Revista de Ciências Farmacêuticas Básica e Aplicada Rev Ciênc Farm Básica Apl., 2014;35(3):385-392 ISSN 1808-4532 Journal of Basic and Applied Pharmaceutical Sciences Desenvolvimento e estudo de estabilidade de formulações extemporâneas de uso oral a partir de comprimidos comerciais contendo espironolactona Aline Marques Rosa1; Mirella Carla Galana Gerlin1; Isabella Correa Alcântara1; Rubia Adrieli Sversut1; Teófilo Fernando Mazon Cardoso1; Patrik Oening Rodrigues1; Marcos Serrou do Amaral2; Nájla Mohamad Kassab1* 1 Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande-MS, Brasil. 2 Instituto de Física, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande-MS, Brasil. RESUMO INTRODUÇÃO O objetivo desse trabalho foi desenvolver e avaliar a estabilidade de formas farmacêuticas líquidas extemporâneas, a partir de amostras comerciais (comprimidos), contendo espironolactona, para que possam ser empregadas em pacientes pediátricos ou adultos com dificuldade de deglutição. A metodologia empregada para a análise do teor e da estabilidade do fármaco espironolactona nos comprimidos e nas dispersões utilizando água, carboximetilcelulose (CMC) 1,5% e xarope simples foi a Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE), utilizando coluna de sílica C18 (250 mm x 4,6 mm x 5 µm), fluxo de 1 mL/min, comprimento de onda 240 nm e fase móvel metanol:água (75:25 v/v). As formulações extemporâneas foram analisadas durante 35 dias nas temperaturas de 8, 27 e 40 ºC. A dispersão aquosa apresentou teor muito abaixo do esperado, com variações significativas em todas as temperaturas, devido à rápida sedimentação. A dispersão aquosa de CMC 1,5% apresentou teor adequado na temperatura de 27 ºC com variações indesejadas nas demais temperaturas. A dispersão de xarope simples apresentou-se estável nas três temperaturas, com teor adequado e sem variações significativas. Não foi observado produto de degradação em nenhuma das formulações propostas. Por ser de fácil preparação, autoconservante, estável e de sabor agradável, a dispersão de xarope simples é a formulação extemporânea recomendada, pois garante teor satisfatório por dose e, portanto, favorece aumento à adesão e à eficácia do tratamento. Palavras-chave: Pediatria. Cromatografia líquida. Formulações extemporâneas. Edema. Hipertensão arterial e dispersão. A maioria dos medicamentos disponíveis no mercado nacional não apresenta forma de dosagem de uso pediátrico, pois grande parte deles está sob as formas farmacêuticas de comprimidos e cápsulas. Indivíduos adultos que apresentam dificuldades de deglutição e crianças são os pacientes que mais sofrem, pois não conseguem ingerir facilmente estes produtos (Allen, 2000a). A carência de formas farmacêuticas pediátricas adequadas obriga os médicos a recorrer ao uso de comprimidos triturados, dissolvidos em solventes ou administrar o conteúdo das cápsulas. Por conseguinte, estas fórmulas se administram sem informação a respeito de sua biodisponibilidade, eficácia e toxicidade (Calderón-Guzmán et al., 2012). Na prática, uma vez que o medicamento está disponível no mercado para uso adulto, também se utiliza em crianças fora das indicações autorizadas. As fórmulas com doses para adultos frequentemente são manipuladas pela equipe de enfermagem do hospital, ou são preparados de maneira improvisada pela farmácia hospitalar, para satisfazer a necessidade de pequenas doses para pacientes pediátricos internados. Estas manipulações podem requerer, por exemplo, cortar e esmagar comprimidos, distribuir e mesclar fármacos com outros agentes antes de sua administração. Estas práticas expõem a um risco elevado de erros porque a biodisponibilidade dos fármacos depois de tais manipulações é muitas vezes desconhecida e imprevisível. Também falta informação sobre sua compatibilidade e estabilidade, além de trazer riscos de inexatidão de dose, contaminação, perda de estabilidade, incompatibilidade e interações (CalderónGuzmán