“Borderline: a natureza eminentemente destrutiva nas relações” Ilckmans Bergma Tonhá Moreira Mugarte Maria Alexina Ribeiro Universidade Católica e Brasília - UCB RESUMO O estudo visa a apresentação de um estudo de caso com diagnóstico de borderline, dando ênfase à organização do transtorno psicopatológico e sua dinâmica familiar, através do método de Rorschach e da abordagem sistêmica. Foram priorizados os dados associados às defesas, às verbalizações e as respostas dadas à representação de si e representação de objeto ao teste. A complexidade das representações de si e do outro no borderline apontam para a compreensão dos padrões de relacionamentos e o estabelecimento dos vínculos nesses sujeitos. O objetivo dessas análises foi identificar associações entre identidade, as relações, os vínculos afetivos e os estilos parentais como possíveis indicadores na personalidade borderline. O estudo demonstra como o paciente borderline apresenta dificuldades nos limites, nas fronteiras e em manter relações íntimas e duradouras com as pessoas. Estas associações caracterizam a natureza eminentemente destrutiva nas relações do borderline. Palavras-chave: borderline, vínculos afetivos, relações familiares, teste de Rorschach 1 – INTRODUÇÃO O "Transtorno Borderline" tem sido definido em termos descritivos, pelo Diagnositic and Statistical Manual, IV edition - DSM IV (APA, 2003) como um transtorno de personalidade que aponta para nove critérios de diagnóstico, sendo cinco suficientes para sua identificação. São eles: um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos; esforços frenéticos para evitar um abandono real ou imaginário; perturbação da identidade; impulsividade; ameaças suicidas ou comportamento automutilante; instabilidade afetiva; sentimentos crônicos de vazio; raiva e dificuldade para controlar a raiva; e ideação paranóide transitória. Alguns autores alertam para a importância de se verificar o processo de formação e dissolução dos vínculos afetivos nos quadros Borderline. Segundo Agrawal, Gunderson, Holmes e Lyons-Ruth (2004), os distúrbios nos vínculos afetivos sobre a organização da personalidade borderline, demonstram estar ligados ao apego inseguro, isto é, ligados às relações que não favorecem sentimentos de segurança e valorização. De acordo com Bowlby (1969/1990) as relações de apego desenvolvem referenciais internos que permitem ao sujeito, estabelecer trocas recíprocas com o outro e a criar expectativas sociais positivas. Quando não há o predomínio destes sentimentos, instalam-se as interações aversivas e as expectativas negativas nas relações. A partir desse tipo de interação, a disponibilidade para o outro é diminuída e, geralmente se evidencia momentos de estresse, instabilidade, insensibilidade, manifestações de sentimentos de raiva, agressão e falta de empatia nas relações, presentes nos sintomas borderline. Com o objetivo de compreender os padrões de relacionamentos que o sujeito portador do transtorno borderline estabelece com si mesmo e com os outros, procurouse associar os dados referentes à identidade, as relações, os vínculos afetivos e os estilos parentais como possíveis indicadores na personalidade borderline. O ambiente familiar, como sendo o primeiro laboratório para as trocas afetivas, adquire relevância no estudo do transtorno borderline, no sentido de que as configurações familiares podem influenciar ou repercurtir sobre a formação dos vínculos do sujeito. A história de vida destes sujeitos, geralmente é marcada por um funcionamento familiar bastante comprometido, denotando um contexto instável, caótico ou inseguro. Vários autores (Bradley & Westen, 2005; Carvalho, 2004; Figueiredo, 2003; Reich & Zanarini, 2001; Russ, Heim, & Westen, 2003; Villa & Cardoso, 2004) sinalizam que estes são os precursores para a organização de personalidade borderline. Além disso, estão associados as experiências traumáticas, histórico de negligências, abusos e violências de diversas ordens. Muitos autores (Cowan, 1997; Donley, 1993; Marvin & Stewart, 1990; Minuchin, 1985) apontam que observações encontradas nos contextos familiares, permitem um entendimento sobre os padrões interacionais. As dificuldades encontradas nesses sujeitos giram em