ASTRONOMIA COMO TEMA GERADOR DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MATEMÁTICOS PARA ALUNOS SURDOS – UM PROJETO EM CONSTRUÇÃO Tina Andreoella – [email protected] Talita Pilati Alves – [email protected] Nadia Sanzovo – [email protected] Aline Brancalione – [email protected] Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR Rodovia do Conhecimento, km 01 Pato Branco - PR Elaine Beilner – [email protected] Secretaria de Estadual da Educação, Colégio Estadual Castro Alves Centro de Atendimento Especializado Área da Surdez - CAES Rua Itacolomi, 1550 Pato Branco - PR Resumo: Este artigo apresenta o projeto intitulado ASTRONOMIA COMO TEMA GERADOR DE ENSINO E DE APRENDIZAGEM DE CONCEITOS MATEMÁTICOS PARA ALUNOS SURDOS – UM PROJETO EM CONSTRUÇÃO, que tem como objetivo trabalhar conceitos matemáticos para alunos surdos através de atividades motivadoras de Astronomia. Utilizando atividades práticas em Astronomia se pretende despertar o gosto pelas Ciências “duras” e com isso trabalhar conceitos matemáticos de difícil compreensão para alunos surdos. Paralelo aos conceitos matemáticos, explorar as atividades para desenvolver, interdisciplinarmente, conceitos de Ciências e Física como eclipses, movimentos da Terra, Fases da Lua, trajetória de planetas e outros. As atividades serão desenvolvidas pelos professores integrantes dos grupos de pesquisa Grupo de Estudo e Pesquisa em Astronomia - GEAstro e Grupo de Pesquisa em Educação, Ciência e Tecnologia – GPECT da UTFPR Câmpus Pato Branco em parceria com o Núcleo de Apoio a Pessoas com Necessidades Especiais- NAPNE e Núcleo Regional de Educação. Para a efetivação do projeto as atividades serão realizadas no Câmpus da UTFPR promovendo assim a inserção dos alunos surdos à Universidade. Palavras-chave: Matemática, Surdez, Astronomia, Interdisciplinaridade. 1 INTRODUÇÃO As pessoas com deficiências, por possuírem características que “fogem ao padrão de normalidade", mesmo nos dias atuais, ainda sofrem inúmeras formas de preconceito, sendo constantemente deixadas à margem da sociedade. No presente estudo entende-se como ‘pessoa normal’, aquela que se desenvolve plenamente através dos cinco sentidos (tato, audição, visão, olfato e paladar) e condição física e neuromotora. A pessoa com deficiência é aquela que está desprovida, temporariamente ou permanentemente, de algum desses sentidos ou de seu desempenho físico/ neuromotor. A inclusão social tem merecido atenção especial nas últimas décadas nas políticas públicas que buscam a transformação, a interação, o crescimento mútuo, o desenvolvimento pessoal das pessoas com deficiência, por meio da integração ao convívio da vida social, econômica, política, assegurando-lhes os direitos como cidadãos. (BRASIL, 1989; DECLARAÇÃO..., 1994). O ensino inclusivo toma por base a visão sociológica de deficiência e diferença, reconhece desse modo que todas as crianças são diferentes, e que as escolas e sistemas de educação precisam ser transformados para atender bem todas às necessidades educacionais de todos os educados com ou sem deficiência. Porém, nas escolas ainda há grande carência na formação e capacitação continuada dos professores para trabalhar com essa nova realidade, isto é, a dos alunos com deficiências de frequentarem a sala de aula do ensino regular e, por isso, um dos principais fatores relacionados ao aspecto de ensino e de aprendizagem de alunos surdos refere-se à adaptação, construção e a elaboração de material rico em recursos visuais, além de metodologias diferenciadas para que eles sejam capazes de apropriar-se com propriedade das informações utilizadas nas aulas de matemática, como nas demais. E os profissionais envolvidos no processo de ensino consigam desenvolver os conceitos propostos. Visando a um trabalho interdisciplinar entre as áreas de Matemática, Ciência, Física, Língua Brasileira de Sinais - Libras, Língua Portuguesa e metodologia da pesquisa, bem como da inserção das TICs, está sendo implantado o projeto — Astronomia como tema gerador de ensino e de aprendizagem de conceitos matemáticos para alunos surdos — um projeto em construção, que tem por finalidade promover a interlocução entre pesquisadores e professores da rede pública, por meio da divulgação de materiais didáticos e tarefas baseadas em tendências metodológicas alternativas da área da Educação Especial. Este projeto surgiu de proposta dos professores integrantes do Grupo de Estudo e Pesquisa em Astronomia - GEAstro e Grupo de Pesquisa em Educação, Ciência e Tecnologia – GPECT. A intenção principal do grupo, ao lançar o projeto de pesquisa, é justamente integrar, na ação, reflexão e ação (SCHÖN, 2000), as atividades do pesquisador, do professor em serviço e do professor em formação, para que juntos possam aprender, fazer melhor a sua prática pedagógica e contribuir para a formação continuada dos professores da rede pública de ensino. 