TÉCNICAS DE TERAPIA MANUAL NO TRATAMENTO DA SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO João A. Ruaro.1; Alberito R. Carvalho2; Juliana C. Frare3 ; Gustavo C. Brandão4; Daniel A. Ávalos5; 1 Setor de Fisioterapia FAAFI – Faculdades Anglo-Americano, Campus Foz do Iguaçu. Av. Paraná, 5661. Vila A. Foz do Iguaçu – PR. Fone/Fax: (45) 3524-2003 1,2,3 Setor de Fisioterapia UNIOESTE 4,5UNIVAP – IP&D [email protected], [email protected], [email protected] Resumo- A Síndrome do Túnel do Carpo (STC) é considerada a mais comum entre as neuropatias compressivas e é caracterizada pelo encarceramento do nervo mediano na sua passagem pelo canal do carpo. Uma das formas de se tratar conservadoramente essa disfunção é através de técnicas de terapia manual. Objetivou-se verificar a eficácia de um protocolo com técnicas de terapia manual direcionadas ao cotovelo e punho para o tratamento da STC de uma paciente. Para isso, foi avaliada e tratada uma paciente com STC sintomática no punho direito. O tratamento consistiu de cinco técnicas de terapia manual direcionadas às articulações e aos tecidos moles. As variáveis utilizadas para avaliar a resposta da paciente ao tratamento foram: dor, parestesia, força muscular do oponente do polegar e ADM de punho. Embora nem todos os sintomas tenham desaparecido por completo, a paciente apresentou uma boa resposta ao tratamento. Conclui-se que o protocolo de tratamento proposto foi eficaz para a paciente do estudo. Palavras chaves: Terapia manual; Síndrome do túnel do carpo; Fisioterapia Área do conhecimento: IV – Ciências da Saúde Introdução O túnel do carpo é um espaço fechado que vai dos ossos escafóide e trapézio em direção aos ossos psiforme e hamato. O ligamento transverso do carpo recobre este espaço. Dentro do túnel ficam os tendões dos músculos flexor superficial e profundo dos dedos, flexor longo do polegar e o nervo mediano [1]. A síndrome do túnel do carpo (STC), é consequência da compressão do nervo mediano na sua passagem pelo punho [2]. Atualmente, é aceita como a síndrome de compressão nervosa mais comum [3,4], com prevalência na população geral de aproximadamente 5,8% no sexo feminino e 0,6% no sexo masculino [5]. Os sintomas mais freqüentes são hipoestesia, parestesia, fraqueza muscular e dor na região suprida pelo nervo mediano [6]. Em condições normais, a pressão tecidual dentro do compartimento de um membro é de 7 ou 8 mmHg. Na STC, a pressão fica em torno de 30 mmHg, podendo chegar aos 90 mmHg na flexão ou extensão do punho [7]. Assim, há isquemia local que resulta em colapso dos vasos capilares da vasa nervorum. O nervo é, então, privado de oxigenação sendo sua resposta fisiológica o bloqueio da condução [8,9]. Com relação à etiologia, sabe-se que qualquer condição que diminua a área do túnel do carpo ou aumente o volume do seu conteúdo pode comprimir o nervo mediano [10, 11]. Porém, a causa na maioria dos pacientes permanece inexplicada, idiopática [12]. Os sintomas e os critérios diagnósticos da STC permanecem pobremente definidos, apesar de se tentar estabelecer o gold standard baseado em uma combinação de sintomas e função do nervo mediano anormal [13]. O tratamento prioriza o alívio da pressão nervosa e, eliminar a isquemia e conseqüentes sintomas [12]. O tratamento cirúrgico é destinado àqueles pacientes com sintomatologia severa para os quais o tratamento conservador foi ineficaz [11, 14, 15]. Há várias modalidades terapêuticas não cirúrgicas para o tratamento da STC; entretanto, a sua efetividade e o papel delas na administração da síndrome permanecem incertos [14]. Técnicas de terapia manual podem ser uma alternativa para o tratamento conservador da STC, por ser um método de avaliação e tratamento de disfunções do sistema musculoesquelético que visa a diminuição das