Avaliação e tratamento psicológico do fumante: uma

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Mudanças – Psicologia da Saúde,
22 (2), Jul.-Dez. 2014, 33-41p
Copyright 2014 pelo Instituto Metodista de
Ensino Superior CGC 44.351.146/0001-57
Avaliação e tratamento psicológico do fumante:
uma revisão bibliográfica
Alex Andrade Mesquita*
Resumo
O tabagismo é a principal causa evitável de morte no mundo e a dependência de nicotina é o transtorno mental mais
prevalente na população. Os objetivos do estudo foram apresentar e discutir a avaliação comportamental do fumante
e os tratamentos psicoterápicos para o tabagismo com base empírica. Realizou-se uma revisão de literatura em artigos e livros da área de psicologia e saúde. A avaliação comportamental do fumante, observando-se os antecedentes
e consequentes do ato de fumar, é fundamental para escolha das técnicas corretas de tratamento. Os tratamentos
psicoterápicos recomendados são os de base cognitivo-comportamental e analítico-comportamental. Estes podem
ser breves, como o aconselhamento, ou mais extensos, utilizando um pacote de técnicas, e focar no momento da
parada, antes ou depois dela. Os primeiros métodos de tratamento do fumante foram os baseados no condicionamento aversivo, seguidos pelo esvanecimento de nicotina. A prevenção da recaída reúne um conjunto de estratégias
a fim de evitar que o fumante volte a fumar após sua parada. A entrevista motivacional é um instrumento que pode
auxiliar na tomada de decisão de parar de fumar. Mais recente, a terapia de aceitação e compromisso, com enfoque
analítico-comportamental, tem mostrado resultados animadores no tratamento do fumante. A psicoterapia também
pode ser associada à farmacoterapia, obtendo-se um aumento da eficácia das duas intervenções. Conclui-se que os
métodos psicoterápicos são eficazes no tratamento do tabagismo, mas ainda pouco utilizados, e que uma avaliação
comportamental do fumante é necessária antes de se aplicar qualquer técnica.
Palavras-chave: revisão bibliográfica; avaliação; tratamento; tabagismo.
The Assessment and Psychotherapeutic Treatment of Smokers: a Literature Review
Abstract
Smoking is the leading preventable cause of death worldwide and nicotine dependence is the most prevalent mental
disorder in the population. The objectives of this study were to present and discuss the behavioral assessment of
the smoker and the empirically-based psychotherapeutic treatments for smoking. We conducted a literature review
of papers and books on psychology and health. The smoker’s behavioral evaluation, observing the antecedents and
consequences of smoking, is essential to choose the correct treatment techniques. The recommended psychotherapeutic treatments are cognitive-behavioral and analytical behavioral ones. These may be brief, such as counseling, or
more extensive, using a group of techniques and focusing on the smoke stopping time: before or after it. The first
smoking treatment methods were based on aversive conditioning, followed by nicotine fading. The relapse prevention
brings together a set of strategies to prevent the smoker to restart smoking after having stopped. The motivational
interview is a tool that can assist in the decision to quit smoking. More recently, the acceptance and commitment
therapy with an analytical behavioral approach has shown promising results in the treatment of smokers. Psychotherapy
may also be associated with pharmacotherapy, increasing the effectiveness of both interventions. We conclude that
psychotherapeutic methods are effective in the treatment of smoking, but still little used, and the smoker’s behavioral
evaluation is necessary before applying any technique.
Keywords: literature review; evaluation; treatment; smoking.
* Professor departamento de psicologia da UFMA – contato: [email protected].
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Alex Andrade Mesquita
O tabagismo é a principal causa de morte evitável no mundo, e a dependência de nicotina, o transtorno mental mais prevalente na população (American Psychiatric Association, 2010). Ele é diretamente
responsável por 30% das mortes por câncer (boca,
faringe, laringe, esôfago, vesícula, rins, pâncreas), 90%
das mortes por câncer de pulmão, 25% das mortes
por doença coronariana, 85% das mortes por doença
pulmonar obstrutiva crônica e 25% das mortes por
doença cerebrovascular. Podem-se observar ainda outras
doenças relacionadas ao uso do cigarro, como aneurisma
arterial, trombose vascular, úlcera do aparelho digestivo,
infecções respiratórias e impotência sexual no homem
(Ministério da Saúde, 2001).
Apesar desta verificação, não é comum que
psicólogos tratarem fumantes. Muitos acreditam que o
tabagismo é apenas um sintoma de uma causa latente,
outros simplesmente desconhecem o assunto, pois raramente são procurados para tal finalidade. Pode-se dizer
ainda que, nos cursos de graduação de Psicologia do
Brasil, os estudantes poucas vezes são expostos ao tema1.
Poucos fumantes param de fumar com psicoterapia,
alguns utilizam medicação e a maioria para por conta
própria, sem qualquer tratamento. Stead, Lancaster e
Perera (2009) dizem que a psicoterapia pode auxiliar na
manutenção da abstinência e na redução dos riscos de
voltar a fumar. Sendo assim, os resultados no longo prazo
são importantes para o fumante.
