Seja bem Vindo! Curso Hepatites Virais e HIV Área Odontológica CursosOnlineSP.com.br Carga horária: 60hs Conteúdo Programático: Hepatites Virais Classificação etiológica e mecanismos de Medidas de prevenção Diagnóstico Manifestações Clinicas Manifestações Orais em Portadores das Hepatites Tratamento Imunização HIV Epidemiologia Transmissão e prevenção Desmistificação de possíveis riscos de transmissão do HIV Diagnóstico Atendimento Odontológico Biossegurança Tratamento odontológico dos portadores de hepatites virais Farmacologia aplicada às hepatopatias e pós-transplantes Atendimento odontológico de rotina para portadores do HIV Aspectos éticos e legais Considerações Finais Bibliografia Hepatites Virais Epidemiologia As hepatites virais são doenças inflamatórias, provocadas por diversos agentes etiológicos a partir do tecido hepático, e que apresentam características epidemiológicas, clínicas e laboratoriais semelhantes, porém, com importantes peculiaridades. No Brasil, existem cinco vírus responsáveis pelas hepatites: A, B, C, e E. No contexto epidemiológico brasileiro, as hepatites virais vêm assumindo papel de destaque, com o aumento do número de casos ao longo dos anos. O conhecimento sobre a transmissão de doenças nos consultórios odontológicos contribui para os cirurgiões-dentistas realizem os procedimentos odontológicos de maneira mais segura, incorporando a sua rotina de trabalho as particularidades em relação às condutas clínicas perante os portadores das hepatites virais. A Organização Mundial da Saúde estima que existam, no mundo, cerca de 325 milhões de portadores crônicos da Hepatite B (desses, 18 milhões também possuem infecção pelo vírus D) e 170 milhões da Hepatite C. Um elevado percentual de portadores crônicos dessas doenças não apresenta sintomas e a infecção persistente pode resultar em cirrose, insuficiência hepática e carcinoma hepatocelular. Anualmente, ocorrem aproximadamente 3 milhões de exposições percutâneas para os 35 milhões de profissionais da saúde de todo o mundo. Estima-se que esses acidentes resultem em 15 mil infecções pelo vírus da Hepatite C (VHC), 70 mil pelo vírus da Hepatite B (VHB) e 500 pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). Mais de 90% dessas infecções ocorrem em países desenvolvidos e a maioria delas pode ser prevenida. não No Brasil, a maior parte dos casos de hepatite aguda sintomática deve-se aos vírus A e B. Nas regiões Norte e Centro-Oeste (norte de Mato Grosso), a coinfecção pelos vírus das hepatites B e D (VHB/VHD) também é importante causa de hepatite aguda sintomática. O vírus C costuma apresentar uma fase aguda oligoassintomática, de modo que responde por apenas pequena parte das hepatites agudas sintomáticas. Em virtude da magnitude e do potencial de transmissão, as hepatites virais são doenças de notificação compulsória e os profissionais de saúde no exercício da profissão, bem como os responsáveis por organizações e estabelecimentos públicos e particulares de saúde e de ensino, são obrigados a comunicar à vigilância epidemiológica dos serviços de saúde do Sistema Único de Saúde – SUS, a ocorrência de casos suspeitos ou confirmados das doenças relacionadas. O conceito de Sistema de Vigilância Epidemiológica é a coleta, a análise e a disseminação das informações sobre determinado agravo. Os principais instrumentos do sistema de vigilância das hepatites virais são as fichas de notificação e de investigação epidemiológica. A notificação dos casos suspeitos faz-se necessária visando à adoção oportuna das medidas de prevenção e de controle, a identificação e interrupção da cadeia de transmissão do vírus, a investigação dos comunicantes e a confirmação ou descarte dos casos. O cirurgião-dentista deve notificar, ainda na anamnese, os casos suspeitos ou confirmados de hepatites virais na ficha de notificação, disponibilizada pelas secretarias municipais de saúde para os estabelecimentos de saúde, devendo encaminhar a ficha à equipe local de vigilância para investigação e digitação no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). Desse modo, o cirurgião-dentista assume importante papel não apenas na notificação de casos suspeitos, mas no aperfeiçoamento de um sistema de vigilância epidemiológica efetivo. Deve, assim, ter conhecimento sobre as hepatites virais para exercer ações no cenário da prevenção primaria e secundária diante da suspeição ou confirmação diagnóstica do agravo, despertando a compreensão da importância de sua inserção no atendimento interdisciplinar no âmbito do SUS. Definições de caso As definições de caso suspeito, de acordo com o Guia de Vigilância Epidemiológica são: Caso suspeito: Suspeita clínica/bioquímica - Sintomático ictérico: Indivíduo que desenvolveu icterícia (coloração amarelada da pele) subitamente (recentemente ou não) com ou sem sintomas como febre, mal-estar, náuseas, vômitos, mialgia, colúria e hipocolia fecal. Indivíduo que desenvolveu icterícia subitamente, a qual o levou a óbito, sem outro diagnóstico confirmado. - Sintomático anictérico: Indivíduo sem icterícia, que apresente um ou mais sintomas como febre, mal-estar, náusea, vômitos, mialgia, e que na investigação laboratorial, apresente valor aumentado das aminotransferases. - Assintomático: Indivíduo exposto a uma fonte de infecção bem documentada. Exemplos: na hemodiálise, em acidente, por transfusão de sangue, procedimentos cirúrgicos ou odontológicos, colocação de piercing ou tatuagem com material contaminado, por uso de drogas endovenosas com compartilhamento de seringa ou agulha. Comunicante de caso confirmado de hepatite, independentemente da forma clínica e evolutiva do caso índice. Indivíduo com alteração de aminotransferases no soro, igual ou superior a três vezes o valor máximo normal dessas enzimas, segundo o método utilizado. Suspeito com marcador sorológico reagente Doador de sangue: Indivíduo assintimático doador de sangue, com um ou mais marcadores reagentes para hepatite A, B, C, D ou E. Indivíduo assintomático com marcador reagente para hepatite viral A, B, C, D ou E. Caso confirmado: Hepatite A: Indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente anti-HAV IgM (anticorpo da classe IgM para o vírus da Hepatite A) reagente. Indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente vínculo epidemiológico com caso confirmado (anti-HAV IgM reagente) de Hepatite A. - Hepatite B: Indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente um ou mais dos marcadores sorológicos reagentes ou exame de biologia molecular para Hepatite B, conforme listado abaixo: HBsAg reagente (antígeno de superfície do vírus da Hepatite B) Anti-HBc IgM reagente (anticorpos da classe IgM contra o antígeno do núcleo do vírus da Hepatite B) HBeAg reagente (antígeno “e” do vírus da Hepatite B) DNA do vírus da Hepatite B detectável. - Hepatite C: Indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente anti-HCV reagente e RNA do HCV detectável. - Hepatite D: Indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente HBsAg ou anti-HBc IgM reagentes e um ou mais dos marcadores sorológicos conforme listado abaixo: Anti-HDV (anticorpo total para o vírus da Hepatite Delta) total reagente. Anti-HDV IgM (anticorpos da classe IgM contra o antígeno do núcleo do vírus da Hepatite D) reagente. - Hepatite E: Indivíduo que preencha as condições de caso suspeito e que apresente anti-HEV IgM (anticorpos da classe IgM contra o antígeno do núcleo do vírus da Hepatite E) reagente. Caso descartado: Caso suspeito com diagnóstico laboratorial negativo para hepatites virais (desde que as amostras sejam coletadas e transportadas oportuna e adequadamente). Todo caso suspeito que durante a investigação, tenha diagnóstico de outra doença confirmado laboratorialmente ou que não preencha os critérios de confirmação acima definidos. Cicatriz sorológica: Indivíduos com marcadores sorológicos de infecção passada, porém curados no momento da investigação, deverão ser notificados e classificados como casos de cicatriz sorológica. Caso inconclusivo: São aqueles que atendem aos critérios de caso suspeito e dos quais não foram coletadas e/ou transportadas amostras oportunas e adequadas ou não foi possível a realização dos testes para os marcadores sorológicos e de biologia molecular específicos. Classificação etiológica e mecanismos de transmissão - Hepatites A e E O vírus da Hepatite A (VHA) é um vírus RNA da família Picornaviridae, tendo o homem como principal reservatório, com período de incubação de duas a seis semanas. O tempo em que o vírus é encontrado no sangue é curto (cinco a sete dias), por isso, a transmissão parenteral (pelo sangue) é rara. O vírus da Hepatite E (VHE) é um vírus RNA da família Caliciviridae, tendo também o homem como um de seus reservatórios. O período de incubação é de duas a nove semanas, com media de seis. O VHA e o VHE têm transmissão fecal-oral, hídrica, pessoa a pessoa (contato intrafamiliar e institucional), por alimentos e objetos contaminados. Essas infecções, geralmente estão associadas às precárias condições socioeconômicas, sendo mais comuns em países pobres, onde podem ocorrer surtos epidêmicos ou endêmicos. - Hepatites B e D A Hepatite B é uma doença sexualmente transmissível (DST), causada por um vírus DNA da família Hepadnaviridae, cujo período de incubação é de 30 a 180 dias, sendo mais comum entre 60 e 90 dias. Após seis meses, a cronificação da doença ocorre aproximadamente entre 5% a 10% dos indivíduos adultos infectados. Caso a infecção ocorra por transmissão vertical, o risco de cronificação dos recém-nascidos de gestantes com replicação viral (HBeAg reagente e/ou HBV DNA > 104) é de cerca de 70% a 90%, e entre 10% a 40% nos casos sem evidências de replicação do vírus. Cerca de 70% a 90% das infecções ocorridas em menores de cinco anos cronificam, e 20% a 50% dos casos crônicos com evidências de replicação viral evoluem para doença hepática avançada (cirrose ou hepatocarcinoma). A especificidade da doença é que ela pode evoluir para hepatocarcinoma sem apresentar cirrose no percurso. O vírus da Hepatite D ou Delta (VHD) é um vírus RNA, único representante da família Deltaviridae, com período de incubação semelhante ao do VHB, tendo período de incubação menor na superinfecção, de 14 a 56 dias. É reconhecido como o mais patogênico e infeccioso dentre os vírus hepatotrópicos. A infecção pelo VHD está sempre associada à infecção pelo VHB, e em alguns casos, à coinfecção entre VHD + VHB + VHC. No mundo, em especial em áreas endêmicas, a infecção envolve formas graves, determinando a hepatite fulminante e o agravamento das lesões de hepatite crônica, além de potencializar a rápida progressão para cirrose hepática, fatos esses comumente observados na Amazônia ocidental brasileira. A taxa de cronificação do vírus D varia em função de aspectos ligados ao tipo de infecção (coinfecção/superinfecção) e a taxa de cronificação do VHB. A transmissão parenteral/horizontal decorre do contato com fluídos orgânicos contendo o VHB, de modo especial o sangue (maior potencial de transmissibilidade), sêmen, secreções vaginais, leite materno ou saliva (menor potencial de transmissibilidade). Abrem-se, assim, diversas possibilidades de transmissão, por vários mecanismos: sexo desprotegido; compartilhamento de escovas de dente, lâminas de barbear/depilar, materiais de manicure, tatuagens ou piercing, agulhas ou seringas; procedimentos médicoodontológicos (tais como cirurgias, raspagem e alisamento radicular) Isso explica, ao menos parcialmente, a vasta distribuição do VHB em diversas partes do mundo, bem como a existência de muitos e diferentes grupos de