Utilização do cateter epidural em cadela portadora de bloqueio

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Utilização do cateter epidural em cadela portadora de bloqueio atrioventricular
de segundo grau Mobitz tipo II submetida a mastectomia total bilateral: relato
de caso
Use of epidural catheter in a bitch carrying Mobitz type II second-degree
atrioventricular block underwent total bilateral mastectomy: a case report
Liliane D. Medeiros1, Caroline M. Bastos2, Marcelo Abidu-Figueiredo2,
Carlos A. Santos-Sousa2, Rodrigo Mencalha1
2
1
Faculdade de Medicina Veterinária de Valença - FMVV, Valença, Rio de Janeiro, Brasil
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ- Seropédica, Rio de Janeiro, Brasil.
Resumo: A utilização de fármacos anestésicos tem sido associado a ocorrência de arritmias e complicações cardiovasculares. No
presente trabalho foi relatado o caso de uma cadela portadora de
bloqueio atrioventricular (BAV) de 2° grau Mobitz tipo II, detectado na avaliação cardiológica pré-cirúrgica, a qual foi submetida
ao procedimento de mastectomia total bilateral. Em decorrência da
urgência do procedimento optou-se pela realização da cirurgia de
forma imediata. A cadela foi anestesiada com 6mg/kg de propofol
e mantida sob vaporização de isoflurano. Ademais, foi inserido um
cateter epidural entre o espaço intervertebral lombossacro sendo
este posteriormente deslocado cranialmente até o dermátomo correspondente a terceira vértebra torácica. Através deste dispositivo foi administrando 2mg/kg de ropivacaína 1% e 0,1mg/kg de
morfina 1% de modo a conferir adequada analgesia e reduzir as
doses necessárias dos anestésicos gerais. Durante o procedimento
cirúrgico, a arritmia manteve-se presente, com frequência cardíaca
média de 37 batimentos por minuto, e arresponsiva a utilização
de parassimpatolíticos (sulfato de atropina). As variáveis pressão
arterial sistólica, diastólica e média se mantiveram dentro dos valores aceitáveis para a espécie ao longo de todo o ato cirúrgico. A
abordagem do paciente com distúrbio de condução AV é de suma
importância para o adequado planejamento anestésico-cirúrgico.
As técnicas de bloqueios locorregionais surgem como valiosas
ferramentas no que tange o controle da dor trans e pós-operatória,
estabilidade hemodinâmica e ajuste adequado do plano anestésico.
Palavras-chave: arritmias, cateter epidural, ropivacaína, anestesia
Summary: The use of anesthetics has been associated with the
occurrence of arrhythmias and cardiovascular complications. In
this paper we report the case of a bitch carrying a Mobitz type II
second-degree atrioventricular block (AVB) detected in the preoperative cardiac evaluation, which was submitted to total bilateral
mastectomy procedure. Due to the urgency of the procedure we
opted for the surgery immediately. The dog was anesthetized with
propofol 6mg/kg and maintained under isoflurane vaporization.
Moreover, an epidural catheter was inserted between the lumbosacral intervertebral space and this subsequently shifted cra*Correspondência: [email protected]
Centro de Ensino Superior de Valença - Faculdade de Medicina
Veterinária de Valença, CEP: 27600-000, Valença, Rio de Janeiro,
Brasil. Tel: + 55 (24) 2453-1888.
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nially to the third thoracic vertebra corresponding dermatome.
Through this device were administered 2mg/kg of ropivacaine
1% and 0,1 mg/kg of morphine 1% in order to give adequate
analgesia and reduces the general anesthetics doses. During
the surgical procedure, the arrhythmia remained present, with
a heart rate average of 37 beats per minute, and the use of parasympatholytic drugs (atropine) were unresponsive. The variables
systolic, diastolic and mean arterial blood pressure remained
in acceptable values throughout the surgery. The management
of patients with AV conduction disturbance is of summary importance for the appropriate anesthetic and surgical planning.
Locoregional anesthesia techniques emerge as valuable tools in
terms of trans and postoperative pain control, hemodynamic stability and adequate adjustment of anesthetic depth.
Keywords: arrhythmias, epidural catheter, ropivacaine, anesthesia
Introdução
O bloqueio cardíaco é um distúrbio da condução do
impulso que pode ser permanente ou transitório, secundário a um comprometimento anatômico ou funcional.
