CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE COMO INTRUMENTO PARA FORMAÇÃO DOCENTE Dayse Peixoto MAIAi Universidade do Estado do Amazonas Ierecê Barbosa MONTEIROii Universidade do Estado do Amazonas RESUMO: O presente estudo sugere uma proposta para a implementação na formação de professores através da abordagem centrada em Ciência, Tecnologia e Sociedade, visando à amplitude de uma capacitação que abranja as necessidades de nossa sociedade pós-moderna e globalizada, ante o deslanchar das novas tecnologias educacionais e das modificações que o desenvolvimento científico induz na sociedade. Através de uma revisão bibliográfica de Popper, Morin e Freire, entre outros, propomos alternativas que potencializem a qualificação dos professores da área de ciências naturais. Se conseguirmos preparar melhor o docente através de atividades que pressuponham uma metodologia dialética que o conduza a uma práxis transformadora, certamente estaremos contribuindo para um significativo avanço na educação. Palavras-chave: Ciência, Tecnologia e Sociedade; Ensino de ciências; Formação de professores. 1. INTRODUÇÃO E OBJETIVOS Independente das discussões que abordam o desenvolvimento científico tecnológico como responsável ou não pela determinação da atual ordem social, a ciência aplicada progride amplamente e tem-se insinuado até nos aspectos mais corriqueiros de nosso cotidiano. Resistir a seu avanço é impossível. Os impactos da tecnologia perspassaram ambientes formais e grupos sociais específicos e já há muito se alargaram por todos os aspectos do desenvolvimento humano, e em especial na educação, enquanto processo formador da cultura, e de elementos que ensejam aspectos diretamente relacionados à cidadania e à inserção social como um todo. Sendo a sociedade mutável em sua essência, é de se esperar que recepcione acolhedoramente quase todas as produções e descobertas científicas, ficando as raras exceções por conta de eventuais dilemas éticos, como o que presenciamos atualmente em relação à pesquisa com células tronco embrionárias. Discordâncias à parte, a própria sociedade revestiu-se da postura de auditoria em buscar respostas e soluções advindas da ciência, para tentar equalizar os problemas surgidos nas duas últimas décadas principalmente em relação à conservação dos recursos naturais não renováveis e do desenvolvimento sustentável. Este trabalho objetiva o aprimoramento na formação de docentes para o ensino de ciências baseado na temática CTS, onde se pretende articular uma unidade entre teoria e prática a partir de conceitos epistemológicos e dialéticos, forjando uma postura comprometida com esta abordagem, como um processo do homem historicamente situado. Pretende-se identificar as principais dificuldades dos professores de ciências, relacionadas ao seu processo de formação acadêmica, com a finalidade de minimizar a dicotomia entre teoria e prática da perspectiva CTS. 2. DESENVOLVIMENTO Sendo o processo educacional algo dinâmico, assim como a sociedade que o circunscreve, e devido a suas rápidas modificações impulsionadas pelo avanço tecnológico e científico, o ensino das ciências tem se destacado, fomentando grande número de pesquisas que visam, como o presente trabalho, o aprimoramento do ensino científico, buscando muito além do conhecimento teórico, a própria inclusão social, decorrente da inter-relação dos aspectos Ciência, Tecnologia e Sociedade que, na educação devem ser abordados em uma visão multicultural quanto à aplicação da ciência na sociedade, não apenas enfocando os possíveis desdobramentos tecnológicos. Nesta abordagem ampliada, pode-se detectar fatores relevantes ao desenvolvimento social, emocional e cognitivo do estudante, que ainda se constituem em dificuldades na atuação dos professores de ciência, a saber: • Compreensão de que a ciência não é infalível, pois como produto do conhecimento humano, é caracterizada por sua base conjectural e ilimitada. • A ciência e a tecnologia não devem ser encaradas como propostas salvadoras das mazelas sociais e ambientais. Podem e devem contribuir significantemente para a minimização ou resolução de problemáticas decorrente da interação do homem enquanto sujeito social, com os diversos desdobramentos econômicos, culturais sociais e ambientais, frutos de seu modelo desenvolvimentista; porém não cumpre a elas a tarefa milagrosa de extinguir as conseqüências nefastas de muitas de nossas escolhas. 2 • A tecnologia é uma ferramenta que facilita a execução de tarefas que visem em seu fim maior, o bem estar humano, não deve ser algo a cercear nossa liberdade por limitar nossa autonomia de ação quando não a dominamos. • O progresso da ciência e da tecnologia não está atrelado a uma garantia de melhoria social e moral, portanto é necessário estimular e participar do debate ético referente à sua amplitude. As aplicações da Ciência e Tecnologia no contexto educacional promovem mais que conhecimento, compreensão dos anseios sociais por possibilitar a efetiva atualização do pensamento humano; e ainda inferindo que, tendo por base a ideologia capitalista subjacente ao mundo moderno, o desenvolvimento científico nunca é descomprometido, estando irremediavelmente vinculado a interesses econômicos. Outra finalidade da abordagem CTS deve ser a de ensinar a compreender a atuação da ciência no contexto social. A ciência tem por finalidade encontrar explicações satisfatórias e, se possível, soluções para problemas postos, (POPPER, 1982). Se ela surge das questões humanas, surge para a sociedade, sendo produto desta. No entanto o primeiro interesse dela não é atender ao coletivo, mas ao grupo minoritário que fomenta as possibilidades de seu desenvolvimento, que está sempre relacionado com a ideologia dominante. Para versar sobre CTS no contexto educacional, é