CENTRO UNIVERSITÁRIO – FMU CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

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CENTRO UNIVERSITÁRIO – FMU
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
Dayana Ximenes Refulia
Maria Angela da Silva
O RETORNO À SOCIEDADE APÓS VIVÊNCIA NO SISTEMA PRISIONAL
FEMININO DA CIDADE DE SÃO PAULO:
DIFICULDADES E ESTIGMAS
São Paulo
2013
Dayana Ximenes Refulia
Maria Angela da Silva
O RETORNO À SOCIEDADE APÓS VIVÊNCIA NO SISTEMA PRISIONAL
FEMININO DA CIDADE DE SÃO PAULO:
DIFICULDADES E ESTIGMAS
Trabalho
de
Conclusão
de
Curso
apresentado ao curso de Serviço Social –
FMU Centro Universitário, para obtenção do
título de Bacharel em Serviço Social, sob
orientação da Profª. Dra. Maria Fernanda
Teixeira Branco Costa.
São Paulo
2013
DAYANA ROUSE XIMENES REFULIA
MARIA ANGELA DA SILVA
O RETORNO A SOCIEDADE APÓS VIVÊNCIA NO SISTEMA PRISIONAL
FEMININO DA CIDADE DE SÃO PAULO:
DIFICULDADES E ESTIGMAS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social do Centro
Universitário FMU, como exigência para obtenção de Bacharel em Serviço Social,
sendo integrantes da banca: Profª. Dra. Maria Fernanda Teixeira Branco Costa,
Profª Maira Kelly Verengue Moya, Profª. Mestre Roberta Vilela Moreno.
Nota_______
São Paulo, 28 de maio de 2013.
__________________________________________
__________________________________________
__________________________________________
DEDICATÓRIA
Dedicamos esta pesquisa aos nossos respectivos maridos,
pelo incentivo, confiança, amor, ajuda, companheirismo e por
suportar nossa ausência no decorrer da realização deste
trabalho.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos primeiramente a Deus, pois sem ele não teríamos forças para essa
longa jornada, por ele nos ter concedido sabedoria, discernimento, paciência para
passarmos por este processo. Aos nossos pais Maciociria Maria Torres Ximenes,
Maria de Souza Bastos e Valdir Luiz da Silva que com grande sabedoria nos
ensinaram o valor da educação. Professora orientadora Maria Fernanda Teixeira
Branco Costa pelo o norteamento ao decorrer da pesquisa, pelo incentivo que
contribuiu no processo de conclusão desta pesquisa. Às nossas queridas irmãs,
Daractelly Ximenes Pereira, Daiane Aparecida da Silva, Patrícia de Souza Silva e a
sobrinha Ana Beatriz de Souza Ribeiro que ao longo do percurso nos incentivaram e
a prima Jane Aparecida da Silva pelas orientações e incentivo ao longo desta
jornada. A professora Mirela Ferraz, pelo convívio, apoio, compreensão e amizade.
Para alguns professores do curso, que foram tão importantes na nossa vida
acadêmica e no desenvolvimento e processo enquanto aprimoramento profissional.
Agradecemos a nosso sujeita de pesquisa S.S.S por compartilhar sua experiência e
contribuir para o enriquecimento da pesquisa. Aos amigos e colegas, pelo incentivo
e pelo apoio constantes.
EPÍGRAFE
“Ai daqueles que pararem com sua capacidade de sonhar, de
invejar sua coragem de anunciar e denunciar. Ai daqueles que,
em lugar de visitar de vez em quando o amanhã pelo profundo
engajamento com o hoje, com o aqui e o agora, se atrelarem a
um passado de exploração e de rotina.”
Paulo Freire
RESUMO
A pesquisa apresentada tem como objeto de estudo as mulheres egressas, partindo
como ponto central compreender o processo de retorno à sociedade das mulheres
que cumpriram penas no sistema prisional, visto que este segmento vive
historicamente um processo de exclusão e a não garantia de seus direitos.
Realizamos inicialmente visitas as instituições que as atendem, a fim de nos
aproximarmos para conhecer suas experiências vividas, porém, a partir desta etapa
nos deparamos com a dificuldade destes contatos. A realidade desvendada ao longo
da pesquisa nos permitiu entender que as políticas disponíveis para estas mulheres
não são efetivas. Em decorrência disto, ha o impedimento de um retorno de maneira
digna. Foram observadas também como se dão as relações sociais destas mulheres
fora do sistema prisional, de maneira que suas relações familiares, sociais,
econômicas, culturais e de trabalho, ficam fragilizadas. No projeto societário vigente,
produz e reproduz as diversas formas de preconceitos, estigmas e representação
sociais, sendo esta uma das expressões da Questão Social. É importante ao Serviço
Social o aprofundamento nesse estudo a fim de trazer ao profissional maior reflexão
sobre a demanda e a possibilidade de novos instrumentos para intervenção
profissional. Papel importante a ser exercido na profissão para a garantia da justiça,
do qual estejam assegurados os seus direitos enquanto cidadãs dentro do que rege
no âmbito dos direitos humanos.
Palavras-chave: Mulher egressa. Retorno à sociedade. Sistema prisional. Políticas.
Serviço Social.
ABSTRACT
The research presented has as object of study ex-prisoners women, with a focus to
understand the process of return to society of women who have served time in prison
system, seen that this return historically living a process of exclusion and denial their
rights. We conducted initial visits to institutions that meet in order to get closer to
hear their experiences, however, from this stage we are faced with the difficulty of
these contacts. The reality unveiled throughout the research allowed us to
understand that the policies available to these women are not effective. As a result,
there is the impediment of a return in a dignified manner. Were also observed how
develop social relationships these women outside the prison system, weakening thus
their family relationships, social, economic, and cultural work. The current social
scenario, produces and reproduces many prejudice forms, stigma and social
representation, which is one of expressions of Social Issues. It is important to Social
Service deepening this study in order to bring largest professional reflection on the
demand and the possibility of new tools for professional intervention. Important role
to be exercised in the profession ensuring justice and rights as citizens within the
framework of human rights.
Keywords: Ex-prisoners women. Return to society. Prison system. Policies. Social
Service.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...............................................................................................
10
1 CONHECENDO O SISTEMA PRISISIONAL FEMININO NA CIDADEDE

SÃO PAULO NA DÉCADA 2000-2012 ........................................................
14
1.1 Mulheres da Ditadura Militar ............................................................................
16
1.2 A história do sistema prisional feminino ......................................................
17
1.3 Questão Social na realidade das egressas .................................................
25
2
APROXIMAÇÃO COM PROFISSIONAIS QUE ATENDEM MULHERES
QUE PASSARAM PELO SISTEMA PRISIONAL FEMININO DA CIDADE
DE SÃO PAULO ..........................................................................................
28
2.1 Situação atual no sistema penitenciário feminino .......................................
30
2.2 Primeiros contatos com os profissionais que atuam com a população
egressa ........................................................................................................
32
2.3 Relato da mulher que passou pelo sistema prisional ..................................
39
2.4 O retorno da mulher egressa à sociedade sobre o olhar do assistente
social ...........................................................................................................
3
40
HISTÓRIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A POPULAÇÃO
EGRESSA ...................................................................................................
44
3.1 Políticas Públicas específicas para mulheres presas e egressas do
sistema prisional feminino ...........................................................................
49
CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................
54
REFERÊNCIAS ............................................................................................
58
APÊNDICES .................................................................................................
62
10
INTRODUÇÃO
O interesse pelo tema surgiu através do curso: “Promotoras Legais
Populares” realizado pela União de Mulheres de São Paulo, do qual a Maria Angela
participou no ano 2011. É uma organização não governamental feminista que surgiu
em 06 de dezembro de 1981, localizada na Rua Coração da Europa, 1395 – Bela
Vista, na cidade de São Paulo. Realiza atendimento a mulheres em situação de
violência doméstica. Fundada por um grupo de mulheres que participavam do
Movimento Estudantil no período da Ditadura Militar (1964 - 1985), com o objetivo de
lutar de forma organizada e política pela conquista dos direitos das mulheres na
sociedade.
O curso foi o primeiro contato que tivemos com a área sócia jurídica e suas
demandas, a partir dele começamos a ter um olhar diferenciado sobre a questão
relacionada às mulheres e homens que estão inseridos no sistema prisional. Em
uma aula discutiu-se o tema: Mulheres encarceradas e suas condições de vida
dentro das prisões.
O que foi apresentado e dito nesse dia deixou-a impressionada e ao mesmo
tempo indignada pela situação desumana em que aquelas mulheres vivem. Daí
surgiu o interesse e empenho para o desenvolvimento deste estudo e temática.
Passamos então a pesquisar, conhecer locais que se referem à questão, visitar sites
e redes sociais que defendam as mulheres e homens inseridos no sistema prisional
e que discutam os problemas por eles (as) enfrentados nas prisões brasileiras.
A partir do ingresso no campo de estágio na Central de Penas e Medidas
Alternativas de São Paulo, voltada aos autores por delitos de menor potencial
ofensivo, passou a perceber que existe um grande campo solicitando estudo sobre
as pessoas que estão neste sistema, referindo-se prioritariamente às mulheres que
cometem delitos. Elas sofrem um processo ainda maior de discriminação, devido ao
agravante da questão de gênero que temos presente na sociedade.
De acordo com Jurkewicz (1994), gênero não está relacionado ao sexo
biológico, ou seja, machos e fêmeas, podemos dizer que é uma construção histórica,
cultural, social e política. Partindo deste pressuposto, a identidade de gênero é a
representação social do sujeito, o que vai diferenciá-los são os elementos
constitutivos, o que é ser homem e o que é ser mulher para a sociedade, a
11
conjuntura no qual estão inseridos, tornando possível o aumento ou a diminuição
das desigualdades entre gêneros. Ao observarmos o sistema penitenciário feminino
analisamos as características de gênero associadas à questão social, relacionada às
particularidades da inserção da mulher neste sistema. No que diz respeito aos
delitos cometidos por elas, geralmente a mulher recorre mais ao tráfico de
entorpecentes, do qual elas “justificam” ter cometido para seu próprio sustento, de
suas famílias e, em muitas vezes, como cúmplice de seus companheiros.
Na realidade brasileira é notória a negação de gênero dentro do sistema
penitenciário, aumentando ainda mais a desvalorização da mulher dentro e fora do
sistema por meio da desigualdade social.
Um aspecto inquietante da temática é a vida cotidiana dessas pessoas e de
suas famílias. Em 18 de fevereiro de 2001, quando ainda no ensino fundamental e
nem imaginando cursar Serviço Social, os noticiários da televisão, principalmente as
rebeliões, que pararam o país, envolvendo várias penitenciárias do Estado de São
Paulo, indicaram já naquela época uma série de perguntas: como vivem e o que
levaram estas pessoas a estar nesta situação nos presídios? Como ficam as mães,
esposas e filhos destas pessoas?
Não podendo deixar de citar a rebelião mais violenta que ocorreu no Brasil,
em 1992, na Casa de Detenção Carandiru em São Paulo, não mais existente, pois
no local foi construído o atual Parque da Juventude.
Outro aspecto que contribui para o interesse na temática foi observar que,
aos finais de semanas, em frente a uma Casa de Detenção no Tatuapé, formam-se
filas enormes aos sábados para as visitas no domingo.
Ao observar esta realidade, ainda que de maneira empírica, pergunta-se:
Cumpre-se sozinho (a) a sentença, ou também a família está presa a esta
realidade? Os familiares participam deste processo, passando também pelo
julgamento da Sociedade Civil, pois os constrangimentos e estigmas colocados aos
familiares não são pequenos, basta olharmos para os noticiários televisivos. Muitas
vezes, as famílias necessitam de proteção legal. Para os sentenciados ou para os
que já passaram pelo sistema penitenciário “se reintegrar ou ressocializar” é um
problema concreto e muito complexo.
Os últimos dados divulgados pelo Departamento Penitenciário Nacional –
DEPEN, em 2012 indica que a população no sistema prisional brasileiro é de
12
548.003, sendo 35.039 do sexo feminino. Entre o estado e município de São Paulo
12.674 são mulheres de um total de 195.695 presos.
Diante da complexidade do tema optamos pelo recorte de gênero, pois é
significativo o número de mulheres sentenciadas na cidade de São Paulo e isto
implica em vários outros temas relacionados a serem estudados.
Assim, este estudo tem como objetivo conhecer o processo de retorno das
mulheres que passaram pelo sistema prisional à família, aos laços sociais anteriores,
ao mercado de trabalho, enfim, à sociedade. Para isso, apresentamos em três
capítulos como ocorreu esse processo:
No primeiro apresentaremos o contexto histórico de como surgiram às prisões
femininas no Brasil e como a questão de gênero influencia na entrada destas
mulheres no mundo do crime. Dialogamos com alguns autores como: Andrea
Almeida Torres, Alvino Augusto de Sá, Jailson Rocha Siqueira, Maria Amélia de
Almeida Telles.
A partir do segundo capítulo, discorremos sobre o processo da aproximação
junto aos profissionais que atuam com estas mulheres na área da Assistência Social
através das redes de apoio, do qual realizamos visitas ao Centro de Acolhida,
Centro de Apoio ao Trabalho, Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadania,
na instituição religiosa Pastoral Carcerária de São Paulo e ao Centro Referência de
Assistência Social – CRAS do bairro da Casa Verde, do qual foi possível realizarmos
entrevistas com duas assistentes sociais e uma usuária, que já passou pelo sistema
prisional e atualmente é atendida no local. Entrevistamos também uma assistente
social aposentada que trabalhou durante 17 anos no Sistema Penal, sendo 9 anos
na atuação direta com mulheres do sistema.
No terceiro capítulo apresentaremos as políticas direcionadas à população
inserida no sistema prisional bem como o contexto do seu surgimento, mencionando
os principais programas e ações criadas para a garantia dos direitos desta
população, assim como os projetos em andamento que ainda não estão em vigor.
Portanto, esta pesquisa tem por finalidade compreender o processo de
retorno à sociedade das mulheres que cumpriram penas no sistema prisional, visto
que este segmento vive, historicamente, um processo de exclusão, pois seus
direitos não são garantidos a partir de sua entrada neste sistema.