pessoas sob maior risco de adquirir a infecção. Outra forma de transmissão e a vertical, ou seja, a passagem do vírus diretamente da mãe para o recém-nascido, comumente no parto ou por meio do contato intimo que se estabelece depois, e não por troca de sangue ao longo da gestação. Estima-se que o risco de infecção pelo VHB em acidentes com instrumentos perfuro cortantes é 57 vezes superior ao do Vírus da Imunodeficiência Humana – HIV, sendo o risco de óbito 1,7 vezes superior, embora o HIV também possua características letais. O VHB apresenta-se, assim, como afecção de alta prevalência de contaminação ocupacional. É importante salientar que a Hepatite B não é transmitida por abraço, beijo, aperto de mãos, tosse ou espirro, nem pelo compartilhamento de talheres. A Hepatite B é uma DST, mas também pode ser transmitida pelo compartilhamento de: - Escovas de dente. - Lâmina de barbear ou de depilar. - Instrumentos de manicure, tatuagens ou colocação de piercing. - Equipamentos para o uso de drogas injetáveis e inaláveis. - Agulhas ou seringas. Pode ser transmitida também em procedimentos médicoodontológico em que não foram tomadas devidas medidas de biossegurança. - Hepatite C O VHC é um vírus RNA da família Flaviviridae, com período de incubação de 15 a 150 dias; em geral, 50 dias. Acredita-se, que em média, 80% dos casos evoluam para a cronicidade e que entre um terço e um quarto possam evoluir para formas histológicas graves ou cirrose, em um período de 20 anos, caso não haja intervenção terapêutica. O restante evolui para formas mais lentas e, talvez, nunca resulte em hepatopatia grave. A infecção pelo VHC já é a maior responsável por cirrose e transplante hepático no mundo ocidental. De modo semelhante à Hepatite B, a transmissão da Hepatite C ocorre essencialmente por contato direto com sangue e hemoderivados contaminados com o VHC, colocando sob máximo risco os usuários de drogas, os politransfundidos, as pessoas submetidas à hemodiálise e os indivíduos que tenham sofrido acidente com objeto perfuro cortante contaminado. A possibilidade de transmissão sexual do VHC ocorre principalmente em pessoas com múltiplos parceiros e com prática sexual de risco (sem uso de preservativo), sendo que a coexistência de alguma DST, inclusive HIV, constitui um importante facilitador dessa transmissão. São consideradas, também, populações de risco acrescido para infecção pelo VHC por via parenteral os indivíduos que receberam transfusão de sangue e/ou hemoderivados antes de 1993. Medidas de Prevenção As medidas de prevenção em relação às hepatites virais devem considerar as dimensões de vulnerabilidade nas quais o individuo está inserido. Considera-se o comportamento individual como o determinante da vulnerabilidade a infecção, embora isso não seja o suficiente para o controle da disseminação da doença. Aspectos relacionados ao âmbito coletivo e social devem ser considerados ao se adotarem as medidas de prevenção nas situações de pré- exposição e pós-exposição. - Hepatites A e E As medidas gerais para a prevenção dependem de ações públicas (saneamento básico) e individuais, tais como: - Consumo de água tratada. - Lavagem das mãos antes e após os procedimentos odontológicos, após o uso do banheiro, antes da preparação de alimentos e antes de se alimentar. - Cumprimento das normas de biossegurança nos procedimentos odontológicos. - Lavagem de alimentos crus (frutas, verduras e legumes), deixando-os mergulhados por 30 minutos em solução preparada com uma colher de sopa de hipoclorito de sódio a 2,5% para cada litro de água. - Consumo de mariscos e frutos do mar bem cozidos. A vacina contra a Hepatite A, administrada em duas doses, com intervalo de seis meses, está disponível na rede pública apenas nos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais (CRIE). É importante ressaltar que para a Hepatite E ainda não existe vacina. - Hepatites B e Delta As principais medidas de prevenção envolvem: - Uso de preservativo. - Não compartilhamento de objetos pessoais: escovas de dente, lâminas de barbear ou de depilar, seringas, agulhas, cachimbos e canudos para o uso de drogas, instrumentos de manicure, material para confecção de tatuagens ou colocação de piercing. - Biossegurança odontológicos. adequada nos procedimentos médicos e - Vacinação contra Hepatite B, disponível nas salas de vacina do SUS para indivíduos de 0 a 19 anos, devendo ser administrada em três doses (0, 30 e 180 dias após a primeira dose), garantindo imunidade de 90% a 95% dos casos, conferindo imunidade também contra a Hepatite Delta. Em recém-nascidos, a primeira dose da vacina contra a Hepatite B deve ser aplicada logo após o nascimento, nas primeiras 12 horas de vida, para evitar a transmissão vertical. Os profissionais e os estudantes de saúde, além dos Auxiliares de Saúde Bucal (ASB) e Técnicos de Higiene Dental (THD), devem cumprir o esquema vacinal. O ideal é que indivíduos vacinados realizem o teste anti-HBs 30 dias após o esquema completo de vacinação (três doses). São considerados imunizados os que apresentarem anti-HBs reagente (≥10 UI/mL). Aqueles com anti-HBs não reagente, após o segundo esquema completo com três doses, devem ser considerados não respondedores e suscetíveis, devendo ser encaminhados para avaliação médica. - Hepatite C: Ainda não existe vacina contra o VHC, em virtude, principalmente, da ocorrência de mutações frequentes do vírus. Por isso, as atitudes preventivas são muito importantes. Uma forma efetiva de controlar a disseminação e a realização de testes sorológicos em pessoas suscetíveis e assintomáticas para identificação do vírus, aliada às ações educativas, com informações sobre os modos de transmissão. Medidas de prevenção contra a Hepatite C são similares à prevenção contra a Hepatite B, ou seja: - Não compartilhamento de: seringas, agulhas, cachimbos e canudos no uso de drogas; escovas de dente; lâminas de barbear ou depilar; instrumentos de manicure, materiais para confecção de tatuagem ou colocação de piercing. - Biossegurança odontológicos. adequada nos procedimentos médicos e - Uso de preservativo em qualquer prática sexual. Diagnóstico Em casos suspeitos, o cirurgião-dentista deve notificar e solicitar a sorologia para hepatites virais. Os exames específicos para o diagnóstico são os marcadores sorológicos e os exames de biologia molecular. Interpretação dos resultados e marcadores sorológicos - Hepatite A: Anti-HAV IgM: a presença desse marcador define o diagnóstico de Hepatite Aguda A. Surge precocemente na fase aguda da doença e começa a declinar após a segunda semana, desaparecendo apos três meses. Anti-HAV IgG: esse marcador está presente na fase de convalescença e persiste indefinidamente, proporcionando imunidade especifica. Os anticorpos dessa classe não permitem identificar se a infecção é aguda ou pregressa. Trata-se de um importante marcador epidemiológico por demonstrar a prevalência de contato com o VHA em determinada população. Interpretação dos marcadores sorológicos da Hepatite A: Anti-HAV T=total Anti-HAV IgM Interpretação (+) (+) Hepatite aguda pelo VHA. Infecção recente (+) (-) Infecção passada /imunidade (por contato prévio com o VHA ou por vacinação) (-) (-) Suscetibilidade - Hepatite B: São marcadores de triagem para a Hepatite B: HBsAg e anti-HBc total. HBsAg (antígeno de superfície do VHB): é o primeiro marcador a surgir após a infecção, em torno de 30 a 45 dias, e pode permanecer detectável por até 120 dias nos casos de hepatite aguda. Ao persistir além de seis meses, caracteriza infecção crônica. Existem mutações que podem alterar a conformação do HBsAg e, consequentemente, inibir a sua detecção pelos testes imune enzimáticos usuais. Nesses casos, a sorologia para o HBsAg apresenta-se negativa, o que pode caracterizar uma infecção oculta, na qual se recomenda avaliar a carga viral do VHB, utilizando testes de biologia molecular. Anti-HBc IgG (anticorpos IgG contra o antígeno do núcleo do VHB): é o marcador que indica contato prévio com o vírus. Permanece detectável por toda a vida nos indivíduos que tiveram a infecção. Anti-HBc Total: marcador utilizado na triagem para a Hepatite B por detectar tanto o anticorpo IgG, quanto o anticorpo IgM. Determina a presença de anticorpos tanto da classe IgM quanto da classe IgG. Por isso, ao receber como resultado o anti-HBc Total Reagente é importante definir se o resultado é por causa dos altos títulos de IgG (imunidade por infecção passada ou imunidade por resposta vacinal) ou pelos altos títulos de IgM (fase aguda). Interpretação e conduta do screening sorológico para a Hepatite B: HBsAg Anti-HBc total Interpretação/conduta (+) (-) Início de fase aguda ou falso positivo. Repetir sorologia após 30 dias (+) (+) Hepatiteagudaoucrônica.Solicitaranti-HBcIgM (-) (+) Falso positivo ou cura (desaparecimento do HBsAg).Solicitar anti-HBs (-) (-) Suscetibilidade Anti-HBc IgM (anticorpos da classe IgM contra o antígeno do núcleo do VHB): trata-se de um marcador de infecção recente, encontrado no soro até 32 semanas após a infecção e, portanto, confirma o diagnóstico de Hepatite B aguda. Anti-HBs (anticorpos contra o antígeno de superfície do VHB): é o único marcador que confere imunidade ao VHB. Encontra-se no soro após o desaparecimento do HBsAg, sendo indicador de cura e imunidade. Está presente isoladamente em pessoas vacinadas. HBeAg (antígeno “e” do VHC): é indicativo de replicação viral e, portanto, de alta infectividade. Na fase aguda, surge após o aparecimento do HBsAg e pode continuar presente por até dez semanas. Na Hepatite B crônica, a presença do HBeAg indica replicação viral, ou seja, atividade da doença. Em pacientes infectados por cepas com mutação pré-core (não produtoras da proteína “HBeAg”) esse marcador apresenta-se não reagente. Nesse caso, recomenda-se avaliar a carga viral do VHB, utilizando testes de biologia molecular. Anti-HBe (anticorpo contra o antígeno “e” do VHB): seu surgimento é um marcador de bom prognóstico na hepatite aguda pelo VHB. A soroconversão HBeAg para anti-HBe indica alta probabilidade de resolução da infecção nos casos agudos. Na hepatite crônica, a presença do anti-HBe, de modo geral, indica ausência de replicação viral e, portanto, menor atividade da doença. Interpretação dos resultados sorológicos para a Hepatite B: Interpretação HBsAg Anti-HBcAnti-HBc HBeAg Anti total IgM HBe AntiHBs Suscetibilidade (-) (-) (-) (-) (-) (-) Período de incubação (+/-) (-) (-) (-) (-) (-) Hepatite B aguda (+) (+) (+) (+/-) (+/-) (-) Final da fase aguda (-) (+) (-) (-) (+) (-) Hepatite B crônica (+) (+) (-) (+/-) (+/-) (-) Hepatite B curada (-) (+) (-) (-) (+) (+)* (-) (-) (-) (-) (-) (+) Imunidade por vacinação Legenda: (+) reagente (-) não reagente. * Em alguns casos de Hepatite B curada, o anti-HB não é detectado por estar em baixos títulos. - Hepatite C: Anti-HCV (anticorpo contra o VHC): é o marcador de triagem para a Hepatite C e indica contato prévio com o vírus. São considerados casos de HEPATITE c AGUDA, AQUELES que presentarem soroconversão do anti-HCV documentada (antiHCV não reagente no momento da exposição e conversão para anti-HCV reagente na segunda dosagem, realizada com intervalo de 90 dias) e detecção do HCV- RNA por volta de 90 dias após o início dos sintomas ou da data de exposição. HCV-RNA (RNA do VHC): utilizado para confirmar a infecção pelo VHC em casos agudos e crônicos, monitorar a resposta ao tratamento e confirmar resultados sorológicos indeterminados, em especial em pacientes imunossuprimidos. Pode ser detectado entre uma e duas semanas após a infecção. - Hepatite D: São marcadores de triagem para a Hepatite D: HBsAg, anti-HBc total e anti-HDV total. Anti-HDV total: determina a presença de anticorpos tanto da classe IgM quanto da classe IgG contra o VHD. Por isso, ao receber como resultado o anti-HDV total reagente, é importante definir se o resultado é por causa dos altos títulos de IgG (imunidade por infecção passada ou imunidade por resposta vacinal) ou dos altos títulos de IgM (fase aguda). O vírus da Hepatite D é um vírus defectivo (incompleto) que necessita do antígeno de superfície do VHB para exercer sua ação patogênica e replicar-se nas células hepáticas. Desse modo, observam-se as seguintes formas de ocorrência: Superinfecção: infecção pelo vírus Delta em um portador crônico do VHB. Coinfecção: infecção simultânea pelo VHB e pelo VHD em individuo suscetível. Interpretação dos resultados sorológicos para a Hepatite D: Formas HBsAg AntiHBc Total AntiAnti- AntiABclgM HDV HBs Coinfecção (+) (+) (+) (+)* (-) Superinfecção (+) (+) (-) (+)* (-) Cura (-) (+) (-) (+)** (+) total * Anti-HDV IgM e IgG em altos títulos. ** Anti-HDV-IgG positivo em baixos títulos. - Hepatite E: Anti-HEV IgM (marcador de infecção aguda): anticorpo específico para a Hepatite E encontrado no soro de todos os indivíduos infectados recentemente. Torna-se positivo no início do quadro clinico, desaparecendo após três meses. Anti-HEV IgG (marcador de infecção passada): anticorpo indicativo de infecção passada pelo vírus da Hepatite E. Está presente na fase de convalescença e persiste indefinidamente. Interpretação dos resultados sorológicos para a Hepatite E: Anti- Anti- Interpretação HEY HEY total IgM (+) (+) Hepatite E aguda. Infecção recente (+) (-) Infecção passada/imunidade (-) (-) Suscetibilidade Exames de biologia molecular Os testes de biologia molecular são utilizados para detectar a presença do DNA viral do vírus da Hepatite B e o RNA viral dos vírus das demais hepatites (A, C, D, E). Podem ser qualitativos, quando detectam a presença ou ausência do vírus, e quantitativos, quando quantificam a carga viral presente na amostra. Existem várias metodologias para realizar esses testes. As mais utilizadas são: reação em cadeia da polimerase (PCR) e branched-DNA (b DNA). Os testes de genotipagem indicam o genótipo do vírus. Manifestações clínicas Após contato com os vírus das hepatites, o indivíduo pode desenvolver um quadro de hepatite aguda, às vezes apresentando as formas clínicas assintomáticas ou sintomáticas. No primeiro caso, as manifestações clínicas são ausentes, bastante leves ou atípicas, simulando um quadro gripal. No segundo, a apresentação é típica, com sinais e sintomas como febre, mal-estar, náuseas, vômitos, mialgia, colúria e/ou hipocolia fecal. A fase aguda (hepatite aguda) tem seus aspectos clínicos e virológicos limitados aos primeiros seis meses da infecção e a persistência do vírus após esse período caracteriza a cronificação da infecção. Apenas os vírus B, C e D têm potencial para desenvolver formas crônicas de hepatite. O potencial para cronificação varia em função de alguns fatores ligados aos vírus e outros ligados ao hospedeiro. Pessoas com qualquer tipo de imunodeficiência também têm maior chance de cronificação após uma infecção pelo VHB. Fase aguda (hepatite aguda) - Período prodrômico ou pré-ictérico: ocorre após o período de incubação do agente etiológico e anteriormente ao aparecimento da icterícia. Os sintomas são inespecíficos como: anorexia, náuseas, vômitos, diarreia (ou, raramente, constipação), febre baixa, cefaleia, mal-estar, fadiga, paladar e/ou olfato intolerantes, fotofobia, urticária, entre outros. - Fase ictérica: com o aparecimento da icterícia, em geral, há diminuição dos sintomas prodrômicos. Observa-se hepatomegalia (aumento do fígado) dolorosa, com ocasional esplenomegalia (aumento do volume do baço). Há alteração das aminotransferases, as quais podem variar de 10 a 100 vezes o limite superior da normalidade. Esse nível retorna ao normal no prazo de algumas semanas; porém, se persistirem alterados por um período superior a seis meses, deve-se considerar a possibilidade de cronificação da infecção no caso das hepatites B, C e D. - Fase de convalescença: segue-se ao desaparecimento da icterícia; a recuperação completa ocorre após algumas semanas, mas a fraqueza e o cansaço podem persistir por vários meses. Hepatite crônica Os vírus B, C e D são aqueles que têm a possibilidade de causar doença crônica. Nesses casos, os indivíduos apresentam sinais histológicos de lesão hepática (inflamação, com ou sem deposição de fibrose) e marcadores sorológicos ou virológicos de replicação viral. Os sintomas dependem do grau de dano hepático estabelecido. Eventualmente, o diagnóstico é realizado quando aparecem, em face das complicações da doença, sinais e sintomas como cirrose e/ou hepatocarcinoma (câncer primário do fígado). Indivíduos com infecção crônica que não apresentam manifestações clínicas, com replicação viral baixa ou ausente, e que não apresentam evidências de alterações graves à histologia hepática, são considerados portadores assintomáticos. Nessas situações, a evolução tende a ser benigna. Contudo, esses pacientes são capazes de transmitir hepatite e têm importância epidemiológica na perpetuação da endemia. Hepatite fulminante O termo é utilizado para designar a insuficiência hepática aguda, caracterizada pelo surgimento de icterícia, coagulopatia e encefalopatia hepática, em um intervalo de ate oito semanas. Trata- se de uma condição rara e potencialmente fatal, cuja letalidade é elevada (de 40% a 80% dos casos). Existem diferenças quanto à etiologia da hepatite fulminante (HF) em todo mundo, sendo que as hepatites A e B têm sido relatadas em vários estudos. A primeira aparece frequentemente com taxas que variam entre 2% e 8%, ao passo que a proporção mencionada para a hepatite B é mais variável, estando entre 2% e 32%. O número de casos registrados na população norte-americana é de 2 mil por ano ou 1/100 ml habitantes. A América do Sul e o Subcontinente Indiano apresentam grande incidência de HF induzida pelo VHA e pelo VHE, em virtude da alta prevalência desses vírus na população. A hepatite aguda C, aparentemente, não está associada a casos de HF, enquanto que a coinfecção VHB/VHD pode ser uma causa do agravo, em regiões endêmicas, para os dois vírus. Na Índia, uma causa frequente dessa forma de hepatite entre mulheres grávidas é o VHE. Basicamente, a fisiopatologia esta relacionada à degeneração e necrose maciça dos hepatócitos. Os primeiros sinais e sintomas são brandos e inespecíficos. A deterioração neurológica progride para o coma dentro de poucos dias apos a apresentação inicial. Manifestações orais em portadores das hepatites virais As infecções com origem bucal podem ter repercussões sistêmicas importantes, assim como as infecções de ordem sistêmica podem resultar em manifestações bucais e/ou implicar cuidados especiais quando da necessidade de intervenções odontológicas. E relatado que a infecção pelo VHC, e em menor proporção pelo VHB, predispõe o paciente ao desenvolvimento de manifestações extra- hepáticas, incluindo manifestações imunologicamente mediadas, como o líquen plano. O Líquen Plano Oral (LPO) tem sido relatado como mais prevalente em pacientes portadores de hepatite C crônica em comparação com a população geral, porém, a associação entre essas enfermidades ainda permanece controversa. Em estudo realizado com 215 pacientes portadores de Hepatite C crônica, 147 (68,4%) apresentavam lesões orais 173 (80,5%) apresentavam alterações de desenvolvimento em cavidade oral. As lesões mais prevalentes foram: “mastigação crônica da bochecha” (morsicatio buccarum), candidose (infecção pelo Candida Albicans, um microorganismo fúngico) e leucoplasia (mancha ou placa de aspecto esbranquiçado, localizada na superfície da pele ou mucosa), porém, a real associação dessas lesões orais com a infecção crônica pelo VHC permanece incerta. Os sinais orais da doença hepática em estado terminal são poucos e associados às manifestações secundárias. Pacientes que apresentam alterações plaquetárias e de proteínas de coagulação podem apresentar petéquias e hematomas em mucosa oral, além de sangramento gengival espontâneo. Hemorragias orais pós-operatórios também podem se apresentar como manifestações orais de pacientes com doença hepática. A mucosa oral desses pacientes pode exibir coloração amarelada ou pálida, devido ao aumento da bilirrubina sérica, o que é mais perceptível na região posterior do palato e no soalho bucal em freio lingual. Ocasionalmente, o fetor hepaticus pode ser detectado, ou seja, um odor corporal e de respiração descrito como „„mofado‟‟ ou „„doceazedo‟‟, e esta relacionado à produção de mercaptanas pela ação de bactérias do trato gastrointestinal. Tratamento Hepatite Aguda O prognóstico das hepatites agudas A e E é muito bom e a evolução resulta em recuperação completa em quase todos os casos. No curso de hepatites virais agudas, o uso de medicações sintomáticas para vômitos e febre deve ser realizado quando pertinente. Entretanto, faz-se necessária a máxima atenção quanto às medicações utilizadas, já que se deve evitar o emprego de drogas que tenham potencial hepatotóxico, como o paracetamol. O repouso é medida imposta pela própria condição do paciente. A sua duração e intensidade, se absoluto ou não, são questões muito discutidas. Como norma geral, recomenda-se repouso relativo até a normalização das aminotransferases, liberando-se progressivamente o paciente para atividades físicas. Dieta pobre em gordura e rica em carboidratos é de uso popular; porém, seu maior benefício é ser mais agradável para o paciente anorético. De forma prática, deve ser recomendado que o próprio paciente defina sua dieta de acordo com seu apetite e aceitação alimentar. A única restrição está relacionada à ingestão de álcool, que deve ser suspensa por seis meses. As drogas consideradas “hepatoprotetoras”, associadas ou não a complexos vitamínicos, não têm nenhum valor terapêutico. A administração de vitamina K durante um a três dias pode ser recomendada nos casos de queda da atividade de protrombina devido à absorção intestinal inadequada dessa vitamina. A administração de corticosteróide é totalmente contraindicada. No acompanhamento de quadros agudos de hepatites virais, as duas primeiras consultas terão um intervalo de duas semanas para companhamento clinico, independentemente de resultado de exames. As consultas subsequentes devem ser realizadas em intervalos de quatro semanas, acompanhadas de seguimento laboratorial com dosagem de aminotransferases, tempo de protrombina, bilirrubinas e albumina com o mesmo intervalo, até a detecção de duas dosagens normais com intervalo de quatro semanas. No início do acompanhamento, realiza-se adicionalmente a dosagem de gama-GT, fosfatase alcalina e proteínas totais e frações. Esses testes são repetidos a cada quatro semanas, ou em intervalos menores de acordo com o quadro clinico do paciente. O critério de alta inclui: - remissão dos sintomas, podendo persistir discreta adinamia e sintomas digestivos vagos; - normalização das bilirrubinas; - normalização do tempo de protrombina; - normalização das aminotransferases, com pelo menos duas dosagens normais com intervalo de quatro semanas, devido à possibilidade de recrudescência. A Hepatite C aguda, particularmente, necessita de avaliação para indicação ou não de tratamento. Os critérios para indicação de tratamento da Hepatite C Aguda incluem: - soroconversão anti-HCV documentada, em paciente com quadro clinico de hepatite aguda (paciente que no início dos sintomas apresenta anti-HCV negativo e que converte para