2 SURDOS NA ATUAL POLÍTICA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Há dois séculos que se discute a condição das pessoas surdas e permanece o embate entre o uso da língua da comunidade ouvinte ou da comunidade surda. Historicamente as concepções da abordagem educacional dos surdos centram-se no oralismo, na comunicação total e no bilinguismo. As políticas educacionais, porém, na atualidade para as pessoas surdas estão centradas na escola bilíngue, isto significa utilizar as duas línguas no cotidiano escolar, a língua de sinais e a língua da comunidade ouvinte, na modalidade escrita. Estudos revelam que a aprendizagem em ambiente bilíngue melhor correspondem às necessidades educacionais dos alunos surdos. O sistema de ensino, ao organizar sua prática pedagógica nesses moldes, está respeitando a condição do sujeito surdo, valorizando a Cultura Surda e, consequentemente, a língua de sinais. Ao pensarmos nas práticas pedagógicas para o Projeto, respaldamo-nos na Abordagem Bilíngue na Escolarização da Pessoa com Surdez, organizada pelo MEC, 2010, na Coleção: denominada: A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar, onde se propõe construir, antes de tudo, um ambiente comunicativo, de interação ampla, em que a língua de sinais e o português escrito tenham lugar de destaque “e o acesso às duas línguas ocorra de forma simultânea no ambiente escolar, colaborando para o desenvolvimento de todo o processo educativo”. (ALVEZ, 2010, p.9) A regulamentação da Lei de Libras - Lei 10.436/2002 (BRASIL, 2002) que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras - pelo Decreto 5.626/2005 (BRASIL, 2005), é considerada hoje um avanço significativo nas lutas sociais e políticas dos sujeitos surdos, pela sua igualdade de direitos, principalmente no que tange à educação. O Art.2º do Decreto considera “pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais – Libras”. Os primeiros capítulos do Decreto preveem a Inclusão da Libras como Disciplina Curricular: No Art. 3o, a Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. No § 1o reza que “todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o curso normal de nível médio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são considerados cursos de formação de professores e profissionais da educação para o exercício do magistério”. Também no § 2o, diz que a “Libras constituir-se-á em disciplina curricular optativa nos demais cursos de educação superior e na educação profissional, a partir de um ano da publicação deste Decreto. (BRASIL, 2005) Como também legislam sobre a Formação do Professor de Libras e do Instrutor de Libras outras ações importantes regulamentadas, encontramos no Art.10 que diz “As instituições de educação superior devem incluir a Libras como objeto de ensino, pesquisa e extensão nos cursos de formação de professores para a educação básica [...]”. Importante salientar que, mesmo com o Decreto, o trabalho de ensino e de aprendizagem com alunos surdos, tanto no Ensino Fundamental e Médio, quanto no Ensino Superior, constitui-se de um processo em construção, repleto de grandes desafios, dentre os quais são considerados relevantes: falta de escolas bilíngues para surdos; professores bilíngues Libras/Língua Português para atuar com as diversas ciências e disciplinas e tradutores/intérpretes de Libras/Língua Portuguesa. Ao se fazer o percurso da História da Educação de Surdos, chegando ao momento atual, com a implementação da atual Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva, que levou os alunos com deficiência, assim como os surdos, a estarem inclusos no ensino regular, pensa-se