A EVOLUÇÃO HIST DOS BENEFÍCIOS E SE~1

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UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
MARCO ANTONIO KUHN
A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA APOSENTADORIA RURAL E A APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA UNIFORMIDADE E EQUIVALÊNCIA DOS BENEFÍCIOS E
SERVIÇOS ENTRE AS POPULAÇÕES URBANAS E RURAIS
Santa Rosa (RS)
2014
MARCO ANTÔNIO KUHN
A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA APOSENTADORIA RURAL E A APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA UNIFORMIDADE E EQUIVALÊNCIA DOS BENEFÍCIOS E
SERVIÇÕS ENTRE AS POPULAÇÕES URBANAS E RURAIS
Trabalho de Conclusão do Curso de
Graduação em Direito objetivando a
aprovação no componente curricular
Trabalho de Curso - TC.
UNIJUÍ - Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do
Sul.
DEJ- Departamento de Estudos Jurídicos.
Orientador: Esp. Mirko Roque Frantz
Santa Rosa (RS)
2014
Dedico este trabalho a meus familiares,
principalmente para minha esposa e
filhos, pela força e apoio, durante esta
caminhada.
AGRADECIMENTOS
A meus familiares, que me acompanharam nesta caminhada, sempre me
incentivando, me inspirando e depositando muita confiança. Toda esta caminhada
rumo à efetivação do presente trabalho, só foi possível graças ao efetivo apoio
familiar.
Ao meu orientador Mirko Roque Frantz, que com seu conhecimento e
disposição, possibilitou as condições necessárias para efetivação deste trabalho.
Meu agradecimento muito especial.
Aos meus amigos, que por muitas oportunidades estiveram privados da minha
companhia, mas que sempre se manifestaram de forma compreensiva, entendendo
minha dedicação aos estudos.
“A tradição não é dada por direito de herança,
e, se a quiser, é preciso muito trabalho para
obter.” Thomas Eliot.
RESUMO
O presente trabalho de conclusão de curso tem por objetivo fazer uma
análise, da evolução histórica da aposentadoria rural no Brasil. Efetuar um estudo e
identificar nas fontes históricas, a origem, a evolução e formação da classe
trabalhadora rural, bem como os direitos previdenciários adquiridos pelos
trabalhadores rurais ao longo da história do país. Aborda dispositivos de Leis e
iniciativas de caráter privados, que tiveram como objetivo proporcionar ao
trabalhador rural, segurança para o caso de alguma necessidade, no tratamento de
alguma doença, acidente ou velhice. Apresenta uma análise da evolução histórica
dos direitos previdenciários dos trabalhadores rurais, a partir da proclamação da
república, com a apresentação de sucessivas cartas constituições, tendo como
ponto culminante a promulgação da Constituição Federal de 1988, cuja redação,
apresentou especial destaque à seguridade social, representando a consolidação
das conquistas previdenciárias da classe trabalhadora rural.
Palavras-Chave: Aposentadoria rural. Período de carência. Segurado
especial. Aposentadoria por idade.
RESUMEN
El presente trabajo de conclucion del curso, tiene como objetivo hacer
unanalisis, de laevolucion historica de la jubilacion rurar del Brasil. Realizar un
estudio y identificar lasfuentes historcas, el origen, y la evolucion de la classe
trabajadoras rurales, asi como los derechos prevideciales adquiridos por los
trabajadores rurales a lo largo de la historia del pais. Aborda dispositivos de leyes y
iniciativas de caracter privados, que tienen como objetivos brindar al trabajador
rural,seguridad, parael caso de algunas nesecidades , en el tratamento de algunas
enfermedades, accidentes de transitos, y a personas de edades avanzadas. Desta
forma un analisis de la evolucion historica de los derechos previdenciales de los
trabajadores rurales, a partir de la proclamacion de la republica,com la demostracion
de susesivas cartas constitucionales, teniendo como punto final la promulgacion de
la constitucion Federal de 1988, la presente redacion, presenta especial destaque de
la seguridad social, representado por la consolidacion de las conquistas
previdenciarias de la clase trabajadora rural.
Palabras claves: jubilacion rural, periodo de carencia, seguridad especial,
jubilacion por edad.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................. ........ 8
1 HISTÓRIA GERAL DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO ........................................... 10
1.1 Noções históricas do direito previdenciário....................................................10
1.2 Direito previdenciário brasileiro – período pré-constituição 1988 ................ 17
1.2 Direito previdenciário – período Pós-Constituição 1988 ............................... 29
2 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA APOSENTADORIA RURAL NO BRASIL .......... 32
2.1 O trabalhador rural e sua evolução histórica ................................................. 32
2.2 Da qualidade de segurado especial ................................................................. 43
2.3 Da aposentadoria híbrida ................................................................................. 51
2.4 O princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais.................................................................................. 57
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 65
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 67
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho de conclusão de curso apresenta um estudo a respeito
da evolução histórica da aposentadoria rural no Brasil, com o objetivo de identificar
historicamente de onde se originaram e quais foram os primeiros trabalhadores
rurais no país. Esse estudo é necessário para melhor compreender as dificuldades
que a classe rural encontrou historicamente, para efetivar alguma conquista, no
sentido de proporcionar segurança, de caráter previdenciário aos trabalhadores
rurais. Através dessa análise, é possível verificar que a classe trabalhadora rural,
tem sua origem no trabalho escravo, fato que dificultou durante séculos, qualquer
possibilidade de consolidação de direitos previdenciários.
Para a efetiva realização e conclusão deste trabalho foram efetuadas
pesquisas bibliográficas, eletrônicas e consultas jurisprudenciais. As consultas
jurisprudenciais tiveram como finalidade, a confirmação do entendimento dos
tribunais, em julgados que tiveram como causa, controvérsias em relação a
dispositivos previdenciários envolvendo direitos de trabalhadores rurais.
Inicialmente, no primeiro capítulo, foi realizada uma pesquisa sobre a
evolução histórica do direito previdenciário em geral. Esta pesquisa se reportou aos
primórdios do império romano, passando pela idade média, até chegar aos dias de
hoje. Esse estudo teve por finalidade, proporcionar uma melhor compreensão da
evolução dos direitos previdenciários conquistados pelos trabalhadores ao longo da
história da humanidade, bem como os motivos que lavaram a classe dominadora a
conceder a seus trabalhadores condições de segurança previdenciária. Após, foi
efetuada uma abordagem das conquistas previdenciárias pelos trabalhadores
brasileiros, através de um estudo individualizado das sucessivas constituições pós-
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república. Este processo de evolução legislativa, atingiu seu ponto culminante com a
promulgação da Constituição Federal de 1988, cuja redação trouxe a seguridade
social como uma das prioridades da federação.
A partir do segundo capítulo, foi efetuada uma abordagem, com a finalidade
de identificar a origem do primeiro trabalhador rural no Brasil. Através desse estudo
conclui-se
que
os
primeiros
trabalhadores
rurais
brasileiros
originaram-se
primeiramente dos nativos indígenas e numa segunda etapa do negro africano, que
por mais de três séculos trabalhou nas lavouras brasileiras, sob o regime de
escravidão. Esta condição de escravo, gerou muitas dificuldades aos trabalhadores
rurais, no sentido de conquistar qualquer direito de liberdade, quanto mais de direito
previdenciário.
Após esta abordagem, o estudo passou a tratar das conquistas dos
trabalhadores rurais, a partir da proclamação da república até atingir o ano de 1988,
com a promulgação da nova Constituição Federal, que trouxe em sua redação um
capítulo inteiro tratando da seguridade social e, por conseqüência, a inclusão de
uma série de dispositivos constitucionais, que proporcionaram aos rurais, uma nova
condição perante a Previdência Social, passando a receber um tratamento
diferenciado, na qualidade de segurado especial. Também objetivamos estudar
através de instrumentos de pesquisa o Principio Previdenciário da Uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços entre as populações urbanas e rurais.
10
1 HISTÓRIA GERAL DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
1.1 Noções históricas do direito previdenciário
Para falar sobre a história do direito previdenciário, se faz necessário
remontar a alguns séculos e nos atermos aos costumes da antiguidade romana.
Mais propriamente dito, a partir de iniciativas, das famílias que, com o andar dos
tempos, sentiram a necessidade de contemplar os antigos servos, com algum
beneficio que lhes amparasse quando a velhice ou a doença lhes acometessem.
Para isso as famílias romanas contribuíam para uma espécie de associação,
que tinha como objetivo, angariar fundos, justamente para prevenir que, quando no
futuro, os servos que não lhe proporcionassem mais, nenhuma utilidade, por motivo
de doença ou velhice, tivessem um meio de sustento, evitando assim que se
tornassem, para os patrões, um fardo a ser carregado e, por eles sustentado.
É o que os romanos chamavam de pater famílias. Estas iniciativas muito
pouco tinham a ver com o conceito de previdência social que hoje temos, era
apenas uma iniciativa isolada de um grupo de famílias romanas, com a finalidade de
prevenir que no futuro viessem a se deparar com pessoas invalidas, velhas ou
doentes que em nada lhes pudessem contribuir, tornando-se um estorvo a ser
carregado e sustentado.
Outras iniciativas ocorreram ao longo da história, proporcionando às classes
mais necessitadas, direitos com a finalidade de amparo social. A igreja teve papel
fundamental, como gestora de idéias de cunho assistencialista, desenvolvendo
políticas de amparo aos mais necessitados, visando sempre à manutenção da
hegemonia do poder papal sobre os povos, que na época exercia grande influência
sobre os governos.
Assim, a partir de 1600, na Europa, mais propriamente na Inglaterra, com a
ingerência da igreja, foi editada a Poor Relief Act (lei de amparo aos pobres), uma
contribuição obrigatória para a paróquia que tinha como fins específicos,garantir aos
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indigentes um auxilio para sua subsistência. Era um imposto de caridade pago por
todos os ocupantes e proprietários de terras.
Também, em meados do século XVlll, por iniciativa da igreja, foram editados
vários pronunciamentos dos pontífices da época, com preocupação de motivar, junto
à população, a formação de políticas, no sentido de criar algum tipo de seguro, que
viesse a prevenir contingências futuras. Podemos citar para tanto a Encíclica Rerum
Novarum, do Papa Leão Xlll e a Quadragésimo Ano de Pio Xl, com conteúdo
predominantemente orientador, sem conteúdo normativo que determinasse a
obrigação de aplicação das idéias
Países como Alemanha, Itália e frança estiveram historicamente em posição
de vanguarda na aplicação de idéias inovadoras, cujos conteúdos instituíram e
criaram novos direitos, com cunho semelhante a benefícios previdenciários para as
populações.
O alemão Otto Von Bismarck, introduziu na Alemanha a partir de 1893,
através de mecanismos criados e custeados mediante contribuições de empregados,
empregadores e do Estado, uma série de seguros que visavam garantir aos
trabalhadores uma cobertura contra as mazelas que por ventura surgissem,
provenientes das atividades laborais que exercessem.
Estes mecanismos tinham o condão de atenuar a tensão existente no meio
das classes trabalhadoras da época que não contavam com nenhuma norma de lei
que lhes assegurassem algum tipo de direito em caso de ocorrer um acidente de
trabalho ou de alguma doença proveniente da atividade laboral, que viesse a
acometer o trabalhador.
Para isso, em 1883, os alemães instituíram o seguro-doença, que seria
custeado por trabalhadores, patrões e pelo Estado. Em 1884, foi criado o seguro
contra acidentes de trabalho, cujos recursos para manutenção, eram provenientes
de contribuições dos patrões. Em 1889, também por iniciativa de Bismarck, a
Alemanha criou o seguro de invalidez e velhice que provinha de contribuições de
parte de patrões, empregados e do Estado.
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As iniciativas de Otto Von Bismarck, foram um marco nas conquistas dos
trabalhadores alemães do século XlX, que até aí não contavam com nenhuma
espécie de proteção que lhes proporcionasse guarida no caso de ocorrer algum
acidente ou que lhe amparasse na velhice. Cabe registrar que estas normas visavam
atenuar a tensão existente na época, proveniente da crise por que passava a
indústria, bem como para obter o apoio da população. A crise fortalecia movimentos
socialistas, que encontravam, junto à população descontente, solo fértil para
propagar sua ideologia e conquistar espaço junto aos trabalhadores.
Nesse sentido escreve Sergio Pinto Martins em sua obra Direito da
Seguridade Social (Martins.2002.p.30).
Na Alemanha, Otto Von Bismarck introduziu uma série de
seguros sociais, de modo a atenuar a tensão existente
nas classes trabalhadoras: [...] (Martins.2002.p.30).
A partir de 1897, a Inglaterra também foi palco de inúmeras inovações e
conquistas, em matéria de direitos, que asseguravam aos trabalhadores guarida em
caso de necessidade.
Entre as medidas a serem citadas, encontra-se em destaque o Workmen’s
Compensation Act, instituído em 1897 para criar o seguro obrigatório contra
acidentes de trabalho, uma importante vitoria da classe trabalhadora que na época
suportava extensas jornadas de trabalho, sem no entanto gozar de nenhuma
garantia que lhe socorresse em caso de algum sinistro.
Assim o empregador respondia pelo acidente mesmo que não tenha
concorrido com culpa ou dolo para a ocorrência do fato, é o que foi conhecido como
o principio da responsabilidade objetiva. Ao empregador era atribuído o dever de
indenização ao empregado.
Mais tarde, também na Inglaterra, mais precisamente no ano de 1907, foi
criada mais uma ferramenta de proteção ao trabalhador, a partir da instituição do
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sistema de assistência a velhice e ao acidente do trabalho, uma inovação importante
para a época, pois além de contemplar o acidente de trabalho, atendia aos anseios
de uma população que após a velhice ficava a mercê, sem nenhuma assistência.
Uma nova norma, com novas conquistas foi criada a partir de 1908,
concedendo pensões a todos que atingissem idade superior a 70 anos,
independente de terem ou não contribuído para tanto, é o que os ingleses
chamavam de Old Age Pensions Act .
Mais mecanismos foram criados na Inglaterra, a partir do ano de 1911,
destacando-se o National Insurence Act, um sistema estabelecido com a finalidade
de arrecadar fundos a partir de contribuições compulsórias, num sistema conjunto de
arrecadação, que incluía trabalhadores, empregadores e Estado, com objetivos
assistenciais e securitários para os trabalhadores.