anti-HCV positivo na segunda dosagem – realizada com intervalo de 90 dias); - quadro laboratorial de anti-HCV negativo com detecção do HCVRNA por biologia molecular (qualitativo), realizado por volta de 90 dias após o início dos sintomas ou da data de exposição, quando esta for conhecida em paciente com histórico de exposição potencial ao vírus da hepatite (HCV). Hepatite Crônica É importante que no nível de atenção básica, o atendimento, seja desde o início, voltado para ações simples que reduzam a chance de progressão para cirrose ou câncer de fígado, modificando ou desacelerando a historia natural da doença. Nesse sentido, a orientação para o não-consumo de bebidas alcoólicas, prevenção da co-infecção com HIV, controle de distúrbios metabólicos, como hiperlipidêmica, obesidade e diabetes, são essenciais. Cabe diagnóstico precoce, adequado encaminhamento para nível de média ou alta complexidade, de acordo com a necessidade e orientação para evitar a transmissão domiciliar – não compartilhamento de utensílios e objetos de higiene contaminados com sangue (escova de dente, barbeadores). Uma parcela dos casos de hepatite crônica necessitara de tratamento, cuja indicação baseia-se no grau de acometimento hepático observado por exame anatomopatológico do tecido hepático obtido por biopsia. Pacientes com aminotransferases normais merecem ser avaliados com exames de biologia molecular, pois pode haver lesão hepática, mesmo sem alteração daquelas enzimas. Hepatite B O tratamento da Hepatite seguintes situações: B crônica está indicado nas • idade superior a 2 anos; • HBsAg (+) por mais de seis meses; • HBeAg (+) ou HBV-DNA > 104 copias/ml ou 1.900 UI/ml (fase de replicação); • ALT/TGO > 2 vezes o limite superior da normalidade; • ter realizado, nos últimos 24 meses, biopsia hepática onde tenha sido evidenciado atividade necroinflamatória de moderada a intensa e/ou presença de fibrose de moderada a intensa; ausência de contraindicação ao tratamento. Hepatite C O tratamento da Hepatite seguintes situações: C crônica está indicado nas - ser portador do vírus da Hepatite C (HCV) identificado por detecção por biologia molecular de acido ribonucléico – teste qualitativo do HCV; - ter realizado, nos últimos 24 meses, biopsia hepática onde tenha sido evidenciada atividade necroinflamatória de moderada a intensa e/ou presença de fibrose de moderada a intensa; - ter entre três e 70 anos; - ter contagem de plaquetas acima de 50.000/mm3 e de neutrófilos acima de 1.500/mm3. Coinfecção com HIV No Brasil, as taxas de prevalência da coinfecção HIV-HCV, obtidas de amostras provenientes de serviços de saúde, situam-se entre 9,2% e 54,7%, conforme distribuição geográfica e fatores de risco para sua aquisição. As maiores taxas de prevalência são observadas nos estudos que incluem usuários de drogas injetáveis em sua amostra, constituindo o fator de risco mais importante para aquisição de HCV. As taxas de prevalência da coinfecção HIV HBV, obtidas em estudos brasileiros de amostras provenientes de serviços de saúde, situam-se entre 5,3% a 24,3%. Nos últimos anos, estudos realizados nos Estados Unidos e na Europa têm mostrado que as hepatopatias (insuficiência hepática crônica, de hospitalização e de óbito entre pacientes, sendo hoje a maior causa de morte entre os infectados pelo HIV segundo alguns centros. Tem-se observado aumento da incidência de complicações crônicas decorrentes das hepatites virais nessa população, o que difere do observado com as outras doenças oportunistas. Isso se explica pelo aumento da sobrevida dos infectados pelo HIV a partir da utilização dos antirretrovirais. Tal fato propiciou tempo para que o HBV e o HCVo HCV desenvolvessem todo seu potencial letal entre os coinfectados. Não foram observadas interações significativas entre o HIV e o HAV. Apesar disso, pacientes portadores de hepatite crônica B ou C, ou com acometimento hepático prévio, poderão apresentar quadros mais graves se adquirirem uma nova infecção pelo vírus da Hepatite A. Nos pacientes coinfectados ocorre aceleração do acometimento hepático, observam-se piores taxas de resposta ao tratamento das hepatites e interações entre os medicamentos para o HIV e o HCV potencialmente graves, além de índices maiores de recidiva. Outro fato de preocupação é o risco de toxicidade hepática dos antirretrovirais nos coinfectados. O tratamento das hepatites crônicas virais em pacientes infectados pelo HIV é complexo e deve ser realizado, preferencialmente, em centros de referência e por profissionais que tenham experiência com as duas doenças. Poderão ser tratados os pacientes coinfectados que não estejam em falha terapêutica do HIV estável clínica (ausência de infecção oportunista ativa ou nos últimos seis meses) e imunologicamente, e com presença de qualquer grau de fibrose, independentemente do genótipo. Imunização Vacina contra Hepatite A As vacinas contra Hepatite A atualmente em uso e licenciadas no Brasil são preparadas a partir de culturas celulares em fibroblastos humanos e inativadas pela formalina. A imunização contra a Hepatite A é realizada a partir de 12 meses de idade, em duas doses, com intervalo de seis meses entre elas. Não há no momento a disponibilização dessa vacina no calendário básico de vacinação, sendo as indicações descritas a seguir. A vacina de vírus inativado contra a Hepatite A está disponível nos Centros de Referência para Imunobiologicos Especiais (Crie), integrante do SUS, para as seguintes situações: - hepatopatias crônicas de qualquer etiologia; - portadores crônicos do HBV e HCV; - coagulopatias; - crianças menores de 13 anos com HIV/Aids; - adultos com HIV/Aids que sejam portadores do HBV ou HCV; - doenças de depósito; - fibrose cística; - trissomias; - imunodepressão terapêutica ou por doença imunodepressora; - candidatos a transplante de órgão sólido, cadastrados em programas de transplantes; - transplantados de órgão sólido ou de medula óssea; - doadores de órgão sólido ou de medula óssea, cadastrados em programas de transplantes; - hemoglobinopatias. As contraindicações se restringem à história de reação anafilática a algum dos componentes da vacina e gravidez. Eventos adversos pós-vacinação (EAPV) locais observados são a dor, eritema ou edema, que ocorrem entre 20% a 50% dos vacinados, sendo leves e transitórios. Os EAPV sistêmicos mais comumente observados são febre e fadiga e ocorrem em menos de 5% dos vacinados; sendo os casos de anafilaxia raros. Vacina contra Hepatite B A vacina contra Hepatite B está disponível nas salas de vacinação do SUS para faixas etárias especificas e para situações de maior vulnerabilidade, conforme descrito a seguir. Faixas etárias específicas - Menores de um ano de idade, a partir do nascimento, preferencialmente nas primeiras 12 horas após o parto; - Crianças e adolescentes entre um e 19 anos de idade. Em recém-nascidos, a primeira dose da vacina deve ser aplicada logo após o nascimento, nas primeiras 12 horas de vida, para evitar a transmissão vertical. Caso não tenha sido possível, iniciar o esquema o mais precocemente possível, na unidade neonatal ou na primeira visita ao Posto de Saúde. A vacina contra Hepatite B pode ser administrada em qualquer idade e simultaneamente com outras vacinas do calendário básico. Para todas as faixas etárias A vacina contra a Hepatite B está disponível nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIE), para os seguintes casos: - vítimas de abuso sexual; - vítimas de acidentes com material biológico positivo ou fortemente suspeito de infecção por VHB; - comunicantes sexuais de portadores de HBV; - profissionais de saúde; - hepatopatias crônicas e portadores de Hepatite C; - doadores de sangue; - transplantados de órgãos sólidos ou de medula óssea; - doadores de órgãos sólidos ou de medula óssea; - potenciais receptores de múltiplas transfusões de sangue ou politransfundidos; - nefropatias crônicas/dialisados/síndrome nefrótica; - convívio domiciliar contínuo com pessoas portadoras de HBV; - asplenia anatômica ou funcional e doenças relacionadas; - fibrose cística (mucoviscidose); - doença de depósito; - imunodeprimidos; - populações indígenas; - usuários de drogas injetáveis e inaláveis; - Pessoas reclusas (presídios, hospitais psiquiátricos, instituições menores, forças armadas); - carcereiros de delegacias e penitenciarias; - profissionais do sexo; - profissionais de saúde; - coletores de lixo hospitalar e domiciliar; - bombeiros, policiais militares, policiais civis e policiais rodoviários; - profissionais envolvidos em atividade de resgate. A imunização contra a Hepatite B é realizada em três doses, com intervalo de um mês entre a primeira e a segunda dose e de seis meses entre a primeira e a terceira dose (0, 1 e 6 meses). A vacina para Hepatite B deve ser aplicada em deltóide. Deve-se evitar a aplicação na região glútea, por resultar em menor imunogenicidade. A dose da vacina, em micrograma ou mililitros, varia de acordo com o fabricante, devendo-se seguir as orientações da bula e as normas do Programa Nacional de Imunizações (PNI). A vacina, após administração do esquema completo, induz imunidade em 90% a 95% dos casos. Algumas populações, como imunocomprometidos, portadores de insuficiência renal em programas de hemodiálise e alguns bebês prematuros devem fazer uso de esquemas especiais. Imunoglobulina Humana anti-Hepatite tipo B A imunoglobulina humana anti-Hepatite tipo B (IGHAHB), disponível nos CRIE, deve ser administrada, usualmente em dose única, 0,5ml para recém-nascidos ou 0,06ml/kg de peso corporal, máximo de 5ml, para as demais idades. A IGHAHB deve ser aplicada por via intramuscular, inclusive na região glútea. Quando administrada simultaneamente com a HB, a aplicação deve ser feita em grupo muscular diferente. É indicada para pessoas não vacinadas, após exposição ao vírus da Hepatite B, nas seguintes situações: - prevenção da infecção perinatal pelo vírus da Hepatite B; - vitimas de acidentes com material biológico positivo ou fortemente suspeito de infecção por HBV, sem vacinação para Hepatite B; - comunicantes sexuais de casos agudos de Hepatite B; - vítimas de abuso sexual; HIV Epidemiologia A AIDS foi reconhecida em 1981, nos EUA, a partir da identificação de um número elevado de pacientes adultos do sexo masculino com comprometimento do sistema imune, o que levou à conclusão de que se tratava de uma nova doença. Posteriormente, alguns casos, ocorridos nos últimos anos da década 70, foram identificados como tendo sido AIDS. No Brasil, a AIDS foi identificada pela primeira vez em 1982. Um caso foi reconhecido retrospectivamente, no estado de São Paulo, como tendo ocorrido em 1980. Agente Etiológico O HIV é um retrovírus com genoma RNA, da família Retroviridae e subfamília Lentivirinae. Pertence ao grupo dos retrovírus citopáticos e não- oncogênicos. O HIV utiliza para multiplicar-se uma enzima denominada transcriptase reversa, responsável pela transcro RNA viral para uma cópia DNA, integrando-se ao genoma do hospedeiro. O HIV-1 foi isolado em 1983 de pacientes com AIDS pelos pesquisadores Luc Montaigner, na França e Robert Gallo, nos EUA. Em 1986, foi identificado um segundo agente etiológico, também retrovírus, com características semelhantes ao HIV-1, denominado HIV-2. O termo HIV (Human Immunodeficiency Virus ou Vírus da Imunodeficiência Humana) foi recomendado por um comitê internacional, reunido nesse mesmo ano, reconhecendo-o como capaz de infectar seres humanos. Transmissão e prevenção As principais formas de transmissão do HIV são: sexual, sanguínea e vertical. Também pode ocorrer a transmissão ocupacional, ocasionada por