que os seus direitos foram legitimados. Entretanto, em função de sua diferença linguística, a realidade tem demonstrado que o rendimento escolar, da grande maioria dos alunos surdos, em quase todas as ciências, tem ficado muito aquém do esperado, levando-os, ainda, a serem vistos como pessoas incapazes ou limitadas. Nesse sentido percebe-se que o processo de inclusão dos sujeitos surdos ainda é algo extremamente complexo, ou seja, segundo Fernandes (1997), a inclusão educacional, da forma como tem sido praticada nos discursos oficiais, utilizando-se de termos extremamente vagos, dada a sua abrangência, como “TODOS”, resulta na massificação das diferenças dos grupos envolvidos, na subtração de seus direitos e na alimentação de estereótipos. (p.3). 2.1 Participação do NAPNE, da UTFPR - Câmpus Pato Branco na inclusão de alunos surdos O Núcleo de Apoio às Pessoas com Necessidades Educacionais Específicas - NAPNE é o setor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR que articula pessoas, instituições a fim de desenvolver a política para inclusão e desenvolver ações de implantação e implementação do Programa TEC NEP – Educação, Tecnologia e Profissionalização para Pessoas com Necessidades Específicas na Rede Federal de Educação Tecnológica – do Ministério da Educação, através da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica SETEC. Na UTFPR, Câmpus Pato Branco, o NAPNE começou a funcionar no segundo semestre de 2006, após sua criação pela Portaria nº 0348, de 26 de maio de 2006, tendo por objetivos “implementar ações de inclusão de Pessoas com Necessidades Educacionais Específicas – PNEEs; promover a discussão sobre aspectos técnicos, didático-pedagógicos, adequações, quebra de barreiras arquitetônicas, atitudinais e educacionais, bem como sobre as especificidades e peculiaridades de cada deficiência, levando não só a uma reflexão sobre o papel do educador e da instituição em sua prática pedagógica, mas principalmente, levando à prática da inclusão. É formado por uma equipe interdisciplinar, composta de Assistente Social, Pedagogos, Psicólogo, Intérprete e Professora de Libras, Docente e Discentes. Em sua linha de atuação articula ações ligadas ao ensino, subsidiando a capacitação e sensibilização da comunidade universitária, no que diz respeito aos aspectos da inclusão. Assim, a atuação é no sentido de levar às comunidades internas e externas, informações, discussões e cursos que abordem formas de identificação e inclusão de pessoas com necessidades educacionais específicas, no que tange aos aspectos pedagógicos e de acessibilidade e ainda, subsidiando com orientações pedagógicas e acompanhamento os casos de alunos com deficiência diagnosticada. Na questão da inclusão de sujeitos surdos, a UTFPR- Câmpus Pato Branco, através do NAPNE, tem se destacado, por promover várias ações que auxiliam em seu desenvolvimento social e educacional, como o Curso de Extensão (figura 1) “Qualificação Profissional para o Primeiro Emprego para Pessoas Surdas” e o Projeto ora aqui relatado, em processo de formatação. Figura 1: Curso de extensão promovido pelo NAPNE - UTFPR 2.2 Aspecto cultural na Educação Matemática do aluno surdo A Cultura Surda é questionada primeiramente quanto a sua existência e os surdos estão constantemente produzindo suas manifestações culturais. Strobel (2009) afirma que os surdos têm suas próprias manifestações culturais e reitera que “a cultura exprime valores, crenças que, muitas vezes, se originaram e foram transmitidas pelos sujeitos de geração passada ou de seus líderes surdos bem sucedidos”, ( p. 29). A Cultura Surda é composta por vários artefatos culturais, os principais citados pela mesma autora estão: a experiência visual, o linguístico, o familiar, a literatura surda, a vida social e esportiva, as artes visuais, a política e os materiais. Os artefatos culturais são “tudo o que se vê e sente quando se está em contato com a cultura de uma comunidade [...] constitui produções do sujeito que tem seu próprio modo de ser, ver, entender e transformar o mundo” (STROBEL, 2009, p. 39). A proposta do presente projeto irá explorar os seguintes artefatos: a experiência visual, o linguístico e o material, por considerá-los relevantes na implementação por