et al., 2012; Costa et al., 2009a). Nos EUA é comum a prescrição de medicamentos off label, isto é, quando um medicamento é indicado ao paciente de maneira diferente daquela indicada pela bula ou autorizada pela Anvisa para pacientes pediátricos, principalmente os hospitalizados (Paula et al., 2011; Autor correspondente: Nájla Mohamad Kassab – Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Curso de Farmácia - Laboratório de Tecnologia Farmacêutica, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Caixa Postal 549, CEP 79070-900, Campo Grande-MS, Brasil. E-mail: [email protected] Formulações líquidas de espironolactona Costa et al., 2009b; Brito, 2012), como por exemplo, as formulações extemporâneas de espironolactona. A literatura relata que muitos medicamentos que não estão disponíveis comercialmente na forma líquida foram preparados de modo extemporâneo. As formulações extemporâneas desempenham um importante papel na terapêutica, principalmente na clínica pediátrica e especialmente em crianças menores de seis anos de idade, já que nesta faixa etária são incapazes de ingerir comprimidos ou cápsulas (Allen, 2000b). Geralmente, formulações extemporâneas são facilmente preparadas e permitem flexibilidade de dosagem. Tais formulações devem conter excipientes adequados para uso pediátrico e assegurar a palatabilidade, além da estabilidade física, química e microbiológica (Salgado et al., 2005). A espironolactona inibe a ação da aldosterona através da sua ligação ao receptor de mineralocorticoides, impedindo sua translocação nuclear (Bhattacharya & Alper, 2009). É um fármaco empregado na clínica pediátrica para o tratamento de hipertensão arterial, edema associado à excreção excessiva de aldosterona, insuficiência cardíaca e hipopotassemia, porém, a única forma farmacêutica disponível no mercado nacional é o comprimido para uso oral (Pinto & Barbosa, 2008; Royal Children’s Hospital, 2010). Segundo Cortizas et al. (2003) a espironolactona é utilizada por 6,1% dos pacientes pediátricos e representa 2,6% das prescrições em seis hospitais espanhóis. Além de ser o medicamento mais utilizado como forma magistral (2,5% das prescrições), preparado como suspensão. A espironolactona é um dos medicamentos frequentemente referido pelos médicos como inexistente na forma líquida para uso oral, porém necessário (10,42%), sendo um dos mais prescritos (15,13%), e uma dos mais receitados em subdoses (Costa et al., 2009a). Até o momento, foram encontrados apenas dois trabalhos na literatura científica relatando o desenvolvimento de formulações líquidas contendo espironolactona. A estabilidade das preparações extemporâneas desenvolvidas por Salgado et al. (2005) foi avaliada exclusivamente na temperatura de 22 ± 3 0C, enquanto que Mendes et al. (2013) avaliaram a estabilidade da suspensão de espironolactona, desenvolvida a partir da matéria-prima, nas temperaturas de 5 ±¬ 3 0C e 25 ± 2 0C. Assim, o presente trabalho teve por objetivo desenvolver e avaliar a estabilidade físico-química de formulações extemporâneas de espironolactona para uso oral infantil, uma vez que não existem disponíveis comercialmente formulações adequadas à administração pediátrica, empregando como metodologia a cromatografia líquida de alta eficiência para o estudo de estabilidade e determinação do teor de fármaco presente na forma farmacêutica. 