Nesse sentido cabe destaca Martins (2002.p.30)
[...] Em 1911, foi estabelecido o National Insurence Act,
determinando a aplicação de um sistema compulsório de
contribuições sociais, que ficavam a cargo do empregador, do
empregado e do estado.
A partir daí, surge uma nova fase, que traz como característica o
constitucionalismo social, período em que as constituições dos estados começam a
trazer em seu bojo normas que passaram a tratar de direitos trabalhistas, sociais e
econômicos, inclusive algumas, como a constituição do México de 1917, que já
trazia inclusa em seu conteúdo, de forma explicita, a determinação da existência do
seguro social, como uma de suas cláusulas. Esta seria a primeira constituição a
tratar de direito previdenciário no mundo.
O estado, a partir destas novas constituições, passou a ter novas atribuições,
pois elas apresentaram em seu bojo uma série de novas conquistas da classe
trabalhadora, como por exemplo, a constituição de Weimar, na Alemanha em 1919,
que trazia em seu conteúdo uma cláusula determinando ao Estado a obrigação de
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prover a subsistência do trabalhador alemão que não conseguia se manter por conta
própria.
Um dos marcos mais importantes nas conquistas de direitos previdenciários
para os trabalhadores, foi o ato da criação em 1921, da OIT – organização
internacional do trabalho que através de suas convenções, criou diversas
ferramentas com objetivo de estabelecer diretrizes para criação de direitos à classe
trabalhadora.
A convenção de número 12, datada do ano de 1921, que trata sobre
acidentes de trabalho na agricultura, tem importância significativa para o estudo a
que nos estamos propondo com este trabalho, ou seja, a evolução histórica da
aposentadoria rural. Essa convenção foi pioneira a tratar de direitos previdenciários
para trabalhadores da área rural na história, sendo um dos primeiros mecanismos a
se preocupar em fornecer algum tipo de seguro àqueles que laboravam como
empregados na agricultura. Mas, trataremos deste tema de maneira mais
aprofundada em outro capitulo, por tratar-se do objeto principal a ser estudado neste
trabalho, merecendo, portanto, um capítulo exclusivo, mais aprofundado e melhor
elaborado sobre a matéria.
A OIT, através de suas convenções, tratou de forma efetiva, das inovações
sobre a matéria de direito previdenciário, contribuindo de forma efetiva na
elaboração destes dispositivos que criaram direitos para os trabalhadores, como por
exemplo, a convenção nº 17 de 1927, que tratou sobre indenização por acidente de
trabalho, entre outras.
De acordo com Martins (2002,p.31)
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi criada em
1919. Tal órgão passou a evidenciar a necessidade de um
programa sobre previdência social, aprovando-o em 1921.
Várias convenções vieram a tratar da matéria, como a de nº 12,
sobre acidentes do trabalho na agricultura, de 1921; a
15
convenção nº 17 (1927), sobre “indenização por acidente do
trabalho”, e outras.
Portanto resta incontroversa a importância fundamental da OIT – Organização
Internacional do Trabalho, que através de suas convenções, prestou contribuição no
sentido de se criar programas sobre previdência social.
Nas décadas seguintes novos direitos previdenciários foram conquistados
pelos trabalhadores, através de iniciativas de governos de todos os continentes,que,
motivados por crises econômicas, viam-se diante da necessidade de criar
mecanismos para amparar aqueles que perdiam o emprego, ou adoeciam devido às
condições de trabalho ou envelheciam.
A maior prova disso, foram às iniciativas dos Estados Unidos da América do
Norte, que, após a crise de 1929, adotaram medidas interventivas com participação
intensiva do estado em todos os setores da sociedade, com preocupação em investir
nas áreas de saúde, assistência social e previdência social, para seis anos mais
tarde, em 1935, criar a previdência social nos Estados Unidos.
De acordo com Kertzman (2013,p.48)
Após a crise de 1929, os Estados Unidos adotaram o New
Deal, inspirado pelo Welfare State (Estado do bem-estar
social). Esta política determinava uma maior intervenção do
estado na economia, inclusive com a responsabilidade de
organizar os setores sociais com investimentos na saúde
pública, na assistência social e na previdência social. Em 1935
este apis editou o Social Security Act, criando a previdência
social como forma de proteção social.
Foi de suma importância a intervenção do presidente Norte Americano
Franklin Roosevelt, que pressionado pela crise econômica que atingia a America na
década de 20, teve de adotar estas medidas, proporcionando às classes menos
favorecidas, um amparo, no momento em que alguma situação inusitada surgisse,
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lhes proporcionando prejuízos. exemplo disso, o alto índice de desemprego gerado
pela crise.
Voltando novamente a falar das conquistas européias, no que tange a direito
previdenciário, vamos nos ater mais uma vez à Inglaterra, mais precisamente no ano
de 1942, quando surgiu um plano marcante na historia da previdência social
mundial, chamado Plano Beveridge, assim denominado por ter seu idealizador o
nome de Wiliam Beveridge.
Este plano visava atingir a todas as áreas da seguridade social: saúde,
previdência social e assistência social, adotando uma concepção moderna, com um
plano de arrecadação compulsória que atingia a todos os trabalhadores
indistintamente, possibilitando assim a estruturação da seguridade social na
Inglaterra, e servindo de modelo para outras nações.
O entendimento Kertzman (2013,p.48):
Ponto chave do estudo da evolução histórica mundial é o
chamado Plano Beveridge, construído na Inglaterra, em 1942
por William Beveridge. Este plano é o que marca a estrutura da
seguridade social moderna, com a participação universal de
todas as categorias de trabalhadores e cobrança compulsória
de contribuições para financiar as três áreas da seguridade:
saúde, previdência social e assistência social.
O Plano Beveridge tinha em sua essência a necessidade de estender a todas
as classes de trabalhadores os diretos à seguridade social, com caráter público
diferente de outros planos que o antecederam, sem o interesse público alcançando
apenas algumas classes de trabalhadores, que organizados, conseguiam obter
algum beneficio social.
Este modelo de concepção de seguridade social, como exemplo, o New Deal,
nos Estados Unidos em 1929, que procurava adaptar o modelo capitalista a um
estado de bem estar social (Welfare State), foi adotado pela maioria dos países no
17
mundo todo, até bem recente, na década de 1970. A crise econômica mundial, a
queda das ditaduras militares, o fim da guerra fria, a extinção da União Soviética, a
abertura democrática que a partir da década de 80 se espalhou pelo mundo, fez
surgir uma nova idéia de direitos fundamentais.
Surge então um novo entendimento de seguridade social, contributiva para a
previdência social, mas direito fundamental não contributivo para assistência social e
saúde pública. Este modelo foi adotado pelo Brasil a partir da constituição de 1988,
que deu status constitucional a seguridade social, dividindo-a em saúde, assistência
social e previdência social.
1.2 Direito previdenciário brasileiro – período pré-constituição 1988.
Para estudarmos o direito previdenciário brasileiro, no período préconstituição de 1988, devemos nos ater às constituições de cada época, pois cada
uma delas apresentou alguma evolução na história da previdência social do Brasil.
A primeira constituição brasileira, do período imperial, outorgada por Dom
Pedro I em 1824, praticamente não continha em sua redação, nenhum conteúdo que
versasse sobre direito previdenciário, com exceção do art. 179, que dispôs sobre os
socorros públicos.
Neste sentido é o entendimento de Martins (2002,p.31)
Na Constituição de 1824, a única disposição pertinente à
seguridade social é a do art. 179, em que se preconizava a
constituição dos socorros públicos (XXXI). O Ato Adicional de
1834 em seu art.10, estipulava a competência das assembléias
legislativas para legislar sobre as casas de socorros públicos,
conventos etc., que foram instituídos pela lei nº 16,de 12 de
agosto de 1934.
18
Sob a égide da constituição de 1824, que vigeu por todo o período do regime
imperial foram instituídos alguns novos dispositivos que traziam em seu bojo
algumas disposições com cunho de direito previdenciário.
Estas inovações que de fato eram bem pontuais, muito pouco continham dos
institutos
jurídicos
hoje
existentes
na
legislação
previdenciária.
Foram
amadurecendo-se com o passar do tempo. Percebe-se que ao longo deste período
as classes que mais conquistaram direitos e instituíram mecanismos de proteção e
seguro foram àqueles trabalhadores cuja função estava ligada de uma forma ou
outra a alguma atividade de prestação de serviços ao estado.
Pode-se observar que um dos marcos principais do direito previdenciário,
sob a égide da constituição de 1824, período pós-colônia, portanto sistema imperial
de governo, deu-se com a criação em 22 de junho de 1935, do Montepio Geral dos
Servidores do Estado (Mongeral), entidade privada da qual varias pessoas se
associavam para, através de contribuições, criar um sistema de cotas com a
finalidade de cobertura de riscos .
Martins (2002,p.31) assim se refere quando explica este sistema criado em
tempos tão remotos, ainda sob a vigência da constituição de 1824, do regime
imperial brasileiro.
O Montepio Geral dos Servidores do Estado (Mongeral)
apareceu em 22 de junho de 1835, sendo a primeira entidade
privada a funcionar no país. Tal instrumento legal é anterior a
lei austríaca, de 1845, e à lei alemã, de 1883. Previa um
sistema típico de mutualismo (sistema por meio do qual várias
pessoas se associavam e vão se cotizando para a cobertura de
certos riscos, mediante a repartição dos encargos com todo o
grupo).Contém a maior parte dos institutos jurídicos securitários
existentes nas modernas legislações e foi concebido muito
tempo antes da Lei Eloy Chaves.
Contudo ainda era precário o sistema à que, o trabalhador brasileiro se
submetia nas suas relações trabalhistas. Muito pouco de segurança existia na
época, pois as jornadas de trabalho eram extensas e a grande maioria dos
trabalhadores braçais eram escravos, sem nenhum direito trabalhista, quanto menos
19
previdenciário, considerados juridicamente uma mercadoria que poderia ser
negociada a qualquer momento.
Os poucos institutos jurídicos que tratavam de direito previdenciário,
excluíam os escravos de qualquer possibilidade de beneficio ou seguro na velhice
ou doença. Era atribuição do senhor, que detinha sua propriedade, prover seu
sustento na velhice.
Vários decretos e códigos foram criados no período com a finalidade de
gerar algum tipo de benefício securitário aos trabalhadores, mas sempre
especificamente, voltado a algumas classes especiais como veremos nas palavras
de Martins (2002,p.32):
O Decreto nº 3.397, de 24-11-1888, criou a Caixa de Socorro
para o pessoal das estradas de ferro do Estado. O decreto nº
9.212, de 26-3-1889, estatuiu o montepio obrigatório para os
empregados dos Correios. O decreto nº10.269, de 20-7-1889,
estabeleceu um fundo especial de pensões para os
trabalhadores das Oficinas da Imprensa Régia.
Percebe-se que durante a vigência da constituição de 1824, muito pouco se
evoluiu na questão relativa aos direitos previdenciários no Brasil. As principais
disposições pertinentes ao caso foram relatadas acima. Talvez uma das principais
causas da falta de prioridade no período monárquico, para criação de leis
previdenciárias, representando alguma condição que garantisse aos trabalhadores,
no futuro uma vida mais digna, está relacionada à própria condição do pais na
época, pouco industrializado e sob o regime escravagista.
Assim chegamos à constituição de 1891, agora o país já se encontra
governado sob um novo regime de político, o republicano.Uma nova realidade surgia
no Brasil, à escravidão já não mais existia e com isso, os trabalhadores deveriam ser
remunerados para efetuar suas atividades laborais.
A constituição de 1891, escrita por Rui Barbosa, teve como modelo a
constituição dos Estados Unidos e pela primeira vez apresentou em suas normas a
palavra aposentadoria e fixava uma pensão vitalícia ao deposto imperador Dom
Pedro.
20
Para melhor compreender o momento em que o país vivia na época da
constituição de 1891, transcreveremos a baixo as palavras de Martins (2002,p.32):
A constituição de 1891 foi a primeira a conter a expressão
“aposentadoria”. Determinou que a “aposentadoria só poderá
ser dada aos funcionários públicos em caso de invalidez no
serviço da Nação” (art.75). na verdade o beneficio era
realmente dado, pois não havia nenhuma fonte de contribuição
para o financiamento de tal valor.
Nas Disposições Transitórias estipulava-se ao Imperador Dom
Pedro uma pensão, a contar de 15 de novembro de 1889,
durante toda sua vida, que seria fixada pelo congresso
ordinário (art.7º).
Foi apenas em 24 de janeiro de 1923, que através do decreto nº 4.682, com
a criação da lei Eloy Chaves, que de fato surgiu à primeira norma de direito
previdenciário no Brasil. Esta lei é considerada, o marco inicial da legislação
previdenciária no Brasil, apesar de contemplar somente algumas classes de
trabalhadores, pois criava a caixa de aposentadorias e pensões para os funcionários
ferroviários da Companhia Nacional. Por ser uma das poucas classes de
trabalhadores
organizadas,
e
que
naquele
momento
demonstrava
grande
inconformismo. Esta medida teve o condão de apaziguar os ânimos dos
trabalhadores.
A criação das caixas de aposentadorias e pensões dos funcionários das
empresas ferroviárias, criadas a partir da lei Eloy Chaves serviram de modelo para
expandir a outras classes de trabalhadores este sistema organizado de prover um
seguro ou aposentadoria, quando acometidos por doença, acidente de trabalho ou
velhice.
Martins (2002.p.33), descreve com propriedade como os fatos acima
relatados aconteceram nos remotos anos de 1923 a 1931 estendendo a outras
classes de trabalhadores o sistema das caixas de aposentadoria e pensões:
A lei Eloy Chaves (Decreto nº 4.682, de 24-1-1923) foi à
primeira norma a instituir no Brasil a previdência social, com a
criação de Caixas de Aposentadorias e Pensões para os
21
ferroviários , de nível nacional. Tal fato ocorreu em razão das
manifestações gerais dos trabalhadores da época e da
necessidade de apaziguar um setor estratégico e importante da
mão-de-obra daquele tempo. Previa os benefícios de
aposentadoria por invalidez, ordinária (equivalente à
aposentadoria por tempo de serviço), pensão por morte e
assistência médica.