Pode ocorrer em qualquer local no qual impulsos elétricos sejam conduzidos, entretanto, é mais frequente
entre o nodo sinoatrial (SA) e o átrio (bloqueio do SA),
entre átrios e ventrículos (bloqueios atrioventriculares)
e dentro do ventrículo (bloqueios intraventriculares)
(Wogan et al., 1993; Barold, 2002).
O bloqueio atrioventricular (BAV) Mobitz tipo II é o
mais avançado grau de bloqueio que ocorre na junção
atrioventricular (AV), feixe de His, ou abaixo, podendo inclusive progredir até ao bloqueio cardíaco total.
As causas incluem fibrose idiopática, estenose hereditária do feixe de His, cardiopatia hipertrófica, infiltração neoplásica metástica e desequilíbrios eletrolíticos
(Wogan et al., 1993). Tal enfermidade é uma alteração
eletrocardiográfica significativamente grave, pois pode
Medeiros L. et al.
reduzir o débito cardíaco e inclusive culminar a morte
do indivíduo (Tomiyasu et al., 1999).
Na clínica de animais de companhia, a incidência
do BAV de segundo grau é relativamente alta, sendo a
exposição aos fármacos anestésicos, tal como o halotano, isoflurano, sevoflurano, desflurano uma das principais causas dessas intercorrências (Nunes et al., 2004;
Trujillo et al., 2005; Ferreira et al., 2008). Dessa forma, é determinante ao anestesista amplo conhecimento
da farmacologia e técnicas anestésicas de modo a ter o
completo entendimento sobre a dinâmica orgânica do
paciente a ser anestesiado.
Pacientes submetidos à anestesia geral, comumente
já apresentam alterações importantes em sua fisiologia,
portanto, podem sob efeitos de fármacos, desenvolverem distúrbios fisiológicos importantes e até incoercíveis, se não identificados e tratados a tempo. É nesse
sentido, que se torna possível afirmar que não se utiliza técnicas anestésicas, mesmo as mais simples, sem
que se acompanhem os sinais vitais do paciente, dando
assim uma maior segurança ao ato anestésico, pois,
permite identificar a tempo uma eventual alteração que
coloque em risco a vida do animal.
O acompanhamento da frequência e ritmo cardíacos
é de extrema importância na anestesia, principalmente em pacientes que dão entrada no centro cirúrgico
já com histórico de alterações de condução. Fato este
que atribui uma maior responsabilidade ao anestesista
que terá que estabelecer técnicas corretivas e a utilização de fármacos que não intensifiquem o problema
(Nunes, 2002).
Dentre os conceitos da moderna anestesia, o uso de
bloqueios locorregionais surgem como uma valiosa
ferramenta de modo a diminuir as doses dos anestésicos gerais, sabidamente depressores do sistema cardiovascular de maneira dose-dependente, portanto, o
adequado conhecimento das técnicas de bloqueios
anestésicos é de suma importância de modo a fornecer
analgesia, relaxamento muscular e minimizar os efeitos deletérios da anestesia geral.
O objetivo deste trabalho é relatar um caso da utilização do cateter epidural em uma cadela portadora de
bloqueio atrioventricular (BAV) de 2° grau Mobitz tipo
II, detectado na avaliação cardiológica pré-cirúrgica, a
qual foi submetida ao procedimento de mastectomia
total bilateral em função da presença de nódulos ulcerados.
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Relato de Caso
Uma cadela mestiça de seis anos de idade foi atendida pelo setor de oncologia de uma clinica veterinária
privada na cidade do Rio de Janeiro. As queixas principais relatadas pelos proprietários foram de emagrecimento progressivo e presença de tumores na região
mamária. Ao exame físico, observou-se intenso sangramento em diversos nódulos mamários em função
de áreas de ulcerações. Após realização dos exames
físico e complementares foi constatada a presença de
uma intensa leucocitose (92.800 cells/mm3) com desvio de neutrófilos nucleares a esquerda regenerativo e
presença de bradicardia sinusal com marca-passo migratório e bloqueio atrioventricular de 2° grau Mobitz
tipo II (Figura 1). Os demais parâmetros clínicos e
laboratoriais estavam dentro da faixa de normalidade
para a espécie.
Posteriormente, o animal em questão foi encaminhado para o serviço especializado em cirurgia geral
da clínica supracitada, e após elucidações quanto ao
procedimento cirúrgico-anestésico e assinatura do
consentimento esclarecido, a cadela foi submetida ao
procedimento de mastectomia total bilateral e ovariossalpingohisterectomia.
Após minuciosa avaliação pré-anestésica, foi optado
pelo profissional anestesiologista abolir a etapa de medicação pré-anestésica, pois, em função das alterações
prévias cardiovasculares, achou-se prudente evitar o
uso de mais fármacos depressores do sistema citado.