386 MATERIAL E MÉTODOS Reagentes, solventes e equipamentos A metodologia empregada para a análise do fármaco espironolactona como Substância Química de Referência (SQR) e nas formas farmacêuticas de comprimido e dispersões utilizando água, carboximetilcelulose (CMC) 1,5% e xarope simples foi a Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE), utilizando Cromatógrafo DionexThermofisher® modelo Ultimate 3000 acoplado a um detector UV/VIS e coluna de sílica C18 (250 mm x 4,6 mm x 5 µm). A fase móvel constituiu-se de metanol: água (75:25 v/v), conforme metodologia desenvolvida por Laxman et al. (2010), comprimento de onda e vazão foram empregados 240 nm e 1,0 mL/min, respectivamente. Os comprimidos utilizados para o desenvolvimento das formulações foram Aldosterin® – 100 mg, lote D709004, do laboratório Cellofarm. A SQR de espironolactona foi adquirida do laboratório DEG/FRAGON, lote 100408, 98,58% de pureza. Todos os solventes empregados foram de grau espectroscópico e analítico e a água purificada foi obtida pelo equipamento Direct®-Q 3. Obtenção da curva de calibração Diluiu-se 12,5 mg da SQR com metanol em balão volumétrico de 25 mL e obteve-se a solução estoque de 500,0 µg/mL. Diluições seriadas foram realizadas, empregando fase móvel a partir da solução estoque. Assim, resultaram as concentrações de 8,0; 12,0; 20,0; 28,0 e 32,0 µg/mL de espironolactona. A curva foi obtida a partir de médias aritméticas de resultados analíticos obtidos em triplicatas para cada concentração. Determinação do peso médio e teor de substância ativa nos comprimidos O teste consistiu na pesagem individual de 20 comprimidos. Após este procedimento se determinou a média aritmética, o desvio padrão (SD) e o coeficiente de variação (CV%), conforme recomendações descritas na Farmacopeia Brasileira (Brasil, 2010). A determinação do teor de espironolactona foi realizada em triplicata, pesando-se 45,25 mg a partir de 20 comprimidos triturados, equivalentes a 12,5 mg de fármaco, em balões volumétricos de 25 mL. O volume final dos balões foi completado com metanol e novas diluições foram realizadas de maneira a obter a concentração final de 20,0 µg/mL em cada balão. Cada solução foi injetada em triplicata no cromatógrafo a líquido com loop fixo (20 µL). A quantidade de fármaco existente nos comprimidos foi calculada em relação à equação da reta obtida na curva de calibração, a partir da média das triplicatas. Desenvolvimento das formulações Três formas farmacêuticas líquidas foram preparadas a partir de comprimidos triturados e pulverizados contendo espironolactona. Rev Ciênc Farm Básica Apl., 2014;35(3):385-392 Formulações líquidas de espironolactona Dispersão aquosa A dispersão aquosa de concentração 4,0 mg/mL foi preparada pesando-se rigorosamente o equivalente a 4320 mg de espironolactona e transferida para um gral de capacidade volumétrica de 500 mL. Gradativamente, foi adicionada água até a formação de uma mistura com aspecto de pasta, a qual foi sendo dispersa com o auxílio do pistilo. A mistura foi transferida para uma proveta, e o volume final obtido foi 1080 mL, completados com água. A dispersão foi distribuída e armazenada em 18 frascos de vidro âmbar com capacidade volumétrica de 60 mL. Dispersão aquosa de CMC Para a obtenção da dispersão aquosa de carboximetilcelulose (CMC) de 1,0 mg/mL, foram pesados o equivalente a 1080 mg de espironolactona. O procedimento de preparo foi semelhante à dispersão aquosa. Entretanto, o veículo utilizado foi uma dispersão de CMC 1,5%. O volume final foi de 1080 mL. A formulação foi armazenada em 18 frascos de vidro âmbar com capacidade volumétrica para 60 mL. Dispersão de xarope simples A preparação dessa forma farmacêutica foi semelhante aos procedimentos anteriores descritos. O veículo empregado foi xarope simples, preparado conforme recomendação do Formulário Nacional da Farmacopéia Brasileira 2ª edição (Brasil, 2012). A concentração final obtida foi de 1,0 mg/mL. Estudo de estabilidade físico-químico e ensaios para a avaliação da qualidade das formulações extemporâneas A avaliação da estabilidade físico-química da espironolactona foi realizada pelo período de 35 dias, onde a aparência física, cor, odor, pH, presença de produtos de degradação e a determinação do teor de fármaco foram monitorados frente a diferentes veículos e temperaturas de armazenamento. O estudo empregou as temperaturas de 8, 27 (± 2) e 40 ºC. Seis frascos de cada formulação (frasco-teste) foram armazenados nas temperaturas citadas e, para as formulações preparadas com