Sabemos que os Direitos Humanos são inerentes a todos os seres humanos,
no entanto, na sociedade na qual vivemos dificilmente é garantido a todos, ainda
13
mais aos que cometem algum tipo de delito, pois estes, para a sociedade estão em
desacordo com a estrutura social e com o sistema, e não “merecessem” o mínimo de
respeito e garantias de seus direitos previstos na Constituição Federal de 1988. No
caso das mulheres, este agravamento é ainda maior, pois sofrem preconceito,
discriminação e todos os tipos de violência, devido ao estigma que carregam
historicamente, sendo tratadas como seres inferiores na sociedade.
Ao considerar a temática: Mulheres Egressas do Sistema Prisional é
importantes esclarecer que o termo Questão Social é aqui compreendido como o
conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura. “[...]
O Serviço Social tem na Questão Social a base de sua fundação como
especialização do trabalho” (IAMAMOTO, 2003, p.27).
O exercício profissional do assistente social deve garantir o acesso aos
direitos e a justiça, enquanto cidadãs dentro do âmbito dos direitos humanos.
A sistematização desse processo, por meio da pesquisa, pode contribuir para
o entendimento das exclusões sofridas na sociedade por esta classe, e os fatores
que contribuem para o processo de reintegração social.
SÁ menciona que,
O termo reintegração social é proposto por Alessandro Baratta
(1990), em oposição a termos como “reabilitação”, “ressocialização”,
exatamente pela responsabilidade da sociedade nesse processo, por
subentender que o preso está sendo compreendido como alguém
exatamente igual a todos os demais homens livres, deles se
diferençando, unicamente, por sua condição de preso e de
segregado (SÁ, 2005, p.11).
Assim sendo, é importante ao Serviço Social o aprofundamento no tema com
a finalidade de proporcionar maior reflexão e conhecimento sobre a demanda e a
possibilidade de novos elementos para intervenção profissional, a fim de auxiliar o
processo de recuperação da dignidade e da cidadania perdida por estas pessoas,
uma vez que elas próprias e “a sociedade” as veem como “marginais”.
14
1 CONHECENDO O SISTEMA PRISIONAL FEMININO NA CIDADE DE SÃO
PAULO NA DÉCADA DE 2000 - 2012
Para entender o retorno à sociedade de mulheres que passaram pelo sistema
prisional, na última década 2000-2012 foi necessário um resgate histórico do
sistema prisional feminino no Brasil, da formação econômica, social, política da
sociedade brasileira; bem como do capitalismo na sociedade contemporânea.
Ao procurar desvendar a sociedade capitalista contemporânea tomou-se
como referência a crise do petróleo na década de 70. Período em que se descobriu
que o petróleo como recurso natural não é renovável. Em decorrência disto, o preço
do petróleo começou a sofrer variações que ocorrem até os dias atuais. O mundo
capitalista, em geral, passou por transformações societárias importantes em relação
ao modelo de produção desde os tempos do Fordismo.
Na revista Serviço Social & Sociedade, número 50, José Paulo Netto cita as
transformações societárias, iniciadas a partir da década de 70, em decorrência dos
processos gerados pela reestruturação produtiva e pela globalização, tendo como
modelo econômico as ideias do neoliberalismo, ou seja, livre mercado – global
privatizado
por
corporações
terceirizadas,
informatizadas,
consequência
-
desemprego estrutural e estado mínimo. A ideia de um Estado Mínimo foi colocada
em prática pelo desmonte do Welfare State, do Estado de Bem Estar Social que
alguns países capitalistas experimentaram enquanto garantias dos direitos sociais
desde o Segundo Pós-Guerra, em 1945, que durou 30 anos, até o início dos anos
70. Tal ordem econômica global foi consolidada entre os anos de 80/90 na maioria
dos países capitalistas, em especial nos países periféricos ou como se dizia nos
anos 70, países de “terceiro mundo”.
Na América Latina a partir dos anos 70 houve uma sucessão de golpes de
direita para a implantação de ditaduras militares em vários países do continente,
como: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Peru, Uruguai. Nesta década foi à eclosão
dos movimentos populares.
Com o fim da Guerra Fria (queda do Muro de Berlim em 1989) o capitalismo
mostra-se como a nova força mundial. Inicia-se a expansão e conquista de novos
mercados, o passo seguinte a este é a configuração da sociedade global. Segundo
Ianni (1994), Sociedade Global é a junção das economias, culturas e sociedades
mundiais, no seu sentido mais amplo, é uma realidade não reconhecida e codificada
15
o suficiente. Já a Sociedade Nacional, o autor vem dizer que é a vivência de cada
Estado, ou seja, sua construção é baseada na sua própria sociedade, história,
cultura e tradições, sem interferência mundial. Com a quebra de barreiras da
Sociedade Nacional tudo se torna interligado, eficiente, informatizado, ou seja, a era
da tecnologia.
O neoliberalismo é a nova ordem, é o capitalismo com nova roupagem, é a
ideologia que justifica e defende os princípios do capitalismo, baseado na
propriedade privada, o que significa ter o mínimo possível de intervenção do Estado
na economia, sendo assim, a economia possui a sua própria regulação de mercado
da qual um dos seus objetivos é a acumulação do lucro excedente.
No Brasil hoje o neoliberalismo se faz presente na terceirização de serviços
públicos, instituições privadas na área da educação, saúde, assistência social,
habitação dentre outros, que por sua vez deveriam ser garantidos pelo próprio
Estado.
Hoje o número de mulheres representa 52% da população economicamente
ativa. Apenas 25% são donas de casa, apesar de muitas delas ainda encontraremse presentes nos serviços domésticos por assumirem a dupla jornada de
trabalho. Houve uma evolução no aumento da participação das mulheres em altos
cargos, tanto no poder público quanto no universo da iniciativa privada (BIANCHINI,
2011).
Nas últimas décadas a figura feminina torna-se mais evidente na participação
social, o que pode representar uma das possíveis razões para o aumento da
criminalidade feminina. Elas querem ter acesso e consumir os produtos que lhes são
oferecidos no mercado, porém poucos têm acesso ou, muitas vezes, assumem o
lugar do companheiro que está no sistema prisional. Essas mulheres buscam no
crime uma forma de garantir a sobrevivência material e social sua e de sua família,
contudo, como possuem níveis de escolaridade muito baixos, falta de qualificação
profissional, sofrem rejeição por terem passado pelo sistema prisional na tentativa
de ingressarem no mercado de trabalho, e não conseguindo, optam como uma
forma de sustento o ingresso no crime, porque esta lhes parece à forma mais
acessível.
As desigualdades sociais vivenciadas na sociedade capitalista muito
contribuem para a entrada destas mulheres no mundo do crime, onde:
16
As precárias condições socioculturais que induzem as mulheres a
“arriscar” no mundo do crime o sustento próprio e de suas famílias,
principalmente filhos, quando combinada com o tempo de pena,
constitui um paradoxo. Com efeito, o maior grupo de mulheres
presas cumprem pena de reclusão entre mais de 4 e até 8 anos e
concentra-se no regime fechado do sistema penitenciário, quando, o
que se espera, é que as políticas públicas adotem estratégias
preventivas diferenciadas e adequadas às especificidades
socioculturais das populações. (NEMESS, 2012, p. 33).
Neste contexto, podemos relacionar as dificuldades encontradas pelas
egressas do sistema prisional ao seu retorno e convivência na sociedade, pois a
partir da não garantia destas políticas, as mesmas encontram dificuldades em
garantir seu sustento, moradia, saúde, trabalho e educação enquanto cidadãs a
procura de retorno de seu convivo social.
“O capitalismo tardio, transitando para um regime de acumulação
“flexível” reestrutura radicalmente o mercado de trabalho, seja
alterando a relação entre excluídos/incluídos, seja introduzindo novas
modalidades de contratação (mais “flexíveis”, do tipo “emprego
precário”), seja criando novas estratificações e novas discriminações
entre os que trabalham (cortes de sexo, idade, cor, etnia) (...), mas
que agora se revelam ainda mais acentuados, incidindo fortemente
seja sobre o elemento feminino que se tornou um componente
essencial da força de trabalho, seja sobre os estratos mais jovens
que a constituem, sem esquecer os emigrantes que, nos países
desenvolvidos, fazem o “trabalho sujo” (NETTO, 1996, p. 92-93).
1.1
Mulher na Ditadura Militar
De acordo com a história as mulheres vivem um processo de lutas e
conquistas que já permanece há décadas em busca de autonomia e respeito pelas
diferenças e superações das desigualdades entre homens e mulheres.
A participação da mulher durante a Ditadura Militar brasileira (1964-1982),
esta vinculada às relações de gênero, e uma de suas lutas para a constituição desta
identidade enquanto sujeito de direitos iniciou-se a partir da sua entrada no campo
político neste período.
Quando a mulher se inseria no movimento de militância nos partidos da
oposição, era entendido que cometia duas infrações graves para o regime atual:
fazer oposição ao governo vigente e quebrar os padrões estabelecidos pela
sociedade da época, que compreendia a mulher somente nas atividades
17
domésticas. Porém, muitas mulheres ousaram e adentraram no espaço político,
através do movimento feminista.
Pelas lutas em busca de igualdade de direitos sociais e políticos, muitas
mulheres foram mortas e desaparecidas neste período, e até os dias de hoje muitos
corpos ainda não foram encontrados. Isis Dias de Oliveira, nascida em 1941, teve
seu desaparecimento em janeiro de 1972 aos 31 anos. Era militante da Ação
Libertadora Nacional - ALN, organização guerrilheira e revolucionária que ia contra a
Ditadura Militar. Isis foi acusada em seis processos, dentre um deles por assaltado
ao Hospital da Ordem Terceira da Penitenciária no Rio de Janeiro. Dos processos,
foi absolvida em três.
Como outro exemplo de luta, podemos citar Ana Maria Nacinovic Corrêa
morta em 14 de Junho de 1972 após ter sobrevivido a emboscada realizada no
Restaurante Varella na cidade de São Paulo em 1971, organizada pelos agentes de
repressão política contra os militantes da Ação Nacional Libertadora 1.
1.2
A história do sistema prisional feminino
Ao analisar a história do sistema prisional feminino na década de 70 os
crimes mais praticados pelas mulheres eram os passionais, porém a partir da
década de 70 até o ano 2010 de acordo com fonte de Informações Penitenciárias –
InfoPen, de São Paulo - Relatórios Estatísticos 12/2010, o crime mais praticado é o
tráfico de entorpecentes.
Assim, como qualquer outra forma de atividade que gere lucro, a questão do
tráfico de drogas é tão significativa e rentável, que está superando e atingindo
diversos ramos da sociedade.
Segundo o grupo de pesquisadores - em “Determinantes do comportamento
Criminoso: um estudo econométrico nas penitenciárias central, estadual e feminina
de Piraquara – Paraná”, Brasil dentre as correntes de pensamento econômico que
discutem a economia do crime podem ser destacadas conforme os autores acima
três. A primeira, uma corrente de origem marxista, que acredita que o aumento da
criminalidade, principalmente aquela ligada à prática de crimes lucrativos, está
relacionada às características do processo capitalista e é resultado direto das
1
Disponível em Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil (1964- 1985); Comissão de
Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos IEVE – Instituto de Estudos sobre a Violência do Estado, 2
Edição, Imprensa Oficial, 2009.
18
alterações do comportamento empresarial no período pós-industrial (FUKUYAMA
apud SHIKIDA et al. 2006, p. 130).
Afirmam os autores que os cientistas enquadrados nessa corrente de
pensamento acreditam que devido o processo empresarial centralizador de capital e
os avanços tecnológicos resultantes, os ambientes sociais tornaram-se mais
propensos às atividades criminosas.
Para essa linha de pensamento, baseada em Fernandez e Pereira (2001), a
convivência social do capitalismo pós-industrial incentivou a criação da chamada
degeneração moral, que permitiu assim, o crescimento da atividade criminosa.
A segunda corrente, mais ampla, associa o aumento da criminalidade a
problemas
estruturais
e
conjunturais,
tais
como
índices
de
desemprego,
analfabetismo, e baixos níveis de renda bem como a desigualdade social. Pode-se
ainda relacionar a esta corrente as ineficiências policiais e judiciais, que contribuem
para a manutenção e crescimento das organizações criminosas. Fernandez e
Maldonado (1999), em seus trabalhos, apontaram para razões dessa natureza.
E uma terceira e importante corrente de pensamento da economia
do crime analisa a prática de crimes lucrativos como atividade ou
setor da economia como qualquer outra atividade econômica
tradicional (BECKER, 1968). O criminoso é então o empresário na
atividade - é ele que mobiliza recursos, assume riscos e objetivando
lucros nesse setor ilegal da economia. Sendo assim, a decisão de
quanto “investir” na atividade ilícita dependerá diretamente da
probabilidade de sucesso na atividade, ou risco inerente a ela, que
dependerá principalmente da eficiência da polícia e da efetividade da
justiça (FERNANDEZ e PEREIRA, 2000, p. 131).
Com base na segunda corrente de pensamento dos autores citados,
entendemos que, a atividade econômica do crime favorece para a conquista de bens
materiais postos hoje na sociedade do consumo, do qual coloca como valor do ser
humano “o que se tem e não o que se é”. Neste caso, atingindo a camada mais
empobrecida da população, em que algumas delas acabavam vendo na
criminalidade a forma mais acessível de atingirem estas conquistas. Por isso, se faz
necessário conhecer as estruturas econômicas, sociais e das classes valorizadas
hoje na sociedade para compreendermos a situação das mulheres egressas do
sistema prisional.
O histórico da prisão é bem antigo, traz em sua gênese formas de punição
para aqueles que estivessem em desacordo com o poder maior determinado por
19
cada tempo histórico, que em sua maioria era comandado por sujeitos que possuíam
grandes influências políticas e econômicas na sociedade.
Michael Focault (1977) em sua obra “Vigiar e Punir” discute a forma política
do poder de punir que acontece desde o tempo medieval. Torturas mentais e físicas
eram aplicadas a todas as pessoas que desafiavam o poder como forma de punição,
muitas vezes, perdendo a própria vida. Depois, aquele que foi punido, ou mesmo o
corpo deste, era exposto a toda sociedade para servir de exemplo e medo para que
ninguém mais ousasse desafiar o poder.