O Ministério da Saúde, em parceria com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), mantém um programa
nacional de tratamento do fumante, presente em diversas cidades do País, em todos os estados. O tratamento
ofertado utiliza a “abordagem cognitivo-comportamental”
associada à medicação, que inclui a reposição de nicotina
e bupropiona, quando disponíveis nos estabelecimentos
de saúde. Para compor uma equipe de tratamento do fumante, o Ministério da Saúde exige médico, enfermeiro,
assistente social e farmacêutico. Pode-se verificar que o
psicólogo não faz parte da equipe básica, sendo incluído
na equipe quando a unidade de saúde tem este profissional (Brasil, 2001).
Os tratamentos psicoterápicos com verificação empírica e recomendados são a terapia cognitivo-comportamental e a terapia analítico-comportamental, sendo a
primeira a mais difundida (Fiori, Bailey & Cohen, 1996;
Le Foll, Cheinin, Rostoker, & Largrue, 2005; Hayes, Pistorello & Biglan, 2008). No Brasil, a pesquisa é incipiente
1
Obs.: esta é uma conclusão pessoal advinda da prática.
Advances in Health Psychology, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
nesta área; existem apenas relatos de tratamentos em serviços públicos de saúde, onde, geralmente, a psicoterapia
de grupo é associada à farmacoterapia. Encontraram-se
apenas recomendações realizadas por médicos e psicólogos sobre como usar a terapia cognitivo-comportamental
e sobre a eficácia de algumas técnicas e programas. Em
geral, estas recomendações são traduções de relatos de
pesquisas e manuais realizados no exterior.
Fato bem diferente é verificado quando se procura
na literatura internacional, na qual existe uma considerável
gama de pesquisas sobre psicoterapia do tabagismo. Os
primeiros estudos datam do início da década de 1960.
Diversas revisões e meta-análises podem ser encontradas (Lipsey & Wilson, 1993; Fiori et al., 1996; Le Foll
et al., 2005). Observa-se, porém, um caráter altamente
tecnicista dos tratamentos ofertados, em que o paciente
é submetido a um pacote de técnicas predeterminadas,
sem uma avaliação mais individualizada do caso e de suas
necessidades pessoais.
Desta forma, os objetivos do estudo são: apresentar
e discutir a avaliação comportamental do fumante e os
métodos psicoterápicos tradicionais e recentes de tratamento do fumante.
Método
Foi efetuada uma revisão de literatura em livros da
área de medicina e psicologia sobre adições e tabagismo
disponíveis na biblioteca da Universidade Federal do
Maranhão e utilizados em cursos da área de saúde para
ensino do tema. Além disto, foi feita uma busca de artigos nas bases de dados virtuais Scielo, Lilacs, Science
direct, Cochrane, Ouvid, Psycarticles e NCBI, publicados
até setembro de 2013. Inicialmente, procedeu-se a uma
busca por meta-análises e revisões sobre tratamento do
tabagismo. Foram utilizadas as palavras-chave “smoking
cessation metanalysis”, sendo encontrados 16 artigos.
Posteriormente, verificaram-se os tratamentos psicoterápicos mais eficazes, destacados conforme a análise
estática, e uma nova busca foi feita nas mesmas bases de
dados com os termos: “avaliação funcional do tabagismo”, “terapia cognitivo-comportamental do tabagismo”,
“tratamento do tabagismo”, “prevenção da recaída tabagismo”, “entrevista motivacional”, “tabagismo e terapia
de aceitação” e “compromisso tabagismo”. Em inglês
foram usados os termos: “functional analysis smoking”,
“cognitive-behavioral therapy smoking”, “smoking cessation methods”, “smoking cessation treatment”, “relapse
prevention smoking”, “motivational interview smoking”
e “acceptance and commitment therapy smoking”. Foram
Escala Dimensional de Sintomas Obsessivo-Compulsivos de Yale-Brown.
identificados nove livros e 414 resumos. Excluídos os artigos repetidos, restaram 231 resumos. Após uma leitura
inicial dos resumos dos artigos e índice dos livros, foram
selecionados aqueles que possibilitassem a construção
de um referencial teórico-explicativo sobre o tema e que
apresentassem verificação experimental dos métodos de
tratamento do fumante.
Resultados
Avaliação do fumante
Os tratamentos psicoterápicos mais utilizados para
o tabagismo são os comportamentais, sendo a avaliação
funcional seu instrumento de diagnóstico. “Análise funcional pode ser definida como a identificação de relações
de dependência entre eventos, ou de regularidades na
relação entre variáveis dependentes e independentes”
(Chiesa, 1994, p. 133). Skinner (2003) diz que os eventos
externos são as variáveis independentes que atuam sobre
o comportamento. A análise está voltada para o reconhecimento da múltipla e complexa rede de determinações
de instâncias de comportamento, representada pela ação
em diferentes níveis (filogênese, ontogênese e cultura) das
consequências do comportamento sobre a probabilidade
de respostas futuras da mesma classe.