tensões musculares, a restauração da mobilidade articular e, em geral, a regularização das funções. Engloba diversas técnicas que possuem ações específicas sobre diferentes tecidos [16]. Levando-se em consideração que não foram encontradas pesquisas similares na literatura, justifica-se a investigação feita neste estudo. O objetivo deste trabalho foi verificar a eficácia de um protocolo com técnicas de terapia manual direcionadas ao cotovelo e punho para o tratamento da STC de uma paciente. IX Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e V Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 1695 Avaliou-se também a força muscular do oponente do polegar através do teste de força muscular proposto por Kendall et al [19]. A amplitude de movimento (ADM) de flexão e extensão do punho, desvios radial e ulnar, pronação e supinação foram medidos por goniometria conforme proposto por Marques [20]. A paciente foi submetida a 10 sessões com freqüência diária. As sessões foram compostas por 5 técnicas de terapia manual direcionadas aos tecidos articulares, moles e musculares do cotovelo e punho do lado sintomático: técnica de tração do cotovelo [21], técnicas articulatória do cotovelo e articulatória do punho [22], streching do retináculo flexor [22], e músculo-energia do pronador redondo [23], Materiais e Métodos Este trabalho foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa do CCBS/ UNIOESTE sob o número de protocolo CR. 006794/2002. Foi realizada uma avaliação inicial, na qual foram obtidos os seguintes achados: paciente do sexo feminino, portadora de síndrome do túnel do carpo, encaminhada por ortopedista com diagnóstico clínico e eletromiográfico (STC bilateral, mas referindo sintomatologia apenas no membro superior direito) STC idiopática; 31 anos; raça branca; atividade de secretária. O primeiro item observado foi a dor. Utilizouse como instrumento de mensuração a escala visual analógica (EVA) [17]. Em uma escala de 0 a 10, onde 0 representa ausência de dor e 10 a dor máxima vivenciada, foi solicitado ao paciente que assinalasse, por comparação, o número que melhor representasse sua dor naquele momento. Outro item avaliado foi a parestesia. Como procedimento de registro do grau de parestesia, foi usada a escala proposta por Louzão Neto [18] (tabela 1). Resultados Os resultados das variáveis encontram-se descritos na tabela 2. Discussão Pelos dados demonstrados na tabela 2, observa-se que, nos parâmetros avaliados, a paciente apresentou melhora, embora não total, do seu quadro. DiFabio [24] argumenta em seu estudo que a terapia manual pode ser um modalidade efetiva quando usada para tratar pacientes que apresentam dores sintomáticas. Convém destacar que o principal objetivo destas técnicas aplicadas em conjunto foi aumentar o espaço dentro do túnel do carpo para liberar a compressão nervosa, diminuindo assim a isquemia. Tabela 1 - Escala de parestesia Grau 0 1 2 3 analisadas Parestesia Parestesia ausente ou duvidosa Parestesia leve que raramente incomoda o paciente Parestesia moderada que incomoda claramente o paciente Parestesia grave que incomoda muito o paciente. Tabela 2 - Resultados obtidos na evolução do tratamento SES SÃO: VARIÁVEIS: 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª 9ª 10ª 5 6 6 4 7 2 6 3 3 1 2 2 2 1 2 1 1 1 1 1 4 4 4 4 5 5 5 5 5 5 78º 80º 80º 80º 72º 85º 86º 88º 80º 80º 56º 60º 50º 60º 60º 60º 52º 60º 64º 60º 18º 25º 26º 27º 30º 30º 30º 29º 30º 30º Desvio ulnar 33º 38º 36º 48º 40º 44º 42º 48º 44º 46º Pronação Supinação 80º 84º 90º 80º 85º 80º 90º 88º 84º 88º 72º 66º 62º 66º 80º 70º 80º 80º 80º 76º Escala De dor Escala de Parestesia Força muscular Flexão do punho Extensão do punho Desvio radial IX Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e V Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 