O PRAZER DE CHEGAR À VELHICE Lenice Pimentel1 O envelhecimento não necessariamente coincide com enfermidades neurológicas, e, muitas vezes, é uma fase de vida muitíssima produtiva. Com efeito, muitos velhos(as) ativos conservam o gosto pela vida, preservando os interesses e suas faculdades. As pesquisas mostram que é possível viver muito sem perder a qualidade. Atualmente se presta grande atenção as possíveis causas genéticas e moleculares para explicar este aspecto e cada vez se sobressai mais a importância de uma atividade intelectual e um compromisso vital na idade avançada. A neurologia, hoje, não foca apenas a ausência de enfermidade ou a manutenção da funcionalidade, mas, também, o potencial necessário para que o idoso(a) possa usufruir os seus anos com qualidade. A função cerebral não é como a cardíaca ou a renal, que procedem de forma mecânica e quase uniforme. No cérebro, na mente, pelo contrário, não há nada puro automatismo pois este órgão intenta constantemente – em todos os níveis: desde a simples percepção até a elaboração de um pensamento filosófico – categorizar e re-categorizar o mundo, compreender e dar significado a própria experiência. Envelhecer se trata, pois, de viver uma verdadeira vida, na qual a experiência nunca é uniforme, em constante mudança requerendo cada vez mais uma integração compreensiva. Não é suficiente que o cérebro-mente se limite a funcionar automaticamente como o faz o coração: tem que aventurar-se e prosseguir durante toda a vida. Assim, do ponto de vista da saúde, o cérebro exige um olhar especial para este século que assiste ao envelhecimento de sua população. Se o sujeito quer permanecer são, tem que seguir ativo até o final: perguntando, indagando, julgando, explorando, experimentando e amando. Embora estas atividades ou estado de ânimo não sejam captadas pela moderna tecnologia ou pela avaliação neuropsicológica, são determinantes para o estado de saúde do cérebro e permitem o seu desenvolvimento durante toda a vida. Esta é a perspectiva de Gerald Edelman que entende o cérebromente como um organismo sempre ativo, capaz de reconsiderar as suas próprias 1 Lenice Pimentel, psicóloga clínica, tem doutorado em Literatura, pela UFAL, e é mestranda da Universidade de Lisboa – “Psicologia da Educação - Aprendizagem e Desenvolvimento no Adulto e no Idoso”. [email protected] atividades ao longo da vida, e que nessa evolução pode construir suas próprias interpretações e significados. Em termos comparativos, o modelo de desenvolvimento da personalidade de E. Erikson é compatível com este modelo neurobiológico. Para E. Erikson, a cada idade corresponde uma fase precisa da mente. Fases que parecem manifestar-se em cada cultura e tem, portanto, caráter universal no ciclo de vida humana. Com o aumento da perspectiva de vida à última fase descrita por E. Erikson – integridade ou desespero -, alguns estudiosos têm acrescentado uma nova fase: esperança e saber ou esterilidade. Nesta fase o velho(a) vive ou deteriora. Se está em comunicação com o mundo, dará sentido a sua vida. Se se centra em suas limitações, sentirá que esta carece de sentido. A grande pergunta que fica, a partir dos estudos de Oliver Sacks, neurólogo, é a de saber se há uma base neural específica que acompanha o modelo desenvolvimental de Erikson. Sabemos que a aprendizagem é possível ao longo da vida, aí incluso o envelhecimento e a enfermidade cerebral, e podemos estar seguros de que durante toda a existência continuam produzindo-se outros processos a um nível ainda mais profundo. Alcançar a integridade, descrita por Erikson, a plenitude, deve implicar, com efeito, a integração de grande quantidade de informação, a síntese da experiência individual de toda a vida, associada às perspectivas do indivíduo em relação a si próprio. Tal processo é totalmente individual e não pode ser prescrito ou ensinado. Assim, em nosso século, como nos anteriores, o que importa é não perder o entusiasmo e a capacidade de maravilhar-se com o mundo e os seus desafios. Muitos são os trabalhos realizados com a maturidade e a sabedoria, própria dessa fase de vida, liberam as pessoas da rotina, da pressão de seus pares, da necessidade de ser competitivos, de fazer carreira e de fazer fortuna.