acidente de trabalho, em profissionais de saúde. Embora o HIV tenha sido isolado de vários fluidos corporais que contenham células inflamatórias, somente o contato com sangue, sêmen, secreções vaginais e leite materno contaminado tem sido implicado como fontes de infecção desse vírus. Conclui-se, pela experiência cumulativa e suficientemente ampla, que não há qualquer justificativa para restringir o convívio de indivíduos infectados pelo HIV de seus ambientes domésticos, escolares, sociais ou profissionais. Transmissão sexual É essa a principal forma de transmissão do HIV no Brasil e no Mundo, sendo a transmissão heterossexual considerada pela OMS, como a mais frequente do ponto de vista global. Os fatores que aumentam o risco de transmissão do HIV numa relação são: - Alta viremia (durante a fase da infecção primária e na imunodeficiência avançada). - Relação anal receptiva. - Relação sexual durante a menstruação. - Presença de outra DST. Sabe-se hoje que as úlceras resultantes de infecções por agentes sexualmente transmissíveis, como cancro mole, sífilis e herpes genital, aumentam muito o risco de transmissão do HIV. Prevenção - Preservativos: os preservativos masculinos ou femininos são as únicas barreiras comprovadamente efetivas contra o HIV e outras DST, quando usados de forma correta e sistemática. Os estudos demonstram que o uso do preservativo masculino pode reduzir o risco de transmissão do HIV e de outras DST em até 95%. - Espermicidas: são substâncias químicas utilizadas para recobrir a vagina e colo do útero, com o objetivo de impedir a penetração dos espermatozóides no canal cervical e, bioquimicamente, imobilizar ou destruir os espermatozóides. O produto espermicida à base de nonoxinol-9 (N-9) a 2% é o mais amplamente utilizado no Brasil e no mundo. Entretanto, o uso de alguns métodos contraceptivos contendo N-9 pode aumentar o risco de transmissão sexual do HIV e outras DST‟s. Isso foi demonstrado em um ensaio clínico que observou risco acrescido entre usuárias/os desse produto. A razão desse risco acrescido reside no fato de o N-9 provocar lesões (fissuras/microfissuras) na mucosa vaginal e retal, dependendo da frequência de uso e do volume aplicado. Transmissão sanguínea A transmissão, por meio da transfusão de sangue e derivados, tem apresentado importância decrescente nos países industrializados e naqueles que adotaram medidas de controle de qualidade do sangue utilizado, como é o caso do Brasil. O uso de drogas injetáveis, associado ao compartilhamento de seringas e agulhas, apresenta alta probabilidade de transmissão sanguínea do HIV. Esse tipo de transmissão vem crescendo em várias partes do mundo, como Ásia, América Latina e Caribe. Prevenção A transmissão pela transfusão de sangue e derivados deve ser prevenida por meio do controle da qualidade pelos bancos de sangue. Os profissionais de saúde devem estar atentos e denunciar as irregularidades às autoridades sanitárias. Estarão, dessa forma, desempenhando papel de grande relevância na prevenção e controle da transmissão do HIV, hepatites e outras doenças que podem ser transmitidas pelo sangue. Prevenção em usuários de drogas injetáveis (UDI) – Os UDI‟s representam uma população particularmente importante, em virtude da alta prevalência do HIV nesse grupo. Consequentemente representam risco de transmissão para os parceiros sexuais e para os que compartilham agulhas e seringas. Ressalta-se, também, o risco da transmissão vertical quando ocorre a infecção da parceira. A disseminação da infecção pelo HIV entre UDI em vários países levantou importantes questões sobre a natureza de seu comportamento e sobre a possibilidade de modificá-lo por meio de intervenções preventivas, reduzindo o risco de transmissão do HIV. Em locais onde a política de redução de danos foi implantada observou-se a redução da incidência de transmissão do HIV nessa população. A vulnerabilidade dos UDI‟s para o HIV, aliada à exclusão social vivenciada por eles, apontam para a necessidade da realização de ações de prevenção nas unidades de saúde destinadas a essa população, tais como: - facilitar o acesso dessas pessoas à unidade de saúde e aos serviços de tratamento da dependência de drogas, quando indicado. - realizar o acompanhamento clínico dessa população. - disponibilizar a testagem sorológica, com aconselhamento. - Articulação com programas de redução de danos, incluindo ações de redução de danos com os usuários de drogas: orientação para uso seguro de drogas injetáveis (troca de seringas e agulhas) e para a prática de sexo seguro. Transmissão Vertical Entre os exames essenciais do pré-natal inclui-se a obrigatoriedade da oferta do teste anti-HIV a todas as gestantes, com aconselhamento pré e pós-teste. O diagnóstico precoce permite o controle da doença materna e a prevenção da transmissão vertical do HIV. Transmissão Ocupacional A transmissão ocupacional ocorre quando profissionais da área da saúde se ferem acidentalmente com instrumentos perfuro cortantes contaminados com sangue de pacientes portadores do HIV. Estima-se que o risco médio de contrair o HIV, após uma exposição percutânea ao sangue contaminado, seja de aproximadamente 0,03%, aumentando esse risco para aproximadamente 0,1% no caso de exposição de mucosas. Os fatores de risco identificados como favorecedores deste tipo de transmissão, são: - A profundidade e extensão do ferimento. - A presença de sangue visível no instrumento que produziu o ferimento. - A exposição envolvendo agulha inserida diretamente na veia ou artéria de paciente portador de HIV. - O paciente, fonte da imunodeficiência avançada. infecção, ter evidências de Boa parte dos acidentes ocorre ao se manusear sangue e secreções em pacientes com sorologia desconhecida. Ocorrendo o acidente, aliado aos esforços de diagnóstico do paciente-fonte, recomenda-se observar manejo idêntico ao realizado nos casos sabidamente em portadores do HIV. Prevenção O meio mais eficiente de reduzir-se tanto a transmissão profissional- paciente quanto à paciente–profissional baseia-se: - Na utilização sistemática das normas de biossegurança. - Na determinação dos fatores de risco associados e na sua eliminação. - Na implantação de novas tecnologias da instrumentação usadas na rotina de procedimentos invasivos. O profissional de saúde acidentado com risco de infecção pelo HIV deverá ser encaminhado nas primeiras horas (idealmente dentro de 1 a 2 horas), após o acidente, para a quimioprofilaxia com antirretrovirais. A duração da quimioprofilaxia é de quatro semanas. Estudos em animais sugerem que a quimioprofilaxia não é eficaz quando iniciada de 24 a 36 horas após o acidente. Desmistificação de possíveis riscos de transmissão do HIV Vacinas A transmissão de HIV por meio de vacinas não foi documentada. Outros produtos imunobiológicos derivados do sangue ou plasma são purificados, e não transmitem o HIV. Mosquitos Não transmitem HIV. Eles não são infectados e sua saliva não contém HIV. A quantidade de vírus circulante no sangue periférico não é suficiente para infecção. Mosquitos não regurgitam sangue na próxima pessoa que eles picam. Estudos realizados na África e nos EUA confirmaram a não ocorrência de transmissão de HIV por meio da picada de inseto. Mosquitos também não transmitem HBV (vírus da hepatite B). Contato com sangue ou fluídos corporais As mãos devem ser lavadas após contato com sangue e fluidos corporais. Apesar de não haver evidências de transmissão do HIV por essa via, deve-se evitar o uso comum de objetos pessoais, tais como escova de dente e lâminas de barbear. Tatuagem e acupuntura Os seus instrumentos devem ser descartados após utilização ou rigorosamente limpos e esterilizados. Saliva A saliva é rica em proteínas que inibem a infecção pelo HIV. Dentre estas proteínas salientamos a enzima inibidora de protease secretada por leucócitos (SLIP) que representa uma barreira natural na transmissão do HIV. Além disso, a hipotonicidade salivar, que provoca a lise celular, também se apresenta como mais um obstáculo para que ocorra a infecção pelo HIV. Deste modo, a saliva não é um meio eficaz de transmissão do vírus da AIDS. Até hoje, não existem casos notificados de transmissão do vírus da AIDS pela saliva. Aerossol e HIV O aerossol é diferente de gotículas e espirros. Ele é constituído de partículas menores que 10 mícrons de diâmetro, que flutuam em corrente de ar. Não existem casos descritos de transmissão do HIV pelo aerossol, durante atividade clínica. Concluindo, não existe evidência de transmissão do vírus da AIDS por via respiratória. O HbsAg (antígeno de superfície da hepatite B), por sua vez, nunca foi encontrado no ar durante o tratamento de pacientes portadores de HBV em consultório odontológico e em centros de hemodiálise. Aspectos clínicos da infecção pelo HIV A infecção pelo HIV pode ser dividida em quatro fases clínicas: 1. Infecção aguda. 2. Fase assintomática, também conhecida como latência clínica. 3. Fase sintomática inicial ou precoce. 4. AIDS. Infecção Aguda A infecção aguda, também chamada de síndrome da infecção retroviral aguda ou infecção primária, ocorre em cerca de 50% a 90% dos pacientes. Seu diagnóstico é pouco realizado, em razão do baixo índice de suspeição, sendo, em sua maioria, retrospectivo. O tempo entre a exposição e os sintomas, é de 5 a 30 dias. A história natural da infecção aguda caracteriza-se tanto por viremia elevada quanto por resposta imune intensa. Nessa fase da infecção, existem evidências de que a imunidade celular desempenha papel fundamental no controle da viremia. Os sintomas aparecem durante o pico da viremia e da atividade imunológica. As manifestações clínicas podem variar desde quadro gripal até uma síndrome, que se assemelha à mononucleose. Os pacientes podem apresentar sintomas de infecção viral, como: febre, faringite, ulcerações mucocutâneas, envolvendo mucosa oral, esôfago e genitália; cefaleia, fotofobia, perda de peso, náuseas e vômitos. Alguns pacientes ainda podem apresentar candidíase oral, neuropatia periférica, meningoencefalite asséptica e síndrome de Guillain-Barré. Janela imunológica: também chamada de janela biológica, é o tempo compreendido entre a aquisição da infecção e a soroconversão. O tempo decorrido para que a sorologia anti-HIV torne-se positiva é de 6 a 12 semanas após a aquisição do vírus, com o período médio de aproximadamente dois meses. Os testes utilizados apresentam geralmente níveis de até 95% de soroconversão nos primeiros seis meses após a transmissão. Fase Assintomática (Latência Clínica) Na infecção precoce pelo HIV, também conhecida como fase assintomática, o estado clínico básico é mínimo ou inexistente. Alguns pacientes podem apresentar uma linfoadenopatia generalizada persistente, “flutuante” e indolor. Fase sintomática inicial (ou precoce) Nessa fase, o portador de HIV pode apresentar sinais e sintomas inespecíficos de intensidade variável, além de processos oportunistas de menor gravidade, principalmente na pele e nas mucosas. As alterações mais frequentes são: - Sinais e sintomas inespecíficos: Sudorese noturna: é queixa bastnte comum e tipicamente inespecífica entre os pacientes com infecção sintomática inicial pelo HIV. Pode ser recorrente e vir acompanhada ou não de febre. Nessa situação deve ser considerada a possibilidade de infecção oportunista, devendo-se lançar mão de investigação clínica e laboratorial específicas. Fadiga: frequente manifestação da infecção sintomática inicial pelo HIV. Geralmente, sentida no final de tarde ou após atividade física. Fadiga progressiva e debilitante deve alertar para a presença de infecção oportunista, devendo ser