Segundo Focault, o corpo deixou de ser o alvo principal para as punições, e o
direito a vida é que começou a ser colocado em discussão como forma de punição,
período este em que houve muitas mortes. Ao notar que tal forma de punição passa
a ser vista como escândalo na sociedade, não surtindo mais efeito enquanto
repressão penal. Ao final deste mesmo século começa-se elaborar novos métodos e
artigos de punição para aqueles que cometessem um crime. Tomavam como ação
punitiva o seu afastamento e convívio em sociedade, resultando na sua privação de
liberdade. A partir daí surge o sistema penitenciário e as prisões, que de certa forma
estava ligada ao funcionamento da sociedade.
A partir do assim, a prisão surgiu intimamente ligada ao próprio
funcionamento da sociedade. A partir do momento em que o
capitalismo colocou nas mãos da classe popular uma riqueza investida
em matérias primas, foi absolutamente necessário proteger melhor
esta riqueza e se encontrou na privação de liberdade o castigo ideal
para proteger os bens de uma sociedade capitalista. (OLIVEIRA, 2008,
p.23).
Segundo Vera apud Luis (2002, p.80) “consta que a primeira “cadeia” em
nosso país data de 1551, em Salvador, Bahia, onde se instalou a sede do governo
geral do Brasil”.
A chamada “cadeia” era utilizada para conter os desordeiros, escravos
fugitivos e criminosos que aguardavam por julgamento. Não se tinham dados se
entre eles também estavam mulheres presas. Somente a partir da criação do
Relatório do Conselho Penitenciário do Distrito Federal (criado em 1870) que se
pode relatar a presença de mulheres neste ambiente. A partir deste relatório que
surgiu a primeira penitenciária feminina do antigo Distrito Federal, em Bangu
inaugurada em 9 de novembro de 1942 com a finalidade de transformar as mulheres
20
“meretrizes, vagabundas e pecadoras” em “mulheres a serviço dos trabalhos
domésticos e para satisfação dos maridos”.
Após a publicação pelo Diário Oficial em 7 de dezembro de 1940 sobre
Decreto-Lei n° 2.848, que dispunha de novas determinações sobre o Código Penal,
entre elas, a criação de local próprio para as mulheres já condenadas cumprirem
suas penas, foi criado em São Paulo a primeira Penitenciária Feminina sob a
administração do Estado, criando o chamado “ Presídio de Mulheres”. Foi a partir
deste Decreto que a Lei de Execução Penal passou a valer também para as
mulheres presas.
A Lei de Execução Penal - LEP2, da mesma forma, dispõe sobre as
penitenciárias femininas, estabelece que estas instituições devam possuir seções
especiais para a gestante, e condições dignas para estas mulheres. Certamente há
um grande espaço vazio entre o que está no papel e o que acontece na realidade,
pois se assim o fosse, cumprindo o que está na lei, não existiria superlotação
carcerária nos presídios brasileiros em respeito aos princípios da Lei de Execução
Penal.
As mulheres encarceradas apenas deveriam sofrer restrições ao seu direito
de ir e vir, porém a negligência e o descaso do Estado no cumprimento de seus
deveres alastram violações e não garantem os demais direitos das presas que não
deveriam ser privados. O Estado, que deveria nesse contexto específico construir
espaços produtivos, saudáveis, de resgate da autoestima e cidadania para as
mulheres, só esta reproduzindo a discriminação e a violência de gênero presentes
na sociedade dentro do sistema prisional feminino.
Um dos maiores fatores que contribuem para entrada destas mulheres no
sistema prisional são as drogas, seja ela através do consumo ou do tráfico. De
acordo com Cerneka (2008), atualmente mais de 50% das mulheres presas no país
estão detidas por crimes relacionados ao mundo das drogas.
Infelizmente, não há estudos aprofundados sobre os crimes
relacionados ao tráfico de drogas, pois, dentro deste percentual de
mulheres presas por tráfico, há mulheres usuárias de drogas,
mulheres já dependentes químicas, mulheres que caem no tráfico
para sustentar sua família, mulheres que entram no tráfico puxadas
por maridos e namorados, e finalmente, de vez em quando,
2
Lei n.º 7.210, de 11.07.1984, destaca em seu Art.1, que: “A execução penal tem por objetivo efetivar as
disposições de sentenças ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do
condenado e do internado”.
21
encontram-se mulheres que traficam porque “ gostam de comer em
restaurantes bons e usar tênis de marca” ( CERNEKA, 2008, p.6 ).
Sabemos que historicamente são postos pela sociedade estigmas e rótulos às
mulheres, tratando-as como seres inferiores e tentando convencê-las de que esta é
sua posição na sociedade. No caso do sistema penitenciário, estas afirmações
aumentam ainda mais, pois além do estigma que já carregam sofrem
discriminações, preconceitos, abusos, violência e desrespeito por estarem nesta
situação. São tratadas, muitas vezes, desumanamente, como se não merecessem a
preservação de uma vida digna e a garantia de seus direitos enquanto cidadãs.
Estas mulheres sofrem desde estruturas inadequadas para uma prisão
feminina até condições mínimas para o aleitamento materno, o qual é um direito
garantido no Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n° 8.069 de 13 de julho de
1990:
“O Poder Público, as instituições e os empregadores propiciarão condições
adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães submetidas à
medida privativa de liberdade” (ECA, 2008, p. 37).
Pouco é garantido no direito à assistência para elas, dormem amontoadas
entre as celas, não têm acesso à saúde, sofrem abusos de poder por parte dos
funcionários que trabalham nas penitenciárias e, por muitas vezes, não conseguem
ter convívio com suas famílias, por serem levadas para locais distantes de seus
endereços. Os maiores relatos que temos disponibilizado através de pesquisas são
de violência e abuso de poder.
Na realidade, a despeito da qualidade da comida e da
majestade do conjunto arquitetônico (construído como se fosse
um internato), incluindo sua capela e a creche, os recintos
dessa prisão têm sido cenários de atos violentos, torturas e
abusos de poder, de acordo com as narrativas feitas por
internas e agentes que se depuseram a falar sem medo
(SOARES e ILGENFRITZ, 2002, p. 23).
As condições vividas dentro das prisões por estas mulheres podem trazer
grandes impactos no momento de seu retorno e convivência com o mundo fora da
prisão, por isso, as questões levantadas servirão para embasar o foco central de
nossa pesquisa: as mulheres egressas, a fim de saber se estas condições
contribuem no processo de retorno e convívio em sociedade após saírem do sistema
penitenciário.
22
Torres (2001)3 esclarece que no Brasil, a política neoliberal dos governos tem
comprometido o processo de consolidação da democracia, cujo princípio
fundamental é a garantia e o respeito aos direitos dos cidadãos, que passam
permanentemente a ter que “lutar pelo direito a ter direitos”. Nesse contexto é
relevante tratarmos da questão penitenciária na sociedade brasileira.
A realidade dos presídios em todo país é o retrato fiel de uma sociedade
desigual e da ausência de uma política setorial séria e estruturada que enfrente a
ineficiência do sistema penitenciário. O quadro caótico em que se encontra hoje o
sistema carcerário brasileiro revela uma “desassistência” generalizada nos presídios,
reflexo da ausência de uma política que venha, minimamente, romper com o estado
de degradação em que se encontram milhares de homens e mulheres presos.
A partir do estudo levantado sobre a questão de exclusão no âmbito do
sistema prisional, se faz necessário o conhecimento de como se dá o funcionamento
desta área, bem como a compreensão de suas políticas publicas. Segundo os
autores Siqueira (2001) e Torres (2001), a questão social no sistema prisional ocorre
através da relação do capital e trabalho. Basearam- se nos conceitos de Marx, para
afirmarem que o capital é também uma relação de produção, da qual é apropriada
pela burguesia de forma dominante e que pouco do trabalho produzido é passado a
todos. Para Dornelles, contudo,
Os comportamentos humanos não são valorados igualmente em
todas as sociedades e em todos os tempos. A valoração será
determinada por todo um complexo processo de formação da
sociedade, em que as relações de poder desempenham um papel
muito importante (DORNELLES, 1992, p.15).
A privatização é o poder de controle do Estado favorecendo minimamente a
classe penitenciária, tornando-se cada vez mais difícil o acesso aos direitos
humanos quanto a esta população. A exclusão social e a criminalidade não são
construídas somente na relação de trabalho, mas também é devido à forma como o
modelo econômico social vai se desenvolvendo e como se dá a eliminação destas
classes menos favorecidas neste processo (SIQUEIRA, 2001).
Segundo Torres (2001) o sistema prisional, em sua estrutura desumana,
expressa também, a falta de vontade política e a incapacidade dos atuais governos
de encaminhar soluções para os problemas brasileiros.
3
Artigo apresentado no Painel: Serviço Social e o Sistema Sócio-Jurídico no X Congresso Brasileiro de
Assistentes Sociais – 2001.
23
O Serviço Social tem grande participação no processo de retorno à sociedade
destas pessoas através dos campos de trabalho, no entanto, sua ação passa
constantemente por conflitos, através das violações de direitos destes e de suas
limitações institucionais para atuação. Tendo como base a sua fundamentação na
questão social, podendo ser expressas nas desigualdades sociais postas na
sociedade. Faz-se necessário o aprofundamento e reflexão sobre este sistema e
suas conjunturas, a fim de entender como o mesmo se organiza e como o Assistente
Social pode trabalhar para o favorecimento do retorno destes indivíduos à sociedade
sem que haja a violação de seus direitos durante e após o cumprimento de sua
pena.
Segundo Siqueira (2001), a assistência social, assim, se constitui um
elemento – chave para a construção da cidadania, sempre negado aos
encarcerados e a uma parcela significativa da nossa sociedade.
A assistência social passou a ser um direito somente a partir da criação da Lei
Orgânica da Assistência Social - LOAS, a qual defende como alguns de seus
princípios, no artigo 4°, o seguinte:
I - supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as
exigências de rentabilidade econômica; II - universalização dos
direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação assistencial
alcançável pelas demais políticas públicas; III - respeito à dignidade
do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços
de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária,
vedando-se qualquer comprovação vexatória de necessidade.
A partir desta nova realidade é que os usuários do serviço penitenciário
passaram a serem olhados pelo Estado como cidadãos de direitos. Dever do Estado
e direito dos usuários do sistema.
Este estudo tem o interesse especifico de compreender as dificuldades
sofridas pelas mulheres do sistema prisional feminino, assim é necessário
abordamos a questão de gênero.
A construção do gênero se dá historicamente, socialmente e culturalmente na
sociedade, através de padrões e concepções do que “é ser homem e o que é ser
mulher”, o que se deve ou não fazer em ambos os sexos. Conceitos impostos, que
são apresentados através dos hábitos, comportamentos, formas de pensar. Padrões
definidos socialmente de acordo com o tempo histórico em que se vive e que
perduram ao longo dos anos sem que sejam questionados.
24
Tal discriminação e construção social faz com que as mulheres estejam
historicamente inseridas no processo de exclusão, o que contribui para a sua
entrada no sistema carcerário, bem como nas consequências das desigualdades
sociais dentro deste contexto, tendo assim maior dificuldade para regressarem
novamente à sociedade e às relações familiares após o cumprimento da pena pelo
delito cometido.
Ainda que definidas pelo sexo, as mulheres são algo mais do que
uma categoria biológica; elas existem socialmente e compreendem
pessoas do sexo feminino de diferentes idades, de diferentes
situações familiares, pertencentes a diferentes classes sociais,
nações e comunidades; suas vidas são modeladas por diferentes
regras sociais e costumes, em um meio no qual se configuram
crenças e opiniões decorrentes de estruturas de poder (LOUISE,
1994, p. 31).
Mediante a todo o processo discriminatório que as mulheres em geral sofrem
há tempos na sociedade, principalmente as egressas do sistema prisional, podemos
entender a questão do gênero também como uma categoria de análise, para
compreender como se dão estas expressões sociais na sociedade e propor formas
de enfrentamento para a sua superação.
Em outras palavras quer dizer que gênero se constrói socialmente de
acordo com cada tempo histórico vivido em cada sociedade,
enquanto a expressão “sexo” teria uma caracterização biológica com
destaque para os aspectos físicos do ser feminino ou do ser
masculino [...]. (TELES, 2007, p.39)
Para compreender melhor o funcionamento desta conjuntura, se faz
necessário conhecer a fundamentação teórica e histórica da construção do sistema
penitenciário. Utilizaremos as legislações LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984,
em especifico, a seção VI da Assistência Social para embasamento teórico e
compreensão de como são aplicadas na sociedade, também, para orientações que
norteiam a prática profissional dentro do “campo sócio – jurídico”.
Campo (ou sistema) sócio-jurídico diz respeito ao conjunto de áreas
em que a ação do Serviço Social articula-se a ações de natureza
jurídica, como o sistema judiciário, o sistema penitenciário, o sistema
de segurança, os sistemas de proteção e acolhimento como abrigos,
internatos, conselhos de direitos, dentre outros. O tema sócio
jurídico, enquanto síntese destas áreas tem sido disseminado no
25
meio profissional do Serviço Social, em especial com a sua escolha
como tema central da Revista Serviço Social e Sociedade n. 67
(Cortez Editora), pelo comitê que a organizou, tendo sido
incorporado, a seguir, como uma das sessões temáticas do X CBAS
– Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais/2001 (FÁVERO, 2003,
p. 10).
A legislação vigente da Assistência Social no sistema penitenciário está
prevista na LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984, o Capitulo II, possui suas
disposições gerais, e na seção VI em especifico da Assistência Social.
O que legitima as ações da profissão dentro deste contexto são os aparatos
de leis e resoluções, documentos e publicações que embasam a profissão, seja nas
leis que legitimam suas funções, seja nas leis que viabilizam o acesso aos direitos,
que são compreensões determinadas pelo Código de Ética do Assistente Social em
seus princípios fundamentais:
I Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das
demandas políticas a ela inerentes - autonomia, emancipação e
plena expansão dos indivíduos sociais;
II “Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e
do autoritarismo”.
Ao que parece, a sociedade neoliberal além de estigmatizar a mulher
egressa, não possibilita condições para que as mesmas se reconheçam como
participantes nessa conjuntura capitalista. O atual cenário socialmente globalizado,
no qual que estão inseridas estas mulheres torna mais difícil o processo de retorno à
convivência social.