O Decreto nº 20.465, de 1-10-1931, reformulou a legislação
das caixas. Estas, na época, já eram extensivas a outros
serviços públicos, como aos telégrafos, água, portos, luz etc.
Em 1930, surge uma nova forma de organização do sistema previdenciário,
a partir da criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões, organizados na
época da revolução de 30 copiado dos moldes do sistema Italiano. Previa uma
tríplice forma de contribuição: do empregado, do empregador e do governo. Da
mesma forma se procedia com relação à administração do instituto, que continha em
sua gerência um representante de cada classe.
O que diferenciava os Institutos de Aposentadorias e Pensões das Caixas
era o fato de as caixas serem organizadas por empresa, enquanto que os institutos
por conseguinte, se organizavam por classe de trabalhadores, atingindo um número
maior de beneficiários. Outra diferença estava no fato de os Institutos prestarem
serviços de saúde, internação hospitalar e atendimento ambulatorial.
Assim vai o entendimento Martins (2002,p.33)
Os Institutos e Pensões surgiram nos moldes italianos. Cada
categoria profissional passava a ter um fundo próprio. Havia
tríplice contribuição: do empregado, do empregador, do
governo. A gerência do fundo era exercida por um
representante dos empregados, um representante dos
empregadores e um do governo. Além dos benefícios de
aposentadorias e pensões, o instituto prestava serviços de
saúde, internação hospitalar e atendimento ambulatorial.
Assim, sob a égide da constituição de 1891, os Institutos de Pensão foram
se reorganizando e novos foram criados, abrangendo cada vez mais pessoas, das
mais diversas classes de trabalhadores.
22
A constituição de 1934, promulgada naquele ano, continha em seu bojo,
princípios democráticos, que geraram uma série de dispositivos, possibilitando a
inserção de várias classes, no jogo do poder. Até aquele momento somente era
admitida a influência de uma oligarquia rural, que comandava o país. Com isso,
militares, classe média urbana e industriais passaram a ter ingerência nas decisões
governamentais.
Esta talvez tenha sido a maior contribuição que a constituição de 1934
proporcionou ao país. Vários artigos estabeleciam princípios previdenciários,
estabelecendo direitos aos trabalhadores e por outro lado estabelecendo a forma
como seria arrecadado o valor necessário para o custeio destes direitos
previdenciários.conquistados.
A constituição fixava competências para legislar sobre as mais diversas
áreas, inclusive sobre aposentadorias, mencionando pela primeira vez a palavra
previdência.
Vejamos o que escreve Martins (2002,p.34):
A constituição mantinha a competência do poder legislativo
para instituir normas sobre aposentadorias (art. 39, inciso VIII,
item d);fixava a proteção social ao trabalhador (art.121). A
alínea h do § 1º, do art..121, tratava da “assistência medica e
sanitária ao trabalhador e à gestante, assegurando a esta
descanso, antes e depois do parto, sem prejuízo do salário e
do emprego, e instituição de previdência, mediante contribuição
igual da União, do empregador e do empregado, a favor da
velhice, da invalidez, da maternidade, e nos casos de acidentes
do trabalho ou de morte”.
Outro ponto, inovador e de fundamental importância, que a constituição
federal de 1934, trazia em sua redação, eram as normas que estabeleciam as
diretrizes de arrecadação das contribuições, estabelecendo para tanto um sistema
tríplice de custeio baseado nos seguintes parâmetros: a arrecadação viria do ente
publico, do empregado e do empregador, sendo obrigatória a contribuição, tudo nos
termos do art.121, § 1º, h da constituição federal de 1934.
23
Em 31 de dezembro de 1936, a lei nº 367, criou o Instituto de
Aposentadorias e Pensões dos Industriários – IAPI, que transformou os empregados
da indústria em segurados obrigatórios deste instituto.
Chegamos à constituição de 1937, outorgada por Getulio Vargas em 10 de
novembro, cujo conteúdo pouco trouxe de evolução em termos previdenciários. A
carta de 1937, dava mais ênfase ao termo seguro social, do que ao termo
previdência social.
Dois eventos devem ser citados como mais importantes e inovadores em
direito previdenciário no período da vigência da constituição federal de 1937: a
criação, pelo decreto 775, de 07 de outubro de 1938, do Instituto de Aposentadorias
e Pensões dos Empregados em Transportes de Cargas – IAPETEC, que envolvia
toda cadeia de trabalhadores do ramo de transporte e cargas.
Outro evento importante foi o decreto nº 7.526 de sete de maio de 1945,
determinando a unificação da previdência social, criando para tanto Instituto de
Serviços Sociais do Brasil – ISSB.
Martins (2002,p.34), comentando sobre inovações previdenciárias na
vigência da constituição federal de 1937, da importante destaque ao decreto 7526
de sete de maio de 1937, conforme transcrição abaixo.
O decreto nº 7528 de 7/5/1945, determinou a criação de
um só tipo de instituição de previdência social, o Instituto
de Serviços Sociais do Brasil (ISSB). O sistema cobriria
todos os empregados ativos a partir de 14 anos, tendo um
único plano de contribuições e benefícios. Houve a
consolidação de todos os recursos existente em um único
fundo. O ISSB na prática não foi implantado.
Nova constituição foi promulgada em 1946, portanto uma constituição
democrática, elaborada por um poder constituinte, diferente da anterior datada de
1937, que foi outorgada por um governo ditatorial.
24
Esta constituição, trazia como destaque, o fato de trazer em sua redação,
pela primeira vez, a expressão previdência social, substituindo a anterior que falava
em seguro social.
A constituição de 1946 teve, durante sua vigência, um grande número de
decretos e leis, que estabeleciam normas sobre direito previdenciário, criando
mecanismos, que geravam novos institutos previdenciários, os unificavam e até
mesmo estabeleciam a forma de arrecadação das contribuições previdenciárias
através de uma fórmula tríplice instituída a partir da contribuição do governo,
empregados e empregadores, formando para tanto um fundo.
O Regulamento Geral da Previdência dos Institutos de aposentadorias e
pensões, foi o mecanismo que unificou todas a políticas de previdência social a partir
de 1940, e o decreto nº 35.448 de primeiro de maio de 1954, foi no mesmo sentido
uniformizando os princípios gerais aplicáveis aos institutos de aposentadorias e
pensões.
Em vinte e seis de agosto de mil novecentos e sessenta, foi criada a LOPS –
Lei Orgânica da Previdência Social, padronizando o sistema assistencial, surgindo
vários novos benefícios previdenciários como auxílio-natalidade, auxilio funeral e
auxílio-reclusão.
Martins (2002,p.35) escreve sobre a criação da LOPS, conforme abaixo
transcreveremos.
A Lei nº 3.807, de 26-8-1960, Lei Orgânica da Previdência
Social (LOPS), padronizou o sistema assistencial. Ampliou os
benefícios, tendo surgido vários auxílios como: auxílionatalidade, auxilio funeral e auxílio reclusão, e ainda estendeu
a área de assistência social a outra categorias profissionais.
Não era a LOPS uma CLT. Era uma lei nova, que trazia novos
benefícios e disciplinava ao normas de previdência social, em
um conjunto. A CLT é a reunião de leis esparsas por meio de
um decreto-lei. Não trazia nada de novo, mas apenas
compendiava as normas já existentes.
25
Várias leis, decretos e emendas constitucionais de cunho previdenciário
foram editadas a partir do ano de 1960, podendo-se destacar entre elas a Lei 3.841
de quinze de dezembro de 1960, que dispôs sobre a contagem recíproca, para efeito
de aposentadoria, do tempo de serviço prestado por funcionários à União, às
autarquia e às sociedades de economia mista.
Uma norma criada a partir da Emenda Constitucional nº 11 de 31 de março
de 1965, gerou e definiu em sua redação o que até hoje está consagrado como um
dos princípios constitucionais do Direito Previdenciário, ou seja, o da fonte de
custeio. Diz a emenda constitucional, que para cada beneficio novo gerado pela
Previdência Social, deverá constar a fonte geradora do custeio total.
Talvez a norma de maior importância para a evolução do tema proposto para
este trabalho, ou seja, a aposentadoria rural, ocorreu em 02 de março de 1963, com
a criação, através da Lei nº 4.214, do Fundo de Assistência ao trabalhador Rural –
FUNRURAL. A Lei 4.214, Estatuto do Trabalhador Rural, trata do FUNRURAL, no
titulo IX, capítulos I e II, arts. 158 e 159.
Iremos nos ater com maior profundidade ao tema do FUNRURAL, no
próximo capitulo deste trabalho, quando abordaremos a evolução histórica da
aposentadoria rural no Brasil, tema central e objeto deste estudo.
Em 21 de novembro de 1966, através do decreto-lei nº 72, todos os institutos
de aposentadorias e pensões foram unificados para centralizar toda organização
previdenciária no Instituto Nacional de Previdência Social – INPS.
A constituição de 1967 teve sua vigência iniciada sob a égide do regime da
ditadura militar. Vários decretos criando normas sobre direito previdenciário, foram
editados no período em que esteve vigente esta constituição.
Martins (2002,p.35), escreve referindo-se à constituição de 1967.
A constituição de 1967, de 24-1-1967, que entrou em vigor em 15-31967 (art. 189), não inovou em matéria previdenciária em relação à
26
constituição de 1946. O art. 158 repete praticamente as mesmas
disposições do art. 157da Lei Magna de 1946. O inciso XI do art. 158
previa descanso remunerado a gestante, antes e depois do parto,
sem prejuízo do emprego e do salário. O inciso XVI do art.158
determinava o direito à previdência social, mediante contribuição da
União, do empregador, e do empregado, para o seguro-desemprego,
proteção da maternidade e nos casos de doença, velhice, invalidez e
morte. Dispunha o inciso XVII do art.158 sobre seguro obrigatório
pelo empregador contra acidentes do trabalho. O beneficio do
seguro-desemprego (art. 158, XVI), que posteriormente foi
regulamentado pela Lei nº 4.923 de 1965, com o nome de auxíliodesemprego. Assegura-se aposentadoria à mulher aos 30 anos de
trabalho, com salário integral (inciso XX do art. 158)
Havia o decreto-lei nº 564 de 01 de maio de 1969, e o decreto-lei nº 704 de
24 de julho de 1969, que tratavam dos direitos previdenciários dos empregados do
setor agrário da indústria canavieira e ampliava o Plano Básico de Previdência
Social Rural estendendo-o aos empregados das empresas produtoras e dos
fornecedores de produto agrário in natura.
O decreto-lei nº 959 ordenava as empresas que recolhessem a contribuição
previdenciária sobre os trabalhadores autônomos que lhes prestasse serviço.
Em 17 de outubro de 1969 foi aprovada a Emenda Constitucionalnº1,
entrando em vigor a partir de 30 de outubro de 1969. Em termos de legislação
previdenciária a Emenda Constitucional nº1 não apresentou grandes inovações se
comparada com a constituição de 1946 e a constituição de 1967.
A matéria concernente à direito do trabalho era tratado junto com a matéria
sobre direito previdenciário, o mesmo que ocorria na constituição de 1967.
O art.165 da Emenda constitucional nº 1, continha vários incisos que
tratavam sobre legislação previdenciária. Alguns, como o inciso II, tratavam sobre o
salário-família para os dependentes. O inciso XVI, ia mais além, aprofundando-se no
tema da previdência social, tratando dos casos relativos a doença, velhice, invalidez
e morte, seguro-desemprego, seguro contra acidentes do trabalho e proteção da
maternidade, incluindo na redação do inciso a fonte de recurso para custear estes
benefícios, com contribuição da União, do empregador e do trabalhador.
27
Vários outros incisos continham normas de direito previdenciário e geravam
para os segurados da previdência social, novos direitos, mas, sempre com o cuidado
de não ferir o princípio existente no parágrafo único do art. 165, ordenando que
nenhuma prestação de serviço de assistência ou de beneficio compreendidos na
previdência social seria criada, majorada ou estendida sem a correspondente fonte
de custeio total.
Em 25 de maio de 1971, através da Lei Complementar nº 11, deu-se inicio a
concessão, nos moldes atuais, de benefícios previdenciários aos trabalhadores
rurais que a partir da criação do PRO-RURAL – Programa de Assistência ao
Trabalhador Rural que substituiu o Plano Básico de Previdência Social Rural.
O trabalhador rural não está obrigado a contribuir sobre nenhum salário de
referência para ter o direito ao beneficio de meio salário mínimo nacional instituído
pelo PRO-RURAL, mas obriga-se a contribuir ao FUNRURAL, com um percentual
fixo sobre toda sua produção que comercializar. O comprador dos produtos rurais
deve se responsabilizar em descontar na nota-fiscal o valor referente ao
FUNRURAL, e posteriormente recolher aos cofres da Previdência Social.
Este foi um grande marco na história da aposentadoria dos trabalhadores
rurais, que será o objeto principal do nosso estudo que abordaremos em capitulo
especifico.
Em 1º de julho de 1977, foi instituído o SINPAS – Sistema Nacional de
Previdência e Assistência Social que mantinha várias divisões, como explica Martins
(2002,p.36):
A Lei nº6.439 de 1º-7-1977, instituiu o SINPAS (Sistema Nacional de
Previdência e Assistência Social), tendo como objetivo a
reorganização da Previdência Social. O SINPAS destinava-se a
integrar as atividades da previdência social, da assistência médica,
da Assistência Social e de gestão administrativa, financeira e
patrimonial, entre as entidades vinculadas ao ministério da
previdência e assistência social. Tinha o SINPAS várias divisões:
28
a) O Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que cuidava de
conceder e manter os benefícios e demais prestações
previdenciárias;
b) O Instituto Nacional de Assistência Medica da Previdência Social
(INAMPS), que prestava assistência médica;
c) A Fundação Legião Brasileira de Assistência (LBA). Que tinha a
incumbência de prestar assistência social à população carente;
d) A Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM), que
promovia a execução da política do bem-estar do menor;
e) A Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social
(DATAPREV), que cuida do processamento de dados da Previdência
Social:
f) O Instituto de Administração Financeira da Previdência Social
(IAPAS), que tinha competência para promover a arrecadação, a
fiscalização e a cobrança das contribuições e de outros recursos
pertinentes à previdência e assistência social;
g) A Central de Medicamentos (CEME), distribuidora de
medicamentos, gratuitamente ou a baixo custo.