SQR, apenas um frasco. As análises foram realizadas uma vez por semana nos seguintes tempos: zero dia, 7º, 14º, 21º, 28º e 35º dia. Para cada tempo, um frasco foi analisado. A determinação dos valores de pH das formulações foi realizada através do medidor de pH da marca BEL®, modelo W3B, empregando eletrodo de vidro previamente calibrado com soluções tampão de pH 4,01 e 7,00. Após a agitação dos frascos para redispersão do conteúdo, o teor de substância ativa nas formulações foi determinado da seguinte forma: Dispersão aquosa – Foram pipetados e transferidos 5 mL do frasco âmbar de (concentração 4 mg/mL) para um balão volumétrico de 100 mL, completou-se o volume com metanol. Homogeneizou-se o conteúdo e, deste, uma alíquota de 5 mL foi transferida para balão volumétrico de 50 mL, onde o volume final foi completado com Rev Ciênc Farm Básica Apl., 2014;35(3):385-392 fase móvel, obtendo-se assim a concentração de 20 µg/ mL. Esta dispersão foi centrifugada a 3000 rpm por 3 minutos e filtrada. Injetou-se, em triplicata, 20 µL do filtrado no cromatógrafo a líquido e o teor foi determinado comparando-se com a curva de calibração da solução padrão. Este procedimento foi repetido durante o período da análise. Dispersão aquosa de CMC 1,5% – Foram pipetados e transferidos 5 mL do frasco âmbar de concentração 1 mg/ mL para um balão volumétrico de 50 mL, completou-se o volume com metanol. Homogeneizou-se o conteúdo e, deste, transferiu-se 5 mL para um balão volumétrico de 25 mL, completando-se o volume com fase móvel. Obtevese a concentração de 20 µg/mL. O procedimento para obtenção da concentração final foi semelhante ao descrito para a dispersão aquosa. Dispersão de xarope simples – Utilizou-se o mesmo procedimento descrito acima para a dispersão aquosa de CMC 1,5%. Ensaios para a avaliação do tempo de viabilidade das formulações Com o intuito de avaliar o período de utilização das formulações após abertura do frasco, sob o ponto de vista físico-químico, todos os frascos das três formulações avaliados no primeiro dia (dia zero) foram analisados nos demais períodos de tempo propostos no estudo, os quais foram denominados de frasco-controle. Cálculos para determinação da validade A determinação da validade foi realizada de acordo com as leis cinéticas de degradação (Carstensen & Rhodes, 2000). RESULTADOS Curva de calibração A curva de calibração obtida apresentou r2= 0,9998. A equação da reta utilizada para calcular o teor da especialidade farmacêutica e das formulações extemporâneas, foi Y = 1,0842x - 0,0037, onde y é a área obtida de cada leitura no cromatógrafo e x é a concentração de fármaco presente na amostra. Peso médio e teor de substância ativa nos comprimidos contendo espironolactona O peso médio com o desvio-padrão encontrados foram 362,12 + 9,92 mg e o teor de fármaco encontrado nos comprimidos utilizados para o estudo foi de 104,14% do teor declarado. Estudo de estabilidade físico-química e ensaios para avaliação da qualidade das formulações extemporâneas O pH de todas as formulações propostas foi medido no primeiro e no último dia de estudo. O pH manteve-se em 6,0 nas diferentes temperaturas avaliadas ao longo de 35 dias. 387 Formulações líquidas de espironolactona Dispersão aquosa: Inicialmente essa formulação apresentou-se com aspecto leitoso quando agitada, devido à presença dos excipientes. Entretanto, todo material suspenso, não solúvel, foi decantado em pouco tempo de repouso e o sobrenadante ficou praticamente transparente. A Figura 1 ilustra os cromatogramas da dispersão aquosa no primeiro e último dia do estudo, respectivamente. Dispersão aquosa de CMC 1,5%: Apresentou-se mais viscosa que a dispersão aquosa, de coloração leitosa, sem formação de sedimento por período de tempo suficiente para a retirada das alíquotas, com o material particulado bem distribuído. As Figuras 1(c) e 1(d) ilustram os cromatogramas da dispersão aquosa de CMC 1,5% no primeiro e último dia do