1.3 Questão Social na realidade das egressas
Para discorrermos sobre Questão Social na realidade das mulheres que
passaram por situação de encarceramento, se faz necessário contextualizar o
significado do conceito “Questão Social”. Baseado no conceito Marxista a concepção
da Questão Social está enraizada na contradição capital x trabalho, em outros
termos, é uma categoria que tem sua especificidade definida no âmbito do modo
capitalista de produção. O conceito de Questão Social mais notório no Serviço
Social é:
“A questão social não é senão as expressões do processo de
formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no
cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como
26
classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no
cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a
burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais
além da caridade e repressão” (CARVALHO e IAMAMOTO, 2009,
p.77).
Vivemos em uma sociedade capitalista, as desigualdades sociais se tornam
cada vez mais presentes, o que não permite que a riqueza social que é produzida
por todos seja apropriada de forma igualitária. Somente uma camada desta
população (no caso, aqueles que detêm maior poder econômico e recursos para a
produção, pois estes acumulam suas riquezas com base na fragilidade daqueles que
tem somente a sua força de trabalho para oferecer à sociedade).
Interligada a esta realidade estão novas formas de expressões da Questão
Social presente na sociedade, que é nitidamente percebida por grande parte da
população, que não conseguiu de alguma maneira ser encaixado no modelo
estruturalista, que a sociedade julga ser o normal, e que sentem no seu cotidiano as
consequências, sintetizadas na precariedade das condições e relações de trabalho,
na ausência de seus direitos como cidadãos, entre outras.
No caso das mulheres que vivenciaram um período de suas vidas no sistema
penitenciário, este cenário, torna-se ainda mais precarizado, pois na visão da
sociedade capitalista, além de terem cometido um delito, “ir contra os princípios da
lei”, não lhe é permitida sua retomada à sociedade como uma cidadã de direitos.
Sofrem preconceitos, discriminações, e tem seus direitos, enquanto seres humanos,
violados, causando assim grande fragilidade psicológica e social, tornando- as
vítimas da violência social, parte dessa conjuntura é causado pela representação
social.
Segundo Moscovic (2009) representação social é um conjunto de conceito,
proposições e explicação originada na vida cotidiana no curso de comunicações
interpessoais. Equivalentes, em nossa sociedade, aos mitos e sistema de crenças
da nossa sociedade tradicional, pode também ser vista como a versão
contemporânea do senso comum.
Para as mulheres que estiveram neste sistema, a representação social está
atribuída de modo negativo pelo fato do delito cometido.
Verificando nesta situação a existência de mais um fator contribuinte para a
crescente da Questão Social em torno destas mulheres, o estigma que de acordo
com Goffman (1988) é, a sociedade estabelecendo os meios de categorizar as
27
pessoas conforme os atributos considerados como comuns e naturais para todos os
membros de determinada categoria.
Cada ambiente social determina categorias de pessoas que serão
encontradas. Estabelece também as categorias a que as pessoas devem pertencer,
bem como os seus atributos, o que significa que a sociedade tem um padrão externo
para o indivíduo que permite a ele se inserir na categoria e aos atributos, a
identidade social e as relações com o meio.
A repercussão desta distribuição em categorias faz como que estas mulheres
sejam vistas como “mulher que foi presa”. Desta maneira, se a sociedade, sempre
as estigmatizarem e não as auxiliarem na construção de uma nova realidade social,
apenas julgando os atos anteriormente cometidos por elas, dificultará o retorno das
mesmas à sociedade e a busca pela constituição de si como ser social. É preciso
obter um olhar diferenciado a esses casos, levando em consideração o contexto
histórico no qual estão inseridas.
28
2 APROXIMAÇÃO COM PROFISSIONAIS QUE ATENDEM MULHERES QUE
PASSARAM PELO SISTEMA PRISIONAL FEMININO DA CIDADE DE SÃO
PAULO
Essa pesquisa pretende compreender o processo de retorno à sociedade das
mulheres que cumpriram pena no sistema prisional feminino sobre a perspectiva do
profissional do Serviço Social. Esse processo acontecerá através de visitas em
Centros de Referências, Casas de Acolhidas e Organizações Sociais que realizam
atendimento a estas mulheres no município de São Paulo, utilizando, quando
possível, os documentos e prontuários das instituições: Centro de Acolhida Nossa
Senhora Aparecida, Centro de Referência de Assistência Social - CRAS bairro da
Casa Verde, Pastoral Carcerária da Arquidiocese de São Paulo, Secretaria
Municipal do Trabalho e do Empreendedorismo – Centro de Apoio ao Trabalho CAT Santana e Centro de Políticas Específicas – Coordenadoria de Reintegração
Social e Cidadania.
Ao ter acesso a estes centros, foi realizado inicialmente visitas com os
profissionais para verificar a possibilidade de contato direto com as mulheres, a fim
de nos aproximarmos para conhecer suas experiências, pois, a partir do dialogo com
elas, acreditávamos poder entender as políticas disponíveis para este sistema e
coletar dados para verificar sua efetivação; bem como observar como acontecem as
relações sociais destas mulheres dentro e fora do sistema prisional, para realizarmos
uma análise critica e aprofundamento no tema. Além, de contribuir para a produção
de conhecimento na área do Serviço Social, na descrição da prática profissional dos
assistentes sociais dentro da área sócio jurídica.
Recorreu-se ao método quantitativo no que diz respeito à coleta de dados
sociais sobre a população pesquisada, a fim de levantar dados estatísticos dos anos
anteriores (2000 – 2012) para realizarmos uma reflexão crítica sobre esta realidade.
No entanto, em função dos objetivos definidos neste projeto, o método qualitativo é o
mais adequado, pois se pretendeu dar centralidade ao sujeito histórico, na
experiência e trajetória de vida destas mulheres. Desejou-se conhecê-las para além
dos números e dos índices levantados.
A experiência das mulheres egressas do sistema prisional enquanto
expressão da “Questão Social” e a relação com a subjetividade das pessoas permite
ao assistente social considerar suas histórias, valores, modo de pensar e sentir
29
sobre dada realidade, ocupando assim um papel importante para compreensão do
processo de retorno destas mulheres à sociedade sobre o olhar dos profissionais
que atuam no Serviço Social.
A pesquisa qualitativa responde as questões muito particulares. Ela
se ocupa nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não
pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o
universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças,
dos valores e das atitudes. Este conjunto de fenômenos humanos é
entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se
distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por
interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e
partilhada com seus semelhantes (MINAYO, 2011, p.21).
O método qualitativo permitirá observar e compreender as experiências dos
profissionais que atuam diretamente com essas mulheres e a atuação do Serviço
Social enquanto equipe multidisciplinar.
As informações e elementos trazidos através dos depoimentos destes
profissionais e os dados coletados contribuíram para entendermos as atuais políticas
e programas sociais que atendem esta população. Verificar se de fato são efetivos e
se contribuem para o retorno e convívio em sociedade; bem como auxiliar na
construção de novas redes de atendimento, na elaboração de programas, na
melhoria dos atendimentos, na implantação e execução efetiva do atendimento as
demandas e problemas enfrentados por estas mulheres.
Utilizaremos como instrumentos: a análise de documentos, entrevista
semiestruturada e gravador.
As entrevistas serão realizadas mediante autorização e agendamento prévio
junto ao Assistente Social, para não interferir na realização de suas atividades. Será
solicitado uso de local privado para a realização da entrevista, a fim de garantir o
sigilo das informações. Utilizaremos o gravador para registro e, posteriormente, as
transcrições dos dados fornecidos.
Foram realizadas entrevistas a três profissionais, destas, uma já atuou, e
outras duas atuam e acompanham mulheres que passaram pelo sistema prisional.
Serão fonte de informações, depoimentos e experiências de como é desenvolvida a
intervenção do profissional de Serviço Social a estas mulheres. São elas:
Gizelda Morato Costa – Formou-se em Serviço Social na cidade de Lins- SP
em 1986 está aposentada deste de 05/01/2013, atuou 17 anos junto ao sistema
penitenciário masculino, e 9 anos junto ao sistema penitenciário feminino. Trabalhou
30
2 anos no regime fechado na penitenciária feminina do Butantã e 7 anos no regime
semi aberto.
Camila Felice Jorge - Formou-se na Pontifica Universidade Católica de São
Paulo (PCUSP-2006). Mestre em Serviço Social pela PCUSP- 2009.
Teve
experiência profissional no centro de acolhimento para criança e adolescente.
Trabalha na prefeitura de São Paulo e atuou 2 anos na área da saúde. Hoje atua
como Coordenadora do CRAS Casa Verde.
Mirela - Formou-se na Pontifica Universidade Católica do Paraná (PUCPR –
2004). Atuou na Secretaria de Estado do Paraná na área da Assistencial Social,
Projetos e Organizações não governamentais do terceiro setor na área da
assistência em atendimento a jovens. Concursada desde 2008 na Prefeitura de São
Paulo, inicialmente na área da Saúde e posteriormente na área de Política de
Assistência Social, atualmente atua no Centro de Referência da Assistência SocialCRAS Casa Verde. Docente em Serviço Social.
2.1 Situação atual no sistema penitenciário feminino
Nos últimos anos tem crescido muito o índice de mulheres inseridas no
sistema penitenciário. Segundo o GRUPO DE TRABALHO INTERMINISTERIAL Reorganização e Reformulação do Sistema Prisional Feminino em “Relatório Final” a
população feminina encarcerada de 2000 a 2006 passou de 5.601 para 14.058, um
aumento de 4,55% neste período. Em paralelo, tem crescido também o número de
mulheres estrangeiras participantes nesse sistema no Brasil. Para uma melhor
compreensão do perfil destas mulheres, recorremos a alguns dados disponíveis no
Ministério da Justiça, conforme gráficos abaixo:
População Carcerária Feminina no Brasil – Ano 2011/2012
Brasil
Presas
Presas Estrangeiras
Faixa etária
Cor/ etnia
Escolaridade
2011
34.058
832
18 a 24 anos
Parda
Ensino Fundamental Incompleto
2012
35.039
774
18 a 24 anos
Parda
Ensino Fundamental Incompleto
Fonte: MJ – DEPEN – Infopen – População Carcerária.
31
População Carcerária Feminina do estado de São Paulo – Ano 2011/2012
Brasil
2011
Presas
Presas Estrangeiras
Faixa etária
Cor/ etnia
Escolaridade
2012
11.853
553
18 a 24 anos
Branca
Ensino Fundamental Incompleto
12.674
557
18 a 24 anos
Branca
Ensino Fundamental Incompleto
Fonte: MJ – DEPEN – Infopen – População Carcerária.
De acordo com os dados recentes das Informações Penitenciárias - InfoPen
nos Relatórios Estatísticos 12/2012, atualmente no Brasil 548.003 pessoas
encontram-se no sistema prisional, sendo que 35.039 são mulheres, um percentual
de aproximadamente 6,39% da população carcerária nacional. Já no estado de São
Paulo, esta população é de 195.695 e 6,49% são mulheres, equivalente a 12.674.
Deste total, 4,64% que representam aproximadamente 557 mulheres, são
estrangeiras e encontram-se inseridas no sistema penitenciário, representando a
maior parte pelos países: África do Sul, Angola e Bolívia.
Com base nas tabelas acima e no gráfico abaixo apresentado, observamos o
aumento das mulheres presas no Brasil, particularmente na cidade de São Paulo.
Houve uma pequena diminuição no número de mulheres estrangeiras presas no
Brasil,
no
entanto,
no
estado
de
São
Paulo
esta
consideravelmente, de 533 presas em 2011, para 589 em 2012.
população
cresceu
32
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
Presas
Presas estrangeiras
15.000
10.000
5.000
0
Brasil
Brasil
2011 São
São Paulo Brasil
2012 São
Brasil
SãoPaulo
Paulo
2011
2012
2011
2011
2012
2012
Fonte: MJ – DEPEN – Infopen – População Carcerária
2.2 Primeiros contatos com os profissionais que atuam com a população
egressa
Abaixo são mencionados os primeiros locais que abriram as portas para a
aproximação e possibilidade de realização de estudo sobre estas mulheres.
Ressaltamos aqui a dificuldade de acesso a estas instituições e as mulheres, por
questões éticas e burocráticas relacionadas à Administração Pública. Em seguida,
realizamos um breve relato sobre as passagens nas instituições visitadas para
desenvolvimento da pesquisa:
Pastoral Carcerária do Estado de São Paulo
Por meio de busca na internet localizamos contato da Sra. Heidi Ann
Cernecka, Coordenadora da Pastoral Carcerária do Estado de São Paulo. A mesma
desenvolve trabalhos voluntários no sistema penitenciário junto à entidade Católica e
33
a Defensoria Pública, auxiliando no desenvolvimento jurídico, social e econômico
desta população.
Na segunda quinzena de setembro de 2012 realizamos uma primeira
entrevista, quando nos foi relatado sobre a fundação e os objetivos da instituição em
auxiliar a população encarcerada. A Sra. Heidi nos indicou também alguns
profissionais para contato sobre o assunto específico das mulheres egressas, bem
como nos concedeu alguns materiais para pesquisa.
Após isso, mantivemos contato com ela através de novos encontros, que nos
permitiu conhecer melhor a realidade destas mulheres e como aprofundarmos nossa
pesquisa.
Casa de acolhida Nossa Senhora Aparecida
Por indicação da aluna Maria Paula do curso de Serviço Social, obtivemos
contato com a diretora da instituição, Marisa Andrade. O local faz atendimento de
acolhida exclusivamente para mulheres egressas estrangeiras. Via contato
telefônico, agendamos uma primeira visita para apresentação do projeto e
entendimento do funcionamento da instituição, afim de futuramente entrevistarmos
aquelas mulheres.
No dia 09.10.2012 comparecemos à instituição para obtermos informações
sobre o seu funcionamento. O local abrigava cerca de 40 mulheres e 6 crianças, em
sua maioria vindas dos países Africano e Latino Americano. Algumas possuem
trabalho fora da casa e segundo a diretora, contribuem com uma determinada
quantia financeira para “o bem estar coletivo” e as demais contribuem com trabalhos
realizados na própria instituição. A Casa possuía também parceria com a unidade de
saúde
da
região,
proporcionava
as
mulheres
atendimento
médico
e
orientações/palestras sobre a saúde da mulher. Falamos então nossa proposta e
nos foi sugerido pela profissional que apresentássemos previamente um
questionário para aprovação da diretoria e uma proposta de atividade para
desenvolvermos juntas às egressas. O objetivo era aproximarmos das egressas
antes da aplicação do questionário.