sempre pesquisada. Emagrecimento: é um dos mais comuns entre os sintomas gerais associados à infecção pelo HIV, estando presente em 95% a 100% dos pacientes com doença em progressão. Geralmente, encontra-se associado a outros sintomas, como anorexia. A associação com diarreia aquosa faz com que esse sinal seja mais intenso. - Processos Oportunistas de menor gravidade: Candidíase Oral e Vaginal (inclusive a recorrente) – incluem as seguintes espécies patogênicas: Candida albicans, C. tropicalis, C. parapsilosis e outras menos comumente isoladas. A candidíase oral é a mais comum infecção fúngica em pessoas portadoras do HIV. Apresenta-se com sintomas e aparência macroscópica características, descritas a seguir: Forma Pseudomembranosa: consiste em placas esbranquiçadas, removíveis da língua e mucosas, que podem ser pequenas ou amplas e disseminadas. Forma Eritematosa: é vista como placas avermelhadas em mucosa, palato mole e duro, ou superfície dorsal da língua. Queilite Angular: também frequente, produz eritema e fissuras nos ângulos da boca. As mulheres infectadas pelo HIV+ podem apresentar como manifestação precoce de imunodeficiência pelo HIV, bem como nas fases mais avançadas da doença, formas extensas ou recorrentes de candidíase vulvovaginal, com ou sem acometimento oral. Leucoplasia Pilosa Oral: é um espessamento epitelial benigno, causado provavelmente pelo vírus Epstein-Barr. Clinicamente apresentam- se como lesões brancas, não facilmente removíveis, que variam em tamanho e aparência, podendo ser planas, ou em forma de pregas, vilosidades ou projeções. Ocorre mais frequentemente nas margens laterais da língua, mas podem ocupar localizações da mucosa oral: mucosa bucal, palato mole e duro. Gengivite: a gengivite e outras doenças periodontais podem manifestar-se de forma leve ou agressiva em pacientes com infecção pelo HIV. Em estágios mais avançados da doença pelo HIV, observa-se frequentemente uma evolução rapidamente progressiva levando a um processo necrotizante acompanhado de dor, perda de tecidos moles periodontais, exposição e sequestro ósseo. Úlceras Aftosas: em indivíduos infectados pelo HIV é comum a presença de úlceras extensas, resultantes da coalescência de pequenas úlceras, em cavidade oral e faringe, de caráter recorrente, e etiologia não definida. Diarreia: a infecção pelo HIV, desde sua fase inicial, tem a diarreia como manifestação frequente. Determinar a causa da diarreia pode ser difícil, portanto, faz-se necessário o exame das fezes para agentes específicos. Sinusopatias: sinusites e outras sinusopatias ocorrem com relativa frequência entre os pacientes com infecção pelo HIV. Herpes Simples Recorrente: a maioria das pessoas infectadas pelo HIV são coinfectadas com um ou ambos os tipos de vírus herpes simples (HSV 1 e 2), sendo mais comum a recorrência do que a infecção primária. Embora o HSV-1 seja responsável por lesões orolabiais, e o HSV-2, por lesões genitais, os dois tipos podem causar infecção em qualquer sítio. A sintomatologia clássica pode manifestar-se independentemente do estágio da doença pelo HIV. Todavia, a apresentação clínica dos quadros de recorrência é geralmente atípica ao comparar-se aos quadros em indivíduos imunocompetentes. Herpes Zoster: a maioria dos adultos foi previamente infectada pelo vírus varicela zoster, e de modo similar ao HSV, pacientes com doença pelo HIV desenvolvem pelo menos algum episódio de herpes zoster. Doenças Oportunistas Uma vez instalada a AIDS, as pessoas portadoras do HIV apresentam sinais e sintomas de processos oportunistas, representados principalmente pelas seguintes doenças: - Infecções oportunistas (pneumonias, meningites e enterites). - Tumores (sarcoma de Kaposi e linfomas). - Alterações neurológicas induzidas pelo HIV. - Doenças oportunistas são, portanto, as que se desenvolvem em decorrência de uma alteração imunitária do hospedeiro. Infecções Oportunistas (IO) São infecções que podem ser causadas por microrganismos não considerados usualmente patogênicos, ou seja, não capaz de desencadear doença em pessoas com sistema imune normal. No entanto, microrganismos normalmente patogênicos também podem, eventualmente, causar IO. Nessa situação, porém, as infecções assumem necessariamente, um caráter de maior gravidade ou agressividade, para serem consideradas oportunistas. As infecções oportunistas associadas à AIDS são várias, podendo ser causadas por vírus, bactérias, protozoários e fungos. Entre as mais frequentes temos: - Vírus: citomegalovirose, herpes simplex, leucoencefalopatia multifocal progressiva. herpes zoster, Bactérias: micobacterioses (tuberculose e complexo Mycobacterium avium intracellulare), pneumonias (S. pneumoniae), salmonelose. - Fungos: pneumocistose, candidíase, criptococose, histoplasmose. - Protozoários: toxoplasmose, criptosporidiose, isosporíase. Os Tumores Certas neoplasias são mais frequentes, entre elas: sarcoma de Kaposi, linfomas não - Hodgkin, neoplasias intra epiteliais anal e cervical. É importante assinalar que o câncer de colo do útero compõe, em vários países inclusive no Brasil, o elenco de doenças que pontuam a definição de caso de AIDS em mulher. Alterações Neurológicas Induzidas pela HIV Além da ação primária sobre linfócitos e macrófagos, o HIV apresenta um neurotropismo bastante acentuado, cuja intensidade pode variar conforme a cepa viral, mas que, frequentemente, leva ao aparecimento de síndromes neurológicas específicas, particularmente nas fases mais avançadas da infecção. Entre as manifestações neurológicas mais frequentes estão: um quadro de atrofia cerebral e demência progressiva; neuropatias periféricas; e a mielopatia vacuolar (todas relacionadas com a ação do HIV, e do próprio sistema imune, no tecido nervoso central e periférico). Diagnóstico Uma história detalhada permite ao profissional, informações indicativas do comportamento de risco para as DST‟s e para a infecção pelo HIV. Com base nas informações adquiridas, o profissional poderá, em conjunto com o paciente, construir processos que minimizem ou eliminem os riscos de uma reinfecção e/ou transmissão para outras pessoas. Febre prolongada, de baixa intensidade, é frequentemente a primeira manifestação de infecções como pneumonia pelo Pneumocystis carinii (pneumocistose), tuberculose, criptococose, ou neoplasias, especialmente os linfomas. Diarreia pode resultar de doenças oportunistas no trato gastrointestinal ou por toxicidade às drogas utilizadas no tratamento do HIV e suas complicações. Pessoas infectadas pelo HIV apresentam risco significativamente maior de desenvolver tuberculose ativa que a população em geral. A doença, quando presente, manifesta-se de forma mais grave, sendo importante causa de mortalidade nessa população. A coinfecção Tuberculose/HIV representa hoje mais de 50% entre as doenças oportunistas que acometem o portador de HIV. Portanto, é imprescindível investigar a história clínica pregressa e contatos recentes com pessoas com tuberculose ativa (bacilífera). É importante pesquisar a história pregressa das DST, especialmente a sífilis, uma vez que associada à infecção pelo HIV aumenta o risco de envolvimento clínico do sistema nervoso central (SNC). História de verrugas genitais ou coito anal receptivo, em mulheres e homens, deve ser cuidadosamente pesquisado. A coinfecção HIV e Papilomavírus Humano (HPV) podem predispor às displasias ao câncer cervical, bem como ao carcinoma de células escamosas na região perianal. Pacientes com história prévia de infecção pelo vírus das hepatites B e C podem experimentar reativação viral durante o curso da infecção crônica pelo HIV, levando à progressão para estados de hepatite clinicamente ativa. Vale ressaltar que a Hepatite C apresenta uma progressão mais acelerada em indivíduos coinfectados pelo HIV. Muitas condições comuns de pele, incluindo-se eczema, dermatite seborreica, psoríase, verrugas comuns, molusco contagioso e infecção pelo vírus herpes simples, podem ser exacerbadas ou apresentarem-se de forma atípica quando em coinfecção com o HIV. As manifestações oportunistas, indicativas de imunodeficiência mais grave, geralmente se manifestam por meio de síndromes respiratórias, digestivas e/ou neurológicas. Testes Diagnósticos Os testes para detecção da infecção pelo HIV podem ser divididos, basicamente, em quatro grupos: - testes de detecção de anticorpos - testes de detecção de antígenos - testes de amplificação do genoma do vírus - técnicas de cultura viral. As técnicas rotineiramente utilizadas para o diagnóstico da infecção pelo HIV são as baseadas na detecção de anticorpos contra o vírus, os chamados testes anti-HIV. Detectam a resposta do hospedeiro contra o vírus (os anticorpos) e não o próprio vírus. Outras técnicas detectam diretamente o vírus, ou suas partículas, e são utilizadas em situações específicas, tais como: esclarecimento de exames sorológicos indeterminados, acompanhamento laboratorial de pacientes e mensuração da carga viral para controle de tratamento. Os anticorpos contra o HIV aparecem, principalmente, no soro ou plasma de indivíduos infectados, numa média de 6 a 12 semanas após a infecção. Em crianças menores de 2 anos, o resultado dos testes sorológicos é de difícil interpretação, em virtude da presença de anticorpos maternos transferidos passivamente através da placenta. Nesses casos, em virtude dos testes imunológicos anti-HIV não permitirem a caracterização da infecção, recomenda-se que a avaliação inicial de diagnóstico seja realizada por testes de biologia molecular para detecção direta do vírus. Testes laboratoriais para detecção de anticorpos anti-HIV - ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay): esta técnica vem sendo amplamente utilizada na triagem de anticorpos conta o vírus, devido à sua facilidade de automação, custo relativamente baixo e elevada sensibilidade e especificidade. Em sua grande maioria, permite a detecção de anticorpos para o HIV- 1 e HIV-2. - Imunofluorescência Indireta (IFI): é um teste utilizado na etapa de confirmação sorológica, sendo de execução simples e de baixo custo. Apresenta interpretação subjetiva, sensibilidade e especificidade elevadas. - Western Blot (WB): este teste é considerado "padrão-ouro", para confirmação do resultado reagente na etapa de triagem. Tratase de um ensaio de execução simples, mas de custo elevado, e que permite discriminar os anticorpos detectados para diferentes proteínas virais. Apresenta interpretação subjetiva, e sensibilidade e especificidade elevadas. - Testes rápidos e testes simples: geralmente, dispensam a utilização de equipamentos para a sua realização, sendo de fácil execução e leitura visual. Sua utilização é recomendada em locais de testagem de um número reduzido de amostras, e em inquéritos epidemiológicos. Apresentam sensibilidade comparável à dos testes de ELISA, e utilizam os mesmos tipos de antígenos. Os testes rápidos são executados em tempo inferior a 30 minutos; já os testes simples são realizados em tempo superior a 30 minutos. - Quimioluminescência: testes semelhantes aos ELISA, quanto aos parâmetros de sensibilidade e especificidade; diferem na metodologia utilizada para a detecção de anticorpos. - Radioimunoensaios: utilizam antígenos marcados com material radioativo; são de execução complexa, custo elevado e uso restrito à pesquisa. Testes laboratoriais para detecção de antígeno, culturas e amplificação do genoma viral Testes de detecção de antígeno viral: estes testes quantificam a concentração da proteína p24, presente no plasma ou em sobrenadantes de cultura de tecido. Embora essa proteína esteja presente no plasma de pacientes em todos os