O princípio selecionista apresenta-se como um
princípio explicativo derivado da investigação do comportamento operante (Neno, 2003). Explicações simplistas
sobre as causas de fumar são comuns no senso comum
e, algumas vezes, até no meio científico. Deve-se considerar que as causas de qualquer comportamento estão na
interação da história filogenética, ontogenética e cultural
do indivíduo.
O fumante, quando fuma, evita os mal-estares da
abstinência, como taquicardia, dores de cabeça, tontura
e ansiedade. Esta operação de retirada de um estímulo
aversivo, que aumenta a probabilidade futura de emissão
da reposta, chama-se reforço negativo (SR). Mas o fumante também sente prazer, tem melhor concentração,
disposição, estado de alerta. Esta operação de introdução
de um estímulo que aumenta a probabilidade futura de
emissão da resposta chama-se reforço positivo (SR+)
(Catania, 1999). Assim, ao fumar, além de evitar o mal-estar, o fumante sente-se melhor e consegue realizar
tarefas com mais disposição. Portanto, as causas do fumo
estão em suas consequências.
O comportamento de fumar pode, muitas vezes, estar sob controle de operações estabelecedoras em virtude
da privação de nicotina, mas nem sempre. O ambiente
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onde ocorre o fumo fica condicionado ao cigarro; assim,
por exemplo, se uma pessoa fuma após tomar café, o
café pode passar a ser um “gatilho” para fumar. Diz-se
que este evento tornou-se um estímulo discriminativo,
pois sua presença é uma ocasião para fumar, além de ser
pareado com a sensação de prazer, tornando-se, também,
um estímulo condicionado. Desta forma, um fumante
regular fuma muitas vezes, não apenas para aliviar a
abstinência, mas também porque existem vários estímulos
discriminativos que ocasionam o fumo, sendo que estes
podem encontrar-se no ambiente externo, como bebidas,
comidas, locais e situações específicas, ou no interno,
como pensamentos ou sentimentos (Axerold, 1991).
Mundin e Bueno (2006) apresentam a avaliação de
um fumante na qual questões do seu dia a dia, como
ficar sozinho, a esposa não limpar o quintal e a falta dos
pedreiros em sua obra provocam ansiedade e pensamentos negativos que funcionam como ocasião para fumar.
Antes de se iniciar qualquer intervenção, deve-se
conduzir uma avaliação do comportamento de fumar,
considerando sua função. Por exemplo, se um indivíduo
usa o cigarro para “espantar o tédio” de ficar sozinho e
para de fumar, se outra forma de obter esta estimulação
não for ensinada, ou atividades substitutas não forem
encontradas, ele poderá voltar a fumar ou engajar-se em
outro comportamento prejudicial, como beber álcool
ou comer em excesso, por exemplo. O cigarro pode ter
múltiplas funções na vida de um fumante; uma pessoa
pode sentir-se alerta para trabalhar apenas se fumar;
outra pode sentir-se estimulada a interagir com as pessoas; outra, para melhorar o humor deprimido e realizar
atividades, e, ainda, algumas pessoas podem obter reforçadores a partir da atenção social de ser um fumante,
como ser considerado um “revoltado”, alguém que não
segue as regras. Desta forma, algumas vezes, parar de
fumar pode provocar um desajuste comportamental e
apenas uma avaliação molecular e molar cuidadosa pode
prevenir esta situação.
Um breve roteiro do que deve ser avaliado inclui: a
história de instalação do comportamento e seu desenvolvimento, incluindo melhoras e pioras; as propriedades da
repostas de fumar, neste caso em especial, a frequência
e a latência entre as repostas; verificar se outras repostas
estão sob o mesmo controle que a resposta de fumar,
isto é, se o fumo faz parte de uma classe mais ampla de
repostas; identificar os antecedentes, incluindo operações
estabelecedoras e estímulos discriminativos. Neste caso,
é importante saber quando se fuma, onde, em que situações, que pensamentos e sentimentos ocorrem anteriorMudanças – Psicologia da Saúde, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
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Alex Andrade Mesquita
mente ao fumar; É importante observar, ainda, quais são
os reforçadores positivos e negativos do comportamento
de fumar, e, por fim; verificar se existem repostas alternativas disponíveis no repertório do fumante que tenham
equivalência funcional ao comportamento a ser extinto.