A instituição do seguro desemprego, através do decreto-lei nº 2.283 de 27
de fevereiro de 1986, foi um dos fatos marcantes, sobre direito previdenciário,
anterior a promulgação da constituição federal de 1988.
1.3 -Direito Previdenciário – Período Pós-Constituição 1988
Com a constituição de 1988, promulgada em 05 de outubro de 1988, através
de um poder constituinte eleito pelo povo, legitimado com a finalidade, entre outras,
de criar a nova carta magna.
Esta constituição tem um capitulo que trata exclusivamente do tema
seguridade social, e está subdividido em partes: a Previdência social, a Assistência
Social e a saúde que passaram a pertencer à seguridade social, ocupando para
tento o art. 194 ao art. 204 da constituição de 1988.
A constituição de 1988, deixou além das normas constantes em sua
redação, um Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que dispôs sobre
temas que, posteriormente, através de plebiscito, emenda constitucional, lei ordinária
ou lei complementar, deveriam ser levados a debate e após aprovados pelo povo ou
pelo congresso nacional, transformados em lei.
29
Entre estas orientações do ADCT, podemos citar o art. 59, responsável pela
ordenação da criação das leis 8212 e 8213 de 24 de julho de 1991, que tratam do
custeio do sistema da seguridade social e versa sobre os benefícios previdenciários
sucessivamente.
Art. 59 do ADCT. Os projetos de lei relativos à organização da
seguridade social e aos planos de custeio e benefício serão
apresentados no prazo máximo de seis meses da promulgação
da Constituição ao Congresso Nacional, que terá seis meses
para apreciá-los.
Parágrafo único. Aprovados pelo Congresso Nacional, os
planos serão implantados progressivamente nos dezoito meses
Em 27 de junho de 1990, através da lei nº 8029 e do decreto nº 99350 de 27
de junho de 1990, foi criado o INSS –Instituto Nacional de Seguro Social, autarquia
federal que hoje está ligada ao Ministério da Previdência e Assistência Social,
mediante a fusão do IAPAS com o INPS.
Varias leis versando sobre direito previdenciário foram criadas a partir da
vigência da constituição federal de 1988, entre elas podemos citar a lei 8540, de 22
de dezembro de 1992, que dispôs sobre a contribuição do empregador rural para a
seguridade social, a lei nº8689, de 27 de julho de 1993, que extinguiu o INAMPS, a
lei nº 8870, de 15 de abril de 1994, que alterou dispositivos das leis nº 8212 e 8213,
extinguindo o abono de permanência em serviço e excluindo o 13º salário para o
calculo do salário-benefício e a extinção da LBA.
A Central de Medicamentos – CEME, é extinta e desativada pela medida
provisória nº 1576 e pelo Decreto nº 2.283, de 24 de julho de 1997.
As leis 8.212 e 8213, que tratam do plano de custeio do sistema da
seguridade social e versa sobre os benefícios previdenciários, foram alteradas, pela
Lei 9548, de 10 de dezembro de 1997, alterando contribuições e teve como
modificação, a extinção das aposentadorias especiais dos aeronautas, telefonista,
jogador de futebol, jornalista e juiz classista da justiça do trabalho.
30
Sobre a organização do Ministério da Previdência e Assistência Social e sua
esquematização transcrevemos a seguir, Martins (2002,p.37).
Atualmente, o Ministério da Previdência e Assistência Social é
assim dividido: (a) Conselho Nacional de Previdência Social;
(b) Conselho Nacional de Assistência Social; (c) Conselho de
Recursos da Previdência Social; (d) Conselho de Gestão da
Previdência Complementar; (e) Secretaria de Previdência
social; (f) Secretaria de Estado de Assistência Social; (g)
Inspetoria-Geral da Previdência social (lei nº 9.649, de 27-0598).
Na data de 26 de novembro de 1999, foi aprovada uma lei que alterou as leis
8212/91 e 8213/91, complementando a reforma da Previdência Social, e cria um dos
mecanismos de cálculo para aposentadoria, mais polêmicos da história do direito
previdenciário, o fator previdenciário. É uma espécie de equação, cujo cálculo leva
em conta o tempo de contribuição, a média do valor das ultimas 80% (oitenta)
maiores contribuições desde julho do ano de 1994, e a expectativa de vida do
contribuinte.
Este sistema de cálculo para aposentadoria gera muita polêmica, pois reduz
o valor da aposentadoria das pessoas que, apesar de atingirem tempo de
contribuição necessária para aposentadoria e uma boa média de contribuição,
tiverem uma expectativa de sobrevida acentuada, ou seja, pessoas mais jovens que
passaram a contribuir prematuramente para a Previdência Social, terão seu
benefício de aposentadoria reduzido, em face do fator previdenciário.
Com a aprovação da constituição de 1988, os agricultores conquistaram o
direito a receber mensalmente como valor do beneficio de aposentadoria, um salário
mínimo nacional. Mas, este direito previsto na constituição, não foi implementado de
forma imediata. Foram necessárias varias manifestações de lideranças sindicais,
que se mobilizaram, pressionando o congresso nacional para que, a partir de 1992
os agricultores aposentados adquirissem o direito de perceber uma aposentadoria
no valor integral de um salário mínimo.
31
As leis 8.212/91 e 8.213/91, respectivamente criaram, através de sua
redação, uma série de direitos para os agricultores e seus dependentes. Citamos
como exemplo, o regime especial de aposentadoria por idade, aos que exercem
atividade rural em regime de economia familiar.
A evolução histórica da aposentadoria rural no Brasil, a aplicação do
princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas
e
rurais
e
a
condição
de
segurado
especial,
tratamento
disponibilizado,constitucionalmente ao trabalhador rural, entre outros segurados,
serão os objetos principais de nosso estudo a partir do próximo capítulo.
2. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA APOSENTADORIA RURAL NO BRASIL
2.1 O TRABALHADOR RURAL E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA
No capitulo anterior, apresentamos um traçado histórico do árduo caminho
percorrido pela classe trabalhadora para enfim, atingir seus objetivos, ou seja,
conquistar os direitos previdenciários que hoje podem ser usufruídos por todos os
cidadãos Brasileiros.
Apesar de ser uma das classes de trabalhadores brasileiros, que mais
contribuíram para forjar a riqueza e desbravar o território nacional, o trabalhador
rural sempre se manteve à margem, ou mais precisamente, excluído do sistema
previdenciário brasileiro.
Isto é bastante compreensível, uma vez que se levarmos em conta a
característica, a origem e o sistema adotado historicamente pelo Brasil, para prover
as necessidades de mão de obra, existente nas propriedades rurais espalhadas pelo
seu imenso território.
32
No inicio da colonização, quando os primeiros portugueses desembarcaram
nas terras Brasileiras, com a intenção ou até mesmo a missão de colonizar este
chão desconhecido, já sentiram a imediata necessidade de procurar por mão de
obra, para executar as tarefas mais difíceis e pesadas.
Os nativos das terras americanas, índios ou bugres, como na época eram
chamados pelos conquistadores portugueses, foram os primeiros a perder sua
liberdade, ante a violência dos colonizadores, na tentativa de resolver o problema da
falta de mão de obra, trabalhando na condição de escravo.
Os portugueses passaram então a ocupar as terras brasileiras, adentrando
às matas, a procura de riquezas. Para isso fundaram vilas e cidades. Outros, com
interesse voltado à agricultura e pecuária passaram a se ocupar de atividades com
características rurais.
Para tanto, necessitavam ocupar o solo rico em nutrientes e muito produtivo.
Ocorre que apesar de existir um solo fértil na nova terra, ele estava coberto por
matas nativas fechadas, que dificultavam suas pretensões de desenvolver atividades
agrárias. Passaram assim a derrubada da mata e a formação de plantações e
pastagens.
Mas o nativo, indígena americano, não se mostrava nada propenso a ser
domesticado, para fins de se tornar, a mão de obra escravizada que os portugueses
necessitavam para executar estas atividades diárias na agricultura ou até mesmo
nas funções domésticas.
Deste breve apanhado, percebe-se que foi com nativo americano que os
colonizadores Portugueses executaram a primeira experiência na tentativa de
encontrar mão de obra barata para execução das mais diversas atividades, entre
elas a de trabalhador rural. Obviamente que sem direito nenhum, na condição de
escravo.
33
O nativo brasileiro, não deu certo nesta condição, pois como grande
conhecedor da mata acabava fugindo deixando assim de exercer suas atividades,
gerando sérios “prejuízos” para seus senhores, que perdiam muito tempo na
tentativa de recapturá-los.
Neste sentido segue o ensinamentos de Figueira (2005,p.157)
Entretanto, uma série de inconvenientes cercava o
trabalho escravo dos nativos na lavoura. Para começar,
em 1570 a Coroa proibiu a escravização dos indígenas.
Uma das razões que levaram a essa decisão foi a
oposição dos jesuítas à submissão forçada dos
ameríndios. Os jesuítas a catequização dos índios,
argumentando que eles precisavam ser conduzidos ao
senhor. Na verdade, porém existiam brechas na
legislação que permitiam aos colonos romper a proibição
da coroa, como o resgate e a guerra justa.
Os indígenas também não aceitavam trabalhar na
lavoura, opondo forte resistência ao trabalho sistemático
imposto pelos colonos portugueses. Para eles, a disciplina
que a atividade exigia violava sua cultura. Tentando
escapar da opressão, muitos nativos migraram para
outras regiões. Os que já haviam sido escravizados
resistiam de varias formas: negando-se a trabalhar no
ritmo exigido pelos colonos, ou simplesmente fugindo das
plantações.
Desta maneira, ante a dificuldade de domesticar o nativo indígena e
transformá-lo num trabalhador rural, os colonos procuram outra solução para
resolver o problema. Passaram a utilizar-se, de um expediente muito difundido na
Europa há muitos anos e que por lá vinha dando muito certo: o tráfico, para fins de
escravidão, de nativos africanos.
Os primeiros escravos africanos chegaram ao Brasil, na metade do século
XVI. Já eram conhecidos e utilizados como trabalhadores escravos pelos
portugueses na Europa. Além disso, não conheciam a nova terra, o que dificultava e
até mesmo impossibilitava qualquer tentativa de fuga.
Nessa mesma linha, o entendimento de Figueira (2005,p.157)
34
A partir de 1500 os colonos, pressionados pela expansão
da produção açucareira, passaram a recorrer cada vez
mais à mão de obra africana, oferecida nos portos
brasileiros pelos traficantes. Isso permitia certa
regularidade no abastecimento de escravos, o que não
ocorria com a mão de obra indígena, cada vez mais difícil
de conseguir. Ademais, os africanos, ao serem
deslocados para um lugar estranho tinham mais
dificuldade do que os indígenas de resistir à escravidão
ou de fugir dos engenhos.
Inicia-se assim o mais longo, cruel e injusto ciclo de exploração de mão de
obra rural já existente na história do Brasil. O negro africano, não apresentou muitas
dificuldades em se habituar ao exercício das tarefas impostas por seus senhores.
Sendo domesticado, passou a fazer parte deste sistema, na condição de escravo.
O tráfico de escravos africanos, ao contrario do que aconteceu com os
nativos indígenas, não encontrou óbice da Igreja, muito pelo contrário, foi visto como
um modo de purgar pelos seus pecados, uma vez que, no continente africano,
muitas tribos, encontravam-se adeptas à religião muçulmana.
Neste sentido nos escreve Figueira (2005,p.157)
Além disso, os africanos não contavam com a proteção
dos jesuítas nem das leis decretadas a partir de 1570 pela
Coroa portuguesa, que proibia a escravidão indígena. Ao
contrário, a submissão dos povos da África era vista como
uma forma de purgar seus pecados e de convertê-los ao
reino de Deus. Afinal, muitos deles tinham entrado em
contato com a religião muçulmana, e na América
poderiam ser catequizados. A substituição de um tipo de
trabalhador por outro se fez aos poucos. Somente depois
de 1600 o número de escravos africanos superou o
número de índios escravizados.
Esta condição, na qual o escravo não possuía direito algum sendo
considerado como uma mercadoria que poderia ser vendida, leiloada, alugado ou
até mesmo dado em troca de qualquer bem, perdurou até o ano de 1888, mais
precisamente até o dia l3 de maio de 1888.
Com a Lei Áurea, assinada pela
Princesa Isabel, aboliu a escravidão em todo território brasileiro.
35
Eis aí um breve apanhado histórico, da formação da classe de trabalhadores
rurais, que mais contribuiu para o enriquecimento da nação e do conseqüente
domínio de poderosos fazendeiros, que a custa do trabalho escravo, forjaram as
divisas do pais e demarcaram a propriedade de suas terras.
A injustiça, a exploração e o preconceito para com o trabalhador rural, não
são discriminações características, dos dias de hoje, mas sim manifestações
intrínsecas à própria colonização do Brasil, que sempre dispensou ao trabalhador
rural um conceito pejorativo, adjetivando-o como pessoa ignorante, sem cultura e
desmerecedor do respeito, localizando-o à margem do sistema e das leis.
Esse sistema escravocrata, que perdurou por quase quatro séculos, retirou
dos trabalhadores rurais a possibilidade de luta por direitos fundamentais e
humanos, reduzindo-os ao nível de seres inferiores, submetendo-os as mais cruéis e
perversas humilhações, inimagináveis nos dias de hoje. Essa classe oprimida, foi
que deu origem ao embrião formador de uma futura classe, que nos dias de hoje
chamamos de agricultores, colonos ou mais tecnicamente falando, de trabalhadores
rurais.
Com o sistema escravocrata em colapso e os antigos escravos, agora
libertos pela Lei Áurea, debandando das fazendas, os senhores donos das terras
viram-se impossibilitados de continuar suas atividades e manter o cultivo do chão. A
partir daí dá-se impulso a um sistema de parceira agrícola, que já se encontrava em
andamento, com a intensificação da imigração para o Brasil, de colonos europeus.
Os imigrantes europeus, fugidos da guerra e perseguidos por diferenças
étnicas e pela fome, lançaram-se numa aventura em direção à America Latina,
espalhando-se por todos os países, motivados por promessas de uma vida melhor
no novo continente, com terras produtivas, paz e uma vida melhor.