estudo, respectivamente. Dispersão de xarope simples: A dispersão de xarope simples apresentou-se mais viscosa que a dispersão aquosa, de coloração amarela clara e com o material particulado bem distribuído, sem formação de sedimento por longo período de tempo. As Figuras 1(e) e 1(f) ilustram os cromatogramas da dispersão de xarope simples no primeiro e último dia do estudo, respectivamente. Figura 1. Cromatogramas das dispersões :(a, b) aquosa; (c, d) aquosa 1,5% CMC; (e, f) xarope simples; (a, c, e) dia 0, (b, d, f) 35º dia. 388 Rev Ciênc Farm Básica Apl., 2014;35(3):385-392 Formulações líquidas de espironolactona Tabela 1. Concentração e teor de substância ativa obtidos nas formulações extemporâneas em diferentes temperaturas. Formulação extemporânea Temperatura (°C) 8 27 40 Teor (%) Dispersão aquosa Dispersão aquosa de CMC Dispersão de xarope simples FT 0 dia --- 29,64 --- FT 35ºdia 9,91 18,52 44,66 FC 35°dia 73,88 6,89 11,85 FT 0 dia --- 100,21 --- FT 35ºdia 100,49 96,14 114,17 FC 35°dia 86,22 101,78 109,41 FT 0 dia --- 103,88 --- FT 35ºdia 102,93 96,41 102,93 FC 35°dia 94,43 97,58 96,11 Conc.: concentração; FT: frasco teste; FC: frasco controle; Tracejado (---): não mensurado Os resultados referentes à concentração e teor de fármaco presentes nas formulações extemporâneas estão ilustrados na Tabela 1. Ensaios para a avaliação do tempo de viabilidade das formulações A Figura 2 ilustra o teor de fármaco presente na dispersão de xarope simples no início e no final do estudo de estabilidade nas temperaturas de 8, 27 e 40 ºC. Figura 2. Teor de fármaco presente na dispersão de xarope simples no início e no final do estudo de estabilidade nas temperaturas de 8, 27 e 40 ºC. Cálculos para determinação da validade Os cálculos teóricos de degradação cinética realizados para os frascos-teste demonstraram que a dispersão de xarope simples, armazenado na temperatura de 8 ºC, permanece viável por pelo menos 12 meses, na temperatura de 27 ºC a validade é de 49 dias e na temperatura de 40 ºC a viabilidade é de 12 meses. Já os Rev Ciênc Farm Básica Apl., 2014;35(3):385-392 cálculos realizados para os frascos-controle indicaram que a dispersão de xarope simples armazenada em 8, 27 e 40 ºC permanecem viáveis por 39, 57 e 47 dias, respectivamente. DISCUSSÃO Curva de calibração O resultado encontrado denota linearidade entre as áreas dos picos cromatográficos obtidos entre as concentrações de espironolactona no intervalo de 8 a 32 µg/mL, o que demonstra que o método desenvolvido por Laxman (2010) é reprodutível e pode ser usado com segurança para a determinação de espironolactona em formulação farmacêutica. Peso médio e teor de substância ativa nos comprimidos contendo espironolactona A variação de peso dos comprimidos de espironolactona encontrou-se dentro dos limites especificados pela Farmacopéia Brasileira (Brasil, 2010), pois o coeficiente de variação encontrado foi menor que 5%. O peso médio foi realizado para verificar se os comprimidos encontravam-se dentro dos parâmetros farmacopeicos para serem empregados na preparação das formulações extemporâneas. O teor de fármaco encontrado está de acordo com o preconizado pela Farmacopeia Americana (USP, 2012), o que garante, em parte, uma quantidade adequada de princípio ativo nas formulações. Estudo de estabilidade físico-química e ensaios para avaliação da qualidade das formulações extemporâneas As formulações foram preparadas a partir de comprimidos triturados, pois esta forma farmacêutica normalmente faz parte do rol de padronização de medicamentos hospitalares, além de ser mais fácil a aquisição e o armazenamento do que a SQR. As preparações compostas apenas pelas SQR apresentaram teores semelhantes aos encontrados nas formulações preparadas com comprimidos triturados, demonstrando que os excipientes presentes nos comprimidos não interferiram na concentração final das formulações extemporâneas. Apenas três frascos contendo a SQR espironolactona foram