Intervenções psicoterápicas breves
O aconselhamento com base cognitivo-comportamental é descrito como uma alternativa psicoterápica para
o tratamento do fumante. Este pode ser mínimo (menos
que 3 minutos), moderado (de 3 a 10 minutos) ou intenso
(mais que 10 minutos). O conteúdo do aconselhamento
seria: 1) perguntar e avaliar informações básicas sobre
consumo de cigarros, tempo de fumante e tentativas
anteriores de tentar parar de fumar; 2) aconselhar a interrupção e preparar o fumante para ela, sugerindo métodos
para tal finalidade; e 3) acompanhar o indivíduo que opte
por parar de fumar (Brasil, 2001). Uma forma alternativa
de realizar o aconselhamento é por meio de telefone,
por materiais escritos de autoajuda e, mais recentemente,
por internet (Chen & Yeh, 2006). Por mais simples que
seja o aconselhamento, ele pode resultar em aumento da
abstinência, sendo que o presencial tem se apresentado
mais eficaz (Presman, Carneiro & Gigliotti, 2005). Um
estudo comparando um grupo de fumantes que recebeu
aconselhamento com um grupo controle que não recebeu
verificou que 49% dos fumantes aconselhados tentaram
parar de fumar; já no grupo controle, apenas 24% tentaram (Kreuter, Chedda & Bull, 2000).
Métodos psicoterápicos tradicionais para o
tratamento do tabagismo
Os primeiros métodos a serem utilizados no tratamento do tabagismo surgiram na década de 1960, após
relatório de governo americano alertando para os problemas relacionados ao tabaco (Lando, 1975).
As primeiras tentativas utilizaram métodos aversivos
baseados nos princípios da saciação e do contracondicionamento aversivo. Nestes procedimentos, o fumante é
solicitado a fumar o maior número de cigarros possíveis
até se sentir mal (náuseas, vômito, sudorese, tontura, dor
de cabeça etc.), ou o fumo era associado a um estímulo
aversivo, como um leve choque elétrico ou substância
malcheirosa. O mais conhecido método era o “fumar
rápido”, que consistia em o fumante tragar, de seis em
seis segundos (em média o intervalo entre tragadas de
um fumante é entre vinte e trinta segundos), três cigarros
seguidamente, parar por cinco minutos e repetir o processo por três vezes, todos os dias, durante uma semana.
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Lichtenstein e Rodrigues (1977) verificaram que a taxa de
abstinência após o tratamento foi de cerca de 90%; outros
autores também reportam altas taxas de abstinência em
curto prazo (Lando, 1975). Porém, estudos mais recentes
foram encontrando taxas de abstinência cada vez mais
baixas. Um dos grandes problemas do “fumar rápido”
era o risco de o fumante apresentar um ataque cardíaco,
caso fosse um cardiopata, além do intenso mal-estar
provocado pelo processo (Hajek & Stead, 2001, 2011).
Com a finalidade de tornar o procedimento mais seguro,
foram desenvolvidos métodos como o smokeholding. Neste
procedimento, o fumante deveria tragar e segurar a fumaça do cigarro na boca por cerca de vinte segundos, até
sentir o gosto ruim na boca. O procedimento era repetido
várias vezes, durante vários dias, até o fumante parar de
fumar. Taxas de abstinência de curto prazo de cerca de
85% foram encontradas com o smokeholding (Becona &
Garcia, 1993). Porém, Hajek e Stead (2011) alertam que
os estudos sobre métodos aversivos apresentam muitos
problemas metodológicos, sendo necessária cautela em
sua interpretação.
Estímulos aversivos, como leves choques elétricos,
barulhos fortes e até mesmo vapores malcheirosos também foram utilizados como métodos de cessação do
fumo, porém sem eficácia (Grimald & Lichtenstein, 1969).
Os métodos aversivos são polêmicos em qualquer
tipo de tratamento; devem ser utilizados apenas em último caso e quando os benefícios superam bastante os
malefícios. Os métodos aversivos de controle do comportamento geram: 1) reações de fuga-esquiva; 2) reações
emocionais adversas; 3) não ensinam o comportamento
correto e 4) não se mantém na ausência do estímulo
punidor (Skinner, 2003).
Além de questões éticas, os procedimentos aversivos
não eram capazes de manter a abstinência por um longo
período de tempo. Desta forma, observavam-se altas taxas de recaída e volta do uso do cigarro (Hajek & Stead,
2011; Hajek, Stead, West, Jarvis, & Lancaster, 2009).
Com o declínio dos métodos aversivos surgiu o
“nicotine fading”, ou esvanecimento de nicotina, que
consistia na redução gradual de ingestão de nicotina por
parte do fumante (não confundir com a redução gradual
do número de cigarros). Esta técnica consistia em reduzir
o teor de nicotina dos cigarros em três ou quatro etapas,
30%, 60% e 90% ou 25%, 50%, 75% e 90%; desta forma,
o fumante trocava a marca de cigarros com alto teor para
outras de baixo teor. Acreditava-se que, no momento de
parar de fumar, o tabagista sentiria menos abstinência,
facilitando a parada. Estudos iniciais, como o de Fox
Escala Dimensional de Sintomas Obsessivo-Compulsivos de Yale-Brown.
e Brown (1979), apresentaram taxas de abstinência de
cerca de 90% após o tratamento. Porém, estudos posteriores não confirmaram a eficácia do método (Fiori et
al., 1996). O maior problema era a compensação, isto
é, para manter a homeostase e evitar os sintomas da
abstinência, o fumante compensa a redução do teor de
nicotina do cigarro fumando mais cigarros ou tragando
mais profundamente. Outro problema apresentado, como
nos métodos aversivos, era a manutenção da abstinência
por um longo período. Desta forma, o fading foi utilizado muitas vezes conjuntamente com outras técnicas da
terapia comportamental e cognitiva (Brown, Lichtenstein,
McIntyre & Harrington-Kostur 1984).