Assim descreve Thales de Azevedo, como se deu a imigração européia no
Brasil em meados de 1824, em sua obra, Italianos e Gaúchos, 2ª Edição, Editora
Cátedra/Pró-Memória Instituto Nacional do Livro, 1982:
36
Em 1824 o governo imperial, cumprindo o plano de criar uma
classe média rural, proprietária e adiantada, que se iniciaria em
1818 nas Matas do Jequitinhonha na Bahia, e continuava, além
do Rio Grande, em Nova Friburgo, em Pernambuco e no
Espírito Santo, toma a iniciativa de introduzir colonos alemães
no Rio Grande, fundando o primeiro estabelecimento, a Colônia
São Leopoldo, à margem do Rio dos Sinos em terras da
malograda Real Feitoria do Linho Cânhamo.
Ocorre que as coisas não se desenrolaram dessa maneira e ao chegar por
estas terras, os imigrantes europeus encontraram um cenário bem diferente daquele
que lhes foi prometido. Aqueles que trouxeram alguma reserva, conseguiram adquirir
alguma área de terra e até se transformaram em senhores de escravos, já outros
não tiveram a mesma oportunidade e passaram a trabalhar em parceria com os
proprietários de terras.
Os imigrantes no Rio Grande do Sul, enfrentaram todos os tipos de
dificuldades, como relata Azevedo (1982,p.189)
(...) Os 10 anos da Revolução Farroupilha, o descumprimento
das condições e das promessas feitas aos colonos por agentes
inescrupulosos, a falta de legislação adequada, a alternância
dos governos imperial e provincial na direção e custeio da
colonização, as dúvidas do Rio Grande, cerca de 1847, sobre a
conveniência de continuar a imigração alemã, a má fama que o
Brasil veio, por tudo isto a sofrer na Alemanha e as restrições
desta à emigração para o nosso país determinaram que a partir
de 1870 começasse a declinar acentuadamente a entrada de
novos imigrantes alemães (...)
Aos poucos esta prática de parceria rural com os imigrantes começou a se
difundir e os proprietários de terras, senhores de escravos passaram a gostar desse
sistema, uma vez que não mantinham nenhuma obrigação nem vínculo com os
37
trabalhadores. Os escravos, ao contrário dos colonos europeus, eram propriedade
dos senhores e estes tinham obrigação de sustentá-los tanto na juventude como na
velhice, quando passavam a se transformar num estorvo e fonte de prejuízo para os
fazendeiros.
Os colonos europeus ao contrário, além de livrar o senhor de terras, dos
ônus da atividade escravagista, representavam um acréscimo de conhecimento
tecnológico que traziam consigo, aplicando novas técnicas de manejo do solo
desenvolvidas na Europa.
Além disso, a grande maioria dos imigrantes mantinha algum tipo de
conhecimento profissional como artesão ou ferreiro entre outros, fato que trazia
vantagens ao proprietário das terras.
Com esta prática amplamente difundida pelo país inteiro, os escravos
libertos acabaram por cair em segundo plano, passando a povoar as cercanias das
cidades ou os fundões das fazendas,sobrevivendo de pequenos serviços prestados
à troco de restos de alimentos e pequenos valores em dinheiro.
Assim, o Brasil entra no século XX, encerrando um ciclo institucional,
vergonhoso e cruel de exploração e escravização de seres humanos. Após a queda
da Monarquia e a outorga de uma constituição republicana, o novo sistema político
em vigor é a república.
Com a proclamação da república,o país passa a ser regido por um novo
sistema de governo. A população passa a ter maior liberdade, parte dela influindo
nas decisões, através de ferramentas colocadas a sua disposição, como o poder do
voto. Apesar de exercido apenas por uma minoria abastada, já significava um
grande avanço na conquista de direitos sociais.
No plano territorial, o país já se encontrava delimitado em suas fronteiras. A
maior parte das áreas de terra fértil e produtiva pertenciam a poucos influentes
proprietários,senhores da riqueza e do poder, que exerciam grande influência nos
meios políticos da república
38
Muitos
agricultores,
tanto
ex-escravos
como
imigrantes
europeus,
trabalhavam num sistema de parceria agrícola, cultivando as terras dos grandes
senhores proprietários, recebendo para tanto uma parte do montante colhido. Outros
recebiam dos proprietário das terras um pequeno rancho para morar dentro das
fazendas e executavam tarefas pré-definidas na atividade agrária a troco de um
valor pré estipulado em dinheiro ou mercadorias para seu sustento e de suas
famílias, mas obviamente sem vínculo empregatício.
O governo republicano, a exemplo do que já se encontrava em andamento
pelo antigo governo imperial, deu continuidade aos planos de demarcação e
distribuição de terras em varias regiões do Brasil. A partir da demarcação, os
agricultores passaram a receber os títulos de suas áreas de terra que, após
devidamente demarcados e levados à registro nos órgãos registrais competentes,
passavam a ser de sua propriedade.
Desta forma surge, entre a metade do século XIX e os primórdios do século
XX, os primeiros povoados originados deste sistema de distribuição de terras, bem
como as localidades interioranas, que proporcionaram as condições, para o
surgimento de um sistema rural voltado para a agricultura familiar.
O pequeno agricultor, já proprietário e de posse da sua pequena área rural,
sem qualquer vínculo com grandes possuidores de terra, passou a viver em
comunidade, cultivando suas terras, produzindo para seu sustento e de sua família.
Vendendo os excedentes nos comércios locais, que passaram a se desenvolver
economicamente, contribuindo assim, para o surgimento de povoados que
posteriormente passariam a condição de municípios.
Os imigrantes europeus trouxeram consigo a tradição e a cultura de se
manterem unidos em sociedade. Para tanto, logo passaram a edificar templos
religiosos e escolas, para executar suas atividades religiosas, bem como para
proporcionar a alfabetização de seus filhos. Os sacerdotes e os professores eram
remunerados pela comunidade, cujos sócios contribuíam com um valor mensal para
manutenção e pagamento dos salários.
39
Assim, definia-se por todo o país, um conceito de homem do campo, muito
diferente daquele conhecido anteriormente. Diferentemente do negro africano,
capturado a força, escravizado e considerado ser inferior pelos senhores donos de
escravos, inclusive com o aval do governo imperial e da igreja, os imigrantes
europeus, chegaram ao Brasil como homens livres, com incentivo governamental e
na grande maioria receberam títulos de terras.
Passados os anos, estes homens do campo, que povoaram o interior do
Brasil, tornaram-se os maiores produtores de alimentos para a nação, e por
conseqüência, os fornecedores de gêneros alimentícios aos maiores centros
populacionais do país.
Veja como Azevedo (1982,p.192)
O ritmo anual, esse decorre do modo de utilização da terra e da
tecnologia empregada. Desde o início cada colono produz em
seu lote aproximadamente todos os artigos agrícolas de que
necessita para consumo de sua família e os que cultiva para
comerciar. Assim, a produção da região e a de cada
estabelecimento é diversificada, não existindo grandes e
extensas culturas de nenhuma planta nem lote algum dedicado
à monocultura.
Ocorre que, com o passar dos anos, todo esse desenvolvimento
populacional existente no meio rural, passou a exigir inovações e melhorias sociais,
bem como o envolvimento de políticas sociais e assistenciais, voltadas ao bem estar
dos trabalhadores rurais, necessitando do apoio governamental.
O meio rural, se desenvolvia produzindo alimentos, para prover às
necessidades alimentares da população urbana. População esta, que impulsionada
pela industrialização dos fatores de produção existentes na época, crescia ante a
grande absorção de mão de obra que o setor industrial apresentava.
40
Em meados do século XX, com esse movimento de industrialização e a
grande absorção de mão de obra, empregada nas indústrias do meio urbano,
surgiram entre as classes operárias, vários movimentos voltados a defesa e luta, por
melhores condições de segurança no trabalho, bem como à conquista de direitos, no
sentido de oferecer ao trabalhador, benefícios que lhe proporcionassem segurança,
em caso de doença ou velhice.
As lideranças dos trabalhadores rurais, perceberam que as iniciativas
libertárias, efetuadas pelas lideranças dos movimentos dos trabalhadores urbanos,
vinham surtindo seus efeitos, gerando para estes, uma série de conquistas sociais,
como por exemplo: seguro para acidente de trabalho, aposentadoria, auxilio doença,
entre outros.
Diante de toda esta situação, os trabalhadores do meio rural, influídos pelas
conquistas e vantagens adquiridas pelos trabalhadores urbanos, iniciaram um
movimento de organização social, com o objetivo de conquistar direitos, que lhes
proporcionassem um seguro e melhores condições para o caso de uma eventual
doença ou acidente, e um benefício que lhe assegurasse um pouco de dignidade na
velhice.
A partir deste momento, com a implantação do governo republicano e a
democratização de alguns setores políticos e administrativos da nação, ante a forte
pressão da classe operária, que já se encontrava organizada através de seus
sindicatos, várias conquistas de cunho trabalhista e previdenciário vieram a ser
implementadas, beneficiando aos trabalhadores.
Os trabalhadores rurais, também já se encontravam organizados, em seus
sindicatos, espalhados pela maioria dos municípios brasileiros. A nível estadual,
existiam as federações dos sindicatos, com jurisdição sobre todo território estadual e
a confederação que exercia jurisdição sobre todo território nacional, tendo as
federações e os sindicatos sob o seu comando. Com lideranças e diretorias fortes e
influentes, eleitas através do voto direto de todos os seus associados, os sindicatos
passaram a exercer forte pressão, junto aos meios políticos, no sentido de
conquistar direitos sociais e por conseqüência previdenciários.
41
Foi a partir da década de setenta, ainda sob a vigência do governo ditatorial
militar, mais precisamente na data de 25 de maio de 1971, que através da Lei
Complementar nº 11, ocorreu o grande marco inicial das conquistas previdenciárias
da história da aposentadoria rural do Brasil. Foi criado o PRO-RURAL – programa de
assistência ao trabalhador rural.
Neste sentido, escreveu Kertzman (2013,p.50):
Os trabalhadores rurais somente passaram a gozar de direitos
previdenciários, a partir de 1971, com a criação do
FUNRURAL, pela Lei Complementar 11/71. Os empregados
domésticos foram incluídos no sistema protetivo, no ano
seguinte, em função da Lei 5.859/72.
Este programa deu inicio a concessão, nos moldes atuais, de benefícios
previdenciários, aos trabalhadores do meio rural, proporcionando assim um plano de
seguros, nunca antes visto no Brasil, para aqueles que se dedicavam diariamente ao
labor rural.
A Lei Complementar nº 11/71, que criou o PRO-RURAL – Programa de
Assistência ao Trabalhador Rural, instituiu o FUNRURAL – Fundo de Assistência ao
Trabalhador Rural, atribuindo-lhe personalidade jurídica de natureza autárquica e
função de executor do PRO-RURAL. O FUNRURAL estava diretamente subordinado
ao Ministério do Trabalho e Previdência Social conforme art. 1º da Lei
Complementar 11/71 que abaixo transcrevemos:
Art.1º É instituído o Programa de Assistência ao
Trabalhador Rural – PRO-RURAL, nos termos da
presente Lei Complementar.
§ 1º Ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural –
FUNRURAL – diretamente subordinado ao Ministério do
Trabalho e Previdência Social e ao qual e atribuída
personalidade jurídica de natureza autárquica, caberá a
execução do Programa de Assistência ao Trabalhador
Rural, na forma do que dispuser o Regulamento desta Lei
Complementar.
42
Portanto, por todo o exposto conclui-se que foi a partir da Lei Complementar
nº11/71, que pela primeira vez no Brasil, o trabalhador rural teve reconhecida sua
qualidade de segurado da Previdência Social, passando a gozar de uma série de
direitos que anteriormente, sempre lhe foram sonegados.
Estes direitos encontram-se implícitos no art. 2º da Lei Complementar 11/71
como abaixo transcrevemos:
Art. 2º O Programa de Assistência ao Trabalhador Rural
consistirá na prestação dos seguintes benefícios:
I – Aposentadoria por velhice;
II – Aposentadoria por invalidez;
III – pensão;
IV – Auxílio funeral;
V – serviço de saúde;
VI – serviço de social.
Estes benefícios conquistados pelos trabalhadores do meio rural, através da
Lei Complementar 11/71, encontram-se até os dias de hoje à disposição dos
agricultores. A Lei supra, instituía ao trabalhador aposentado, o direito a perceber
mensalmente um benefício cujo valor não poderia ultrapassar meio salário mínimo
nacional, sendo que somente um membro da família teria este direito. Portanto, era
por esse motivo que, quando o casal atingia a idade mínima, exigida para a
concessão do benefício de aposentadoria, somente um dos membros recebia.
Os benefícios acima citados, que inicialmente representaram a maior
conquista previdenciária dos trabalhadores rurais do Brasil, com o tempo passaram
a ser objetos de muita polêmica, levando os agricultores de todo o país, de forma
organizada pelas entidades sindicais, a organizarem uma série de manifestações,
por todo o território nacional.
Os pontos, que com o passar dos anos, se tornaram polêmicos e se
transformaram em bandeiras para agricultores e lideranças sindicais, encontravamse relacionados ao fato, de que somente um membro do grupo familiar, teria o direito
de perceber o benefício previdenciário. O valor do benefício não poderia ultrapassar
meio salário mínimo nacional.
43
Essa situação perdurou até o ano de 1988, quando foi promulgada a nova
Constituição federal, que tratou da previdência social nos art. 201 e 202. A nova
constituição federal dispensou ao trabalhador rural, um tratamento muito especial. O
agricultor que exerce suas atividades rurais em regime de economia familiar, passa
a ser o único segurado da Previdência Social, com status constitucional, conforme
preconiza o art. 201 § 7º, inciso II que a seguir transcrevemos:
Art. 201 A Previdência Social será organizada sob a forma
do regime geral, de caráter contributivo e de filiação
obrigatória, observados critérios que preservem o
equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da
lei, a:
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de
Previdência Social, nos termos da lei, obedecidas as
seguintes condições:
II – Sessenta e cinco anos de idade, se homem, e
sessenta anos, se mulher, reduzido em cinco anos o limite
para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os
que exerçam suas atividades em regime de economia
familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o
pescador artesanal.