atender as necessidades educacionais do público alvo e também por estar relacionado ao contexto educacional. Assim, as experiências visuais são consideradas entre os surdos a mais significativa, por serem os olhos o canal direto com o outro e o mundo. “O primeiro artefato da cultura surda é a experiência visual em que os sujeitos surdos percebem o mundo de maneira diferente, a qual provoca as reflexões de sua subjetividade”, (STROBEL, 2009. p. 40). O endosso da autora em relação a essa perspectiva vem de que [...] experiência visual significa a utilização da visão, em (substituição total à audição), como meio de comunicação. Desta experiência visual surge a cultura surda representada pela língua de sinais, pelo modo diferente de ser, de se expressar, de conhecer o mundo, de entrar nas artes, no conhecimento científico e acadêmico. A cultura surda comporta a língua de sinais, a necessidade de intérprete, de tecnologia de leitura. (PERLIN e MIRANDA, 2003 p. 218, apud STROBEL, 2009, p. 41). Dessa forma, o artefato cultural linguístico representa o aspecto fundamental da cultura surda, por ser através da língua de sinais que a comunidade surda se comunica, no caso do Brasil, a Libras. Ela proporciona ao sujeito surdo contato entre seus pares e o mundo, além de ter acesso às informações e ao conhecimento. A língua de sinais é uma das principais marcas da identidade de um povo surdo, pois é uma das peculiaridades da cultura surda, é uma forma de comunicação que capta as experiências visuais do sujeito surdo, e que vai levar o surdo a transmitir e proporcionar-lhe a aquisição de conhecimento universal. (STROBEL, 2009, p. 47) Os materiais descritos por Strobel (2009) foram desenvolvidos por profissionais surdos, direcionados aos meios de comunicação entre os surdos e a sociedade, “que auxiliam na acessibilidade na vida cotidiana de sujeitos surdos, [...] pertencem ao mundo digital de comunicação em tempo real a distância”, (SROBEL, 2009, p. 84 e p.87). A ausência de descrição de materiais didático-pedagógicos, que contempla as necessidades educacionais diferenciadas, preocupa e leva a considerar a ausência de profissionais surdos pedagogos que estejam desenvolvendo materiais ricos em recursos visuais, que favoreçam o ensino e aprendizagem dessa parcela de educandos. Nesse sentido, para expandir o conhecimento matemático no currículo do ensino para o aluno surdo, observam-se dificuldades, que se dão por vários motivos, tais como: a questão da linguagem matemática que é de difícil compreensão, a postura tradicional adotada pelo professor, ausência de referenciais teóricos, materiais didático-pedagógicos com recursos visuais próprios para a área da surdez e a ausência da sua língua materna (Libras). Com o intuito de contribuir para a formação do sujeito surdo, buscamos a desmistificação da matemática como ciência pronta. A Matemática está em contínua fase de crescimento e adaptação ao “povo a sua volta”, dessa forma, não seria diferente se tratando das pessoas surdas. Alguns dos pontos norteadores desta pesquisa têm por base a etnomatemática e a cultura surda. Estes dois ramos teórico-metodológicos possibilitam o pensar e o fazer matemático, atendendo as expectativas e necessidades culturais presentes nesse meio educacional, ou seja, [...] esta matemática cultural tem uma perspectiva de decodificar elementos característicos do discurso matemático de uma cultura dominante. Os processos que esta empreende e os resultados que obtém são a partir das construções matemáticas centradas em si mesmas. (CARNEIRO, 2009, p.55). Com enfoque maior ao aspecto cultural na educação matemática do aluno surdo, podemos verificar que a etnomatemática é uma metodologia de ensino que enfatiza entender o saber/fazer matemático ao longo da história da humanidade, contextualizado em diferentes grupos de interesse, comunidades e povos. Essa metodologia possibilita ao professor uma visão crítica da realidade de cada aluno, utilizando instrumentos de natureza matemática. De acordo com D’Ambrosio (2002), “reconhecer e respeitar as raízes de um indivíduo não significa ignorar e rejeitar as raízes do outro, mas [...] reforçar suas próprias raízes” (2002, p. 42). Essa é a vertente mais importante da etnomatemática. A proposta