O nicotine fading ainda sobrevive nos dias atuais; seu
princípio está presente nos filtros ou piteiras que reduzem
gradualmente os níveis de nicotina e alcatrão ingeridos
pelo fumante.
Com o advento das medicações, na década de 1980,
e sua ampla divulgação, como os repositores de nicotina
– chiclete, adesivo, inalador e spray –, os métodos psicoterápicos tradicionais aversivos e de fading utilizados para
cessação de fumo foram praticamente abandonados, dando lugar a novos métodos que pudessem ser conciliados
com a farmacoterapia.
Prevenção da recaída
Marlatt e Donavan (2009) desenvolveram um pacote de técnicas cognitivo-comportamentais para auxiliar
na manutenção da abstinência. Baseados sobretudo na
teoria da aprendizagem social de Bandura, os autores
mudaram os rumos do tratamento das adições. Até então
havia muita preocupação com a “parada”, a cessação do
fumo, porém não havia métodos eficazes de manutenção
da abstinência. Foi verificado que o mais difícil não era
parar de fumar, beber ou usar drogas, mas, sim, manter-se longe delas.
Os autores pregavam a avaliação da autoeficácia e
da discriminação das situações de risco de recaída. O fumante, alcoolista ou drogadito deveria planejar sua parada;
para tal, deveria ter consciência das situações em que usa
a droga e ter métodos e estratégias de enfrentamento
delas. Segundo Knapp e Bertolle (1994), a prevenção da
recaída é um conjunto de habilidades e modificação do
estilo de vida de uma pessoa para evitar uma recaída.
Uma mudança de paradigma ocorre: o drogadito
deixa de ser um viciado ou doente que espera, como
“paciente”, que o médico o cure, e assume um papel ativo
em sua recuperação. Sua recuperação depende principalmente de seu esforço.
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Uma situação de risco é aquela em que a substância é usada habitualmente e fica condicionada ao uso da
droga. Trata-se de lugares, pessoas, comidas, bebidas, situações de medo, ansiedade, tédio ou até mesmo horários
específicos. Estes eventos tornam-se “gatilhos” para o uso
da droga. Pensando em drogas como cocaína, heroína,
crack ou mesmo álcool, o fumante apresenta um número
bem maior de situações de risco que usuários de outras
drogas, pois fumantes habituais podem fumar até quarenta cigarros por dia, o que seria difícil de ocorrer com
outras drogas (Knapp & Bertolle, 1994). Para Marllat e
Donavan (2009), quando um usuário de droga apresenta
estratégias de enfrentamento adequadas diante de uma
situação de risco, ocorre um aumento da autoeficácia, isto
é, a sensação de poder se controlar diante da situação, ou
a expectativa de sucesso diante dela. Desta forma, ocorre
diminuição da probabilidade de uso da substância.
Este tipo de intervenção deve ser planejado, preferencialmente enquanto o sujeito está fazendo uso da
droga. Podemos comparar este processo a uma viagem
planejada e antecipar possíveis problemas. Como descrito
anteriormente, a identificação de situações de risco de recaída é o primeiro passo. Pode-se solicitar que o fumante
anote a hora, o local e a situação que o levou a fumar.
Knapp e Bertolle (1994) dividem as situações de risco
em seis grupos: 1) lidar com emoções negativas; 2) lidar
com situações difíceis; 3) lidar com diversão e prazer; 4)
lidar com problemas físicos e psicológicos; 5) lidar com
o hábito de usar a droga; e 6) lidar com o tratamento.
Posteriormente, para cada situação de risco deve-se
ter uma estratégia de enfrentamento. Segue um exemplo.
Situação de risco: fumar após tomar café.
Respostas de enfrentamento:
1. substituir o café por chá ou suco nos primeiros
dias pós-cessação do fumo;
2. chupar uma bala de menta ou chiclete de nicotina;
3. realizar uma atividade após tomar café.
Algumas situações funcionam como gatilhos ou estímulos discriminativos para o consumo da droga, outras
funcionam como situações inibitórias do consumo. Por
exemplo, a prática de exercícios físicos é incompatível
com fumar: dificilmente se observa uma pessoa correndo,
fazendo musculação ou jogando futebol e, ao mesmo
tempo, fumando. Um bom plano de tratamento deve
reduzir as situações gatilho e aumentar as inibitórias,
principalmente nos primeiros dias após a parada (Marllat
& Donavan, 2009).
Mudanças – Psicologia da Saúde, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
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Alex Andrade Mesquita
Técnicas de reestruturação cognitiva são frequentemente utilizadas para reduzir as crenças disfuncionais do
usuário de droga (Beck, 2013). Uma crença muito comum
do fumante é a de que ele sentirá um enorme mal-estar
após a cessação, e este mal-estar nunca vai passar. As
técnicas cognitivas funcionam tanto na instrução do
paciente sobre o que vai acontecer após parar de fumar,
beber ou usar drogas na redução de estados de ansiedade
e depressão que possam surgir.