torno dos limites, às fronteiras e em manter relações íntimas e duradouras com as pessoas ou sobre a construção dos vínculos. Os padrões interacionais refletem na qualidade dos relacionamentos com o meio social. Assim o contexto familiar não pode ser desprezado quanto às suas implicações na formação da empatia com os outros ou sobre o sofrimento psíquico e as repercussões na má formação dos vínculos afetivos em sujeitos com transtorno borderline. A fim de atender os objetivos desse estudo, foi relevante analisar as relações no contexto familiar. Verifica-se a importância de compreender as experiências e a história familiar que colaboram ou não para as características de vinculação afetiva entre pais e filhos, os padrões de apego estabelecidos e sua relação com a manifestação dos sintomas borderline. Com este propósito, verificou-se que o padrão dos relacionamentos são enraizados pela família e podem favorecer ou influenciar a formação dos vínculos primários e, estes estão intimamente ligados à capacidade que o sujeito tem para desenvolver as habilidades nos relacionamentos interpessoais futuros. Outra linha útil na compreensão destes transtornos é abordar a dimensão do funcionamento da personalidade do sujeito, verificado por estudos qualitativos, a partir da utilização do método de Rorschach. Existem estudos (Romaro & Loireiro, 1997; Chabert, 1999, Traubenberg, Silva & Yazigi, 2004; Vaz & Santos, 2006; Westen e cols., 1990; Zilberleib, 2006) que têm tratado as dimensões da identidade e das relações objetais em pacientes borderline. Neste estudo foi dada prioridade às respostas ao Rorschach quanto às verbalizações de defesas, à representação de si e a representação de objeto que evocaram a fragmentação, desvalorização, manipulação, necessidade de gratificações dos objetos, impulsividade e dificuldades egóicas. Assim, caracteristicamente a personalidade borderline, segundo vários autores (Bradley & Westen, 2005; Bradley, Zittel e cols., 2005; Fonagy & Target, 2000; Kernberg, 1995). é marcada por fragilidades nas vinculações afetivas, já que estes fazem uso de defesas primitivas e manifestam dificuldades acentuadas no processo de individuação e difusão da identidade. A falha no contexto da identidade é demonstrada pela falta de integração do conceito de self, onde o sujeito apresenta um grau alto de respostas defensivas, centradas no mecanismo de clivagem e identificação projetiva. Além disso, há uma tendência do sujeito em pensar de forma egocêntrica, tornando difícil a sua convivência com os outros, além de estabelecer uma natureza eminente destrutiva nas relações pela dificuldade em diferenciar-se e de perceber os demais. Chabert (2004) explora a questão do senso de identidade, através do eixo de representação de si, onde afirma que no borderline há uma falta de identidade integrada e esta é permeada por sentimentos de vazio crônico. A experiência subjetiva sobre as percepções de si e dos outros tornam-se contraditórias, empobrecidas e superficiais. Não há uma representação do EU de maneira integrada. Segundo Traubenrberg (1998), a representação de objeto no borderline evoca respostas de medo, abandono, vazio que provocam uma forte sensibilidade à rejeição, o temor à solidão e ao conflito com o outro. Embora o borderline tenha uma necessidade de conexão com os outros, na tentativa de preencher o vazio interno, manifesta-se diante deste outro com sentimentos de raiva e ódio, decorrentes de sensações de rejeição, incompreensão ou vitimização. Sobre a complexidade dos aspectos representacionais e das vicissitudes da constituição psíquica do transtorno borderline, o método de Rorschach e a abordagem sistêmica mostraram-se complementares para o estudo, como meios de identificar as categorias e as variáveis envolvidas no fenômeno da vinculação humana, possibilitando, deste modo, propostas teórico-metodológicas compatíveis com tal complexidade. 2 – OBJETIVO “Identificar associações entre identidade, as relações, os vínculos afetivos e os estilos parentais como possíveis indicadores na personalidade borderline”. 3 – MÉTODO 3.1 – Pesquisa qualitativa: por meio do estudo de caso 3.2 – Participante: Família de AMILY: formada pela mãe, 69 anos, pai, 70 anos, Any, 47, diagnosticada com Transtorno borderline e , Emily, 44 e Jony 40. 