pedagógica da etnomatemática é fazer da matemática algo vivo, lidando com situações reais no tempo [agora] e no espaço [aqui]. E, através da crítica, questionar o aqui e agora. Ao fazer isso, mergulhamos nas raízes culturais e praticamos dinâmica cultural. Estamos, efetivamente, reconhecendo na educação a importância das várias culturas e tradições na formação de uma nova civilização, transcultural e transdisciplinar. (D’AMBROSIO, 2002, p. 46). Importante ressaltar que, segundo Gasparin (2005), não basta o professor entrar na sala de aula e dar uma aula tradicional, com o simples objetivo de repassar o conteúdo, pois perante o desenvolvimento da sociedade de hoje, exige-se muito mais teoria, crítica, saber o contexto histórico dos conteúdos, do que simplesmente conhecer sua aplicação. Assim fica claro que as responsabilidades aumentaram tanto para o professor como para o aluno. Acreditamos que com o auxílio da Astronomia, podemos possibilitar para o aluno surdo um ambiente com recursos visuais, acompanhado da introdução em Libras, através da intérprete de Libras/Língua Portuguesa e adaptando as atividades que primeiramente foram elaboradas para alunos ouvintes, permitindo então a superação das dificuldades de aprendizagem referentes à Matemática. A carência de materiais disponíveis em Libras e também de profissionais capacitados é enorme. Por isso, um dos objetivos do projeto em desenvolvimento é dar um “solavanco” às pesquisas para o desenvolvimento de materiais nessa área, superando os obstáculos epistemológicos de ensino-aprendizagem. Destarte, transformamos a teoria em algo concreto, inteiramente visual e voltado exclusivamente para o aluno surdo. 3 APRENDIZAGEM DE CONCEITOS E A ORGANIZAÇÃO DO ENSINO As Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (CNE/CEB, 2001) bem como a Declaração de Salamanca (1994) e também os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB, 1996), prescrevem um discurso em defesa da inclusão: mudanças de currículo, adaptações do contexto escolar, metodologias, preparação dos educadores, planejamento. (p. 1). Dessa forma, a inclusão significa que não é o aluno que se molda ou se adapta à escola, mas a escola coloca-se à disposição do aluno, fornecendo, por exemplo, no caso do aluno surdo, foco deste projeto, material desenvolvido especialmente para suprir suas necessidades de recursos visuais, subsidiar os professores do ensino regular, ampliar o léxico da língua de sinais e da língua majoritária e facilitar a interpretação e tradução dos conteúdos com apoio do profissional intérprete de Libras/Língua Portuguesa, porque no momento a capacitação continuada no aspecto das adaptações curricular e pedagógico é recente e não contempla toda a demanda. Dentre todos os aspectos da escolarização, Vygotsky já dedicava especial atenção à formação de conceitos científicos. Para ele, o domínio desses conceitos é tão determinante de rupturas e transformações no homem quanto o domínio da escrita. O elemento novo possibilitado pelo domínio de conceitos não é a maior quantidade de conteúdos de posse do sujeito, mas essencialmente a qualidade que a aprendizagem de generalizações conceituais confere ao pensamento. Dessa forma dizia “[...] uma correta organização da aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental [...]”. (VYGOSTSKY, 1998 apud SFORNI, 2012). Porém, não basta ao sujeito frequentar as escolas para ter acesso aos conceitos científicos para que seus processos internos sejam acionados, é necessário ter acesso a uma situação de ensino adequada. 3.1 Astronomia como tema gerador interdisciplinar No processo de ensino-aprendizagem de astronomia, professores e alunos tomam parte em uma série de atividades intelectuais, tais como: observar fenômenos; entender modelos e teorias; desenvolver habilidades de raciocínio e examinar a epistemologia. Assim, pretende-se desenvolver um projeto no qual a Astronomia é uma poderosa aliada no processo de ensinoaprendizagem, com objetivo de desmitificar pré-conceitos dos conteúdos científicos, minimizar o problema na aprendizagem e despertar o interesse dos alunos pela Astronomia, trabalhar conceitos matemáticos, que são de difícil aprendizado pelos alunos ouvintes, e desse modo chamar a atenção da comunidade