Portanto, após tricotomia, assepsia e punção venosa o
animal foi submetido à pré-oxigenação com oxigênio a
100% de modo a aumentar a PaO2 e consequentemente
as reservas orgânicas deste gás. Na sequência, procedeu-se a indução anestésica com 6mg/kg de propofol,
por via intravenosa, e, após relaxamento laríngeo e
abolição dos reflexos protetores o animal foi intubado com sonda endotraqueal com balonete adequada
ao porte físico. Dessa forma, a cadela foi conectada
ao circuito anestésico com reabsorvedor de gás carbônico e a manutenção anestésica foi realizada através
da oferta de isoflurano em oxigênio a 100%. O plano
anestésico foi regulado com base nos estágios de Guedel e a monitoração realizada através de um monitor
multiparamétrico com os módulos de eletrocardiografia, oximetria de pulso com pletismografia, pressão arterial não invasiva e temperatura.
Figura 1 - Traçado eletrocardiográfico registrado em derivação DII e amplitude 2N com velocidade de 25 mm/s registrado antes do
procedimento cirúrgico. As setas mostram o bloqueio atrioventricular de 2° grau Mobitz tipo II
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Medeiros L. et al.
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Figura 2 – A: Introdução da agulha espinhal; B: Mensuração do tamanho do cateter epidural; C: Introdução do cateter epidural
De modo a atender as exigências da moderna anestesia, foi procedida a realização do bloqueio do neuroeixo
através da inserção de um cateter epidural. Após tricotomia da região lombossacra e rigorosa assepsia, foi
introduzido um cateter no espaço epidural sendo este
dispositivo deslocado cranialmente até o dermátomo
correspondente à terceira vértebra torácica (Figura 2).
Tendo estabelecido essa via de administração, foi injetada uma solução de cloridrato de ropivacaína 1% (2mg/
kg) e sulfato de morfina 1% (0,1mg/kg) sem conservantes de modo a fornecer analgesia e adequado relaxamento muscular.
Durante todo o procedimento cirúrgico, a frequência
cardíaca se manteve entre 37±4 batimentos por minuto
com presença de bloqueio atrioventricular de 2 grau Mo-
bitz tipo II; a pressão arterial sistólica, diastólica e média oscilaram entre 95±7 mmHg, 63±6 mmHg e 73±3,
respectivamente. As variáveis saturações de oxigênio na
hemoglobina (SPO2), frequência respiratória e temperatura corporal se mantiveram em níveis fisiológicos durante o ato operatório. Vale ressaltar que a administração
de sulfato de atropina durante o procedimento anestésico-cirúrgico foi procedida de modo a tentar controlar a
bradicardia, entretanto, não houve êxito farmacológico.
Após o término do procedimento, o animal recebeu
alta e foi encaminhado ao serviço de internação o qual
permaneceu por 72 horas. Neste período, a cadela permaneceu com o cateter epidural para adequada analgesia, onde fora administrado 0,1 mg/kg de morfina 1%
(a cada 24 horas) (Figura 3). Ademais, foram realizados
Figura 3 - A: Administração pós-operatória de morfina por via epidural; B: Retirada do cateter no dia da alta médica.
Figura 4 - Traçado eletrocardiográfico registrado em derivação DII e amplitude 2N com velocidade de 25 mm/s registrado após o
procedimento cirúrgico. A seta mostra o bloqueio atrioventricular de 2° grau Mobitz tipo II.
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Medeiros L. et al.
eletrocardiogramas seriados de modo a acompanhar o
desenvolvimento da arritmia, e, em todos os exames, o
padrão arrítmico manteve-se presente (Figura 4).
Durante todo o período de internação o animal foi rigorosamente monitorado no que tange o controle da dor
através do uso da Escala Analgésica da Universidade
de Melbourne. Não houve necessidade de intervenção
analgésica ou alteração do protocolo em questão.
Foi solicitado ao proprietário do animal o acompanhamento cardiológico periódico, entretanto, até o presente
momento não houve retorno.