4 – ANÁLISE DOS DADOS: 1) Dados do Teste de Rorschach: Foram analisados os protocolos de Rorschach de acordo com a escola francesa (ANZIEU, 1986; CHABERT, 2004; RAUSCH DE TRAUBENBERG, 1998). 2) Dados das entrevistas: -Foram analisados de acordo com o método construtivo-interpretativo de Gonzáles Rey (2002). 5 – INSTRUMENTOS -Roteiro de entrevista semiestruturada do Ciclo de Vida Familiar; -Teste de Rorschach. 6 – RESULTADOS E DISCUSSÃO 6.1 – Any, sua família e as relações 1ª Zona de Sentido: “sempre tive que ser só” – experiência traumatizante de Darly Retrata a história da mãe de Any (Darly) que teve que aprender a viver sozinha porque sua mãe se suicidou quando ela tinha 5 anos. Passou a morar na casa de parentes. Mudou várias vezes, passando a morar com vários tios, onde teve que se adaptar a cada ambiente, onde expressavam sentimentos de ajuda e de humilhação. 2ª Zona de Sentido: “a gente se basta” – construção da família nuclear Retrata o casamento de Sra Darly com Sr João e o nascimento dos filhos. Sra Darly conta que não foi bem aceita na família de Sr João, que era de uma família tradicional do interior de São Paulo, enquanto ela era de origem pobre da mesma região. A sogra não aceitou o casamento e as vezes a humilhava também. Tiveram 3 filhos. Os filhos nasceram no interior de São Paulo, mas o casal resolveu mudar de cidade. Mudaram para Brasília, onde construíram a família nuclear em meio ao conflito com a família de origem e sem grandes recursos financeiros. O Sr João era o provedor, enquanto Sra Darly era dona de casa e cuidava dos filhos. Segundo relatos, a família se bastava com esta dinâmica, ou seja, não estabelecida contatos interpessoais ou tinham comunicação com as famílias de origens. 3ª Zona de Sentido: “Brasília permite viver numa relação de cada um por si” – trajetória da vida de Any Any até a adolescência não manifestou comportamentos que causasse estranhamento, sempre foi boa aluna, começou a trabalhar cedo. Casou-se aos 25 anos. No período do seu casamento passou a se isolar da família, com visitas raras à casa da mãe e dos irmãos. A família diz que não percebia o afastamento de Any como algo estranho. Seu marido (Joaquim), com quem ficou casada por 15 anos não tinha um bom relacionamento com a sua família. A relação com ele era regido pela submissão e dependência emocional. A família tinha a impressão que ele a dominava. Não havia interferência da família nesta relação. Any perdeu um filho antes de nascer e nunca mais quis engravidar. A família diz que ela nunca demonstrou sentimentos de dor ou algo parecido em relação a este episódio de vida, apenas não falava sobre o assunto. O episódio de perder um filho na vida de Any pode ter sido um marco em relação às perdas. A vivência da falta caracteriza uma angústia e este vazio pode traduzir uma experiência borderline. O casamento foi desfeito porque Any descobriu que ele tinha um caso com outra mulher. Após a separação nunca mais se falaram. Alguns anos antes do término do casamento, Any saiu de um trabalho estável para abrir um negócio com o marido. Ao término do casamento a família soube que havia um rombo financeiro. No caso da separação, uma das características do borderline é o ressentimento, que dependendo da vulnerabilidade narcísica pode tornar-se indomável, violento e duradouro, provocando desejo de vingança e ruptura relacional. As relações entre os irmãos eram estabelecidas por meio indireto, a comunicação só acontecia com trocas de ironias, sem muita intimidade ou confiança. Any tinha uma maior abertura com a irmã (Emily), mas exercia sobre ela um controle, pois vivia lhe emprestando dinheiro e segundo a irmã ela cobrava em tom de humilhação todas as vezes. Emily destaca que sua irmã não tinha muitos amigos, mas que nos poucos contatos ela estabelecia a superioridade sobre o outro, como descreve: “ela tinha sempre algo na ponta da língua ... mas era algo que detonava o outro...tinha um tom de arrogância e desqualificação do outro”. A irmã já presenciou várias humilhações de Any com as pessoas, desde as empregadas domésticas aos amigos. Conta que quando uma amiga ia casar ela tinha sempre um comentário