar e categorizar práticas de de fato acontecendo, em que medida secre- acompanhamento da frequência escolar e tarias de educação estariam incorporando manutenção das crianças nas escolas desen- o acompanhamento a suas políticas locais, volvidas pelos atores da condicionalidade de com as adaptações necessárias, e integran- educação, no âmbito do programa Bolsa Fa- do-o a outras políticas educacionais. mília. Utilizando um conjunto de métodos de enfoque qualitativo e quantitativo de for- De forma análoga, a preocupação com o con- ma complementar, elencou-se um conjunto ceito de vulnerabilidade se justifica em razão de práticas que poderão ser adotadas como da suposição de que o acompanhamento da 3 Em todo o período de outubro de 2006 até março de 2010, a taxa percentual média de beneficiários com registro de frequência escolar foi de 95,6%. 25 frequência, para ser tomado como uma ação de escolas, em especial as da zona rural) e de cunho educacional, e não como apenas o recolhimento dos formulários nos perí- uma contribuição da educação para uma odos previstos para inserção dos dados no ação assistencial, requer que o problema a sistema. Desta forma, pode-se afirmar que ser atacado – a vulnerabilidade dos alunos be- o nível mais elementar de institucionaliza- neficiários, definida em sentido amplo – seja ção – o nível operacional, relativo às “roti- compreendido como perpassando também nas de trabalho e atividades desenvolvidas” a esfera educacional. Ou seja, seria preciso (Carneiro, 2007, p. 60) – teria sido superado, investigar como os atores locais e estaduais restando agora o desafio mais difícil, que é o entendem os objetivos a serem alcançados de alcançar os níveis mais estratégicos e de por meio da condicionalidade de educação e enraizamento dos objetivos que norteiam a como este entendimento se relaciona com a implantação da condicionalidade. percepção destes atores a respeito da condição socioeducacional em que se encontram A intersetorialidade aplicada à gestão da os alunos beneficiários do Bolsa Família. condicionalidade de educação, a incorporação desta gestão às demais políticas edu- 3. Alguns resultados gerais cacionais locais e o entendimento dos seus objetivos por parte de atores educacionais A avaliação concluiu, de forma geral, que há – desde secretários de educação até secre- um avanço em termos da institucionaliza- tários escolares – são dimensões relevantes ção da implementação da condicionalidade, do processo de institucionalização que ain- dado que se constatou um elevado grau de da não foram alcançadas plenamente. Em padronização dos procedimentos de levan- razão disso, não se tem promovido o uso tamento dos dados relativos à frequência estratégico de dados relativos aos motivos escolar nas gestões municipais. Os opera- da baixa frequência como subsídio para in- dores têm se mostrado capazes de cumprir tervenções públicas mais amplas, inclusive com sucesso, o que é demonstrado pelo alto de cunho educacional, junto a famílias em percentual de informação da frequência, um situação de risco (incapazes de cumprir o re- processo que já se tornou rotina nas admi- quisito da frequência escolar). nistrações locais em todo o país, como extensamente comprovado pela pesquisa de No entanto, o passo inicial para a institucio- campo: o acesso ao sistema, a impressão nalização desta ação junto às Secretarias de de formulários, a distribuição deles às esco- Educação já foi dado e o funcionamento re- las (com soluções variadas e informais em gular da rede de operadores municipais com municípios de grande dispersão geográfica acesso ao sistema online de acompanha- 26 mento é o maior indicador disso. Ademais, de vulnerabilidades que podem resultar em a condicionalidade consiste num procedi- evasão escolar ou baixo rendimento de par- mento já incorporado à rotina de escolas e te significativa de seus alunos. A maximiza- beneficiários, ou seja, as escolas já tinham ção do potencial redistributivo do programa o dever de acompanhar a frequência de seus Bolsa Família depende de um investimento alunos e mesmo de tentar descobrir os mo- maior na articulação com o setor educacio- tivos pelos quais ocorrem as faltas junto às nal. próprias famílias devido a normas legais anteriores ao programa - Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que Referências Bibliográficas estipula um percentual de frequência mínima (75%) menor que o estabelecido pelo PBF, que é de 85% para alunos de até 15 anos – assim como as famílias já haviam internali- A maximização do potencial redistributivo do programa Bolsa Família depende de um investimento maior na articulação com o setor educacional. zado o requisito da frequência Desta forma, o programa não criou exigências desconhecidas e incompatíveis com a rotina escolar. Esta é uma base sobre a qual é possível avançar no sentido de institucio- Carla Bronzo. Intersetorialidade como princípio e prática nas políticas públicas: reflexões a partir do tema do enfrentamento da pobreza. XX Concurso del CLAD sobre Reforma del Estado y escolar como condição para aprovação dos alunos. CARNEIRO, Modernización de la Administración pública, 2007. DESLANDES, Suely. Metodologia de avaliação III: introdução aos métodos qualitativos. Brasília: ENAP, 2006. nalizar os demais procedimentos necessários para que escolas e Secretarias de Educação enxerguem no acompanhamento da frequência escolar dos beneficiários do PBF um instrumento relevante de identificação RUA, Maria das Graças. A avaliação no ciclo da gestão pública. http://www.pr.gov.br/sepl/ avalciclogestpubl.doc 27 Presidência da República Ministério da Educação Secretaria de Educação a Distância Direção de Produção de Conteúdos e Formação em Educação a Distância TV ESCOLA/ SALTO PARA O FUTURO Coordenação-geral da TV Escola Érico da Silveira Coordenação Pedagógica Maria Carolina Machado Mello de Sousa Supervisão Pedagógica Rosa Helena Mendonça Acompanhamento Pedagógico Carla Ramos Coordenação de Utilização e Avaliação Mônica Mufarrej Fernanda Braga Copidesque e Revisão Magda Frediani Martins Diagramação e Editoração Equipe do Núcleo de Produção Gráfica de Mídia Impressa – TV Brasil Gerência de Criação e Produção de Arte Consultora especialmente convidada Martina Ahlert E-mail: [email protected] Home page: www.tvbrasil.org.br/salto Rua da Relação, 18, 4o andar – Centro. CEP: 20231-110 – Rio de Janeiro (RJ) Novembro 2010 28