Discussão
O Bloqueio atrioventricular de segundo grau visível esta relacionado a uma diminuição da condução
atrioventricular (AV) (Barold e Herweg, 2012). A literatura contém numerosas definições de bloqueio AV
de segundo grau, especialmente o bloqueio AV Mobitz
tipo II de segundo grau. O uso difundido de inúmeras
definições do bloqueio do tipo II é o principal responsável por muitos problemas quanto ao diagnóstico desta condição clínica. Ainda segundo Barold e Herweg
(2012) o bloqueio AV de segundo grau tipo II descreve o que parece ser uma condução tudo-ou-nada sem
alterações visíveis no tempo de condução AV, antes e
após o impulso bloqueado. O diagnóstico do bloqueio
do tipo II requer uma taxa de despolarização sinusal
estável, pois, a ausência de desaceleração sinusal é um
critério importante neste bloqueio tendo em vista que
uma onda vagal pode causar desaceleração sinusal simultânea e bloqueio nodal AV, que pode se assemelhar
superficialmente ao bloqueio de tipo II. Estes dados
corroboram com os observados no presente relato de
caso o qual observou-se uma estabilidade sinusal em
todos os traçados observados.
Segundo Barold (2002), tal condição clínica é marcada pela presença de um prolongamento progressivo,
ciclo a ciclo, no tempo de condução atrioventricular,
até o aparecimento de uma despolarização atrial sem
resposta ventricular. O conjunto de ciclos com prolongamentos dos intervalos PR, até a perda da resposta ventricular, constitui os chamados períodos de
Wenckebach. O bloqueio atrioventricular de segundo
grau Mobitz tipo II, é identificado pela presença de
um padrão atrioventricular variável, porém, sempre
mostrando um tempo de condução atrioventricular fixo
nos batimentos que apresentam resposta ventricular. O
bloqueio da condução Mobitz II é, geralmente, intermitente e, normalmente ocorre dentro do nó atrioventricular. As anormalidades de condução AV podem ser causadas por tônus vagal excessivo, fármacos (digitálicos,
bloqueadores de canais de cálcio, anestésicos gerais,
agonistas alfa-2 adrenérgicos, etc) e doença intrínseca
do nodo AV e/ou do sistema de condução intraventricular. O bloqueio AV vagalmente mediado pode ser
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definido como um bloqueio AV paroxístico, localizado dentro do nó AV e associada à diminuição da taxa
de despolarização. Todos os tipos de bloqueio AV de
segundo grau podem estar presentes (Alboni et al.,
2013).
Na clínica de animais de companhia, a incidência do
BAV de segundo grau é relativamente alta (Saunders et
al., 2003; Voet et al., 2003) e segundo Schrope e Kelch
(2006) O implante de marcapasso deve ser fortemente
considerada em todos os cães com bloqueio persistente
de segundo ou terceiro grau independentemente de sinais clínicos evidentes. Se o tratamento médico for justificada, medicamentos vagolíticos pode ser a melhor
escolha. A exposição aos fármacos anestésicos parece
ser uma das causas mais importantes na instalação do
BAV em pacientes livre de enfermidades primárias nas
vias de condução elétrica do coração. (Nunes et al.,
2004; Trujillo et al., 2005; Ferreira et al., 2008).
Os anestésicos gerais estão entre os fármacos que
mais alteram a fisiologia do sistema cardiovascular
(Day e Muir, 1994; Voss et al., 2002). Dessa forma,
todo o planejamento anestésico-cirúrgico deve ser rigorosamente calculado de modo a evitar intercorrências no período trans ou pós-operatório. Neste procedimento, foi escolhido o propofol como fármaco indutor
da anestesia em função de sua menor influência nas
vias de condução cardíaca do coração do cão (Ikeno et
al., 1999; Warpechowski et al., 2010).
Com a inserção dos novos conceitos que norteiam
a anestesia moderna, a anestesia balanceada ou multimodal surge como uma grande alternativa para minimizar os efeitos deletérios dos anestésicos gerais
(Ilkiw, 1999; Tonner, 2003). No presente estudo preconizou-se atender os princípios da anestesia balanceada
a fim de evitar maiores repercussões sobre a dinâmica
orgânica do animal.
Os bloqueios locorregionais compõem o entendimento da moderna anestesia que tem como objetivo a
associação de fármacos e/ou técnicas de modo a explorar efeitos sinérgicos, reduzindo dessa forma a quantidade ofertada dos anestésicos gerais sabidamente
promotores de efeitos cardiodepressores. A anestesia
balanceada, portanto, está cada vez mais presente no
cotidiano do anestesiologista propiciando inquestionáveis benefícios como analgesia, relaxamento muscular,
hipnose e diminuição do tempo de recuperação anestésico-cirúrgico (Ilkiw, 1999; Tonner, 2003; Columbano
et al., 2012; Wakoff et al., 2013).