A solução de problemas é outra técnica bastante
empregada na manutenção da abstinência. Consiste em
ensinar o sujeito a encontrar alternativas para resolver
situações problemáticas. Em geral, solicita-se que o paciente discrimine adequadamente o problema, levante
diversas alternativas para sua solução, faça uma análise das
vantagens e desvantagens de cada alternativa e decida-se
pela mais vantajosa (Caballo, 1999).
O treino de habilidades sociais constitui uma ferramenta bastante utilizada nos programas de prevenção da
recaída. Muitas situações, como recusar bebidas, drogas
ou cigarros de amigos, dificuldades de relacionamento
interpessoal, inassertividade ou agressividade, podem
gerar estados psicológicos de ansiedade, raiva ou medo e
funcionar como gatilhos para o uso da substância (Marllat
& Donavan, 2009; Marlatt & Gordon, 1993).
Três estudos de meta-análise com adictos e fumantes, um com 24 experimentos controlados, outro, com 26,
e outro com 56, verificaram que a prevenção da recaída
foi superior na condição de controle sem intervenção
na manutenção da abstinência (Hajek et al., 2009; Irvin,
Bowers, Dunn & Wang, 1999; Carroll, 1996).
Os programas de prevenção da recaída revolucionaram o tratamento de usuários de drogas, alcoolistas e
tabagistas, colocando a responsabilidade da mudança no
próprio sujeito, dando atenção, não apenas à cessação da
droga, mas também à sua manutenção no longo prazo.
Para tal finalidade, emprega diversas técnicas cognitivo-comportamentais, avaliações cognitivas e análises funcionais. Sua eficácia é amplamente reconhecida, inclusive
sendo parte integrante do tratamento do tabagismo oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil (Brasil,
2001). Outros transtornos mentais têm a prevenção da
recaída como parte integrante de seu tratamento, como o
transtorno obsessivo-compulsivo (Cordiolli, 2004).
Entrevista motivacional
Miller e Rollnick (2001), criadores da entrevista
motivacional, definem-na como um meio particular de
ajudar pessoas a reconhecer e fazer algo a respeito de
Advances in Health Psychology, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
seus problemas. É particularmente útil com pessoas que
relutam em mudar e que estão ambivalentes. Fumantes,
alcoolistas e usuário de drogas frequentemente estão ambivalentes quanto ao uso da substância: “querem e não
querem usar”, estão em situação de conflito. Sabem dos
riscos e das consequências negativas do uso da substância,
mas sentem-se apegados a ela. Pode-se dizer, em outras
palavras, que, no curto prazo, o uso da substância lhes é
prazeroso ou funcional, mas não no longo prazo. O uso
de álcool, drogas e tabaco era considerado pela igreja e
grande parte da sociedade como uma fraqueza moral ou
pecado. Mais recentemente, o modelo médico impôs o
rótulo de viciado ou doente ao adicto, e o primeiro passo
para sua cura é a aceitação de que é um doente. Este tipo
de abordagem ainda é predominante no meio médico
e utilizada nos Alcoólicos Anônimos e seus derivados,
como o Narcóticos Anônimos. Este tipo de tratamento
de confrontação, segundo Miller e Rollnick (2001), não
é eficaz no tratamento das adições, mas, pelo contrário,
é contraproducente. Obrigar um drogado ou alcoólatra
a aceitar sua doença provoca minimização ou negação
imediata do problema. Os autores pregam que a abordagem do usuário de qualquer droga deve ser empática,
colaborativa e que leve o próprio sujeito a chegar à conclusão sobre seus problemas. A entrevista motivacional é
um procedimento breve, com poucas sessões de duração,
em geral, de uma a quatro. Nela, o terapeuta identifica
a ambivalência e estimula a motivação e o compromisso
de mudança, vencendo as resistências.
Miller e Rollnick (2001) dizem que uma abordagem
motivadora deve oferecer orientação sobre os males e
consequências do uso da droga, remover as barreiras que
possam estar impedindo a mudança, proporcionar escolhas sobre parar de usar a droga e o tipo de intervenção
a ser utilizada, diminuir o aspecto desejável do comportamento, isto é os benefícios de continuar utilizando
a substância, praticar a empatia, proporcionar feedback,
estabelecer objetivos e ajudar ativamente o paciente.
Prochasca e Di Clemente (1984), após estudarem
tabagistas, desenvolveram um modelo sobre estágios de
mudança que uma pessoa passa durante o curso de resolução de um problema. A Tabela 1 descreve o tipo de
intervenção necessária em cada estágio.
Escala Dimensional de Sintomas Obsessivo-Compulsivos de Yale-Brown.