Mediante solicitações, documentos foram apresentados para aprovação da
atividade. Tivemos grandes dificuldades em contato com a diretora, pois o retorno
era demorado e a comunicação difícil. Após um mês, em novembro de 2012,
34
tivemos a aprovação para executarmos as atividades. Foram marcadas datas para a
realização de acordo com agenda da Casa de Acolhida e, por vezes, houve o
cancelamento da atividade por parte da instituição. Mediante ao exposto, foi
sugerido novas datas para o início de dezembro de 2012, porém a mesma informou
que sairia de férias e somente retornaria em meados de janeiro de 2013. Enviamos
então, e-mail informando que retomaríamos a proposta a partir de seu retorno,
entretanto, não obtivemos resposta.
Retomamos então as formalizações por meio eletrônico no dia 11/2/2013,
para solicitação de andamento das atividades programadas anteriormente e
informando os contatos realizados, sem sucesso, após seu retorno de férias até a
presente data. Após dois dias, 13/2/2013 recebemos retorno da diretora, relatando,
segundo ela, lembrar-se da proposta e que devido à ausência de contato das
pesquisadoras com a instituição durante muitos dias, seria inviável a sequência nas
atividades, pois outras estudantes já estavam desenvolvendo pesquisa na
instituição. De contra partida, argumentamos contatos feitos via fone e email sem
retorno e que entendíamos a situação, porém gostaríamos de verificar a
possibilidade de reavaliação do posicionamento, tendo em vista o longo período de
abordagem que vínhamos realizando a fim de aplicar a pesquisa na Casa de
Acolhida, local muito importante para a construção de nosso processo de formação
profissional, acadêmico e pessoal. Infelizmente, a resposta foi negativa e por tal
motivo encerramos atividades de pesquisa com as egressas deste local.
Centro de Políticas Específicas – Coordenadoria de Reintegração Social e
Cidadania.
Por indicação da Sr. Heidi obtivemos o contato do profissional André Luzzi,
responsável pelas ações voltadas aos egressos/as do sistema prisional feminino e
suas famílias. Em encontro no dia 07/2/2013 nos foram apresentados alguns
programas realizados atualmente pela Reintegração Social: Pró Egresso4 e as
4
Programa criado pelo Estado de São Paulo em parceria com a Secretaria de Administração Penitenciaria - SAP
e a Secretaria do Emprego e Relações de Trabalho - SERT com a finalidade de promover capacitação e gerar
empregos aos egressos/as com intuito de contribuir para sua reintegração na sociedade, dar condições para o
acesso à cidadania, diminuição na reincidência criminal e diminuição na vulnerabilidade social. Tendo em vista
que o acesso ao emprego e recolocação no mercado de trabalho é uma das maiores dificuldades enfrentadas
por esta população após o seu retorno à sociedade.
35
Centrais de Atenção aos Egressos e Família - CAEF5, e concedido materiais sobre o
trabalho realizado pela Coordenadoria de Reintegração Social para este segmento.
Ao verificar possibilidade de entrevista com o profissional sobre suas experiências e
vivencias neste contexto, para inclusão no trabalho, fomos informadas que a
liberação é concedida somente mediante aprovação do Comitê de Ética da
Secretaria de Administração Penitenciária - SAP, sendo este muito burocrático e
moroso para concessão de autorização, o que inviabilizaria a entrevista para anexo
ao projeto devido ao prazo para conclusão.
Todas as informações acima passadas foram baseadas em visitas e contatos,
realizados via emails e telefones, ao longo da elaboração de pesquisa, no qual estão
como anexo ao fim deste trabalho.
Secretaria Municipal do Trabalho e do Empreendedorismo – Centro de Apoio
ao Trabalho - CAT Santana – São Paulo
Em contato com assistente social do Centro de Apoio ao Trabalho – CAT
Santana apresentamos roteiro para levantamento de características das mulheres
que passaram pelo sistema penitenciário atendidas na instituição. Estes roteiros
foram respondidos no período de novembro de 2012 a janeiro de 2013, através das
respostas concedidas por elas, via roteiro estruturado, foi construída a tabela:
5
Centrais de Atenção ao Egresso e Família que atuam na Assistência aos vínculos familiares, na construção e
ampliação a rede de apoio para garantia ao emprego e renda a fim de possibilitar ao sujeito a retomada de sua
autonomia enquanto cidadão e seu retorno ao convívio social. Os profissionais que atuam nesta área são
assistentes sociais, psicólogo, técnicos e/ou estagiários.
36
37
De acordo com os dados, quatro das cinco usuárias, possuem ensino
fundamental incompleto como grau de instrução, o que interfere diretamente na sua
recolocação ao mercado de trabalho. As cinco mulheres estudadas, estavam
desempregadas, foram à instituição em busca de vaga de emprego.
Duas são ajudantes gerais e duas têm profissão de secretaria e advogada,
uma não respondeu, três das cinco contribuem na renda familiar; quatro das cinco
mulheres são naturais do estado de São Paulo. Elas têm entre 25 a 61 anos; quatro
tem entre 02 a 04 filhos, quatro são solteiras e uma é divorciada. Destas cinco
mulheres três cumprem pena em liberdade condicional e duas em regime
semiaberto.
Um dado relevante é que duas mulheres tiveram familiares no sistema
penitenciário. As mulheres estudadas saíram do sistema penitenciário entre abril de
2011 a janeiro de 2013.
De acordo com os dados, três delas cumpriram pena referente ao art. 157
”Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou
violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência” (LEI Nº 2848 de 7 de dezembro de 1940).
E duas mulheres cumpriram pena referente ao artigo. 33 do Código Penal:
Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir,
vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer
consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou
fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar. (LEI Nº 11.343,
de 23 de agosto de 2006).
As mulheres deixam claro que quando saem do cárcere, na maioria das
vezes, quem as acolhem são os familiares quando os vínculos ainda permanecem
mantidos ao longo do cumprimento da pena. Apenas uma necessitou da rede de
apoio da Assistência Social. Esta recorreu ao Centro de Acolhida. Observamos que
não possui filho e não demonstrou perspectivas para o seu futuro.
Ademais, as outras pesquisadas trazem como expectativas para futuro:
“Recuperar a dignidade perdida com o delito, se reintegrar à sociedade e criar meus
filhos com liberdade” (E.S.R). “Reabilitar-me socialmente, conseguir um trabalho e
criar meus filhos” (R.A.S). “Poder provar que sou vítima de uma ação de má fé, e se
38
reintegrar à sociedade como cidadã de direitos” (A.L.F). “Não precisar voltar nunca
mais para o sistema prisional” (R.V).
As mulheres, quando responderam sobre seu futuro, evidenciaram o desejo
de “reintegração” à sociedade. Isso nos traz inquietações, pois partimos do
pressuposto que, se as mesmas já cumpriram sua pena com a justiça, não tem por
que excluí-las da sociedade. Ou seja, paralela ou antecipadamente à preocupação
com o retorno das mulheres à sociedade, nos leva a crer que os esforços devem ser
também direcionados para o enfrentamento como problemas sociais, abordando
necessidades reais e concretas de suas vidas, como habitação, saúde, educação,
assistência, trabalho, entre outros. São necessárias Políticas Públicas que
assegurem de maneira efetiva o retorno destas mulheres para a sociedade, ou seja,
proporcionando condições concretas para que consigam viver dignamente, não
sendo necessário recorrer ao mundo do crime novamente.
Centro de Referência de Assistência Social – CRAS
O acesso a esta instituição surgiu a partir do contato com a assistente social e
ex-professora do curso de Serviço Social da Faculdade Metropolitanas Unidas FMU, Mirela Ferraz. Desde o 5° semestre do curso, nos acompanhava e contribuía
no processo de formação do projeto de pesquisa sobre o tema, que, ao mencionar
como objeto de pesquisa as egressas do sistema prisional demonstrou grande
interesse em nos auxiliar no desenvolvimento da pesquisa. Passado um tempo, nos
relatou sobre um atendimento e acompanhamento realizado a uma egressa do
sistema prisional no Centro de Referência de Assistência Social – CRAS Casa
Verde- São Paulo e nos questionou sobre o interesse em entrevistar a mulher. O
convite foi aceito, realizamos visita ao CRAS no dia 22/10/2012. A assistente social
Mirela nos apresentou o prontuário da usuária do serviço para conhecermos melhor
a história desta mulher egressa. Em nossa presença contatou a usuária para
verificar a possibilidade de ida ao CRAS para apresentação de proposta da
pesquisa. Na mesma semana, a profissional conversou com egressa, que segundo
relatos da mesma, demonstrou - se muito feliz com o convite, aceitando prontamente
ser entrevista por nós pesquisadoras. Após o convite aceito, realizamos entrevistas
com as assistentes sociais Camila Felice Jorge, Mirela Ferraz e uma usuária
egressa do CRAS, que nos relatou sua experiência.
39
2.3 Relato da mulher que passou pelo sistema prisional
A usuária do Centro de Referência de Assistência Social - CRAS terá seu
nome preservado e será denominada “S.S.S”, tem 43 anos, é cozinheira, solteira,
reside na zona norte da cidade de São Paulo, tem 6 filhos, 02 meninos e 04
meninas, destes 6 filhos quatro moram com S.S.S. Relata que foi presa em 1992,
foi condenada no artigo 1556, porém alega ser inocente. Estava no barzinho com o
companheiro quando chegou uma conhecida e sentou-se a mesa para beber com
ambos, foi quando a polícia chegou, informou que todos estavam presos por furto,
porém a mesma tentou defender-se da acusação, não foi ouvida e todos foram
presos. Ela foi condenada há cinco anos, quatro meses e treze dias, desta pena,
cumpriu quatro anos e dois meses em regime fechado. A pena fora reduzida por
bom comportamento.
“S.S.S” descreve que neste período ainda era nova e inocente, diz que não
tinha acesso e nem meios para avisar seus familiares sobre o que aconteceu, foi
quando ocorreu uma rebelião no presídio e estava sendo transmitida por uma
emissora de televisão, neste dia seus familiares viram-na na TV.
Descreve, com lágrimas nos olhos, os horrores que viveu na penitenciária,
desde conflitos com outras usuárias até violência dos profissionais.
Foi perguntado a “S.S.S” se teve apoio dos familiares quando saiu da prisão,
a mesma disse que sim, do pai e irmão. Quando questionada sobre a rede de apoio
que teve quando saiu do sistema prisional, alega ter recebido ajuda do repórter
Paulo Salgado, que fazia visitas voluntárias a mulheres enquanto estavam presas,
as visitas tinham cunho religioso. Quando saiu da penitenciária foi à procura de
Paulo Salgado, que comprou um isopor, refrigerante e águas para que ela pudesse
vender e ter meios para se sustentar.
S.S.S informou já ter se envolvido com tráfico de drogas para obter o sustento
dela e dos filhos. Ao longo de sua trajetória relata ter procurado trabalho formal,
porém sem sucesso devido seu histórico do passado. Relata sobre o período que
participou de uma ocupação a um prédio no centro da cidade de São Paulo, meses
depois desta ocupação, decidira tentar a vida no Estado de Minas Gerais, os planos
de construir uma nova vida junto dos filhos e companheiro não deram certo, retornou
6
Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940 do qual se refere aos crimes relacionados ao de roubo.
40
para a cidade de São Paulo onde reside até hoje e busca nas Políticas Sociais
através do Centro de Referência de Assistência Social - CRAS alguns benefícios,
tais como: transferência de renda e benefícios eventuais (pagamentos de contas
auxílio aluguel entre outros), orientações e encaminhamentos para ter acesso às
demais Políticas Públicas, como saúde, educação, habitação, entre outras.
De maneira marcante diz com lágrimas nos olhos “Eu não volto, prefiro a
morte”. S.S.S fala sobre sua dinâmica familiar hoje, seu atual companheiro saiu da
penitenciária em torno de um mês, entristecida fala sobre o filho de 17 anos que
está fascinado pelo mundo do crime, diz que fará de tudo para tentar tirá-lo, pois
sabe que se o mesmo ingressar nesta vida, não terá futuro. Descreve um pouco
sobre a filha de sete anos muito estudiosa e pontua que consegue força para
prosseguir através de seus filhos, pois não quer que eles tenham sua mesma
história.
Ao questionarmos sobre o que ela esperava de seu futuro, com emoção
respondeu:
Assim, meus filhos criados, eu numa casa, minha panela de pressão
chiando sabe, meus cachorros no quintal, meus filhos indo e voltando
pra escola. Eu não quero furtuna, não peço riqueza peço [...] só
queria ter um cantinho pra minha cabeça e dos meus meninos, só
isso mais nada, não peço riqueza [...] só ter um espaço pra mim e
pro meus filhos sabe. (S.S.S).
2.4 O retorno da mulher egressa à sociedade sobre o olhar do assistente
social.
O ponto de partida desta pesquisa são as experiências expressadas no
atendimento às mulheres egressas e como acontecem as relações ao retorno delas
a sociedade pelo olhar do profissional do Serviço Social.
Tendo como pressuposto O Código de Ética Profissional do Serviço Social,
no qual dispõe como um dos seus princípios fundamentais “não discriminar e não
ser discriminado, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião,
nacionalidade, orientação sexual, idade e condição física”, ou seja, entende-se que o
assistente social tem que ter uma atitude crítica e iniciar um processo de construção
junto a estas mulheres para mostrar-lhes o quanto elas são importantes, que têm
41
direitos e devem lutar para garanti-los, fundamentando-se na defesa dos Direitos
Humanos e no repúdio aos preconceitos existentes na sociedade.