Nota-se,portanto,que o trabalhador rural recebeu uma proteção especial do
legislador constituinte. A Constituição Federal reservou apenas dois artigos para
tratar sobre a Previdência Social, mas dispôs que o assunto deverá ser regulado por
lei.
A Constituição Federal de 1988, também tratou de definir, a forma de
financiamento da seguridade social. O agricultor deve participar com parte do
resultado da comercialização de sua produção conforme artigo 195, § 8º:
Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a
sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei,
mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes
contribuições sociais
§ 8º O produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais e o
pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que
44
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem
empregados permanentes, contribuirão para a seguridade
social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado
da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos
termos da lei.
Para tanto, em 27 de julho de 1991, foram criadas duas leis: a 8212 e a
8213, sendo que a primeira dispõe sobre a organização da Seguridade Social e
institui Plano de custeio, e a segunda dispõe sobre os planos de benefícios da
previdência social.
A Lei 8213/91, veio a consolidar os direitos previdenciários dos
trabalhadores rurais, que ao longo da história da Previdência Social foram mantidos
à margem das conquistas. Esta Lei além de dispor sobre os planos de benefícios,
elencou, em seu art. 2º os princípios e objetivos da Previdência Social, que entre
outros destacamos o II, que trata da uniformidade e equivalência dos benefícios e
serviços às populações urbanas e rurais, cujo conteúdo será objeto de estudo no
próximo ponto.
Esta lei também regulamentou uma das matérias que sempre geraram
grande polêmica no meio rural, ou seja, o valor do benefício do trabalhador rural e
estendeu à mulher trabalhadora rural a qualidade de segurada especial da
Previdência Social, com direito a aposentadoria por idade, entre tantos elencados na
Lei 8213/91. A qualidade de segurado especial do agricultor que exerce atividade
rural em regime de economia familiar, será tema de estudo no próximo ponto.
2.2 DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL
A Constituição Federal de1988, marcou o apogeu das conquistas de direitos
previdenciários aos agricultores brasileiros. Os artigos 201 e 202, instituíram uma
série de orientações e mandamentos ordenando a criação de leis com o objetivo de
45
instituir normas regulamentadoras, que estabelecessem diretrizes, dispondo sobre
planos de benefícios da Previdência Social, a organização da seguridade social e
instituir plano de custeio.
Neste sentido é o entendimento de Marina Vasques Duarte, 6ª edição,
Editora Verbo Jurídico, 2008, em sua obra Direito Previdenciário, que passamos a
transcrever:
Antes da CF 88, havia expressa distinção entre os
trabalhadores urbanos e rurais para efeitos previdenciários. Os
benefícios para estes trabalhadores rurais eram bem reduzidos:
tinham direito a meio salário-mínimo a titulo de aposentadoria
por invalidez por velhice e pensão (esta para dependentes),
além do auxílio-funeral de um salário mínimo (Lei
Complementar nº11, de 25.05.1971). Não existia um sistema
previdenciário propriamente dito: era mais um sistema
assistencial onde os segurados recebiam o benefício
independentemente do recolhimento de contribuições
Aliás, não existia sequer a possibilidade de o trabalhador rural
contribuir para um regime previdenciário .a exceção que se
fazia era quanto ao empregado de empresa agroindustrial ou
agrocomercial que embora prestando exclusivamente serviço
de natureza rural, era considerado segurado da previdência
Social Urbana (art.6º, § 4º, CLPS/84)
Os mandamentos constitucionais, ordenando a instituição de normas que
regulamentassem o sistema previdenciário brasileiro, conforme acima descrito,
foram concluídos pelo Legislador, na data de 24 de julho de 1991, com a criação das
leis 8212 e 8213. A primeira trata exatamente da organização da Seguridade Social
e da instituição do plano de custeio, sendo que a segunda Lei trata sobre os planos
de benefícios da Previdência Social.
A Lei 8212/91 é responsável por regulamentar todo sistema de
financiamento da Seguridade Social, dispondo sobre a forma pela qual a Seguridade
Social será mantida, bem como quais serão suas fontes de receita e quais são os
segurados obrigatórios da Previdência social.
46
Já o artigo 1º define um conceito e dispõe sobre os objetivos da Seguridade
Social, bem como, o âmbito de abrangência de suas ações, como abaixo
transcrevemos:
Art. 1º. A Seguridade Social compreende um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da
sociedade, destinado a assegurar o direito relativo à
saúde, à Previdência,e à Assistência Social.
Mais adiante, a Lei 8212/91 passa a tratar da forma como a Seguridade
Social será financiada, quais são as formas de receita e fornece um rol das
contribuições sociais.
O capítulo VI, trata da contribuição do produtor rural e do pescador, na
qualidade de segurado especial, entre os artigos 25 e 25A, dispondo em sua
redação, sobre qual será o percentual a ser descontado de sua produção, como
forma de contribuição à Previdência Social.
Transcrevemos abaixo o enunciado do artigo 25, I para melhor elucidar a
forma como o Legislador se valeu, para viabilizarão trabalhador rural, a possibilidade
de contribuir para a Previdência Social, e com isso, obter o direito aos benefícios
previdenciários:
Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física,
em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e
II do art. 22, e a do segurado especial, referidos,
respectivamente, na alínea a do inciso V e no Inciso VII
do art. 12 desta Lei, destinada à seguridade social, é de:
I – 2% (dois por cento) da receita bruta proveniente da
comercialização da sua produção.(destacamos)
Muitos doutrinadores e até mesmo parte da jurisprudência, manifestam-se
favoráveis ao entendimento, de que o legislador ao instituir, através da lei 8213/91, a
qualidade de segurado especial, proporcionou ao pequeno proprietário, que exerce
atividade rural em regime de economia familiar, em área de até 4(quatro) módulos
47
fiscais, um tratamento diferenciado junto à Previdência Social. Este entendimento
encontra guarida no fato de que muitos segurados que mantém esta qualidade se
aposentaram, sem nunca ter contribuído para com a Previdência social.
Exemplo clássico dessa situação, é o caso dos bóia frias, que apesar de não
necessitarem apresentar prova documental, nem recolhimento à Previdência Social,
possuem o direito à percepção do beneficio de aposentadoria por idade. Este seria o
motivo, pelo qual, o Legislador lhe conceituou, como Segurado Especial.
Para melhor entendimento, transcrevemos abaixo, jurisprudência neste
sentido:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE
RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. BÓIA-FRIA. QUALIFICAÇÃO COMO
DOMÉSTICA.
PERCEPÇÃO
DE
BENEFÍCIO
PREVIDENCIÁRIO POR MEMBRO DA FAMÍLIA. LABOR
URBANO. DESCONTINUIDADE. 1. Remessa oficial tida por
interposta. 2. O tempo de serviço rural pode ser comprovado
mediante a produção de prova material suficiente, ainda que
inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 3. Em se
tratando de trabalhador rural "bóia-fria", a exigência de
início de prova material para efeito de comprovação do
exercício da atividade agrícola deve ser interpretada com
temperamento, podendo, inclusive, ser dispensada em
casos extremos, em razão da informalidade com que é
exercida a profissão e a dificuldade de comprovar
documentalmente o exercício da atividade rural nessas
condições. Precedentes do STJ. 4. A qualificação da mulher
como "doméstica" ou "do lar" na certidão de casamento não
desconfigura sua condição de segurada especial, seja porque
na maioria das vezes acumula tal responsabilidade com o
trabalho no campo, seja porque, em se tratando de labor rural
desenvolvido em regime de economia familiar, a condição de
agricultor do marido contida no documento estende-se à
esposa. 5. O fato de o marido da autora ser aposentado pela
área urbana ou desempenhar atividade urbana não constitui
óbice, por si só, ao enquadramento dela como segurada
especial, na medida em que o art. 11, VII, da Lei n. 8.213/91,
conferiu ao produtor rural que exerça a atividade agrícola
individualmente o status de segurado especial. Precedentes
desta Corte. 6. O exercício de labor urbano por ínfimo período
durante o intervalo equivalente à carência não impede o
deferimento da aposentadoria por idade rural, porquanto se
enquadra na autorização do art. 143 da Lei de Benefícios à
descontinuidade do trabalho campesino. 7. Implementado o
48
requisito etário (55 anos de idade para mulher e 60 anos para
homem) e comprovado o exercício da atividade agrícola no
período correspondente à carência (art. 142 da Lei n.
8.213/91), é devido o benefício de aposentadoria por idade
rural, a partir do ajuizamento, ante a ausência de requerimento
administrativo. 8. Os honorários advocatícios devem ser fixados
em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da
sentença, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte.
(TRF4, AC 2006.70.99.000666-2, Quinta Turma, Relator Celso
Kipper, D.E. 03/05/2007) (destacamos)
A qualidade especial do segurado está muito bem caracterizada na ementa
supra,uma vez que apresenta em seu conteúdo, várias situações em que o
segurado recebe um tratamento diferenciado do julgador,conforme passamos a
demonstrar:
Veja o item 1(um), no qual o julgador afirma que, “o tempo de serviço rural
pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que
inicial, complementada por prova testemunhal idônea”. Em momento algum o
julgador referiu-se à comprovar alguma forma de contribuição, bastando apenas a
existência de prova material suficiente, corroborada por prova testemunhal.
Da mesma forma, a Lei 8213/91 em seu art.106, nos traz um rol de
documentos por meio dos quais o segurado especial poderá comprovar o exercício
de atividade rural, conforme abaixo transcrevemos:
Art. 106. A comprovação do exercício de atividade rural será
feita, alternativamente, por meio de:
I – contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho
e Previdência Social;
II – contrato de arrendamento, parceria ou comodato
rural;
III – declaração fundamentada de sindicato que
represente o trabalhador rural ou, quando for o caso, de
sindicato ou colônia de pescadores, desde que homologada
pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS;
IV – comprovante de cadastro do Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária – INCRA, no caso de
produtores em regime de economia familiar
V – bloco de notas do produtor rural;
49
VI – notas fiscais de entrada de mercadorias, de que trata
o § 7º do art.30 da Lei n.8212 de 24 julho de 1991,emitidas
pela empresa adquirente da produção, com indicação do nome
do segurado como vendedor;
VII – documentos fiscais relativos a entrega de produção
rural à cooperativa agrícola, entreposto de pescado ou outros,
com indicação do segurado como vendedor ou consignante
VIII – comprovantes de recolhimento de contribuição à
Previdência Social decorrentes da comercialização da
produção;
IX – cópia da declaração de imposto de renda, com
indicação de renda proveniente da comercialização de
produção rural; ou
X – licença de ocupação ou permissão outorgada pelo
INCRA.
Este rol, segundo entendimento do próprio INSS, corroborado pela
jurisprudência, é apenas exemplificativo, podendo o agricultor comprovar atividade
rural através de outros documentos como certidão de nascimento de irmãos e filhos,
certidão de casamento entre outros.
A jurisprudência supra, em seu item nº 3, trata também, de uma das
profissões mais antigas do Brasil, o bóia fria, cujo tratamento disponibilizado, é ainda
mais benéfico, ante a condição de hipossuficiência à que o trabalhador encontra-se
submetido. Inclusive sendo dispensado da produção de prova material, para
comprovação da atividade rural. Nestes casos, muitas vezes o próprio INSS, produz
as provas, através de diligência ao local onde o trabalhador afirma ter exercido
atividade de bóia-fria, entrevistando pessoas da comunidade, bem como àqueles a
quem ele teria prestado os serviços.
A Lei 8213/91, dispensou ao agricultor familiar um tratamento diferenciado,
percebe-se
esta
diferença
no
momento
da
concessão
dos
benefícios
previdenciários. Entre tantos, podemos citar o benefício de aposentadoria por idade,
que possui regras mais benéficas com requisitos que proporcionam ao agricultor, a
possibilidade de se aposentar 5(cinco) anos mais cedo que o trabalhador urbano. O
trabalhador que exerce atividade rural em regime de economia familiar ao
complementar a idade de 55 anos se mulher e 60 anos se homem, e implementada
50
a exigência do período de carência (art.142 da Lei 8213/91), tem o direito à
aposentadoria por idade.
De todo exposto, depreende-se que o agricultor familiar, cuja pretensão seja
aposentar-se, na qualidade de segurado especial, terá somente uma opção,
aposentar-se por idade, uma vez que os recolhimentos efetuados mediante o
desconto de um percentual de sua produção ao FUNRURAL – Fundo de Assistência
ao Trabalhador Rural, na nota fiscal de venda de produtos agrícolas, não são podem
se considerados para comprovação de contribuição para a Previdência Social. Este
entendimento é pacífico, tanto pela autarquia responsável por gerir o sistema
previdenciário brasileiro, o INSS – Instituto Nacional do Seguro Social, como pela
jurisprudência majoritária.
O artigo 11 da Lei 8213/91, trata dos segurados obrigatórios da Previdência
Social, trazendo em sua redação o caráter compulsório do enunciado deste artigo,
não deixando outra alternativa às pessoas físicas por ele elencadas a não ser filiarse à Previdência Social. Como contrapartida a Previdência Social lhe oferece uma
série de benefícios e garantias, como por exemplo aposentadoria, auxilio doença,
salário família entre outros enumerados no artigo 18 da Lei supra.
A qualidade de segurado especial, atribuída aos agricultores familiares, um
dos objetos de nosso estudo, encontra-se prevista no inciso VII do artigo 11 da Lei
8213/91. Trata-se de filiado obrigatório ao RGPS – Regime Geral de Previdência
Social.
Para melhor compreensão passamos a transcrever parte do artigo 11 da Lei
8213/91, cuja redação define com mais clareza o entendimento do legislador sobre o
significado da qualidade de segurado especial:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as
seguintes pessoas físicas:
VII – como segurado especial: a pessoa física residente no
imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele
que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
51
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor,
assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou
arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas
atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei 9985
de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio
de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da
pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16
(dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado
de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que,
comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade
em que o trabalho dos membros da família é indispensável à
própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do
núcleo familiar e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados
permanentes;
(...)
§ 6o Para serem considerados segurados especiais, o cônjuge
ou companheiro e os filhos maiores de 16 (dezesseis) anos ou
os a estes equiparados deverão ter participação ativa nas
atividades rurais do grupo familiar.