inconveniente do tipo: “esta aliança parece mais um bambolê”...”Pra quê este vestido se você está gorda” etc. A irmã relata que vê poucas manifestações de carinho de Any, ela não é de agradar as pessoas, de dar presentes em datas comemorativas, passa sempre uma frieza nos contatos que estabelece. Ao mesmo tempo, a irmã relata que nos ambientes onde Any é pouco conhecida, ela oscila em termos de manifestar-se de maneira agradável com as pessoas. Any emite mecanismos de clivagem, ou seja, ora se identifica com o objeto bom ora com o mau. Esta alternância caracteriza a dinâmica típica da personalidade borderline que acentua a sua inconstância e instabilidade nas relações. Quando Any é questionada sobre as relações diz que “Brasília permite viver numa relação de cada um por si” – para justificar que não procura estabelecer contatos com as pessoas, prefere manter-se distante delas. Após a separação teve que procurar ajuda familiar para suporte financeiro em relação às dívidas que havia adquirido. Após esta reaproximação com a família, Any tem manifestado comportamentos regredidos, passou a exigir a presença da mãe pra tudo e segundo a irmã: “passou a controlar a vida dos pais em todos os aspectos, desde a escolha da empregada à rotina da casa”. A irmã diz que como ela sempre esteve afastada, hoje é difícil frequentar a casa da mãe quando ela está perto, pois ela quer controlar tudo. 4ª Zona de Sentido: “as pessoas e os médicos acham que eu vivo no vazio” – Sobre os sintomas borderline Nos últimos 3 anos, Any tem piorado os comportamentos agressivos direcionados aos outros. Any sempre se recusou a procurar ajuda especializada. Nestes últimos anos emagreceu muito, chegando a pesar 40 kg sendo que tem 1,65m. A mãe exigiu que ela passasse um tempo em sua casa para alimentar-se direito. Durante este período, foi levada pelos pais em médicos que a diagnosticaram com o transtorno borderline. Segundo o que os dados indicam, Any utiliza um funcionamento regressivo no enfrentamento de crises e utiliza o corpo como meio de expressar seu sofrimento. Além disso, emite o comportamento de retomar a relação primitiva com a mãe, ou seja, ser alimentada por ela novamente. Any, segundo os pais, passou a viver uma adolescência tardia, com comportamentos estranhos que ela nunca havia manifestado. Passou a idolatrar a cantora Amy Winehouse. Enquanto a cantora era viva fez novas dívidas para acompanhar algumas turnês da cantora fora do país. Relatam que a filha antes não bebia e agora já chega bêbada em casa. Após a morte da cantora, Any passou a se vestir como ela e a manifestar alguns comportamentos parecidos. Any utiliza o mecanismo da identificação projetiva, ou seja, encontra no outro (Amy Winehouse), ilusoriamente a possibilidade de se tornar o outro, sem correr o risco de deixar de ser ela mesmo. Esta projeção é sobre aquilo que ela não reconhece em si. Este mecanismo é utilizado pela maioria das pessoas, mas é a intensidade e a qualidade que determina se este mecanismo é patológico ou normal. A mãe diz não entender a postura da filha, pois ela sempre foi boa aluna, uma pessoa bem sucedida. Agora não trabalha mais, vive com estes comportamentos e depende financeiramente e até emocionalmente dos pais novamente. Ao que parece Any, como não reconhece o outro, volta contra si mesmo. Any ainda não manifesta consciência de suas dificuldades, apenas relata que “as pessoas e os médicos acham que eu vivo no vazio”. Any hoje não tem amigos para se relacionar. Com os irmãos, não consegue interagir. Any diz que suas dificuldade são porque as pessoas não a entendem, então ela prefere viver no seu mundinho. Any parece se defender contra a angústia, apresentando uma identidade difusa, onde não se conhece por dentro ou por aquilo que sente, mas por aquilo que os outros lhe dizem que ela é. Ao que tudo indica Any vive uma ansiedade de separação intensa, típica da personalidade borderline, onde liga-se ao outro mais por necessidade do que por afeto. 6. 