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Quadro 1 - Os estágios da mudança e as tarefas do terapeuta
ESTÁGIO DO CLIENTE
Pré-ponderação
Ponderação
Determinação
Ação
Manutenção
Recaída
TAREFAS MOTIVACIONAIS DO TERAPEUTA
Levantar dúvidas – aumentar a percepção do paciente sobre os riscos e problemas do
comportamento atual.
“Inclinar a balança” – evocar razões para mudança, os riscos de não mudar; fortalecer a
autossuficiência do paciente para mudar de comportamento.
Ajudar o paciente a determinar a melhor linha de ação a ser seguida na busca da mudança.
Ajudar o paciente a dar passos rumo à mudança.
Ajudar o paciente a identificar e a utilizar estratégias de prevenção da recaída.
Ajudar o paciente a renovar os processos de ponderação, determinação e ação, sem que
este fique imobilizado ou desmoralizado em razão de recaídas.
Fonte: Miller e Rollnick (2001)
Existem cinco princípios básicos na entrevista motivacional: expressar empatia; desenvolver a discrepância, isto é, promover ou aumentar as dúvidas sobre o
comportamento problemático do paciente, levando o
próprio sujeito a argumentar a favor de sua mudança;
evitar a argumentação, ou seja, não forçar o paciente a
aceitar rótulos ou confrontá-lo, dizendo o que deve fazer;
acompanhar a resistência, o que significa oferecer opções
ao paciente e levá-lo a ter insights e promover a autoeficácia, levando o paciente a acreditar em sua capacidade
de sucesso e enfatizando sua responsabilidade pessoal no
processo (Miller & Rollnick, 2001; Colby et al., 1998).
Diversos estudos de revisão e meta-análise fornecem suporte para a entrevista motivacional. Heckman,
Egleston & Hofmann (2009) analisaram 31 estudos, com
9.485 participantes, e verificaram que os que passaram
pela entrevista motivacional aumentaram suas chances
de parar de fumar quando comparados com a condição
controle, com aconselhamento ou sem intervenção.
Outras meta-análises também apresentam resultados
semelhantes, confirmando a eficácia da entrevista motivacional em fumantes (Lai, Cahill, Qin, & Tang, 2010;
Colby et al., 1998).
A entrevista motivacional é uma técnica breve,
que busca incentivar a mudança de comportamento e
fortalecer o compromisso com a abstinência. É utilizada
quando o sujeito encontra-se em dúvida ou ambivalente
em relação à mudança. Tem apresentado bons resultados
e se mostrado um valioso instrumento no tratamento das
adições, dentre elas do tabagismo.
Terapia de aceitação e compromisso
Esta forma de psicoterapia baseia-se na terapia
analítico-comportamental. Foi desenvolvida tendo como
base a teoria de quadros relacionais e difundiu-se no
Brasil nos últimos anos. Pode ser considerada a “terceira
onda” de terapias comportamentais (Hayes, 2004). A terapia de aceitação e compromisso (ACT) visa aumentar o
autocontrole comportamental desenvolvendo habilidades
de aceitar as experiências internas e recontextualizar as
cognições problemáticas. Clientes são ensinados a fazer
escolhas comportamentais com base em objetivos ligados aos valores da vida, e não com base na procura de
modificar certos pensamentos ou sentimentos. Associa
processos de aceitação e atenção a processos de compromisso e mudança de comportamento para a criação de
uma flexibilidade psicológica (Hayes, 2004). Esta forma
de psicoterapia apresenta uma forte base empírica e pode
ser aplicada em diversas áreas, como tratamento do transtorno obsessivo-compulsivo, psicose, depressão, síndrome
de burnout, ansiedade, dor, tricotilomania, autoescoriações,
uso de drogas, autolesões, preconceito e estigma, entre
outras (Hayes, Pistorello & Biglan, 2008).
Gifford et al. (2004) realizaram um experimento
com 76 fumantes, divididos em dois grupos: um que
utilizou reposição de nicotina e um que realizou sete
sessões individuais de ACT. As técnicas utilizadas foram:
1) identificação das situações “gatilho” internas e externas
que faziam com que o fumante fumasse; 2) identificação
de situações de tentativas de controle e esquiva de experiências internas ligadas ao fumo, com o objetivo de
aumentar a aceitação do problema pelo sujeito; 3) identificação das metas a serem alcançadas e das barreiras
que impedem sua obtenção, tais como sentimentos, pensamentos ou sensações; 4) levar o participante a aceitar
seus sentimentos e pensamentos aversivos e interpretá-los não como ameaça, mas como esquiva, levando ao
aumento do desconforto, e não sua redução; 5) aumento
Mudanças – Psicologia da Saúde, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
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Alex Andrade Mesquita
da consciência das situações que promovem a flexibilidade
comportamental e cognitiva; 6) exposição gradual ao mal-estar da abstinência e aos estímulos internos aversivos
com o objetivo de evitar a fuga destes eventos aversivos
e promover respostas alternativas de controle; 7) promoção do aumento gradual da latência entre o estímulo que
evocava o fumo e o ato de fumar; 8) exercícios de identificação e mudança dos “gatilhos” cognitivos. O paciente
deveria identificar as racionalizações que poderiam levá-lo
a continuar fumando; 9) levantamento de respostas alternativas ao comportamento de fumar. Após o tratamento,
35% dos participantes do grupo ACT pararam de fumar,
contra 33% do grupo reposição de nicotina, porém esta
diferença não foi significativa. Após seis meses, 23% dos
participantes do grupo ACT estavam sem fumar, contra
11% do grupo reposição de nicotina, e, após um ano, as
taxas de abstinência foram respectivamente 35% contra
15%. Pode-se observar ampla diferença a favor do grupo tratado com psicoterapia após seis meses e um ano,
confirmando a efetividade da ACT.