escolar do município de Pato Branco e adjacentes para o entendimento de conceitos matemáticos por alunos surdos, por meio de atividades envolvendo experimentos, demonstrações e observações. O projeto pretende, por meio da Astronomia com desenvolvimento/aplicação de experimentos, despertar a curiosidade e incentivar o interesse dos alunos surdos por esta área, auxiliando-os na compreensão de conceitos matemáticos e, interdisciplinarmente conceitos de Ciências, Física, Libras e Língua Portuguesa envolvidos, posto que é consenso que a experimentação desperta interesse entre os alunos, independente do nível de escolarização, isto é, divulgar de forma lúdica a Astronomia enquanto ciência visa a despertar o interesse de alunos do ensino fundamental e médio para o estudo da Astronomia e contribuir de forma efetiva para a qualidade e eficácia dessa aprendizagem, desmistificando o repasse de conteúdos da disciplina para a melhoria do ensino das escolas públicas. Utilizando-se de um espaço inovador, explorar-se-ão as relações entre Astronomia, Ciências, Física, Matemática, Libras e Língua Portuguesa, para que estas possam conferir uma à outra, conteúdos, metodologias e linguagens que convirjam na construção de um processo pedagógico mais amplo, como também a linguagem será poderosa aliada no processo ensino-aprendizagem. A metodologia para execução do trabalho desenvolver-se-á em várias etapas. Inicialmente far-se-á um apanhado de sinais em Libras referentes a expressões relacionadas aos assuntos abordados. Para desenvolver a compreensão de conceitos matemáticos e de fenômenos físicos serão realizadas as atividades como: Atividade 1: Sistema Terra – Lua em escala, conforme sugestão de aula postada no portal do professor, adaptada para alunos surdos, com o intuito de trabalhar conceitos matemáticos de comprimento: raio, comprimento, perímetro, Pi e Geometria: área, volume, circunferência, esfera, elipse. Noções de grande /pequeno, perto/longe, maior/menor e excentricidade. Porcentagem e escala. Em Física e Ciências serão trabalhados movimentos de rotação e translação, fases da lua eclipses do sol e da lua e excentricidade. Em Libras, o léxico do contexto do projeto apresentado na Língua Brasileira de Sinais e em Língua Portuguesa, o léxico do contexto do projeto reconhecido na Língua Portuguesa, leitura e escrita. Atividade 2: Sistema solar em Escala, conforme sugestão da Olimpíada Brasileira de Astronomia, abordando os conceitos matemáticos anteriores ampliando o conhecimento do sistema solar e a relação de dimensão entre seus elementos. Atividade 3: Distância dos planetas ao sol em escala, com prática que caracteriza a distância dos planetas em escala de forma a trabalhar comprimento, escala e proporção. Todas as atividades serão acompanhadas de observação do céu diurno e noturno através de telescópios. Poder-se-á constatar neste trabalho que experimentos demonstrativos despertam as habilidades de observação e o interesse dos alunos pela Astronomia, uma vez que podem demonstrar interesse de conhecer mais sobre a teoria envolvida nos experimentos realizados. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir dessa opção estão em discussão as fases seguintes, considerando-se que deve constituir-se em um módulo de ensino, para explorar os fenômenos da astronomia, questões tecnológicas e representações matemáticas e físicas envolvidos, bem como a interação entre eles. O nível em que está sendo realizada a discussão depende de opção dos autores e do aporte do público envolvido - o aluno surdo. Assim, estabelecer conexões entre conhecimentos específicos de várias ciências, formulando e construindo materiais específicos para o surdo pode indicar um caminho para a reflexão do professor, sobre a utilidade da disciplina que trabalha, sobre a aplicabilidade dos conhecimentos e sobre a possibilidade de um trabalho interdisciplinar. É nesse sentido que a proposta converge, uma vez que as fases subsequentes estão em estudos teóricos no grupo e passa agora a um segundo estado: o de possibilitar aos alunos surdos o encontro dos conteúdos de astronomia com o estabelecimento das conexões entre a Matemática, Física, Língua Portuguesa e Libras, Metodologia Científica e as relações que podem ser feitas para a construção de uma metodologia e respectivos materiais para utilização em sala de aula. Agradecimentos À professora Mirelia Flausino Vogel pelo incentivo e apoio em relação ao conteúdo referente ao ensino de alunos surdos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVEZ, Carla Barbosa. A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: abordagem bilíngue na escolarização de pessoas com surdez. Coleção A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar. Brasília e UFC, 2010. BOZCKO, Roberto. Conceitos de Astronomia. São Paulo: Edgard Blücher, 1984. 