estágios da infecção pelo HIV, sua maior prevalência ocorre antes da soroconversão e nas fases mais avançadas da doença. Técnica de cultura viral: as culturas de células mononucleares de sangue periférico, para isolamento do HIV, foram inicialmente utilizadas com AIDS. Atualmente, esse teste tem a sua utilidade restrita aos ensaios clínicos de pesquisa. Testes de amplificação do genoma viral: trata-se da análise quantitativa direta da carga viral, por meio de técnicas baseadas na amplificação de ácidos nucléicos, tais como a reação em cadeia da polimerase quantitativa e a amplificação sequencial de ácidos nucléicos. Embora essas técnicas sejam distintas, elas apresentam alta sensibilidade, permitindo o acompanhamento da resposta terapêutica antirretroviral. Além disso, valores elevados de partículas virais (em cópias de RNA/ml), detectados nessas técnicas, parecem estar relacionados com um maior risco de progressão da doença, independentemente da contagem de células T CD4+. Sugere-se seu monitoramento a cada 3 ou 4 meses. Considerações sobre os resultados dos testes sorológicos Todos os conjuntos de diagnósticos apresentam características intrínsecas que podem conduzir a resultados falsos. Resultados falso-positivos podem ser decorrentes de problemas técnicos no procedimento do exame, ou de alterações biológicas no indivíduo que determinam reatividade, independentemente da condição investigada. Entre as causas de origem técnica, podemos citar: contaminação de ponteiras; contaminação da reação por soros vizinhos fortemente positivos; troca de amostras; ciclos repetidos de congelamento e descongelamento de amostras; inativação da amostra a 56º C; e transporte ou armazenamento inadequado das amostras ou dos kits. Como possíveis causas de resultados falso-positivos podem ser mencionadas, entre outras: as semelhanças antigênicas entre microrganismos; doenças autoimunes; infecções por outros vírus; uso de drogas endovenosas; e aquisição de anticorpos anti-HIV passivamente. É importante salientar que nem todos os casos de reações falsopositivas têm a sua causa definida ou podem ser evitados. Além disso, tais causas podem variar ou não, de acordo com os métodos utilizados. Com relação aos resultados falso-negativos, é importante mencionar a sensibilidade do teste como uma das principais causas – em função das diferentes capacidades de detecção dos kits, da ocorrência do período de janela imunológica ou da variabilidade na constituição antigênica dos conjuntos de diagnóstico. Entre as causas de ordem técnica que contribuem para o aparecimento de resultados falso-negativos, podemos citar: a troca da amostra; o uso de reagentes fora do prazo de validade; a utilização de equipamentos desajustados; e transporte ou armazenamento inadequado das amostras ou kits. Finalmente, é importante enfatizar que, mesmo com o processamento adequado das amostras de sangue e a execução técnica correta de todas as etapas da reação sorológica no laboratório, é fundamental que o processo de aconselhamento, antes e depois do teste, seja feito de forma cuidadosa. Esta prerrogativa é essencial, para que o resultado do exame seja corretamente interpretado, tanto pelo profissional de saúde quanto pelo paciente, gerando atitudes que visem a promoção da saúde e/ou prevenção da infecção pelo HIV nos indivíduos testados, conforme o diagnóstico obtido a partir da avaliação clínica e laboratorial. Atendimento Odontológico Biossegurança Os acidentes de trabalho, com sangue ou outros fluidos potencialmente contaminados, devem ser tratados com casos de emergência médica, uma vez que as intervenções para profilaxia da infecção pelo HIV e Hepatite B necessitam, para a sua maior eficácia, serem iniciadas logo após a ocorrência do acidente, apesar da eficácia destas medidas não estarem totalmente comprovadas. Deve-se destacar a necessidade de implementar ações educativas permanentes, que familiarizem os profissionais de saúde com as precauções universais e os conscientizem da necessidade de empregá-las adequadamente, como a medida mais eficaz para a redução do risco de infecção pelo HIV ou pelas hepatites em ambiente ocupacional. Serão aqui apresentados os cuidados a serem adotados para evitar a infecção por exposição ocupacional a agentes biológicos com ênfase em HIV e hepatites B e C. Serão descritas as precauções universais, bem como os procedimentos que devem ser seguidos após exposição ocupacional ao material biológico potencialmente contaminado. Tipos de exposição As exposições que podem trazer risco de transmissão ocupacional são definidas como: - Exposições percutâneas: lesões provocadas por instrumentos perfuro- cortantes (agulhas, bisturis, vidrarias). - Exposições em mucosas: quando há respingos na face envolvendo olho, nariz ou boca. - Exposições cutâneas: contato com pele com dermatite ou feridas abertas e mordeduras humanas que são consideradas como exposição de risco quando envolvem a presença de sangue, devendo ser avaliadas tanto para o individuo que provocou a lesão quanto para aquele que tenha sido lesado. Vírus da Imunodeficiência humana Em situações de exposição ao sangue, o risco médio de adquirir o HIV é de aproximadamente 0,3% após exposição percutânea, e de 0,09 % após exposição de mucosas ou de superfície da pele com lesão. Pesquisas demonstraram que o uso profilático do AZT (zidovudina), logo após exposição ocupacional, esteve associado à redução de 81% do risco de soroconversão após exposição ocupacional. Atualmente, o uso combinado de antirretrovirais é recomendado pela sua possibilidade de maior eficácia na redução do risco de transmissão do HIV. Vírus das hepatites B e C A probabilidade de infecção pelo vírus da Hepatite B, após exposição percutânea, é significativamente maior do que a probabilidade de infecção pelo HIV. Em exposição percutâneas envolvendo sangue sabidamente infectado pelo HBV e com a presença de HbeAg (o que reflete uma alta taxa de replicação viral e, portanto, uma maior quantidade de vírus circulante), o risco de hepatite clinica varia entre 22% a 31%, e o da evidência sorológica de infecção de 37% a 62%. Quando o paciente-fonte apresenta somente a presença de HbsAg (HbeAg negativo), o risco de hepatite clinica varia de 1% a 6%, e o de soroconversão, 23% a 37%. No Brasil, a utilização da vacina contra Hepatite B é recomendada para todos os profissionais de saúde. Após exposição ocupacional ao material biológico, para profissionais não imunizados, o uso da vacina, associado à imunoglobulina hiperimune para Hepatite B (IGHAHB) é uma medida que, comprovadamente, reduz o risco de infecção. Para o vírus da Hepatite C, o risco médio é de 1,8%. É importante ressaltar que não existe intervenção específica para prevenir a transmissão do vírus da Hepatite C após exposição ocupacional. Normas de precauções universais Precauções universais, atualmente denominadas Preocupações Básicas, são medidas de prevenção que devem ser utilizadas pelos profissionais de saúde na assistência a todos os pacientes; na manipulação de sangue, secreções e excreções, e contato com mucosas e pele não íntegra. Isso independe do diagnóstico, definido ou presumido, de doença infecciosa (HIV, hepatites B e C). Essas medidas incluem a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), cuja finalidade é reduzir a exposição do profissional ao sangue ou fluidos corpóreos, bem como recomendações quanto aos cuidados específicos ao manipular e descartar materiais perfuro-cortantes contaminados por material orgânico. Equipamentos de Proteção Individual (EPI) Os equipamentos de proteção individual são: luvas, máscaras, gorros, óculos de proteção, capotes (aventais) e botas, e atendem às seguintes indicações: - Luvas: sempre que houver possibilidade de contato com sangue, secreções e excreções, com mucosas ou com áreas de pele não íntegra (ferimentos, escaras, feridas cirúrgicas e outros). - Máscaras, gorros e óculos de proteção: durante a realização de procedimentos em que haja possibilidade de respingo de sangue e outros fluidos corpóreos nas mucosas da boca, nariz e olhos do profissional. - Capotes (aventais): devem ser utilizados durante os procedimentos com possibilidade de contato com material biológico, inclusive em superfícies contaminadas. - Botas: proteção dos pés em locais úmidos ou com quantidade significativa de material infectante (centros cirúrgicos, áreas de necrópsia e outros). Cuidados com materiais perfuro-cortantes Recomendações específicas devem ser seguidas durante a realização de procedimentos que envolvam a manipulação de material perfuro-cortante: - Máxima atenção durante a realização dos procedimentos. - Jamais utilizar os dedos como anteparo durante a realização de procedimentos que envolvam materiais perfuro cortantes. - As agulhas não devem ser reencapadas, quebradas ou retiradas da seringa com as mãos. entortadas, - Não utilizar agulhas para fixar papéis. - Todo material perfuro cortante (agulhas, scalp, lâminas de bisturi, vidrarias, entre outros) deve ser desprezado em recipientes com tampas e resistentes à perfuração. - Os recipientes específicos para descarte de material não devem ser preenchidos acima do limite de 2/3 de sua capacidade total e devem ser colocados sempre no local onde é realizado o procedimento. - Todo lixo proveniente de serviços de saúde deve, preferencialmente, ser recolhido para ser incinerado. Não dispondo o município deste serviço, proceder conforme orientação da vigilância sanitária do município. Recomendações específicas para imunização: Hepatite B Umas das principais medidas de prevenção é a vacinação de rotina contra Hepatite B, indicada para todos os profissionais da área de saúde, idealmente antes de sua admissão. A vacina contra Hepatite B é extremamente eficaz e segura. Induz títulos protetores em mais de 90% dos receptores adultos imunocompetentes. Os eventos adversos são raros, e usualmente, pouco importantes, tais como: dor discreta no local da aplicação (3% a 29%), febre nas primeiras 48- 72 horas após a vacinação (1% a 6%); mais raramente, fenômenos alérgicos relacionados a alguns componentes da vacina; e anafilaxia (estimativa de 1:600.000 doses). A gravidez e a lactação não são contraindicações para a utilização da vacina. As doses recomendadas variam conforme o fabricante do produto utilizado (de 10 a 20 mcg de HBsAg/ml para adultos, de acordo com o fabricante). A utilização de doses maiores é recomendada para os profissionais de saúde que apresentem imunodeficiência e naqueles que se encontram em programas de diálise. A aplicação da vacina deverá ser realizada sempre por via intramuscular, em região de músculo deltóide ou no vasto-lateral. Isto porque a aplicação em glúteos, comprovadamente, tem menor eficácia em adultos. A agenda das doses preconizada pelo Ministério da Saúde, independente da gravidade do acidente, deverá ser: 0 (primeira dose), 30 e 180 dias. Para profissionais que tenham interrompido o esquema vacinal: - Após a 1ª dose – deverão realizar a 2ª dose logo que possível e a 3ª dose com um intervalo de pelo menos dois meses da dose anterior. - Após a 2ª dose – deverão realizar a 3ª dose da vacina tão logo seja possível. Para conhecimento do seu „status sorológico‟, todo profissional de saúde deve realizar a pesquisa do anti-HBs, após um a dois meses do término do esquema vacinal. Quando não há resposta vacinal adequada após a primeira série de vacinação, grande parte dos profissionais (até 60%) responderá a uma série adicional de três doses. Caso persista a falta de resposta, não é recomendada uma revacinação. Uma alternativa que deve ser considerada antes do início da