Gifford et al. (2011) trataram 303 fumantes, divididos em dois grupos: um recebeu bupropiona e outro
recebeu bupropiona e passou por sessões de ACT. Após
um ano, 17,5% das pessoas tratadas com bupropiona
estava sem fumar, contra 31,6% das pessoas tratadas com
bupropiona e ACT.
Outros estudos utilizando ACT obtiveram sucesso
no tratamento do fumante, fornecendo evidências adicionais sobre a efetividade da ACT e sua possibilidade de
combinação com a farmacoterapia (Bricker, Wyszynski,
Comstock, & Heffner, 2013; Powers, Vörding, & Emmelkamp, 2009).
Tratamentos combinados
Na prática clínica, observa-se, com frequência, a
combinação de farmacoterapia (reposição de nicotina,
bupropiona, vareniclina), que são medicamentos de primeira linha, com um pacote de técnicas psicoterápicas
(Cahill, Perera & Lancaster, 2013; Fochhi & Braun, 2005).
A união destes métodos pode promover aumento da abstinência. Segundo Mesquita (2013), após quatro sessões de
terapia cognitivo-comportamental associada à reposição
de nicotina e bupropiona, 83,5% dos 109 participantes
avaliados pararam de fumar. Fatos semelhantes são citados por Haggsträm, Chatkin, Cavalet-Blanco, Rodin e
Fritscher (2001), Azevedo et al. (2009), Meier, Vannuchi
e Secco (2011) e Sales, Figueiredo, Oliveira, & Castro
(2006). Medições no longo prazo confirmam a eficácia
dos tratamentos combinados, como Garcia-Vera (2004),
Advances in Health Psychology, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
que observou que, após cinco anos, dos 142 pacientes
tratados com terapia comportamental e reposição de
nicotina, 58,5% continuavam sem fumar.
Existem diversas recomendações, no Brasil e no exterior, para que o tratamento do fumante seja realizado com
a associação entre psicoterapia e farmacoterapia (Brasil,
2001; Lipsey & Wilson, 1993; Fiori et al., 1996; Le Foll et
al., 2005; Balbani & Montovani, 2005). Desta forma, pode-se obter a vantagem em curto prazo da farmacoterapia,
com redução do desejo de fumar, e redução da síndrome
da abstinência, com o aumento da motivação para parar e
a manutenção da abstinência promovida pela psicoterapia.
Conclusão
Novos medicamentos têm surgido para o tratamento
do tabagismo. O mais recente, em fase de testes, é uma
vacina antitabaco. Com exceção da ACT, ainda pouco
difundida neste meio, quase nada foi feito de inovador
em relação às psicoterapias nos últimos vinte anos. A
psicoterapia do tabagismo teve seu age durante as décadas de 1970 e 1980 e, apesar de ser recomendada por
manuais como o do Ministério da Saúde (Brasil, 2001)
e ser oferecida pela rede pública no Brasil, atinge um
número reduzido de pessoas. Parte da responsabilidade
por esta situação é do desconhecimento de profissionais
de saúde e do público sobre esta modalidade de tratamento, e parte se deve à cultura “medicalista” de nossa
sociedade, na qual a medicação é vista como única forma
de tratamento para problemas de comportamento. Também se pode destacar a demora e a dificuldade de um
processo psicoterapêutico quando comparado à ingestão
de um remédio.
Conforme verificado, a psicoterapia pode aumentar
a probabilidade de o fumante parar de fumar e manter-se abstinente. Porém, antes da aplicação de técnicas ou
protocolos, deve-se conduzir uma avaliação individual do
comportamento de fumar para oferecer um tratamento
adequado para cada fumante.
Mesmo intervenções breves, que podem durar poucos minutos, como perguntar se fuma, se tem vontade de
parar, advertir sobre os problemas ocasionados (evitando
ameaças), fornecer alternativas para parar de fumar e
apoiar o paciente em sua decisão podem promover aumento da motivação para parar de fumar.
É rara a condução de pesquisas experimentais sobre
o tema no País. Profissionais da área de saúde também
pouco sabem sobre como conduzir o tratamento do fumante. Espera-se que relatos como o apresentado possam
estimular o interesse pelo tema.
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submetido em: 29-01-2014
Aceito em: 10-10-2014
Mudanças – Psicologia da Saúde, 22 (2) 33-41, Jul.-Dez., 2014
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