2 - Dados do Rorschach Representação de si Integração da identidade Any evoca um aumento de respostas globais que indicam um traço egocêntrico. Demonstra a ausência de si mesmo integrada e ao mesmo tempo respostas de texturas que expressam uma necessidade de contato. As representações são expressas por imagens boas e más, o que corresponde a um ego contraditório, dissociado através do mecanismo de clivagem. Any traz a representação de caricaturas, máscaras, objetos bons e maus representados por: magos, bruxas, personagens de filmes, pessoa meditando, etc. Prancha I R2 – “(...) enxergo uma máscara para Halloween”. “(...) Halloween porque é de coisa para assustar”. “(...) A Textura é escura para assustar”. R4 – “(...) Consigo visualizar 2 pessoas de costas, uma encostada na outra, como se fossem iguais, como se fosse um reflexo”. R5 – “(...) Dá para ver reflexo, duas metades idênticas. Uma bruxa com nariz comprido”. Any manifesta dificuldades na adaptação às situações novas, passa a não estabelecer diferenciação entre o interno e o externo e sente-se invadida. A necessidade de simetria reflete uma busca de organização psíquica, já que se percebe de maneira desorganizada e fragmentada. Prancha V R5 – AH!!! “(...) Tem 2 perfis de rostos, masculinos, idênticos, aquele queixo pra frente e pontudinho...não é um desenho delicado...por isso masculino” Esta resposta traduz a representação que Any tem de si mesmo, como tendo dois perfis, que reflete a problemática da sua identidade. Segundo Chabert (1999), a Prancha V revela a identidade pelo ponto de vista psíquico e explica fragilidade narcísica. Neste caso, há muita proximidade identificatória de Any à prancha, ou seja, ela se percebe como tendo dois perfis e um deles muito provavelmente não é de uma pessoa delicada. Autoimagem As respostas de simetria são vistas como uma identificação projetiva, o sujeito se projeta em um mundo desorganizado (como o de Amy Winehouse). Ela provavelmente se vê como “uma bruxa de nariz comprido”. Ao utilizar termos como “igual” ou “idêntico”, instala um conflito direto ao conteúdo das respostas, pois estes termos confirmam a história do sujeito. Como apresenta nas seguintes respostas: R5 – “(...) Dá para ver reflexo, duas metades idênticas. Uma bruxa com nariz comprido (Prancha I) R1 – “(...) Dois duendes brincando. Dois idênticos. Não como se fosse idênticos. Como se fossem gêmeos ... Colocaram o papel com figuras idênticas”. (Prancha II) R1 – “(...) Este aqui é como se fossem 2 seres magros girando”. “(...) Sempre dois idênticos”. (Prancha III) R5 – “(...) AH!!!-Tem 2 perfis de rostos, masculinos, idênticos, aquele queixo pra frente e pontudinho”. Representação de Objeto Identificação com as figuras parentais Prancha IV Any demonstra certo respeito às figuras de autoridade (“ele é rei, está de coroa”), mas manifesta certa reação à textura (pele), ou seja, demonstra certa fragilidade em relação à figura paterna, provavelmente por um histórico de castigo ou surra (“tiram o couro”). A noção de neblina ou tempo nublado pode indicar sentimentos obscuros ou que não deseja enfrentar. R1 – “(...) Isso aqui é uma rã aberta, tiram o couro, osso, está preparada para fritar ou para ir para o forno... A pele dela e não ela (textura da pele)”. R2 – “(...) NOSSA! Aqui (riu) eu já vi como se fosse um dragão de frente/só a cara dele/ ele é rei, está de coroa.”. R3– “(...) Também dá pra ver a formação rochosa. Como se fosse neblina. O tempo está nublado”. Prancha VII Any, em relação à figura materna emite respostas direcionadas ao conteúdo de imagens de satélite e raio X, que representam um desejo de controlar as ansiedades frente às suas frustrações, através de recursos intelectuais. O sujeito tende a voltar-se para o mundo interno, utilizando recursos introspectivos para manter certo distanciamento e sem manifestar a emoção envolvida. Por outro lado, pode-se caracterizar como um mecanismo que permite ao sujeito tolerar melhor a sua ansiedade. R1 – “(...) Ah!! Este é um desenho visto de satélite. Foto de relevo, de uma área que tem água. Sempre relaciona com o mar... as partes brancas é a terra”. R2 – “(...) Um cogumelo planta, não é o de explosão atômica não”. R3 – “(...) Eu vejo também, mais ou menos, a parte do corpo humano, quadril, como se estivesse vendo o corpo humano num raio X, como se fosse a estrutura óssea”. R4 – “(...) Dois tigres, como se estivessem de boca aberta, rosnando um para o outro. Não seria uma coisa agressiva, não sei como um tigre vai fazer isso sem ser agressivo, mas...”