necessária a formulação de políticas educacionais centradas na expectativa de elaborar uma dimensão do mundo que, possibilite uma releitura do mesmo, e sua necessária transformação. Já se mostrou que a formação de professores, quer inicial, quer continuada, deve ser embasada pela apreciação de temas de CTS com destaque para a devida abordagem histórica dos temas científicos para facilitar uma prática docente que privilegie a contextualização da ciência inclusive pela narrativa histórica. O que se defende é o tratamento de questões científicas de forma que o estudante valorize este conhecimento por relacioná-lo a seus saberes cotidianos. Esta atitude possibilita a construção de uma abordagem crítica sobre a ciência, necessária para a construção da identidade cidadã. Nesta perspectiva CTS torna-se um propulsor dos imprescindíveis aprimoramentos no ensino de ciências. É necessário que o professor seja não somente conhecedor da epistemologia que embasa seu componente curricular, mas eficiente em técnicas didáticas e metodológicas capazes de permitir uma correta articulação entre os conteúdos, os estudantes e temas CTS. O exercício da atividade docente requer preparo que não deve se esgotar nos cursos de formação. O docente quando verdadeiramente educador, vai muito além de conteúdos programáticos. Atuando como agente transformador; segundo MORIN “... O ensino tem de deixar de ser apenas uma função, uma especialização, uma profissão e voltar a se tornar uma tarefa política por excelência, uma missão de transmissão de 3 estratégias para a vida. A transmissão necessita, evidentemente, da competência, mas, além disso, requer uma técnica e uma arte...” (2003). Devemos, portanto, nos empenhar pelo resgate da qualificação do docente, uma vez que existe concordância entre os educadores acerca dos principais objetivos do ensino das ciências, porém “... outra interpretação sugere que os objetivos são aceitos, mas os professores estão despreparados para transmitir o currículo de uma forma congruente com as propostas...” (KRASILCHIK, 1997:3). A reflexão crítica parece ser o melhor caminho a seguir se quisermos nos distanciar dos modelos prédeterminados e nos arriscarmos na direção de atitudes transformadoras. Para GHEDIN (2002), é necessária a transição da epistemologia da prática, para a da práxis, se quisermos formar docentes mais comprometidos, menos alienados em relação à própria identidade profissional e funcional enquanto sujeitos direcionadores do processo ensino aprendizagem, pois, “... para adquirir novos conhecimentos é preciso agir conscientemente, de acordo com finalidades, sobre a realidade, prefigurando em idéias os resultados proveitosos esperados...” (PINTO, 1969 Visando uma potenciação do aproveitamento escolar dentro do currículo das ciências, é importante a contextualização dos conteúdos de CTS trabalhados, preferencialmente regionalizando os exemplos e fenômenos abordados. Se o estudante não se sentir parte do que é tratado em sala de aula, acaba por excluir a si próprio já que a aprendizagem não terá significância em sua vida real. (FREIRE, 1996). 3. CONCLUSÕES Os resultados indicam que as dificuldades causadas pelo distanciamento na atividade docente da reflexão pedagógica didática, precariamente presente nas escolas, precisam ser identificadas e diagnosticadas com exatidão e transformadas por pesquisas que embasem a determinação dos agentes envolvidos em todas as esferas do processo ensino aprendizagem, pois “... os professores formados nas Universidades, apesar dos esforços, não têm delas saído com a necessária formação científica e pedagógica para ensinar ciências às crianças e jovens...” (DELIZOICOV, 1990: 11). Faz-se necessário confrontarmos essas dificuldades e as características culturais locais, considerando que a formação de uma atitude científica está intimamente vinculada ao modo como se constrói o conhecimento, e como está relacionado à abordagem de CTS, de forma que necessita ser amplamente difundido em todas as camadas de nossa sociedade, despertando um pensamento ético, centrado no papel da Ciência e da Tecnologia, e nas intrincadas teias que fomentam na sociedade pós-moderna, assim como suas reais contribuições para o desenvolvimento do homem-cidadão, neste início do século XXI. 4 4. REFERÊNCIAS DELIZOICOV, D. & ANGOTTI, J. A. Metodologia do Ensino de Ciências. 2ª ed. São Paulo: Cortez.1994. FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. 35ª ed. São Paulo: Paz e Terra. 1996. KRASILCHIK, M. O Professore o Currículo das Ciências. Temas Básicos de Educação e Ensino. São Paulo: EPU. 1987 MORIN, E. Educar na Era Planetária. São Paulo: Cortez. 2003. PIMENTA, S. G. & GHEDIN, E. Professor Reflexivo no Brasil. Gênese e Crítica de um Conceito. 2ª ed. São Paulo: Cortez. 2002. PINTO, A. V. Ciência e Existência. Rio de Janeiro. Paz e Terra. 1969. POPPER, K. R. Conjecturas e refutações. 2. ed. Brasília: EDUNB. 1982. i Mestranda em Ensino de Ciências pela Universidade do Estado do Amazonas, licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Amazonas. Com experiência docente em Biologia no Ensino Médio e séries finais do Ensino Fundamental. ([email protected]) ii Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal do Pará (1974), graduada em Comunicação Social pela Universidade do Amazonas (1982), mestra em Educação pela Universidade do Amazonas (1993) e doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2003). Atualmente é professora da Universidade do Estado do Amazonas, professora da Universidade Federal do Amazonas e professora do Centro Universitário do Norte. Tem experiência nas áreas de Educação, Comunicação e Psicanálise, atuando principalmente nos seguintes temas: educação, cultura, ensino - aprendizagem, engenharia de produção, gênero e semiologia. 5