[...] enquanto assistente social eu sempre defendi que nós tínhamos
que trabalhar os sujeitos que se encontram privados de liberdade, no
sentido de elevar ele enquanto cidadão. Em que sentido, é
desenvolvendo ações projetos e programas sociais que pudessem
promovê-los enquanto cidadãos que são. No sentido de através
dessa promoção social ele poder vir a ser, ou reorganizar sua historia
de vida e elaborar novos projetos, de modo que ele inserir-se na
sociedade, não vou dizer de uma forma positiva, mas de modo que
ele pudesse se inserir ou ela se inserir na sociedade, de um modo
que ao travar as novas relações ou buscar os vínculos das relações
que tinha para que a pessoa conseguisse viver em sociedade [...].
(Gizelda Morato).
Tudo isso vai de encontro ao trabalho do assistente social, que tem como um
dos seus objetivos possibilitar o retorno destas mulheres de maneira digna.
[...] a questão do próprio preconceito que a sociedade emprega a essa
pessoa, uma pessoa que como se tivesse passado pelo sistema
prisional ela é taxada pelo resto da vida como alguém criminoso. A
nossa sociedade de alguma forma ela é sensacionalista, ela vive a
partir destes fatos que envolvem pré- julgamentos, que envolve
culpabilização, o nosso próprio sistema judiciário ele caminha para a
penalização dos indivíduos [...]. (Mirela Feraz).
Mas, devemos entender que para o retorno de maneira digna à sociedade, é
necessário um atendimento efetivo das demandas apresentadas, ou seja, uma
efetiva articulação entre as políticas.
[...] pessoas que passaram por alguma situação de privação, e ela tá
trazendo a questão filho, habitação, isso é muito claro na vida dela,
[...] ela participa de outros programas sociais, que é o aluguel social,
ela teve o acesso do beneficio de transferência de renda, cortado até
por conta de não conseguir colocar as crianças na escola, [...].
(Camila F. Jorge).
Quando o profissional depara-se com as demandas apresentadas por estas
mulheres, cabe a ele fazer mediações entre o que o Estado deveria garantir como
direito, e verificar o que estas egressas têm como prioridades assistenciais a serem
atendidas.
42
Uma mulher que tá tentando se reinserir no mercado de trabalho de
forma inclusive a ter um registro na carteira de trabalho, na forma de
conseguir retomar ai a sua própria autonomia financeira, a gente já
sabe que ela não vai conseguir de forma tão acessível, tanto numa
questão de que ela vai carregar essa vivência, essa característica
negativa como o preconceito, a sociedade ela é muito
preconceituosa nesse sentido, então alguém que está fazendo uma
seleção, não vai querer dar preferência pra uma pessoa que tem no
seu histórico essa realidade. (Mirela Feraz).
Ou, seja, a própria Sociedade e o Estado dificultam este retorno:
E ai atrelado a isso, tem as questões objetivas, as próprias
instituições acabam exigindo documentos como: Antecedente
Criminal, o CPF, Título de Eleitor que essas pessoas que teve a
experiência no sistema prisional não têm [...]. Elas falam que depois
que se passa por essa experiência pela essa questão de sistema
prisional, alguns documentos: CPF, Título de Eleitor são bloqueados
e isso acaba dificultando qualquer inserção [...], acaba tendo até a
questão do [...] antecedentes criminais que não deve ser exigido.
(Mirela Feraz).
Uma forma de criar oportunidade para a entrada destes sujeitos no mercado
de trabalho é quando o Estado faz parcerias com o setor privado para propiciar este
retorno dos egressos à sociedade, porém por falta de ações efetivas e pela falta de
monitoramento com as parceiras acordadas, perpassas de maneira utópica no
cotidiano da população egressa do sistema prisional.
Então a questão da política, as políticas públicas que estão sendo
desenvolvida atualmente para o egresso seja homem ou mulher, é
uma política seria, uma política que tem tudo para dar certo, a
questão é que é assim [...], por exemplo, esse projeto do Pró
Egresso foi divulgado gastou-se milhões em propagandas há dois,
três anos passados e até hoje, por exemplo, a FIESP é que se
propôs a abrir as portas da construção civil pra que pudesse
empregar mais de 5 mil egressos de imediato, isso não aconteceu,
então [...] porque a falta de esclarecimento da sociedade como um
todo no sentido de dar oportunidade pra essa pessoa, que quando
sai duma prisão é muito grande ainda, então é necessário ainda
muito esclarecimento pra isso.(Gizelda Morato).
A ausência e a não efetivação das Políticas Públicas existentes dificulta a
intervenção profissional.
[...] as políticas publicas não respondem a isso, fica mais fácil o
crime. Até a gente fala, é um concorrente desleal pro assistente
43
social, com que argumentos tenho para falar pra essa mulher pra
essa família [...] não vai, por favor, ela com seis mil reais de aluguel
atrasado, com comida escassa na família e enfim [...] ausência de
tudo, [...] o crime batendo na porta dela, oferecendo vai lá faz uma
corridinha enfim outras coisas que você vai ter o seu dinheiro, como
é que fica isso, eu aqui, [...] representante de um poder publico, não
tenho instrumentos, ferramentas pra poder trabalhar [...].(Camila F.
Jorge).
Nesta conjuntura estas mulheres passam por dificuldades financeiras, falta de
oportunidade, dentre tantos outros problemas que impedem seu retorno à
sociedade.
Acabava sendo novamente mais acolhedor o retorno pro mundo do
crime, pro mundo seja do tráfico, porque lá não tem essa questão,
não existem critérios de exclusão, têm critérios óbvios né, estou aqui
fazendo uma analogia no sentido de sua inserção, mas essa pessoa
passa a ser muito mais acolhida pelo crime do que na verdade pela
Politica Pública, ai entra a gente na assistência de fato tentando lidar
com todas essas dificuldades e recai pra nós também essa ausência
de comunicação entre as outras políticas, tendo em vista também
que outra politica essencial seria a Politica do Trabalho e essa
politica também passa a ter essa dificuldade que eu já relatei, então
assim é um trabalho que a gente tem histórias de vida extremamente
ricas a gente passa a ver aquele sujeito para além do estigma que a
sociedade cria com quem viveu essa circunstância [...]. (Mirela
Feraz).
Após sair do sistema prisional, esta mulher não consegue retornar à sua
antiga rotina na sociedade, pois perde sua identidade enquanto cidadã.
A S.S.S, ela já veio logo de inicio mostrando quem era, a S.S.S e
colocou na identidade dela, eu sou ex-presidiária. Então foi uma
identidade [...]. (Camila F. Jorge).
Desta forma, ao retornarem para a vida em sociedade, estas mulheres se
encontram fragilizadas para retomarem as suas relações tanto dentro do convívio
familiar quanto social.
Que eu posso sai na rua, que eu posso passar por perto de um carro
de policia de cabeça erguida, que eu posso ir numa delegacia se
precisar de um documento que eu perdi, de uma coisa assim, que eu
sou livre, que eu tenho minha casinha, meu cantinho. É o meu sonho
ter um espaço pra mim e pro meus filhos, vê meus filhos bem na
escola, a minha filha formada de Assistente Social ou qualquer outra
coisa que ela quiser ser, meu filho, a Vitória minha bailarina que eu
tenho em casa. (S.S.S).
44
3 HISTÓRIA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A POPULAÇÃO EGRESSA
Este é um desafio bem grande, um desafio que a gente acaba vendo
uma sociedade sendo criada dentro de outra sociedade, que é o
próprio mundo do crime, que passa a ser todo muito mais acolhedor
do que a nossa esfera pública, onde a gente se insere como
profissionais (Mirela Ferraz).
Por meio dos dados coletados e apresentados podemos constatar a
importância da participação e efetivação das Políticas Públicas como instrumento
fundamental para a contribuição no processo de retorno à sociedade desta
população. Para melhor entendimento de como surgiu as políticas específicas para
as mulheres egressas do sistema prisional feminino no Brasil, faremos aqui um
breve relato da contextualização histórica da construção das Políticas Públicas no
Sistema Prisional Brasileiro.
Durante a maior parte do século XX a concessão de direitos era voltada
somente ao homem, sem reconhecer a mulher como ser pertencente de uma
mesma sociedade igualitária em direitos e deveres enquanto ser humano.
A partir da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem,
aprovada na IX Conferência Internacional Americana, em Bogotá no mês de abril de
1948, é que se passou a reconhecer os Direitos Humanos inerentes à pessoa
humana, seja ele homem ou mulher, qual dispõe no Capítulo I - dos Direitos em seu
artigo 1° a igualdade do ser humano em relação à liberdade, à segurança e direito à
vida. Foi a partir desta declaração que tivemos a Universalização da Declaração
Universal dos Direitos Humanos, criada pela Organização das Nações Unidas - ONU
em 10 de Dezembro de 1948, documento este como base fundamental para garantia
dos direitos de todos os cidadãos, que garante não somente o direito a vida,
segurança pessoal e liberdade bem como dispõe em seu artigo 2° o seguinte:
1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as
liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de
qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião
política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza,
nascimento, ou qualquer outra condição.
2. Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição
política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença
uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela,
sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de
soberania.
45
Importante ressaltar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos não
foi adotada por todos os países, mas boa parte do mundo fez adesão à carta.
Baseados nos artigos de tal declaração houve a criação da Convenção sobre a
Eliminação de Todas as formas de Discriminação contra a Mulher, criada em 18 de
Dezembro de 1979, que estabelece aos Estados participantes do acordo:
Para os fins da presente Convenção, a expressão "discriminação
contra a mulher" significará toda a distinção, exclusão ou restrição
baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou
anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher,
independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do
homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades
fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil
ou em qualquer outro campo.
O Brasil passou a incorporar a Convenção sobre a Eliminação de Todas as
formas de Discriminação contra a Mulher a partir de 1985, antes mesmo de
incorporar ao Estado a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que só veio a
ocorrer a partir da reforma constitucional ocorrida em 1988, a partir da Constituição
Federal da República Federativa do Brasil, do qual determina como princípios
fundamentais:
A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel
dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em
Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por
meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição.
Após a inclusão da Declaração Universal dos Direitos Humanos na
Constituição Federal de 1988, o Brasil adere também em 1992 através do Decreto
N° 678 a carta Convenção Americana sobre os Direitos Humanos elaborada em 22
de novembro de 1969, entrando passou a ter vigor internacional a partir de 18 de
julho de 1978, que tem em sua base a reafirmação ao reconhecimento dos direitos
essenciais da pessoa humana.
Foi criada a LEI N° 7.353 de 29 de agosto de 1985, que determinava a
criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, do qual objetivo é promover
46
políticas que visem eliminar as descriminações sofridas pelas mulheres e assegurar
condições de igualdade e liberdade em direitos, participação na política, economia e
cultura do País, conselho este criado com base nas diretrizes da Convenção. No
mesmo ano, foi implantado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher - CNDM,
vinculado ao Ministério da Justiça. Entre 1985 a 2010 o órgão teve suas atribuições
muito alteradas, dentre elas a agregação de estrutura à Secretaria Especial de
Políticas Públicas para as Mulheres, criada em 2003 a partir da LEI N° 10.683 do
qual tem por objetivo formular, articular e coordenar as políticas elaboradas para as
mulheres, bem como criar campanhas que visem a eliminar as descriminações
contra a mulher. Conta também com a participação de representantes do poder
Público e da Sociedade Civil para a garantia e controle da efetivação das políticas.
Em 19 de agosto de 2010 a Secretaria de Políticas Públicas para as
Mulheres passa a compor a Presidência da República juntamente com as Secretaria
de Direitos Humanos, Secretaria de Políticas de Promoção de Igualdade Racial e
Secretarias de Ponto através da LEI N° 12.314 sancionada.
Conforme visto acima, muitas ações para a garantia dos direitos das mulheres
foram iniciadas a partir da criação do Conselho Nacional dos Direitos das mulheres,
no entanto, a população que se encontravam dentro do sistema prisional no estado
de São Paulo, tanto homens como mulheres, neste período ainda não eram vistos
como cidadãos de direitos, pois não existiam políticas específicas para esta
população que pudessem reafirmar a sua existência enquanto seres humanos e
cidadãos de direito, pois neste período em que se encerrava a Ditadura Militar (1964
– 1985) esta população era vista pela sociedade como pessoas que ocasionavam
desordem pública e dano moral e social a sociedade.
É criado em janeiro de 1993 a Secretaria de Estado da Administração
Penitenciária do estado de São Paulo, que foi a primeira no Brasil voltada para a
população inseridas ou egressas do sistema prisional, do qual tem por finalidade:
Fica criada a Secretaria de Estado da Administração Penitenciária,
destinada a promover a execução penal no âmbito administrativo e a
proporcionar condições para a reinserção social do condenado e do
internado (LEI N° 8.209, de janeiro de 1993, art.1).
Secretaria de Administração Penitenciária - SAP foi criada com propósito de
proporcionar melhores condições de retorno a sociedade aos presos e presas do
Estado de São Paulo, através de políticas que viabilizem ações para a promoção e
47
assistência para os usuários deste sistema, a fim de promover humanização aos
presos para auxiliar na sua “reinserção à sociedade”. Fica responsável também em
formular e executar programas que viabilizem assistência às famílias dos presos e
egressos/egressas do sistema prisional, do qual inicialmente foi criado o
Departamento de Reintegração Social Penitenciário no ano de 2003 do qual seria o
responsável em desenvolver estas ações, que mais tarde foi substituído
Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadania.
Para o desenvolvimento no atendimento especifico em relação às pessoas
que já passaram pelo sistema prisional ou encontram-se em
cumprimento de
alternativas penais, é criado a Coordenadorias de Reintegração Social e Cidadania CRSC
7
têm como finalidade prestar atendimento aos sentenciados e egressos
através das Centrais de Penas e Medidas Alternativas e as Centrais de Atenção ao
Egresso e Família - CAEF, através do Decreto N° 54.025 de 16 de Fevereiro de
2009, do qual dispõe no Capítulo V, Seção I das Disposições Gerais:
II - promover:
a) a articulação sistemática das unidades da Secretaria para
elaboração, implantação, avaliação, revisão e reajustes dos planos,
programas, projetos e atividades de reintegração social dos
sentenciados e dos egressos.
VI - elaborar e propor normas que visem à reintegração social dos
sentenciados e dos egressos.
VIII - fomentar a aplicação:
a) das políticas de atenção ao egresso e aos familiares de presos.
