130 0.30.2 Ondas planas sinusoidais monocromáticas Para além de obedecerem às equações de onda (417) e (418), os campos eléctrico e magnético no vazio estão também sujeitos às equações de Maxwell, o que se traduz em caracterı́sticas especı́ficas das ondas electromagnéticas. No sentido de estudarmos estas caracterı́sticas, consideremos que o campo eléctrico é descrito no vazio por uma onda plana sinusoidal monocromática, a propagar-se na direcção positiva do eixo dos xx, tendo a seguinte forma: E(x, t) = E0 ej(k x−ω t+φ0 ) = (E0x êx + E0y êy + E0z êz )ej(k x−ω t+φ0 ) (420) O campo magnético associado a esta onda está indissociavelmente ligado ao campo eléctrico através da lei de Ampère-Maxwell e da lei de Faraday. A variação temporal do campo eléctrico gera o campo magnético e vice-versa. Esperamos pois que o campo magnético associado à mesma onda plana seja também descrito por uma onda plana propagando-se na mesma direcção com a mesma frequência. Sendo também a mesma velocidade de propagação, o comprimento de onda será idêntico: B(x, t) = B0 ej(k x−ω t+φ1 ) = (B0x êx + B0y êy + B0z êz )ej(k x−ω t+φ1 ) (421) Estamos para já a admitir que o campo magnético possa não estar em fase com o campo eléctrico, mas rapidamente verificaremos que, no vazio (não é o caso geral), o campo magnético se propaga em fase com o campo eléctrico. No vazio, a densidade de carga é nula, ρ = 0, pelo que a lei de Gauss implica ∇·E = 0. Isto implica, para a onda plana em questão: ∇ · E = 0 ⇔ j k E0x ej(k x−ω t+φ0 ) = 0 ⇔ E0x = 0 (422) A componente do campo eléctrico paralela à direcção de propagação é assim nula, sendo o o campo eléctrico perpendicular à direcção de propagação. O mesmo decorre para o campo magnético, da equação ∇ · B = 0. A onda electromagnética associada é pois uma onda transversa, quer no que diz respeito ao campo eléctrico, quer no que diz respeito ao campo magnético. Recorrendo à lei de Faraday, podemos calcular o campo magnético associado a esta onda: ∇×E=− ∂B ∂B ⇔ (−E0z j k êy + E0y j k êy ) ej(k x−ω t+φ0 ) = − ∂t ∂t (423) 0.30. ONDAS ELECTROMAGNÉTICAS NO VAZIO 131 Daqui resultam equações para By e Bz : ∂By = E0z j k ej(k x−ω t+φ0 ) ∂t (424) ∂Bz = −E0y j k ej(k x−ω t+φ0 ) ∂t (425) Estas equações têm como solução (desprezando as constantes de integração, por corresponderem a soluções triviais, não ondulatórias, da equação de onda): k 1 By = − E0z ej(k x−ω t+φ0 ) = − E0z ej(k x−ω t+φ0 ) ω c Bz = k 1 E0y ej(k x−ω t+φ0 ) = E0y ej(k x−ω t+φ0 ) ω c (426) (427) em que se atendeu a ω/k = c, no vazio. O campo magnético assim obtido está pois em fase com o campo eléctrico. Além disso, é-lhe perpendicular, conforme se pode verificar rapidamente calculando o produto vectorial E · B: E · B = Ey By + Ez Bz = 0 (428) Para uma onda electromagnética no vazio, o campo eléctrico, o campo magnético e a direcção de propagação (neste caso êx ) formam assim um conjunto de vectores ortogonais, que podemos relacionar através do produto vectorial: B= 1 (êx × E) c (429) Em resumo, podemos sintetizar as propriedades das ondas electromagnéticas que se propagam no vazio: • são ondas transversas, em que o campo eléctrico e o campo magnético são perpendiculares à direcção de propagação k̂; • o campo eléctrico e o campo magnético são mutuamente perpendiculares e formam, com a direcção de propagação k̂, um conjunto ordenado de acordo com a regra da mo direita, na ordem E → B → k̂; 132 • o módulo do campo magnético e o módulo do campo eléctrico relacionam-se por: 1 |B| = |E| c (430) Costuma associar-se à direcção de propagação k̂ o número de onda k, resultando o vector k = k k̂. Por outro lado, sendo as ondas electromagnéticas ondas transversas, são portanto polarizáveis. Na presença de ondas electromagnéticas polarizadas, costuma definir-se o vector de polarização n̂, paralelo ao plano de polarização do campo eléctrico. As ondas electromagnéticas (planas, sinusoidais, monocromáticas) no vazio podem ser reescritas de forma mais geral em função de k e de n̂: E(r, t) = E0 ej(k·r−ω t+φ0 ) n̂ B(r, t) = 0.31 E0 j(k·r−ω t+φ0 ) e (k̂ × n̂) c (431) (432) Propagação de energia pelo campo electromagnético No estudo separado dos campos eléctrico e magnético, tivémos oportunidade de encontrar duas expressões particularmente poderosas que exprimem a energia necessária para criar estes campos. Por um lado, o trabalho necessário para dispôr a distribuição de carga responsável pelo campo eléctrico E é: 0 WE = 2 2 E dτ = uE dτ (433) e o trabalho necessário para estabelecer a distribuição de corrente responsável pelo campo magnético B é: 1 WB = 2µ0 2 B dτ = uB dτ (434) Estas expressões são ainda válidas na presença simultânea (e concomitante) dos dois campos, designados então campo electromagnético, sendo a energia armazenada no campo dada pela expressão conjunta: 0.31. PROPAGAÇÃO DE ENERGIA PELO CAMPO ELECTROMAGNÉTICO WEB = 0 2 1 2 B dτ = uEB dτ E + 2 2µ0 133 (435) No decurso da propagação do campo electromagnético, o campo pode realizar trabalho nas cargas existentes no espaço percorrido pelo campo. Obviamente, este trabalho será realizado à custa da energia do próprio campo, de acordo com a lei da conservação da energia. O trabalho realizado pelo campo electromagnético num elemento de carga dq, que sofre um deslocamento dl por acção da força de Lorentz FL , é: dW = FL · dl = dq (E + v × B) · vdt = dqE · vdt (436) em que, como sabemos, apenas o campo eléctrico realiza trabalho na carga. Se assumirmos que este elemento de carga se encontra distribuído uniformemente no volume dτ , sendo dq = ρdτ , podemos reescrever então este trabalho em função da densidade de corrente J associada ao movimento da carga dq = ρdτ , atendendo à relação J = ρv: dW = E · dqvdt = E · ρdτ vdt = E · Jdτ dt (437) A potência trasmitida pelo campo á ao elemento de carga é assim: dW = E · Jdτ dt (438) E a potência transmitida a todo o volume ocupado simultaneamente pelo campo e pelas cargas é: dW = dt 0.31.1 E · Jdτ (439) τ Teorema de Poynting A expressão (439) traduz o facto de a transferência de trabalho para as cargas pelo campo electromagnético ser feita pelo campo eléctrico. No entanto, tal tem consequncias na própria distribuição de correntes e, logo, no campo magnético. A expressão (439)pode assim ser reescrita de forma mais conveniente em função de ambos os campos. Recorrendo à lei de Ampère-Maxwell, temos: J= ∇×B ∂E − 0 µ0 ∂t (440) 134 pelo que dW = dt τ ∇×B ∂E E· − 0 E · dτ µ0 ∂t (441) Podemos agora usar a relação E · (∇ × B) = −∇ · (E × B) + B · (∇ × E), conhecida do cálculo vectorial, em conjunto com a lei de Faraday ∇ × E = −∂B/∂t, e reescrever a potência como: dW =− dt τ ∇ · (E × B) 1 ∂B ∂E + B· + 0 E · µ0 µ0 ∂t ∂t dτ (442) Atendendo ainda a que E· 1 ∂E2 ∂E = ∂t 2 ∂t (443) B· ∂B 1 ∂B2 = ∂t 2 ∂t (444) e fazendo uso do teorema de Gauss para converter o integral da divergência no volume τ num fluxo através da superfı́cie fechada A que delimita esse volume: ∇ · (E × B) dτ = (E × B) · dA (445) 1 2 0 2 B + E dτ 2µ0 2 (446) 1 2 0 2 dW 1 B + E dτ = − − (E × B) · dA 2µ0 2 dt µ0 A (447) τ A obtemos: dW 1 =− dt µ0 d (E × B) · dA − dt A τ ou, rearranjando os termos: d dt τ Este resultado, conhecido por teorema de Poynting, informa-nos que a taxa de variação da energia armazenada no campo electromagnético num dado volume τ diminui devido 0.31. PROPAGAÇÃO DE ENERGIA PELO CAMPO ELECTROMAGNÉTICO 135 a dois motivos: (i) à potência dW/dt tranferida pelo campo electromagnético para as cargas contidas no volume τ ; (ii) ao fluxo de energia por unidade de tempo que atravessa a superfı́cie A que demilita o volume τ . O teorema de Poynting mais não é, portanto, do que a lei da conservação da energia para o campo electromagnético. Podemos também identificar a energia transportada pelo campo electromagnético, por unidade de área e de tempo, com o vector S= 1 (E × B) = E × H µ0 (448) Podemos ainda reescrever o teorema de Poynting na forma local. Para tal, é conveniente definirmos uma densidade de energia cinética uM associada à densidade de carga, escrevendo: dW = dt uM dτ (449) τ O teorema de Poynting fica então d dt τ (uM 1 + uEB ) dτ = − µ0 (E × B) · dA ⇔ A τ 1 ∂ (uM + uEB ) dτ = − ∂t µ0 ∇ · (E × B) dτ tau (450) onde fizémos mais uma vez uso do teorema de Gauss. Obtemos assim a expressão local: E×B ∂u ∂ (uM + uEB ) = −∇ · ⇔∇·S=− ∂t µ0 ∂t (451) Esta é também uma equação de continuidade (tal como a que já utilizámos abundamentemente para a conservação da carga eléctrica, ∇ · J = −∂ρ/∂t), que traduz agora a conservação de energia, expressa através da ”corrente de energia” S e da respectiva densidade (mecânica e electromagnética) em cada ponto, u = uM + uEB . Refira-se ainda, sem o demonstrar e por uma questão de completude, que o campo electromagnético, tal como transporta energia, transporta também momento linear, sendo o momento linear transportado por unidade de tempo e de superfı́cie, P, expresso também recorrendo ao vector de Poynting: P = µ0 0 S (452) 136 0.31.2 Energia transportada por ondas electromagnéticas Consideremos uma onda electromagnética plana monocromática polarizada paralelamente ao eixo dos yy descrita por: E = E0 ej(k x−ω t) êy E0 j(k x−ω t) B= e êz c (453) Podemos verificar facilmente que as densidades de energia associadas ao campo eléctrico e ao campo magnético são iguais: uE uB 0 2 0 E02 2j(k x−ω t) E = e = 2 2 1 2 E02 2j(k x−ω t) 0 E02 2j(k x−ω t) e = B = e = 2µ0 2µ0 c2 2 (454) O vector de Poynting é neste caso: S= E2 1 E × B = 0 e2j(k x−ω t) êx = c 0 E02 e2j(k x−ω t) êx µ0 µ0 c (455) E a sua amplitude corresponde pois ao produto da velocidade de propagação pela densidade de energia do campo. Relembre-se que, na representação complexa que estamos a utilizar, apenas a parte real das quantidades representadas é que tem significado fı́sico. Isto é, as densidades de energia, o vector de Poynting reais são: u = uE + uB = 0 E02 cos(2 k x − 2 ω t) (456) S = c 0 E02 cos(2 k x − 2 ω t)êx (457) A densidade de momento linear transportada pela onda é: P = µ0 0 S = 0 E02 cos(2 k x − 2 ω t)êx c (458) 0.31. PROPAGAÇÃO DE ENERGIA PELO CAMPO ELECTROMAGNÉTICO 137 No caso de ondas electromagnéticas de comprimento de onda suficientemente reduzido (logo frequência elevada) em relação às dimensões do sistema em causa, é frequente tomarse apenas o valor médio quadrático das funções trigonométricas 32 , isto é, fazer a substituição: cos(2 k x − 2 ω t) → cos(2 k x − 2 ω t) = 1 2 (459) resultando u = uE + uB = 0 E02 2 c 0 E02 S = = c u 2 P = µ0 0 S = 32 O valor médio é nulo... S u 0 E02 = = c2 c 2c (460) (461) (462)