. Prancha IX As respostas de Any sugerem uma mobilização dos conflitos, tensões e angústias existenciais que não consegue elaborar, como expressa nas respostas: ESTE! ESTE! EITA CARAMBA R1 – “(...) Esse aqui é como se estivesse vendo o perfil do relevo terrestre, como se tivesse tirado uma fatia da terra, vê os níveis da terra”. RI: “(...) Um vulcão ... como se tivesse saindo bolha “. Esta resposta de “vulcão” traduz uma representação violenta como meio de expressar a ausência (“como se tivesse tirado uma fatia da terra”), que sinaliza o medo de perder o objeto. Any demonstra uma angústia de invasão, representada pelo choque ao branco e que representam o vazio interior. Os “vãos brancos” sugerem uma necessidade de preencher este vazio, como na resposta à Prancha II: R1 – “(...) Também dá um visual de um tipo de máscara para fantasia que aparece nestes vãos brancos ... Tem um vão para a orelha ... O olho redondo já sugeriu uma máscara”. Ao mesmo tempo, Any evoca uma resposta agressiva (Kob) como mecanismo de defesa ao vazio. Além disso, apresenta uma defesa à sua representação, quando completa: “Como se fosse um desenho animado”, com intuito de amenizar a agressividade, como expressa na resposta à Prancha II: R2 – “(...) Como se fosse uma nave espacial com fogo vermelho saindo uma chama embaixo do foguete ... Como se fosse um desenho animado”. 7- CONSIDERAÇÕES FINAIS Segundo análises deste estudo pudemos constatar a falta de habilidade de Any em estabelecer uma relação intersubjetiva entre o interior e o exterior. A fim de avaliar a totalidade de fatores que caracterizam o funcionamento borderline, foi possível identificar associações entre a identidade, as relações, os vínculos afetivos à esta intersubjetividade. O estudo demonstrou um quadro amplo sobre a dinâmica afetiva e psicológica do indivíduo. A integração dos dados através dos métodos de Rorschach e da abordagem sistêmica nos fez refletir sobre como as relações estabelecem uma interdependência à organização da personalidade borderline. Ambos os dados confirmaram as dificuldades de Any em estabalecer fronteiras, limites e em manter relações íntimas e duradouras com as pessoas. A qualidade de suas respostas demonstraram um distanciamento afetivo em quase todas as modalidades de relação, mesmo com pessoas mais próximas, como são as relação entre pai/mãe e filho e entre irmãos. A projeção e o aparecimento de expressões de conflitos psíquicos e de temas específicos nos fez compreender o modo de funcionamento de Any. Os dados oferecem informações essenciais para traçar estratégias a fim de reestabelecer os vínculos, a partir de recursos que favoreçam os sentimentos de valorização e apoio. Acredita-se que nesta fase, Any estará mais aberta a aprender novas formas de se relacionar, até mesmo porque hoje já permite que a família se aproxime dela. A intenção é propor um estudo mais aprofundado sobre a personalidade borderline, fazendo uma articulação entre o contexto terapêutico e o ambiente familiar. A proposta é ampliar espaços para o acolhimento às dificuldades de Any. Os dados demonstram esta inconsistência sobre a identidade que se confronta com uma maciça expressão das necessidades emocionais. Desta forma, entender o funcionamento da dinâmica familiar no contexto da personalidade borderline, torna-se um requisito fundamental na compreensão dos vínculos. A visão ampla das abordagens teóricas visam desenvolver a necessidade de caracterizar cada vez mais a dinâmica relacional em casos como este, já que é justamente a falta que dá origem a natureza eminentemente destrutiva do borderline. 8 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÀFICAS BOWLBY, J. Apego: a natureza do vínculo. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1990, v. 1. BRADLEY, R., JENEI, J., & WESTERN, D. (2005). Etiology of borderline personality disorder: Disentangling the contributions of intercorrelated antecedents. Journal of Nervous and Mental Disease, 193, 24–31. CHABERT, C. A psicopatologia no exame do Rorschach (N. Silva Jr., trad.). São Paulo: Casa do Psicólogo,2004. GREEN, A. (1977). 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