429 p. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB, 1996. ______. Parâmetros Curriculares Nacionais, 1998. ______. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica - CNE/CEB, 2001. ______. Lei 7.853, de 1989. Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, 1989. ______. Lei de Libras Nº 10.436/2002. Presidência da República Casa Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm>. Acesso: 26 jun. 2012. _____. Decreto 5.626 de 22 de dezembro de 2005. Presidência da República Casa Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm>. Acesso: 26 jun. 2012. CARNEIRO. K. T. A. Cultura surda na aprendizagem matemática: o som do silêncio e uma sala de recurso multifuncional. Belém 176 p., 2009. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Pará. D’AMBROSIO, Ubiratan. Etnomatemática: elo entre as tradições e a modernidade. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2002. DECLARAÇÃO de Salamanca e enquadramento da acção na área das necessidades educativas especiais - Conferência mundial sobre necessidades educativas especiais: acesso e qualidade. Salamanca, Espanha, 7-10 de Junho de 1994. Disponível em: <http://redeinclusao.web.ua.pt/files/fl_9.pdf>. Acesso em: 26 jun. 2012. FERNANDES, S. Educação de Surdos. Curitiba, PR: Ibpex, 2007. GASPARIN, João Luiz. Uma Didática para a Pedagogia Histórico-Crítica. 3. ed. Campinas: Autores Associados, 2005. SCHÖN, D.A. Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Trad.Roberto Cataldo Costa. Porto Alegre: Artmed, 2000, 256p. SFORNI, Marta Sueli de Faria. Aprendizagem conceitual e organização do ensino:contribuições da teoria da atividade. Disponível em: <http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:4PGXmp54rqUJ:www.anped.org.b r/reunioes/26/trabalhos/martasuelidefariasforni.rtf+perspectivas+p%C3%B3sVigotski&cd=3&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 26 de jun.2012. STROBEL, Karin. As imagens do outro sobre a cultura surda. 2 ed. rev. Florianópolis. Ed. da UFSC, 2009. TERRAZAN, E. A. & AULER, D. “Repensando a Física no Ensino Médio” In: Formação de Professores: um Desafio, Goiânia, Editora da Universidade Católica de Goiás, 1996. TRAJANO DA COSTA, R. C. Introdução à História das Ciências Físicas, notas nãopublicadas .(1992). ASTRONOMY AS THEME GENERATOR OF TEACHING AND LEARNING OF MATHEMATICAL CONCEPTS FOR DEAF STUDENTS - A PROJECT UNDER CONSTRUCTION Abstract: This article represents a project intitled ASTRONOMY AS A THEME GENERATOR OF THE TEACHING AND LEARNING MATHEMATICAL CONCEPTS TO DEAF STUDENTS – A PROJECT UNDER CONSTRUCTION which has an objective to work on mathematical concepts to the deaf students through motivating Astronomy activities. Using practical activities in Astronomy, it is intended to call attention to the “hard” Sciences and with that to work on difficult mathematical concepts to the deaf learners. Parallel to the mathematical concepts, exploring the activities to develop in an interdisciplinary approaching, concepts in Science and Physics as eclipses, Earth movements, phases of the Moon, the movement of th planets and others. The activities will be developed by the teachers who are part of the Astronomy Research Work Study Group – GEASTRO and Education, Science and Technology Research Group – GPECT from Universidade Tecnológica do Paraná - UTFPR, Campus Pato Branco in association with Núcleo de Apoio a Pessoas com Necessidades Especiais - NAPNE and Regional Center of Education – NRE. In order to execute the project, the activities will be accomplished at UTFPR Campus promoting the introduction of deaf students in the University. Key-words: Mathematics, Deafness, Astronomy, Interdisciplinary