IX - articular ações de intercâmbio, cooperação técnica e integração
de trabalho com unidades do sistema penitenciário, órgãos e
entidades públicas
e
particulares
e
organizações não
governamentais, com vista à inserção social dos presos, seus
familiares, egressos e beneficiários de concessões legais.
As Centrais de Atenção ao Egresso e Família fazem parte do “Programa de
Atenção ao Egresso e Família” criado pela Secretaria de Administração
Penitenciária juntamente com a Coordenadoria de Reintegração Social e Cidadania,
que visa prestar assistência na área da saúde, emprego, jurídica, psicossocial e
cultural levando em consideração seu contexto familiar a fim de proporcionar a estes
indivíduos o exercício da cidadania e promover a sua autonomia, procurando auxiliar
no resgate de sua dignidade ao retorno e convívio social, bem como resgate de sua
7
Departamento compõe a estrutura básica e subordinado a Secretaria de Administração Penitenciária,
oficialmente publicado no Diário Oficial Poder Executivo do Estado de São Paulo através do Decreto mencionado
acima.
48
identidade enquanto usuário, do qual é perdida após ter passado pelo sistema
prisional8.
Em 2009 é criado o Programa de Inserção de Egressos do Sistema
Penitenciário no Mercado de Trabalho - PRÓ-EGRESSO que surge como Política
Pública complementar para auxiliar no retorno à sociedade destas pessoas9. Tem
como proposta a criação instrumentos de intervenção através do auxilio na
concessão de emprego e renda como meio de combater o retorno destas pessoas
ao mundo do crime, uma vez que o preconceito, a falta de oportunidade na busca
por emprego para recolocação no mercado de trabalho são um dos grandes fatores
que colaboram para a reincidência criminal destas pessoas.
Possui parceria com a Secretaria do Emprego e Relações de Trabalho SERT e Programa Estadual de Qualificação e de Requalificação Profissional - PEQ,
trabalho este desenvolvido em conjunto com os órgãos de competência do sistema
prisional como a Secretaria de Administração Penitenciária e a Coordenadoria de
Reintegração Social e Cidadania.
Atualmente, existe um projeto de Lei em andamento para a criação do
Programa Nacional de incentivo ao Emprego de Egressos do Sistema Penitenciário
– PROESP, elaborado pelo Deputado Sandro Mabel em 2006. O projeto de lei visa à
qualificação profissional para o mercado de trabalho, geração de postos de trabalhos
e criar oportunidade para geração de renda aos presos e egressos, a fim de
assegurar-lhes a “Ressocialização” a sociedade por meio do trabalho.
Alega como justificativa para criação de lei a atual situação caótica do
sistema penitenciário, ao exemplo da superpolução nas penitenciárias bem como o
descumprimento na efetivação dos direitos garantidos através da Lei de execução
Penal. Até a apresentação deste trabalho, projeto de lei ainda não havia sido
aprovado e encontra-se em tramitação junto a Câmara dos Deputados aguardando
definição de recurso apresentado para o não arquivamento de projeto.
Tivemos, ao longo dos anos, avanços significativos sobre políticas voltadas
ao sistema prisional, no entanto, ainda não suficientes para que possam ser
efetivadas de fato como já acontecem em outros países.
8
As Centrais tem como prioridade em seu atendimento o acolhimento, encaminhamento e atendimento as
diversas demandas apresentadas por esta população, inseri-los em programas de capacitação que proporcione
a geração de emprego e renda, inclusão e auxilio no recebimento de programas sociais, trabalhistas e de saúde,
auxilio jurídico e orientação para retirada de documentos pessoais, encaminhamento as redes de saúde e
orientação no auxilio a retomada de estudos e cursos profissionalizantes. Desde sua criação, atualmente no
estado de São Paulo possuem 25 CAEF´S.
9
Instituído o programa através do Decreto N° 55.216, de 7 de Dezembro de 2009.
49
[...] falta muito esclarecimento e falta mais ações, ações em que
sentido, por exemplo, nos EUA o programa de livramento condicional
quando o sujeito vai sair da prisão, ele já passa pelo Serviço Social
dentro da prisão, o Serviço Social já tem parcerias com as
organizações sociais, que já encaminha o sujeito pra frentes de
trabalho, já encaminha o sujeito para o trabalho ele é acompanhado
de fato, durante um ano, enquanto egresso ele é acompanhado. No
Brasil embora a lei determine isso, isso não acontece, a mulher
egressa ou o homem egresso não é acompanhado [...]. (Gizelda
Morato).
Em entrevista realizada junto à assistente social que atuou por muitos anos
na penitenciária de regime semiaberto no Butantã, nos relatou o quanto ainda falta
acompanhamento assistencial por parte do Estado em relação às pessoas que saem
do sistema prisional.
[...] existe um acompanhamento do judiciário para o egresso, mas é
um acompanhamento do que, ir lá, bater um carimbo na carteirinha
que, você sabe disso, é pontual, não é algo que você vai investigar,
vê de fato o que esta acontecendo com a pessoa. Quais são suas
demandas, o que essa pessoa tá trazendo, para que o Estado possa
continuar auxiliando, porque é responsabilidade do Estado, a pessoa
que sai duma prisão enquanto egressa for, ela é responsabilidade do
Estado. Então, o Estado já falha imagina a sociedade. (Gizelda
Morato).
3.1 Políticas Públicas específicas para mulheres presas e egressas do sistema
prisional feminino
Como pudemos notar até aqui, algumas ações e políticas foram implantadas
em favor das pessoas que passaram por este sistema, no entanto, mesmo com a
criação das Políticas Públicas para as Mulheres iniciadas a partir de 1985, ainda
nada de concreto no que diz respeito à legislação ou projetos em defesa da mulher
presa ou egressa havia-se desenvolvido. Em 7 de dezembro de 2007 o Grupo de
Trabalho Interministerial em conjunto com a Secretaria de Políticas Públicas para as
Mulheres, o Ministério da Justiça e Departamento Penitenciário Nacional realizam o
Relatório Final que visa implementar políticas efetivas para atender as necessidades
das mulheres que saem do sistema prisional e não conseguem acesso a rede de
serviços enquanto cidadã de direitos, considerando que as mulheres vivem um
50
contexto histórico de descriminação e preconceito muito grande, conforme já citado
no capítulo anterior.
Levando em consideração este cenário e as violências sofridas pelas
mulheres na prisão, a I e II Conferência Nacional de Políticas Públicas para as
Mulheres aprovam diretrizes que viabilize a criação de políticas especificas para este
segmento. A partir dessas pontuações este relatório coloca como prioridade:
É, portanto, com base no arcabouço legal existente e diante das
inegáveis violações de direitos pelos quais passam as mulheres que
se encontram em situação de prisão que apresentamos este
relatório, esperando que o mesmo possa contribuir com a elaboração
de políticas transversais que venham a propiciar às mulheres em
situação de prisão a recuperação de sua autoestima, sua formação
educacional e sua qualificação profissional de forma a reintegrá-las
na sociedade de maneira que a reincidência em atos de infração seja
totalmente descartada; possibilitando assim, o acesso pleno aos
direitos fundamentais e à justiça (BRASIL, 2007, p.11).
Para atingir ao objetivo proposto, o Grupo de Trabalho Interministerial - GTI
propõe que é necessário que as mulheres presas e egressas, mas também suas
famílias sejam incluídas no Programa Bolsa Família através do Centro de Referência
de Assistência Social – CRAS, pois na sua maioria atinge os requisitos para
participar do programa e dessa forma além de garantirmos o direito enquanto cidadã
destas mulheres estará de fato efetivando e garantido a sua integridade.
É neste contexto que apresentamos propostas de ação que envolve
Poder Executivo, Judiciário e Legislativo, nas esferas Federal,
Estadual e Municipal, cabendo ao Executivo Federal à articulação
destes entes, a construção de políticas públicas nacionais e o
incentivo às políticas regionais, observando-se a imprescindibilidade
do monitoramento das ações que se iniciarem. (BRASIL, 2007, p.85).
A partir deste relatório começam a surgir novas portarias promulgadas pelo
Departamento Penitenciário Nacional - DEPEN para auxiliar na construção de novas
políticas. A seguir faremos uma breve contextualização das mais recentes portarias
estabelecidas pelo departamento.
Em 08 de Janeiro de 2010 é promulgada a Portaria N° 04 que estabelece em
seu artigo 1°:
Estabelecer procedimentos, critérios e prioridades para a concessão
de financiamento de projetos, ações ou atividades com recursos do
Fundo Penitenciário Nacional - FUNPEN, no exercício de 2010,
51
visando à modernização
Penitenciário Nacional.
e
ao
aprimoramento
do
Sistema
Tal Portaria tem o interesse em disponibilizar recursos financeiros para
elaboração e efetivação de novos projetos que visam à criação de Políticas Públicas
para as mulheres egressas, desde que atendam aos critérios estabelecidos nesta
portaria para a sua concessão. O Fundo Penitenciário Nacional é quem será
responsável pelos repasses de verba após aprovação dos projetos apresentados.
A Portaria N° 154 de 13 de Abril de 2012 estabelece a criação da Comissão
Especial, comissão esta vinculada ao Departamento Penitenciário Nacional e
responsável pela Coordenação do Projeto Mulheres e por elaborar propostas de
ações para o Projeto “Efetivação dos Direitos das Mulheres no Sistema Penal”
lançado em 2011 pela Diretoria de Políticas Penitenciárias. Este Projeto busca
trabalhar entre diversos temas, melhoria nas ações voltadas à pesquisa de dados da
população feminina carcerária e egressa do Sistema Penal Brasileiro, do qual
atualmente se utiliza dos dados disponíveis em Informações Penitenciarias INFOPEN para levantamento.
Para auxiliar no processo de elaboração para efetivação dessas políticas, o
Ministério da Justiça instituiu o Grupo de Trabalho como intuito elaborar políticas
integradas e intersetoriais que são destinadas as mulheres que se encontram em
situação de privativa de liberdade, restrição de direitos e às egressas através da
Portaria N° 885, de 22 de Maio de 2012 que define em seu Artigo 2°, Inciso I:
I - avaliar e propor atualizações, ações integradas, estratégias de
implementação e de monitoramento das políticas públicas destinadas
às mulheres em situação de privação de liberdade, restrição de
direitos e às egressas, tomando por base o relatório intitulado
"Reorganização e Reformulação do Sistema Prisional Feminino",
elaborado pelo Grupo de Trabalho Interministerial instituído pelo
Decreto de 25 de maio de 2007.
A partir das portarias apresentadas, o Ministério da Justiça juntamente com a
participação do Departamento Penitenciário, Diretoria de Políticas Penitenciárias e a
Comissão Especial elaboraram o I Relatório Final do I Encontro de Planejamento do
“Projeto Efetivação dos Direitos das Mulheres no Sistema Penal”. Este relatório faz
um resgate das principais discussões ocorridas neste I Encontro que ocorreu no
período de 31 de maio e 01 de junho de 2012. Contaram com a participação da
52
União, Unidades Federativas (somente o estado do Rio de Janeiro esteve ausente),
áreas técnicas do Departamento Penitenciário e do Grupo de Trabalho
Interministerial, contando também com a participação do Ministério da Saúde,
Ministério da Educação, Ministério do Trabalho e Emprego, Secretária de Políticas
para as Mulheres e Secretaria dos Direitos Humanos.
Nesse encontro foram apresentados os índices de perfil e a quantidade das
mulheres presas atualmente no Brasil, assim como as dificuldades enfrentadas por
elas dentro deste sistema, por exemplo: violação de direitos, condições precárias de
encarceramento, a forma como o judiciário conduz mediante ao enfrentamento da
criminalidade feminina entre outras. Posteriormente, apresentados os estados do
Espírito Santo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul que dispõem de Políticas de
Atenção Integral as Mulheres Presas e Egressas do Sistema Penal, em que realizam
atendimento na área da saúde, educação, trabalho e cultura para estas mulheres.
Tendo em vista o exposto, este encontro propõe implementação e mudanças
estruturais e institucionais no Sistema Penitenciário a nível nacional e estadual
através dos dados apresentados, reforçando a necessidade da estruturação da
Política Nacional de Atenção Integral às Mulheres Presas e Egressas do Sistema
Penal, para que assim possa atingir de forma nacional todas as mulheres que se
encontram inseridas neste sistema e não somente em alguns estados como é
proposto hoje. Por isso, a participação da União neste encontro foi de extrema
importância para a colocação de proposta no âmbito Federal.
As maiores pautas discutidas sobre os temas foram a efetivação de condições
concretas na área da saúde, educação, trabalho, assistência material e social,
parcerias, recursos humanos do pessoal que trabalham nas penitenciarias. Para
cada campo, foram apresentados proposta de melhorias para concretizar ações
através de condições dignas e essenciais para sua efetivação. Dentre algumas
propostas, alguns itens pontuados chamaram mais atenção para a discussão como:
a criação de parceria com instituições de ensino superior, conscientização dos
agentes profissionais sobre a importância de capacitação e humanização nos
atendimentos a estas mulheres para que os seus direitos enquanto cidadãs e ser
humano sejam preservados e respeitados, ampliar o repasse de recursos financeiros
pelo Fundo Penitenciário, trabalhar a questão do recorte de gênero, propor ao
Conselho Nacional de Justiça que o Poder Judiciário adote o encarceramento como
ultima medida penal, sendo formalizadas mais propostas de alternativas penais,
53
propor ao judiciário procedimento de remição de pena e garantir e garantir benefício
acumulativo por meio do trabalho e educação e alterar a legislação de Execução
Penal nos casos de delito em que há a devolução do bem, deixando assim de existir
a punibilidade.
Portanto, neste encontro pretendeu-se:
As propostas elaboradas de forma participativa retratam ações macro
e micro que precisam ser enfrentadas na conjuntura atual da política
penitenciária e das políticas sociais, como forma de garantir os
direitos das mulheres em situação de privação de liberdade,
egressas e seus núcleos familiares, rechaçando, assim, práticas
institucionais violadoras dos direitos humanos (BRASIL, 2012, p.15).