§ 7o O grupo familiar poderá utilizar-se de empregados
contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que
trata a alínea g do inciso V do caput, à razão de no máximo 120
(cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos
corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em
horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o
período de afastamento em decorrência da percepção de
auxílio-doença.
§ 8o Não descaracteriza a condição de segurado especial:
I – a outorga, por meio de contrato escrito de parceria, meação
ou comodato, de até 50% (cinqüenta por cento) de imóvel rural
cuja área total não seja superior a 4 (quatro) módulos fiscais,
desde que outorgante e outorgado continuem a exercer a
respectiva atividade, individualmente ou em regime de
economia familiar;
II – a exploração da atividade turística da propriedade rural,
inclusive com hospedagem, por não mais de 120 (cento e vinte)
dias ao ano;
III – a participação em plano de previdência complementar
instituído por entidade classista a que seja associado em razão
da condição de trabalhador rural ou de produtor rural em
regime de economia familiar; e
IV – ser beneficiário ou fazer parte de grupo familiar que tem
algum componente que seja beneficiário de programa
assistencial oficial de governo;
52
V – a utilização pelo próprio grupo familiar, na exploração da
atividade, de processo de beneficiamento ou industrialização
artesanal, na forma do § 11 do art. 25 da Lei nº 8212, de 24 de
julho de 1991: e
VI - a associação em cooperativa agropecuária; e
VII - a incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados IPI sobre o produto das atividades desenvolvidas nos termos
do § 12.
§ 9o Não é segurado especial o membro de grupo familiar
que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente
de:
I – benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílioreclusão, cujo valor não supere o do menor benefício de
prestação continuada da Previdência Social;
II – benefício previdenciário pela participação em plano de
previdência complementar instituído nos termos do inciso IV do
§ 8o deste artigo;
III - exercício de atividade remunerada em período não superior
a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil,
observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei nº8212, de 24
de julho de 1991;
IV – exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de
organização da categoria de trabalhadores rurais;
V – exercício de mandato de vereador do Município em que
desenvolve a atividade rural ou de dirigente de cooperativa
rural constituída, exclusivamente, por segurados especiais,
observado o disposto no § 13 do art. 12 da Lei nº 8212, de 24 de
julho de 1991;
VI – parceria ou meação outorgada na forma e condições
estabelecidas no inciso I do § 8o deste artigo;
VII – atividade artesanal desenvolvida com matéria-prima
produzida pelo respectivo grupo familiar, podendo ser utilizada
matéria-prima de outra origem, desde que a renda mensal
obtida na atividade não exceda ao menor benefício de
prestação continuada da Previdência Social; e
VIII – atividade artística, desde que em valor mensal inferior ao
menor benefício de prestação continuada da Previdência
Social. (destacamos)
Ao instituir a qualidade de segurado especial, através da Lei 8213/91, o
Legislador criou uma ferramenta de inserção social, possibilitando à classes que,
anteriormente encontravam-se excluídas do manto protetivo da Previdência Social,
como pequenos agricultores familiares, e pescadores, entre outros, recebessem
tratamento diferenciado, e pudessem usufruir de benefícios previdenciários.
53
2.3 DA APOSENTADORIA HÍBRIDA
Após compreender o significado da qualidade de segurado especial,
atribuída ao agricultor familiar através da Lei 8213/91, estudada no ponto anterior,
vamos nos ater a uma nova modalidade de aposentadoria, a aposentadoria híbrida.
Esta modalidade de aposentadoria híbrida, encontra-se prevista no artigo 48
§ 3º da Lei 8.213/91, que foi acrescentado à Lei supra, através da Lei 11718/08.
Para uma melhor compreensão do tema abordado passamos a transcrever o
artigo 48,§ 1º, 2º e 3º:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado
que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta),
se mulher.
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e
cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais,
respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do
inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art.
11.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o
trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de
atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por
tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado
o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art.
11 desta Lei.
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo
que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que
satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao
benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade,
se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
Da redação do artigo 48, depreende-se em primeiro lugar o entendimento de
que tal benefício de aposentadoria por idade hibrida, só seria concedido a segurados
que na data da DER – Data da Entrada do Requerimento, comprovassem o efetivo
exercício de atividade rural.
54
Portanto, para ter direito a aposentadoria de forma híbrida, ou seja, com o
aproveitamento do tempo rural e urbano, o segurado deverá estar exercendo
atividade rural em regime de economia familiar no momento imediatamente anterior
ao requerimento do benefício.
A aposentadoria hibrida é uma modalidade de benefício previdenciário, no
qual o segurado que estiver exercendo atividade rural, poderá utilizar-se de períodos
de contribuição sob outras categorias, para implementar as condições exigidas pela
Lei 8213/91, para a concessão do beneficio de aposentadoria por idade.
Mas, para que o benefício seja concedido, é necessário que o trabalhador
rural cumpra com uma exigência. Diferentemente da aposentadoria por idade
concedida ao segurado especial, nos moldes do § 1º do art.48 da Lei 8213/91, cujos
limites de idade exigidos são reduzidos para 60 (sessenta) anos e 55 (cinqüenta e
cinco anos), respectivamente homens e mulheres, a aposentadoria híbrida será
concedida ao trabalhador rural, com o acréscimo de mais cinco anos de idade, ou
seja ao completarem 65 (sessenta e cinco anos) se homem e 60 (sessenta anos) se
mulher.
No mesmo sentido é o entendimento da jurisprudência majoritária:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE
URBANA. SEGURADA EMPREGADA. CTPS. AVERBAÇÃO.
ATIVIDADE RURAL. TRABALHADORA RURAL EM REGIME
DE ECONOMIA FAMILIAR E COMO PARCEIRA AGRÍCOLA.
AVERBAÇÃO DO TEMPO RURAL COMO SEGURADA
ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE, NOS TERMOS
DO § 3º DA LEI N.º 8.213/91, COM A REDAÇÃO DADA PELA
LEI N.º 11.718/2008. REQUISITOS PREENCHIDOS. TUTELA
ESPECÍFICA. 1. Havendo prova plena do labor urbano, através
de anotação idônea, constante da CTPS da autora, que goza
da presunção de veracidade juris tantum, deve ser reconhecido
o tempo de serviço prestado nos períodos a que se
refere.2. Restando demonstrado nos autos o exercício de labor
urbano como segurada empregada o mesmo deve ser
considerado para fins previdenciários. 3. O tempo de serviço
rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de
início de prova material, desde que complementado por prova
55
testemunhal idônea. Precedentes da Terceira Seção desta
Corte e do egrégio STJ. 4. A Lei n.º 11.718/08 instituiu a
possibilidade de outorga do benefício de aposentadoria por
idade ao trabalhador rural, com o implemento da carência
mediante o cômputo do tempo de serviço prestado em outras
categorias - como empregado urbano ou contribuinte
individual, v.g. - desde que haja o implemento da idade mínima
de 60 anos para mulher e 65 anos para homem. 5. Somado o
tempo de serviço rural, sem o correspondente suporte
contributivo, ao tempo de serviço urbano, a autora preenche a
carência e os demais requisitos da aposentadoria por idade
devida ao segurado, fazendo jus ao benefício a contar da data
do requerimento administrativo, nos termos da Lei n.º
11.718/2008. 6. Determina-se o cumprimento imediato do
acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o
benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental
que deverá ser efetivada mediante as atividades de
cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do
CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo
(sineintervallo). (TRF4, AC 0012633-50.2012.404.9999, Sexta
Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 25/09/2013)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO
E
PROCESSUAL
CIVIL.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. COISA JULGADA MATERIAL.
NÃO CONFIGURAÇÃO. TRABALHADORA RURAL COMO
BOIA-FRIA. CONDIÇÃO
DE
SEGURADA
ESPECIAL
COMPROVADA EM PARTE. AVERBAÇÃO DO TEMPO
RURAL COMO SEGURADA ESPECIAL. CONCESSÃO DE
APOSENTADORIA POR IDADE NOS TERMOS DOS §§ 3º E
4º DA LEI N.º 8.213/91, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI
N.º 11.718/2008. REQUISITOS PREENCHIDOS. MARCO
INICIAL. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Cuidando-se de prestações
de natureza continuada apenas as cotas devidas no quinquênio
anterior à propositura da ação é que são alcançadas pela
prescrição. Súmula n.º 85 do STJ. 2. Uma vez que a parte
autora não obteve provimento judicial quanto ao pedido de
outorga do benefício da Aposentadoria por Idade nos termos
da Lei n.º 11.718/2008, viável a apreciação da questão, não
havendo falar em afronta o princípio da coisa julgada
material. 3. Tratando-se de trabalhadora rural que desenvolveu
atividade na qualidade de bóia-fria, deve o pedido ser
analisado e interpretado de maneira sui generis, conforme
entendimento já sedimentado no âmbito do STJ e ratificado
pela recente decisão da sua Primeira Seção, no julgamento do
REsp n.º 1.321.493-PR, submetido à sistemática dos recursos
repetitivos, no sentido de que a apresentação de prova material
somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica
violação da Súmula n.º 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a
reduzida prova material for complementada por idônea e
robusta prova testemunhal. 4. Constando dos autos a prova
necessária a demonstrar o exercício de atividade rural, tal
56
tempo de serviço deve ser reconhecido e averbado, para fins
de futura ou diversa aposentadoria. 5. A Lei n.º 11.718/2008
instituiu a possibilidade de outorga do benefício de
aposentadoria por idade ao trabalhador rural, com o
implemento da carência mediante o cômputo do tempo de
serviço prestado em outras categorias - como empregado
urbano ou contribuinte individual, v.g. - desde que haja o
implemento da idade mínima de 60 anos para mulher e 65
anos para homem. 6.Quanto à data de início do benefício,
consoante o disposto no art. 49, inciso II, da Lei de Benefícios,
deve ser fixada na data de entrada do requerimento e, quando
este for inexistente, na data de ajuizamento da ação, porquanto
neste momento a parte autora manifestou seu interesse na
concessão do benefício. No caso, considerando que o
requerimento na via administrativa se deu em data bem anterior
à da publicação da Lei nº 11.718/2008, em 23-06-2008, o
marco inicial do benefício deve ser fixado na data do
ajuizamento da ação. 7. Somado o tempo de serviço rural
como
bóia-fria,
sem
o
correspondente
suporte
contributivo, ao tempo de serviço urbano, a autora
preenche a carência e os demais requisitos da
aposentadoria por idade devida à segurada, fazendo jus ao
benefício a contar da data do ajuizamento da ação, nos
termos da Lei n.º 11.718/2008. 8. Determina-se o
cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à
obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão
de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as
atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas
no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo
executivo autônomo (sineintervallo).
(TRF4, AC 001526027.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto
Silveira, D.E. 26/08/2013) (destacamos)
Portanto, é pacífico, o entendimento da jurisprudência, no sentido de que,
implementadas as condições exigidas pelo artigo 48 § 3º, a Previdência Social deve
conceder ao segurado a aposentadoria por idade. Este é o entendimento da
jurisprudência que a seguir transcrevemos:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE
RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE
ECONOMIA
FAMILIAR.
DESCONTINUIDADE.
APOSENTADORIA POR IDADE MISTA. POSSIBILIDADE. 1. A
comprovação do exercício de atividade rural deve ser efetuada
mediante início de prova material, complementada por prova
testemunhal idônea, nos moldes do art. 55, § 3º, da Lei
8.213/91. 2. Reconhece-se o direito à aposentadoria por idade
mista ou híbrida, conforme o art. 48, § 3º, da Lei 8.213/91, na
57
redação da Lei 11.718/08, se implementadas a idade mínima e
carência, considerado o tempo de serviço rural e o urbano.
(TRF4, APELREEX 5003147-54.2011.404.7003, Sexta Turma,
Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, juntado aos
autos em 27/09/2013)
Da mesma forma é o entendimento da doutrina, como podemos observar na
obra de Kertzman (2013,p.408):
Caso o trabalhador rural não consiga comprovar a atividade
rural no período de 180 meses imediatamente anterior ao
requerimento, mas satisfaça as condições para a
aposentadoria por idade, utilizando o tempo de atividade em
outra categoria de segurado, fará jus ao benefício ao completar
65 anos, se homem, e 60 anos se mulher.
Transcrevemos abaixo o entendimento de Jane Berwanjer, ao responder
sobre o instituto da aposentadoria híbrida, em entrevista ao jornal Diário Regional,
na coluna Toque Diário, edição de terça-feira, dia 03 de julho de 2012:
Diário Regional – Dra Jane Berwanger, o que é, exatamente,
aposentadoria híbrida?
Dra. Jane Berwanger – A Lei 11.718/08 garante tratamento
diferenciado para o agricultor familiar, não somente aquele
sobrevive na atividade agrícola, mas também o que produz
excedente. Foi uma grande modificação no conceito de
segurado especial, o que possibilitou a inclusão de milhares de
pessoas. A mesma lei, reconhecendo o grande êxodo rural que
provocou a migração de milhões de pessoas do campo para as
cidades, em busca de outras oportunidades, permitiu que o
segurado somasse, para fins de aposentadoria por idade,
tempo de atividade rural e urbana, que vem sendo chamada de
aposentadoria híbrida.
Ao ser instada, na mesma reportagem, a responder sobre o funcionamento
da aposentadoria híbrida, Jane Berwanjer, responde com certa irresignação, pelo
fato do INSS, não reconhecer o mesmo direito aos trabalhadores urbanos:
DR – Na prática, como funciona a aposentadoria híbrida?
58
Dra. Jane – O INSS vem reconhecendo, administrativamente,
que é possível somar períodos urbanos e rurais apenas
quando a atividade agrícola é a última, o que significa dizer que
somente quem está na atividade rural pode somar períodos
urbanos, mas não admite que a última atividade seja urbana.
Trata-se de uma interpretação restritiva e que não condiz com
a realidade. Tal entendimento afronta o princípio da isonomia:
se aos trabalhadores rurais é permitido computar períodos
urbanos, também deve ser permitido aos trabalhadores
urbanos somar os de atividade agrícola.
Neste mesmo sentido é o entendimento da jurisprudência
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO.