preparados para cada formulação extemporânea, a fim de se obter um padrão comparativo para controle do teor. Com relação à dispersão aquosa, pôde se verificar que o teor de espironolactona teve variação superior a 10% (Tabela 1). Além do fármaco ser praticamente insolúvel em água, a falta de um agente dispersor dificultou a homogeneização do conteúdo dos frascos, pois foi perceptível a rápida decantação das partículas, impossibilitando a uniformidade da dispersão e resultando no baixo teor de fármaco encontrado. Por isso, acredita-se que esta preparação extemporânea possa levar a subdoses e, consequentemente, à falha no tratamento dos pacientes. Problemas semelhantes foram encontrados no trabalho de Albuquerque (2007) ao propor uma formulação extemporânea para pirazinamida, um fármaco pouco 389 Formulações líquidas de espironolactona solúvel em água, empregando dispersão aquosa sem agente dispersor de conteúdo, o qual resultou na impossibilidade do doseamento do fármaco. Diferentemente dos resultados aqui encontrados, Santos e colaboradores (2005), avaliaram a estabilidade física, química e o teor de ácido fólico presente na dispersão aquosa extemporânea, sem agente dispersor, onde concluíram que a formulação se manteve estável durante todo período de estudo (14 dias) e com teor adequado na temperatura de 2 a 8 °C, mesmo se tratando de um fármaco pouco solúvel em água. A dispersão aquosa de CMC 1,5% foi preparada na concentração de 1 mg/mL para facilitar a tomada de ensaio e homogeneização. Os resultados obtidos demonstraram que tal formulação é adequada quando armazenada na temperatura de 27 ºC, pois se manteve estável com variações de teor dentro dos limites aceitáveis. Já na temperatura de 40 ºC, após 35 dias notou-se acréscimo do teor, que pode ser devido ao aumento da solubilidade em função da temperatura, ou pela evaporação do veículo, tornando a formulação mais concentrada. Na temperatura de 8 ºC a dispersão aquosa de CMC 1,5% não se manteve viável, uma vez que apresentou teor abaixo do aceitável no último dia de estudo, conforme evidenciado na Tabela 1. Mendes et al. (2013) avaliaram a estabilidade de uma dispersão aquosa de CMC 0,18% contendo espironolactona para ser empregada em pacientes pediátricos hospitalizados, durante 7 dias nas temperatura de 5 ±¬ 3 0C e 25 ± 2 0C. Ao final do estudo, concluíram que a formulação permaneceu estável. Porém, é sabido que conservantes podem causar alergias, principalmente em crianças. Além disso, o uso da matéria-prima, ao invés de comprimidos triturados, pode constituir uma dificuldade, já que a maioria dos hospitais adquire a especialidade farmacêutica e não o fármaco (SQR) para o tratamento dos pacientes. Na formulação extemporânea composta por xarope simples, os teores obtidos não tiveram variação superior a 10%, pois, uma vez agitado, o pó se mantinha suspenso e permitia a retirada de alíquotas adequadas de forma homogênea para as análises. Este fato também foi observado por Albuquerque (2007) no doseamento da preparação extemporânea xarope simples contendo pirazinamida. Através dos resultados encontrados, pôdese perceber que a melhor temperatura de armazenamento para o xarope extemporâneo de espironolactona é a ambiente (27 ± 2 ºC), pois a variação do teor foi a menor quando comparada com os teores encontrados nas temperaturas de 8 e 40 °C (Tabela 1). Resultados semelhantes foram encontrados no estudo de Salgado et al. (2005), onde analisaram a estabilidade química, física e microbiológica de suspensões de xarope simples de espironolactona durante 60 dias nas temperaturas de 5 ºC e 22 ºC. Ao final do estudo, concluíram que as suspensões permaneceram estáveis. 