1696 Verifica-se que o quadro álgico da paciente do caso em estudo teve uma evolução positiva saindo da posição 5 pela EVA no momento da avaliação inicial, para a posição 1 na 10ª sessão. Porém, a evolução deste quadro não foi harmoniosa, sendo relatada pela paciente, na 5ª e 7ª sessões, níveis álgicos maiores que os registrados na avaliação inicial. Por outro lado, a avaliada relatou, nessas sessões, que no dia anterior havia trabalhado mais que o usual e vivenciado situações estressantes. Talvez isso justifique o aumento da percepção dolorosa. Na STC, não há um padrão quanto à variação da dor sendo que esta pode variar expressivamente de intensidade [14]. Isto vem corroborar com nossos achados. Já a parestesia evoluiu com uma melhora mais constante em comparação a dor. A parestesia é pouco discutida na literatura, mas Posner [25], a define como uma sensação exteroceptiva de aparecimento espontâneo, podendo se apresentar na forma de sensações de alfinetadas, queimação ou formigamento. No trabalho de Campos et al. [26], encontra-se que parestesia e/ou dor nas mãos e/ou punho são os principais sintomas da compressão do nervo mediano no carpo, apesar de que outras afecções, tais como radiculopatias, plexopatias, polineuropatias, lesões ósteoarticulares, lesões corticais, e compressões do próprio nervo mediano em outros locais são citadas na literatura como possíveis causadoras dos mesmos sintomas. Quanto à força muscular do oponente do polegar, verificou-se uma melhora persistente no grau de força a partir da 5ª sessão. Meals [12], coloca que o teste da oposição do polegar contra resistência poderá revelar debilidade da musculatura tênar, que é inervada pelo nervo mediano. Hamil e Knutzen [27] complementam este dado dizendo que o movimento de oposição do polegar é o mais importante porque proporciona a oportunidade para pinçar, segurar e pressionar um objeto posicionando o polegar sobre qualquer um dos dedos. Sendo o principal músculo responsável o oponente do polegar. A melhora da força muscular do oponente do polegar corrobora com os indícios de que as técnicas foram capazes de propiciar descompressão nervosa, pois uma maior força muscular comprova uma inervação motora mais íntegra. Com relação à ADM, observou-se apenas uma discreta melhora nos ângulos. O protocolo estipulado para este caso mostrou-se eficaz. Entretanto, estudos avaliando um grupo amostral maior deve ser realizado para que inferências possam ser feitas. Deste modo conclui-se, concordando com Barak et al [16], que os fisioterapeutas devem desenvolver a perícia de utilizar as mãos em um aspecto mais amplo, pois existe à disposição uma multidisciplinaridade de abordagens que podem ser utilizadas para desenvolver programas de tratamento individualizados. Conclusão Conclui-se que o protocolo proposto para Síndrome do Túnel do Carpo foi adequado para o tratamento da paciente deste trabalho pautado nas melhoras: a) dos níveis de dor relatados, embora estes tenham apresentado variações; b) do grau de parestesia; c) da força muscular do oponente do polegar e, d) da ADM dos movimentos do punho. Referências [1] NADLER, S.; NADLER, J. W. Distúrbios por traumas cumulativos. In: DeLISA, J. A.; GANS, B. M.; BOCKENEK, W. L.; CURRIE, D. M.; GEIRINGER, S. R.; GERBER, L. H.; LEONARD JR, J. A.; McPHEE, M. C.; PEASE, W. S.; WALSH, N. E.; et al. Tratado de medicina de reabilitação – princípios e prática. 3 ed. São Paulo: Manole, 2002, v. II, cap 65, p. 1752-1753. [2] DAWSON, D. M. Current concepts: entrapment neuropathies of the upper extremities. [Review articles]. The new england journal of medicine. Boston, v. 327, n. 27, p. 2013-2018, dec. 1993. [3] PEREIRA, E. S.; ZALCMAN, I.; MORI, C. E.; AMARO, J. T. 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