A anestesia epidural é a técnica de bloqueio locorregional mais utilizada na rotina médico-veterinária conferindo potente analgesia retroumbilical e relaxamento
muscular (Valverde, 2008). A partir desta consagrada
técnica, surgiu a possibilidade da implantação de um
dispositivo biocompatível no espaço epidural, de modo
que de forma contínua fosse estabelecido uma via importante para administração de fármacos.
A utilização do cateter epidural é uma das ferramentas mais eficazes para controle e alívio da dor pós-ope113
Medeiros L. et al.
ratória. O cateter epidural é um dispositivo de material
biocompatível, descartável, radiopaco, resistente e flexível, que se ajusta facilmente às particularidades anatômicas da coluna vertebral. A agulha apropriada para
a punção epidural é de ponta romba, com fundo cego,
dificultando dessa forma a canulação de vasos sanguíneos ou a perfuração da dura-máter. Em cães este cateter é introduzido por meio da punção com agulha de
Tuohy no um espaço intervertebral lombossacro e deslocado cranialmente até a região do dermátomo correspondente a área desejada. As principais indicações
da cateterização epidural se relacionam a cirurgias
cruentas que cursem com dor de magnitude moderada
a severa em região abdominal, torácica, membros pélvicos e torácicos (Swalander et al., 2000). No presente
relato de caso, optou-se pelo uso desta técnica em função do alto nível de dor relacionado ao procedimento
cirúrgico associado ao fato da alteração de condução
AV. Os profissionais envolvidos com o caso, visaram
minimizar ao máximo a exposição ao gás anestésico
de escolha (isoflurano) através do completo bloqueio
anestésico do neuroeixo. Durante todo o procedimento
os parâmetros cardiovasculares e respiratórios permaneceram dentro de padrões de normalidade conotando
dessa forma uma excelente estabilidade de plano anestésico.
O uso de analgésicos opióides por via epidural está
relacionado com a diminuição da concentração alveolar mínima dos anestésicos gerais (Muir et al., 2003;
Credie et al., 2010; Campagnol et al., 2012), dessa
forma, em associação ao uso da ropivacaína em nosso
estudo, foi possível a manutenção superficial do plano
anestésico.
As principais intercorrências observadas com a cateterização epidural se relacionam ao deslocamento indevido do cateter, obliteração, dobras e falha na técnica, e os efeitos adversos farmacológicos estão de acordo com a escolha das drogas em questão (Swalander
et al., 2000). Vale ressaltar que neste relato nenhuma
das intercorrências e ou efeitos adversos supracitados
foram observados.
O sulfato de atropina é uma droga parassimpatolítica
rotineiramente utilizada em âmbito cirúrgico (Winter
et al., 2011). No presente relato, utilizou-se este fármaco no período transoperatório de modo a tentar estabilizar o ritmo AV. Em cães com bloqueio AV de primeiro
grau ou segundo grau Mobitz tipo I, a falta de condução elétrica adequada através do nó AV é tipicamente
um resultado do aumento do tônus do parassimpático,
o que provoca um aumento na dispersão do grau de
refratariedade do AV. Após a administração de atropina
nestes cães, a condução AV tende a voltar ao normal.
Em cães portadores de bloqueio AV de segundo grau
Mobitz tipo II é mais frequentemente observarmos
causas associadas a doença do nodo AV orgânica e,
geralmente, estes não respondem à administração de
atropina (Moise, 2000). Tal como esperado, no presente relato, não observou-se nenhuma melhoria na con114
RPCV (2015) 110 (593-594) 110-115
dução ou ritmo cardíaco após a administração de 0,04
mg/kg de sulfato atropina por via intravenosa. Ainda
de acordo com a literatura, fármacos alternativos como
a teofilina os antagonistas de adenosina, e isoproterenol podem ser utilizados (Moise, 2000). Neste caso clínico, optou-se por não administrar outros fármacos de
eleição, pois, apesar da severa bradicardia e alteração
de ritmo AV a pressão arterial manteve-se dentro de
valores considerados satisfatórios.
Conclusão
Dessa forma, a abordagem do paciente com distúrbio de condução AV é de suma importância para o
adequado planejamento anestésico-cirúrgico. As técnicas de bloqueios locorregionais, como o bloqueio do
neuroeixo, surgem como valiosas ferramentas no que
tange o controle da dor trans e pós-operatória, estabilidade hemodinâmica e ajuste adequado do plano anestésico. Não obstante, vale ressaltar a refratariedade do
bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo II as drogas
parassimpatolíticas como o sulfato de atropina.
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