390 Outros estudos analisaram a estabilidade de formulações extemporâneas compostas por xarope contendo clopidogrel (temperatura ambiente e refrigeração) e acupril (temperatura de 5 ºC), e constaram estabilidade maior do que 30 dias (Skillman et al., 2010; Freed et al., 2005). Os cromatogramas (Figura 1) mostraram que o fármaco não sofreu degradação química em nenhuma das formulações propostas até o último dia do estudo, uma vez que não se detectou o aparecimento de qualquer novo pico que pudesse ser atribuído a um eventual produto de degradação da espironolactona. Portanto, os problemas relacionados ao teor da dispersão aquosa e da dispersão aquosa de CMC 1,5%, ocorreram devido à falta de uniformidade do conteúdo ocasionada por uma instabilidade física das formulações. Dentre as três formulações preparadas, a dispersão de xarope simples foi a que demonstrou melhor comportamento em termos de estabilidade, manutenção do teor de fármaco e uniformidade de dose. A dispersão de xarope simples tem como vantagens ser uma formulação simples, de fácil preparação, sabor adocicado, com propriedades auto conservantes e, por isso, algumas vezes, é desnecessária a adição de substâncias que tenham essa função, evitando-se assim riscos de reações adversas, principalmente a pacientes pediátricos hipersensíveis ao metilparabeno e propilparabeno (Silva et al., 2008). Um estudo realizado por Tonazio et al. (2011) apontou que além dos conservantes acima citados, outros excipientes como benzoato de sódio, sulfitos, corante amarelo tartrazina e sorbitol podem provocar danos à saúde de pacientes pediátricos. A especialidade farmacêutica utilizada para o desenvolvimento das formulações extemporâneas não continha nenhum dos excipientes mencionados acima, o que assegura a utilização sem riscos em crianças. De acordo com os resultados encontrados, pode-se afirmar que a dispersão de xarope simples de espironolactona é a formulação extemporânea mais indicada, pois propicia aumento da adesão ao tratamento e garante sua eficácia. Ensaios para a avaliação do tempo de viabilidade e validade das formulações Todas as formulações foram submetidas ao estudo de viabilidade. Entretanto, não foi possível finalizar o teste para a dispersão aquosa e dispersão aquosa de CMC em virtude da falta de uniformidade e reprodutibilidade das doses. Por apresentar vantagens em relação às demais formulações propostas, a preparação extemporânea com xarope simples foi escolhida para a realização do teste de viabilidade e validade. Observou-se que até o 35º dia de estudo não houve perda significativa de fármaco, tanto nos frascos-teste, quanto nos frascos-controle, isto é, mais de 90% do fármaco permaneceu estável na formulação nas temperaturas de 8, 27 e 40 °C. Rev Ciênc Farm Básica Apl., 2014;35(3):385-392 Formulações líquidas de espironolactona Embora os cálculos teóricos realizados para a determinação da validade da dispersão de xarope simples tenham mostrado que tanto os frascos-teste quanto os frascos-controle são estáveis físico-quimicamente, a validade do frasco-teste nas temperaturas de 8 e 40 ºC foi maior que a validade do frasco-controle nestas mesmas temperaturas. Já na temperatura ambiente, os cálculos indicaram que ambos os frascos apresentaram período de validade semelhante, mas como o estudo experimental de viabilidade foi compreendido por 35 dias, é possível que a formulação seja válida apenas por este período. Os resultados encontrados demonstram que o frasco-controle de dispersão de xarope simples tem viabilidade e validade longas, isso é importante porque ela pode ser utilizada em pacientes que estejam em tratamento por período de tempo prolongado. Apesar do estudo experimental e teórico indicar que a dispersão de xarope simples de espironolactona pode ser armazenada e utilizada por pelo menos um mês, independente da temperatura, com garantia de estabilidade físico-química, testes de estabilidade microbiológica precisariam ser realizados para certificar a qualidade da formulação. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CNPq e a FUNDECT (Processo nº 23/200.215/2010) pelo auxílio financeiro que possibilitou a realização deste trabalho. 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