Mesmo com todo o histórico que temos de ações e decretos para que possa
ser viabilizada uma política especifica para a Mulher presa ou egressa, a cidade de
São Paulo ainda não criou nenhum programa, projeto de lei ou ação que venha
pautar esta questão e ir buscar a sua efetivação de forma especificas para as
mulheres do sistema prisional. O que temos hoje na cidade são diversos programas
que abordam a situação da mulher que sofre violência, programas de auxilio ao
egresso e à família de uma forma em geral como o PRÓ - EGRESSO e as Centrais
de Atenção ao Egresso
a Família, mas nada em especifico para a população
feminina egressa. Pouco é apresentado pelo município e estado em relação dessa
atual demanda que representa uma das expressões da questão social.
[...] a S é pra mim ela tem sido realmente uma família que precisa de
muito acompanhamento ela é reflexo desse não atendimento das
políticas públicas é em relação quando ela saiu no momento em que
ela saiu e ela tá é vamos dizer sofrendo toda essa consequência por
ter passado pela penitenciaria em algum momento na vida dela [...] ai
ela vem com isso pra gente, mostrando que de fato ela não
consegue não que ela tenha que se diferenciar em atendimentos por
conta dela ter passado pelo um sistema prisional, mas que ela
tivesse oportunidades diferenciadas que outras pessoas talvez não
necessitem. (Camila F. Jorge).
Por isso é necessário que haja um acompanhamento e atuação efetiva das
Políticas Públicas para as mulheres inseridas no sistema prisional, a fim de que seus
direitos enquanto cidadãs sejam garantidas tanto dentro como fora do sistema
prisional, diminuindo assim as desigualdades sociais existentes na sociedade.
54
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ressaltamos aqui o quão enriquecedora foi esta pesquisa, apesar de
apresentar, no decorrer do percurso, muitos imprevistos, que somente agregaram
maior riqueza e qualidade ao estudo. Ao iniciarmos a pesquisa, o foco seria
conhecer como se desenvolvem as relações do processo de retorno à sociedade
das mulheres que passaram pelo sistema prisional, através de suas vivências nas
prisões. No entanto, no avançar da pesquisa de campo, identificamos que esta não
seria uma tarefa tão fácil.
A dificuldade em localizar e se aproximar destas mulheres é extremamente
grande, pois, na maioria dos casos, elas não se sentem a vontade para falar. Em
casos específicos, as próprias instituições que prestam serviço a esta população,
dificultam o acesso às mesmas, colocando-as como vítimas e como pessoas
fragilizadas. Sendo assim, não lhes mostram a possibilidade de que seu depoimento
pode servir como incentivo para a criação de novos projetos, de intervenção
profissional e de reconhecimento enquanto cidadã na sociedade. No entanto, novas
portas de análise para compreensão do presente estudo foram surgindo ao longo da
pesquisa.
Para compreendermos o processo de análise de campo, realizamos um
resgate histórico do contexto das prisões e de como elas foram surgindo ao longo
dos anos no Brasil e no mundo, bem como, resgates das bases conceituais que
abordam a Questão Social e o capitalismo neoliberal, o qual hoje está posto na
sociedade. Para tal compreensão, nos utilizamos de autores como: Andrea Almeida
Torres e Jailson Rocha Siqueira, que discutem a questão do sistema prisional como
o reflexo das desigualdades sociais na sociedade e as relações de poder por ela
imposta. Foi necessário também nos apropriarmos sobre as Políticas Públicas
direcionadas para a defesa e garantia dos direitos das pessoas que se encontram
em situação de prisão ou egressa deste sistema.
Houve duas instituições que foram de extrema importância para análise de
metodologia, sendo elas: Centro de Apoio ao Trabalho – CAT Santana, na qual
aplicamos um questionário para cinco mulheres que são atendidas no local, para
traçarmos, ainda que de forma superficial, mas de grande conteúdo qualitativo,
características do seu perfil. Ao aplicarmos questionários, nos causou grande
55
surpresa ao perceber que, somente uma das cinco mulheres teve apoio da rede
sócio assistencial ao sair do sistema prisional e que a sua entrada no mundo do
crime justificou-se com a garantia de seu sustento familiar, por conta do rompimento
com seus companheiros ou pelo fato do mesmo estar preso.
Outra fonte de estudo foi o Centro de Referência de Assistência Social –
CRAS Casa Verde, que nos possibilitou a conquista do depoimento de uma usuária
do serviço da rede que já teve experiência no sistema prisional. Estas experiências
foram muito importantes para a concretização dos objetivos propostos na pesquisa e
para maior compreensão desta realidade.
Confessamos que, ao buscarmos estes locais surgiram novas inquietações,
como o de observar o olhar dos profissionais da área do Serviço Social, sobre como
ocorrem às relações no processo de retorno à sociedade destas mulheres. Para
isso, realizamos entrevistas com três assistentes sociais, com o intuito de
analisarmos como a intervenção profissional está inserida na perspectiva desta
temática.
Com base em todos os dados pesquisados e entrevistas realizadas,
concluímos, portanto, nesta pesquisa, que há uma grande deficiência do Estado em
relação às Políticas Públicas aplicadas para os/as egressos/as do sistema prisional
e principalmente, às mulheres.
Entendemos que as desigualdades vivenciadas na sociedade por conta deste
“bum” do capitalismo neoliberal e a exigência de uma sociedade de consumo,
proporcionam para estas mulheres o seu ingresso ao mundo do crime, tendo em
vista que sofrem constantemente discriminações, preconceitos, estigmas e violação
de seus direitos, uma vez que, após a sua saída do sistema prisional não lhe é
oferecida oportunidade de emprego, moradia, saúde, educação, entre outros. As
condições vividas dentro de um sistema prisional são desumanas, o que agravam
ainda mais as condições de retorno à sociedade desta população.
Estas mulheres além de não terem acesso a estas oportunidades, que
sabemos ser de responsabilidade do Estado, sofrem ainda mais discriminação por
conta da identidade de gênero, então, é “aí que se torna mais fácil à retomada ao
mundo do crime, porque lá elas terão oportunidade de retomar a sua vida cotidiana e
garantir o seu sustento” conforme nos disse a assistente social Mirela Ferraz.
56
A realidade que elas vivem evidencia a precariedade das Políticas Públicas
existentes e a urgência da criação de políticas específicas para esta segmentação
da população.
Esta é mais uma das expressões da Questão Social colocada frente ao
capitalismo, que nos conduz a uma realidade onde a desigualdade social se torna
cada vez mais presente, mencionando o sujeito como responsável por todas as
situações, eximindo a sociedade e o Estado de qualquer culpa, colocando assim, o
sujeito como principal causador da realidade vivida. Por isso, se faz tão importante
ao Serviço Social o aprofundamento nesta temática, pois atualmente poucos
estudos e pesquisas são realizados pelos profissionais da área para o atendimento
desta demanda, bem como, para o seu fortalecimento enquanto categoria
profissional, que tem como um dos eixos centrais de sua atuação a defesa aos
Direitos Humanos e a garantia na efetivação dos direitos.
Ao iniciarmos a pesquisa, não esperávamos que a mesma tivesse uma
dimensão tão enriquecedora e ampla, que nos apresentasse resultados tão
fantásticos, deixando claro que o entendimento do trabalho não acontece somente
através da metodologia escolhida, vai além, perpassa o que foi pretendido através
dos novos conflitos que surgem no decorrer do processo, da busca por estratégias,
das formas de atuação e construção de vínculos para a realização do trabalho.
Servir-nos além de grande conhecimento profissional e pessoal, será a porta inicial
para a nossa inserção na profissão, bem como o inicio da nossa vivência no
exercício profissional.
Cabe a nós, profissionais, contribuirmos no processo de elaboração para
novas políticas que visem contemplar a garantia efetiva dos direitos da mulher
egressa do sistema prisional e, proporcionar a mesma um retorno digno à
sociedade, trabalhando-a enquanto cidadã em todas as suas demandas: físicas,
sociais, psíquicas, econômicas e culturais. Entendê-la em sua totalidade,
considerando o seu contexto histórico.
Para além da mudança política e social desta população, se faz necessário
também iniciarmos um processo de conscientização da sociedade de que esta
mulher, assim como qualquer outra pessoa, é detentora de direitos garantidos na
Constituição Federal de 1988, e que independente do delito que tenha cometido em
um determinado momento de sua vida, não pode ser marcada pelo resto de sua
existência como uma pessoa marginalizada, e que, de maneira alguma, podemos
57
excluí-la da sociedade, pelo contrário, temos que buscar recursos e subsídios que
contribuam no seu processo de “ressocialização ao meio e convívio social”.
Registramos aqui a importância da pesquisa, para que possamos conhecer
uma realidade, encontrar novos rumos e fazeres profissionais para a intervenção
profissional, e o convite à busca de novos caminhos. Quem sabe, a busca também
por uma nova sociedade, a fim de garantirmos a proposta do exercício profissional
colocada no projeto ético político lutando por uma sociedade mais igualitária.
58
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SHIKIDA, Pery Francisco Assis; JUNIOR, Ari Francisco de Araujo; SHIKIDA, Cláudio
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62
ENTREVISTA COM SUJEITA DE PESQUISA S.S. S
(...) Ai foi muito ruim muito ruim mesmo foi sem palavras (...) a minha vida eu
perdi de viver, eu deixei de viver, não vivi a vida que eu vivo aqui fora. Você acorda
de manhã não vê a rua, não vê as pessoas, não come uma comida que pode comer,
num andar sabe (...) muito ruim mesmo, não sei nem como te explicar. (1) Só volta lá
pra dentro quem for trouxa, inteligente que não volta. É que nem eu te falei eu prefiro
a morte, mas não volto para a cadeia.
A o que eu espero do meu futuro, posso falar? Ai, que cê quer falar tipo um
sonho? Assim, meus filhos criado, eu numa casa, minha panela de pressão chiando
sabe, meus cachorro no quintal, meus filhos inos e voltando pra escola. Eu não
quero furtuna, não peço riqueza peço (...) só queria ter um cantinho pra minha
cabeça e dos meus meninos, só isso mais nada, não peço riqueza (...) só ter um
espaço pra mim e pro meus filhos sabe. Que eu posso sai na rua, que eu posso
passar por perto de um carro de policia de cabeça erguida, que eu posso ir numa
delegacia se precisar de um documento que eu perdi, de uma coisa assim, que eu
sou livre, que eu tenho minha casinha, meu cantinho.
É o meu sonho ter um espaço pra mim e pro meus filhos, vê meus filhos bem
na escola, a minha filha formada de Assistente Social ou qualquer outra coisa que
ela quiser meu filho, a Vitória minha bailarina que eu tenho em casa. Nossa não
peço mais nada pra Deus, saúde só isso (...) e nada mais. Não quero riqueza, quero
só (...) que eu possa viver bem com (...) que é a minha família.
(...) Que eu enfrentei ou ainda enfrente? Tive muito (...). A lembrança eu acho
né, porque querendo ou não passam na minha cabeça as recordações de muitas
coisas que eu vivi lá dentro, às vezes eu vejo mulheres sendo presas, eu passo na
porta (...). De eu não ter vivido o que eu podia ter vivido aquela época. Às vezes eu
me culpo por (...) ter acontecido isso comigo, e eu tenho vergonha dos meus filhos,
de tocar nesse assunto, deles saberem. Tenho vergonha de tocar assim no assunto
e saber que eu sou uma ex-presidiária, (...).
Num gosto de num ter feito o que eu poderia ter feito muitas coisas naquela
época, poderia ter ficado de bem, hoje em dia eu poderia ser uma outra pessoa né.
Os anos que eu perdi os tempos que eu perdi ali dentro, quem sabe eu teria me
ajudado, hoje em dia num teria o sofrimento que eu tenho agora. Não sei se isso
prestou pra você né.
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(...) Só vou te falar uma coisa, meus filhos são tudo que eu tenho na vida
(...).Tudo o que eu faço é por eles, cada dia que passa eu peço a Deus só uma
coisa: saúde, forças pra mim não ter que vir a fazer mais nada de errado nessa vida,
pra poder dá o melhor pra eles, porque o melhor que eu acho que posso dar pra eles
é educação.Também pra eles, pra minha Vitoria, pro meu Vitor, pra minha Aninha,
pro meu Israel, resgatar o meu filho e principalmente meu filho Israel. Resgatar ele,
mostrar pra ele que essa vida que ele tenta entrar não é a vida não é futuro. Ele não
vê que não tem futuro, é ilusão, tipo assim: ele dá um tapete vermelho de ouros e
prata e quando ele puxa, puxa de uma vez e te joga lá dentro daquele buraco, perde
tudo, (...) perde dignidade, perde filho, perde mãe, perde pai, amigos. Amigos eu
digo irmão, amigo pra mim é irmão, é contato nos dedos as pessoas que a gente
fala a palavra amigos.
Fora isso meus filhos é tudo que eu tenho na vida e eu sei que eu vou vencer
pelos meus filhos, porque eu só forte tenho muita força de vontade, muita e ninguém
vai tirar isso de mim. Mais voltar eu não volto, eu pela minha força não volto. Nossa
essa é meu anjo da guarda o.
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ROTEIRO DE ENTREVISTA
1. Nome:_____________________________________________________
2. Profissão:__________________________________________________
3. Escolaridade:_______________________________________________
4. Endereço:__________________________________________________
5. Telefone para contato:________________________________________
6. Data de nascimento: _____/_____/_____. Idade:__________________
7. Naturalidade:_______________________________________________
8. Estado civil:________________________________________________
9. Têm filhos, quantos?
_________________________________________________________
10. O que levou a entrar para o sistema prisional?
_______________________________________________________________
11. Quando saiu do sistema prisional?
_______________________________________________________________
12. Teve acesso a alguma rede de apoio, como Centro de Referência de
Assistência Social, Centro de Acolhidas, ONGs entre outras?
_______________________________________________________________
13. Teve apoio familiar ao sair do sistema carcerário?
_______________________________________________________________
14.Teve apoio de amigos?
_______________________________________________________________
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15. Está trabalhando atualmente? Se sim, onde?
_______________________________________________________________
16. Contribui para a renda da família?
___________________________________________________________________
17. Alguém da família já esteve no sistema penitenciário anteriormente?
___________________________________________________________________
18. Como foi a experiência em passar pelo sistema prisional?
___________________________________________________________________
19. O que espera do seu Futuro?
___________________________________________________________________
20. Quais as dificuldades que tem enfrentado/enfrentou após ter saído do
sistema prisional?
___________________________________________________________________
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