APOSENTADORIA
POR
IDADE. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. LEI Nº
11.718/2008. LEI 8.213, ART. 48, § 3º. TRABALHO RURAL E
TRABALHO URBANO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO A
SEGURADO
QUE
NÃO
ESTÁ
DESEMPENHANDO
ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO
DOS REQUISITOS. DESCONTINUIDADE. POSSIBILIDADE.
1. É devida a aposentadoria por idade mediante conjugação de
tempo rural e urbano durante o período aquisitivo do direito, a
teor do disposto na Lei nº 11.718, de 2008, que acrescentou §
3º ao art. 48 da Lei nº 8.213, de 1991, desde que cumprido o
requisito etário de 60 anos para mulher e de 65 anos para
homem. 2. Ao § 3º do artigo 48 da LB não pode ser
emprestada interpretação restritiva. Tratando-se de
trabalhador rural que migrou para a área urbana, o fato de
não estar desempenhando atividade rural por ocasião do
requerimento administrativo não pode servir de obstáculo
à concessão do benefício. A se entender assim, o
trabalhador seria prejudicado por passar contribuir, o que
seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural,
ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de
apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir
o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês
para fazer jus à aposentadoria por idade. 3. O que a
modificação legislativa permitiu foi, em rigor, para o caso
específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65
(sessenta e cinco) anos (mulher ou homem), o aproveitamento
do tempo rural para fins de carência, com a consideração de
salários-de-contribuição pelo valor mínimo no que toca ao
período rural. 4. Não há, à luz dos princípios da
universalidade e da uniformidade e equivalência dos
benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, e
bem assim do princípio da razoabilidade, como se negar a
aplicação do artigo 48, § 3º, da Lei 8.213/91, ao trabalhador
59
que exerceu atividade rural, mas no momento do
implemento do requisito etário (sessenta ou sessenta e
cinco anos), está desempenhando atividade urbana. 5. A
denominada aposentadoria mista ou híbrida, por exigir que o
segurado complete 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se
homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, em rigor é uma
aposentadoria de natureza urbana. Quando menos, para fins
de definição de regime deve ser equiparada à aposentadoria
urbana. Com efeito, a Constituição Federal, em seu artigo 201,
§ 7º, II, prevê a redução do requisito etário apenas para os
trabalhadores rurais. Exigidos 65 (sessenta e cinco) anos de
idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, a
aposentadoria mista é, pode-se dizer, subespécie da
aposentadoria urbana. (TRF4, AC 0010071-34.2013.404.9999,
Quinta Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E.
10/09/2013) (destacamos)
Conclui-se
portanto,
que
o
dispositivo
da
aposentadoria
híbrida,
proporcionou ao trabalhador rural um tratamento diferenciado, garantindo-lhe o
reconhecimento da possibilidade de, ao atingir a idade de 65(sessenta e cinco anos)
se homem e 60(sessenta anos) se mulher, requerer a aposentadoria por idade,
somando os períodos urbanos e rurais.
Certamente muito se discutirá a respeito desta nova modalidade de
benefício previdenciário. Há controvérsias, tanto nas vias administrativas, como nas
vias judiciais, quanto mais na construção doutrinária, cujo entendimento é diverso do
disponibilizado ao segurado, no momento de requerer sua aposentadoria, junto ao
INSS.
No entanto, o entendimento da doutrina e da jurisprudência, vai muito além,
firmando corrente, no sentido de estender tal benefício as classes de trabalhadores
urbanos, invocando como base de fundamentação desta teoria, o Princípio da
Uniformidade e Equivalência dos Benefícios e Serviços às Populações Urbanas e
Rurais, que será nosso próximo tema a ser abordado.
2.4 O
PRINCÍPIO
DA
UNIFORMIDADE
E
EQUIVALÊNCIA
DOS
BENEFÍCIOS E SERVIÇOS ÀS POPULAÇÕES URBANAS E RURAIS
60
A Lei Complementar 8213/91, criada a partir da Constituição Federal de
1988, rege-se por princípios. A Constituição Federal, em seu artigo 194, elenca os
objetivos a serem alcançados pela Seguridade Social, conforme a seguir
transcreveremos:
Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da
sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à
saúde, à previdência e à assistência social.
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei,
organizar a seguridade social, com base nos seguintes
objetivos:
I - universalidade da cobertura e do atendimento;
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais;
III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios
e serviços;
IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;
V - eqüidade na forma de participação no custeio;
VI - diversidade da base de financiamento;
VII - caráter democrático e descentralizado da administração,
mediante gestão quadripartite, com participação dos
trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do
Governo nos órgãos colegiados.
Os objetivos da Seguridade Social, instituídos pela Constituição Federal,
foram recepcionados pela Lei 8213/91, na forma de Princípios que passaram a reger
a Previdência Social, conforme prescreve o artigo 2º da lei previdenciária.
O objetivo do presente estudo, tem por finalidade, estudar o princípio
previdenciário elencado no inciso II do artigo 2º da Lei 8213/91, ou seja, o que trata
da “Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços à população urbana e
rural”.
A partir da promulgação da Constituição Federal/88, os benefícios pagos
pela Previdência Social, não podem mais ser inferiores ao valor do salário mínimo
nacional, fato que igualou os direitos das populações urbanas e rurais. Esta paridade
61
de direitos entre as populações urbanas e rurais, está alicerçada na redação do
princípio previdenciário supra, uma vez que encontra fundamentação legal na Lei
8213/91.
Ao escrever sobre os princípios previdenciários Ivan Kertzman, traça um
comentário, sobre os ganhos dos trabalhadores rurais a partir da Constituição
Federal de 1988, associando o principio da Uniformidade e equivalência dos
benefícios e serviços entre as populações urbanas e rurais ao fato dos agricultores
passarem a receber, como benefício, o valor de um salário mínimo mensal.
Veja o entendimento de Kertzman (2013,p.60):
No passado, a população rural obtinha benefícios de valor
inferior ao salário mínimo, pois contribuíam sobre bases
ínfimas. A partir da nova Carta, os benefícios recebidos pelos
rurais foram elevados ao patamar do salário mínimo, mesmo
inferiores a este valor. Isso fez com que a previdência social
passasse a custear benefícios aos segurados que não
contribuíram suficientemente para deles fazer jus.
O Autor, ao discorrer sobre tais ganhos adquiridos pela classe rural, traça
um comentário criticando o fato de o trabalhador rural receber um benefício da
previdência social, maior do que a média de contribuições efetuadas pelo segurado.
No entender do autor, estes gastos com os acréscimos pagos aos rurais,
estariam quebrando os cálculos atuariais da previdência social, gerando um
desequilíbrio em suas contas.
Transcrevemos a seguir o entendimento de Kertzman (2013.p.61),no qual
ele demonstra que a adequação do valor dos benefícios previdenciários ao valor de
um salário mínimo mensal trata-se de uma ação político assistencial:
Acreditamos ser justa a correlação do benefício à dimensão do
salário mínimo, porém, os gastos com o acréscimo no valor dos
benefícios dos rurais não deveriam ser incluídos no orçamento
securitário dentro das contas da Previdência Social, tendo em
vista que foi uma ação político-assistencial. A previdência
62
utiliza uma lógica financeira baseada em cálculos atuariais, que
não podem ser quebrada por decisões políticas.
Destaca ainda, o mesmo autor, que a constituição federal propiciou aos
trabalhadores rurais um tratamento diferenciado, quando da concessão do benefício
previdenciário, reduzindo em cinco anos a exigência da idade mínima para a
aposentadoria por idade, qualificando-o como segurado especial, com o objetivo de
adequar a prestação às características de cada atividade.
Transcrevemos a seguir o entendimento de Kertzman (2013,p.61):
Saliente-se que a própria Constituição Federal traz algumas
diferenças em relação aos benefícios e serviços previdenciários
das populações urbanas e rurais, sempre com o objetivo de
adequar a prestação às características de cada atividade.
Assim a própria Carta Magna, prevê que os trabalhadores
rurais podem aposentar-se por idade, com redução de 5 anos.
Desta forma, enquanto o trabalhador urbano se aposenta com
65 anos, se homem, e 60 se mulher, os rurais aposentam-se
com 60 anos, se homem, e 55 anos se mulher. Por outro lado,
os benefícios do segurado especial- espécie de trabalhador
rural, como veremos em capítulo próprio – são limitados a um
salário mínimo e independem de comprovação de contribuição.
A Constituição Federal, ao prever que nenhum benefício previdenciário,
possa ter valor inferior ao salário mínimo nacional, não tem por objetivo beneficiar
somente a classe rural. Os trabalhadores urbanos também são beneficiados por tal
dispositivo, uma vez que também possuem o mesmo direito.
Ao requerer sua aposentadoria por tempo de contribuição, o trabalhador
urbano deve cumprir com o requisito da carência imposta pela Lei 8213/91, artigo
142, ou seja 180 contribuições, e contar com 35 anos de contribuição, se homem, e
30 anos se mulher.
Ocorre que ao calcular o valor do beneficio a ser pago ao aposentado
urbano, a previdência social leva em conta a média das 80% maiores contribuições
efetuadas pelo segurado a partir de julho de 1994, incidindo ainda sobre o cálculo o
fator previdenciário, que se trata de uma equação que leva em conta a média de
63
contribuição, a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida do
segurado. Esse procedimento, muitas vezes, reduz o benefício a um valor inferior ao
salário mínimo nacional, mas que por força do princípio da uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços entre as populações urbanas e rurais, e
fundamentado no § 2º do artigo 201 da Constituição Federal que a seguir passamos
a transcrever, é elevado até atingir o valor do salário mínimo:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de
regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória,
observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
(...)
§ 2º Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição
ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal
inferior ao salário mínimo.
Para melhor entender o procedimento para o cálculo do valor do benefício
com a incidência do fator previdenciário deve-se observar a equação que a seguir
demonstraremos:
Valor Limitado ao Teto
Fator Previdenciário =
= 0,6102
onde,
Tc - Tempo de contribuição em anos = 35,0
Es - Expectativa de Sobrevida em anos = 28,8000
Id - Idade em anos = 51,1
a - alíquota = 0,31
Salário de Benefício = média X fator previdenciário = 724,00
onde,
média - Média dos 80% maiores salários de contribuição = 76.048,04
520,87
y - Número de meses, após a Publicação da Lei = 179
Renda Mensal Inicial = Salário de Benefício X coeficiente = 724,00
onde,
Coeficiente = 1,000
146 =
64
Veja que o cálculo do fator previdenciário é igual a 0,6102, fator este, que
reduz o valor do benefício, a menos de um salário mínimo nacional. Ocorre que por
força do princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços entre as
populações urbanas e rurais, e fundamentado no § 2º do artigo 201 da Constituição
Federal, que institui o salário mínimo nacional como o menor valor pago pelos
benefícios previdenciários, este valor é elevado até alcançar o teto mínimo, ou seja,
o valor do salário mínimo:
Este é o verdadeiro sentido do Princípio em estudo. Propiciar as populações
urbanas e rurais uma equivalência no momento de conceder o beneficio
previdenciário. Não é função do principio igualar os direitos de ambas as classes,
mas sim de fornecer a equivalência, levando em conta as particularidades de cada
classe. Os rurais, apesar de muitas vezes não contribuírem o necessário para
receber um salário mínimo de benefício, tem esse direito garantido pela constituição.
Do mesmo modo os trabalhadores urbanos, que quando atingidos pelo fator
previdenciário, tem seu benefício reduzido a valores inferiores ao salário mínimo,
mas, por força do mandamento constitucional em epígrafe, e amparados no principio
previdenciário supra, recebem da previdência um beneficio no valor de um salário
mínimo mensal.
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CONCLUSÃO
A colonização do continente americano, a partir do ano de 1500, foi marcada
por ações desenvolvidas através da exploração da mão de obra escrava. Esta
prática, que retirava dos trabalhadores qualquer possibilidade de reivindicar direitos
previdenciários perdurou por quase quatrocentos anos, gerando prejuízos que são
sentidos pelos trabalhadores rurais até os dias de hoje.
Somente após a proclamação da república e com as sucessivas constituições
promulgadas e outorgadas, é que os trabalhadores rurais foram aos poucos sendo
inseridos no sistema previdenciário brasileiro. O trabalhador rural sempre esteve
situado à margem do sistema, e sua trajetória sempre foi marcada pelo trabalho
informal e pela falta de uma legislação que proporcionasse alguma segurança e
regularização da atividade.
A partir da criação do FUNRURAL – Fundo de Assistência ao Trabalhador
Rural, é que os trabalhadores rurais passaram a receber um benefício com origem
previdenciária, mas que não ultrapassava o valor de meio salário mínimo nacional.
Este benefício somente era concedido à um membro do grupo familiar.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a seguridade social,
tornou-se uma das prioridades da República Federativa do Brasil, constando
expressamente em sua redação. O trabalhador rural, da mesma forma, recebeu um
tratamento diferenciado do Legislador Constituinte, obtendo através da Constituição
Federal, a qualidade de segurado especial, perante a Previdência Social. Este status
constitucional
conquistado
pelo
trabalhador
rural,
veio
ao
encontro
das
reivindicações da classe, inserindo os rurais no Regime Geral da Previdência Social.
66
A partir das Leis 8213 e 8212/91, a Previdência Social passou a ser regida
por princípios previdenciários, entre eles citamos o Princípio da Uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços entre as populações urbanas e rurais, cujo
teor regulou o sistema de concessão de benefícios, proporcionando aos
trabalhadores rurais um tratamento diferenciado. Desta forma conclui-se que a
Constituição Federal de 1988, possibilitou aos trabalhadores rurais, sua inserção no
sistema Previdenciário Brasileiro, com direitos equivalentes aos trabalhadores
urbanos, respeitadas as características de cada categoria.
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REFERÊNCIAS
BERWANJER, Jane, Jornal Diário Regional, Coluna Toque Diário, edição de
terça-feira, dia 03 de julho de 2012.
BRASIL.
Constituição.
Brasília:
Senado
Federal,
1988.
Disponível
em,
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>
Acessado em 06 de out. de 2014.
___.
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Disponível
em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8213cons.htm> Acessado em 24 de set. de
2014.
___.
Lei
8212/91.
Disponível
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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8212cons.htm> Acessado em 24 de set. de
2014
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68
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RUPRECHT Alfredo J. Direito da Seguridade Social. São Paulo: LTr Editora Ltda.
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