segunda série do esquema vacinal, ou depois da comprovação de falta de soroconversão com seis doses da vacina (não respondedor), é a solicitação de HBsAg, para descartar a possibilidade de esses profissionais terem infecção crônica pelo VHB e que, portanto, não estariam apresentando “resposta vacinal”. O profissional de saúde não respondedor (sem resposta vacinal a duas séries com três doses cada) deve ser considerado como susceptível à infecção pelo VHB. Caso ocorra uma exposição a materiais biológicos com risco conhecido, ou provável, de infecção pelo HBV, o não respondedor deve utilizar a imunoglobulina hiperimune contra Hepatite B. A imunoglobulina hiperimune contra Hepatite B (IGHAHB) também deve ser aplicada por via IM. Ela fornece imunidade provisória por um período de três a seis meses após a administração. Exposição ao material biológico Os procedimentos recomendados em caso de exposição ao material biológico incluem: - Cuidados locais na área exposta. - Recomendações específicas para imunização contra o tétano. - Medidas de quimioprofilaxia para Hepatite B e HIV. - Acompanhamento sorológico para o HIV, e para o vírus das hepatites B e C. Cuidados locais na área exposta Após exposição ao material biológico, cuidados locais com a área exposta devem ser imediatamente iniciados. Recomenda-se lavagem exaustiva com água e sabão, em caso de exposição percutânea. O uso de solução antisséptica degermante (PVP-Iodo ou clorexidina) pode também ser utilizado, embora não haja nenhuma evidência objetiva de vantagem em relação ao uso do sabão. Após exposição em mucosas é recomendada a lavagem exaustiva com água ou soro fisiológico a 0,9%. Evitar o contato com soluções irritantes como éter, hipoclorito ou glutaraldeído, na pele, pois promove aumento da área exposta. Hipoclorito ou glutaraldeído são substâncias que devem ser utilizadas exclusivamente para desinfecção de material e superfície, sendo obrigatório o uso de luvas. Quimioprofilaxia para o VHB Caso ocorra uma exposição a materiais biológicos com risco conhecido, ou provável, de infecção pelo VHB, o não respondedor (anti HBs negativo) deve utilizar a imunoglobulina hiperimune contra Hepatite B. A imunoglobulina hiperimune contra Hepatite B (IGHAHB) deve ser aplicada por via IM, na dose de 0,06ml/kg de peso. Se a dose a ser utilizada ultrapassar 5ml, deve-se dividir a aplicação em duas áreas corporais diferentes. A vacina e a IGHAHB podem ser administradas simultaneamente, sendo indicada a aplicação em locais diferentes. A aplicação da IGHAHB resulta em imunidade provisória por um período de três a seis meses após a administração. Existe maior eficácia na profilaxia pós-exposição quando a imunoglobulina é utilizada dentro das primeiras 24 a 48 horas após o acidente. Tanto a vacina quanto a imunoglobulina devem ser aplicadas dentro do período de sete dias após o acidente. Profissionais que já tiveram hepatite B estão imunes à reinfecção e não necessitam de profilaxia pós-exposição. A gravidez e a lactação não são contraindicações para a utilização da IGHAHB. Medidas relacionadas ao VHC Não existe medida específica eficaz para redução do risco de transmissão do vírus da Hepatite C após exposição ocupacional. Os estudos não comprovaram benefício profilático com o uso de imunoglobulinas e nenhum trabalho foi realizado para avaliar o uso de antivirais. Acompanhamento sorológico A sorologia anti-HCV do profissional exposto deve ser realizada quando a sorologia do paciente-fonte for desconhecida ou positiva. Deve-se realizar a sorologia anti-HCV: no momento do acidente, três, seis e 12 meses após o acidente. Os testes sorológicos imunoenzimáticos permitem a detecção de anti- HCV a partir da 6ª a 12ª semana após a exposição. Medidas específicas e quimioprofilaxia para o HIV acompanhamento sorológico de A exposição ocupacional ao HIV deve ser tratada como emergência médica, uma vez que a quimioprofilaxia deve ser iniciada o mais rápido possível, idealmente até duas horas após o acidente e no máximo 72 horas. Indicações de antirretrovirais pós-exposição A indicação do uso de antirretrovirais deve ser realizada no serviço de referência para acidente ocupacional, a partir de uma avaliação criteriosa do risco de transmissão do HIV, baseada nas características do acidente ocorrido. Serão considerados com o acidentado, os riscos e benefícios do uso da medicação, que quando indicada, é realizada com terapia combinada. A duração da quimioprofilaxia é de quatro semanas. Tendo em vista a alta taxa de abandono observada em alguns estudos, é fundamental o monitoramento da toxicidade e da adesão terapêutica, independentemente do esquema escolhido. Sorologia do paciente-fonte O paciente-fonte deve ser orientado sobre a importância da realização do teste, ressaltando as implicações para o profissional de saúde envolvido no acidente. A solicitação de teste anti-HIV (teste rápido) deverá ser feita com aconselhamento pré e pós-teste, ressaltando que quando se utiliza apenas um teste rápido não se define o diagnóstico. O achado de um resultado negativo pode evitar o início da quimioprofilaxia antirretroviral pelo profissional de saúde, dependendo da condição epidemiológica do paciente-fonte (considerar a possibilidade de “janela imunológica”). Acompanhamento do Profissional de Saúde A realização do teste anti-HIV no momento do acidente é importante para posterior caracterização de infecção pelo HIV em decorrência do acidente profissional. Deverá ser garantida ao profissional exposto a confidencialidade do resultado. O profissional de saúde com teste anti-HIV não reativo deverá ser acompanhado em serviço de referência pelo período de seis meses, quando o acidente envolver material infectado pelo HIV ou com paciente-fonte desconhecido. Em exposição com paciente-fonte anti-HIV negativo, o acompanhamento do profissional acidentado somente é indicado caso haja possibilidade do paciente-fonte estar em “janela imunológica” (exposição ao HIV nos últimos três a seis meses). Tratamento odontológico dos portadores de hepatites virais Nos portadores das hepatites virais agudas ou crônicas, a conduta odontológica tem início com a anamnese, avaliando-se os dados de identificação do paciente, perfil psicossocial e demográfico, história médica pregressa, tratamento atual e medicações em uso, presença de hábitos orais (deletérios ou não) e história odontológica pregressa e atual. A interação do cirurgião-dentista com a equipe multiprofissional é indispensável para o conhecimento do estado geral de saúde e do dano hepático do paciente, fatores importantes para a elaboração do plano de tratamento odontológico. Tratamento odontológico em portadores das hepatites virais agudas Recomenda-se que tratamentos odontológicos eletivos somente sejam realizados em portadores de hepatites virais agudas após o período de recuperação clinica e bioquímica do individuo. Durante o quadro agudo, apenas tratamentos de urgência devem ser realizados. Caso o paciente necessite de intervenções cirúrgicas cruentas, devem ser solicitados exames hematológicos, como plaquetometria, tempo de protrombina/NR (International Normalizated Ratios) e tempo de tromboplastina parcial ativada. Tratamento odontológico em portadores das hepatites virais crônicas e candidatos a transplantes No caso dos portadores de hepatites virais crônicas e pacientes condidatos a transplantes, exames bioquímicos, como dosagem de bilirrubina sérica, dosagem de aminotransferases séricas (AST, aspartato aminotransferase e ALT – alanina aminotranferase), dosagem de fosfatase alcalina, transpeptidase glutamil e tempo de protrombina (TP), podem ser solicitados para avaliação da função hepática, bem como exames radiográficos intra e extrabucais ou outras técnicas de análise imagiológica. Na Adequação do Meio Bucal (AMB), o cirurgião-dentista deve orientar o indivíduo quanto à higiene bucal, uso do fio dental e dieta adequada e realizar escavação e selamento em massa das cavidades abertas, além do tratamento periodontal básico e do ajuste de próteses. O nível de infecção oral deve ser reduzido, com a restauração das lesões cariosas, a remoção dos nichos de infecção (dentes semiinclusos, com prognóstico indefinido e raízes residuais), bem como exodontias e realização de tratamento endodôntico dos dentes com comprometimento pulpar. A realização de qualquer cirurgia em paciente hepatopata envolve risco de hemorragia severa. Uma avaliação do sistema de coagulação e mandatória e deve incluir hemograma completo, plaquetometria, tempo de protrombina (TP), INR (Índice Internacional Normalizado) e tempo de tromboplastina parcial (TTP). As alterações de coagulação na doença hepática são bastante variáveis, podendo apresentar diferentes causas, como: defeitos quantitativos e qualitativos das plaquetas; produção diminuída de fatores procoagulantes e inibidores da coagulação; deficiência de vitamina K; clearance diminuído de fatores ativos; hiperfibrinolise. Trombocitopenia é um achado comum em pacientes com doença hepática crônica avançada, podendo acometer 30% a 64% dos pacien tes. Diferentes mecanismos têm sido atribuídos a plaquetopenia, entre eles: sequestro de plaquetas no hiperesplenismo; produção reduz ida de trombopoetina; destruição aumentada de plaquetas por u m mecanismo imune, com altos níveis de IgG, IgM e componentes d o complemento, como C3-C4; e a associação de imunocomplexos a plaquetas. O consumo de álcool, a deficiência de folato e o uso de outras drogas também podem contribuir para plaquetopenia. Embora uma contagem de plaquetas de 100.000/mm de sangue seja desejável para cirurgias maiores, cirurgias odontológicas menores podem ser realizadas com uma contagem de plaquetas acima de 50.000/mm , sendo a transfusão necessária caso essa contagem caia para níveis inferiores. Cirurgias de maior risco hemorrágico como exodontias de dentes inclusos ou outras cirurgias ósseas, devem ser realizadas com uma plaquetometria mínima de 80.000 plaquetas/mm de sangue. É comum que o paciente portador de doenças hepáticas apresente uma plaquetometria inferior a 50.000 plaquetas/mm de sangue. Nesses casos, a maioria dos protocolos vigentes recomenda, sempre que a realização de procedimentos odontológicos invasivos for necessária, a utilização de medidas hemostáticas sistêmicas, como o uso de concentrado de plaquetas. No entanto, muitos serviços relatam a utilização de protocolos para realização de procedimentos odontológicos invasivos, sem compensação hematológica, com plaquetometria inferior a 50.000 plaquetas/mm de sangue. A transfusão de Concentrado de Plaquetas (CP) está indicada para profilaxia e tratamento de sintomatologia hemorrágica relacionada com alterações quantitativas e/ou qualitativas das plaquetas. Estima-se que cada unidade de concentrado de plaqueta transfundida aumente a contagem circulante do paciente em 5.000 a 8.000 plaquetas/mm de sangue. Um adulto recebe, em média, de cinco a oito unidades de CP, em infusão rápida, o que aumenta a contagem de plaquetas em torno de 30.000/mm , sendo realizada nova contagem apos a transfusão. Alterações nas cascatas de coagulação também são comuns. A coagulopatia relacionada à doença hepática é proporcional à severidade da doença e a tendência ao sangramento. Onze proteínas participantes das cascatas de coagulação são produzidas pelo fígado; portanto, frente a uma insuficiência hepatocelular, sua produção pode ficar prejudicada. Os primeiros fatores cuja produção sofre redução são os fatores vitamina K dependentes (protrombina e fatores V, VII e X), o que se manifesta laboratorialmente por meio de tempos aumentados de protrombina e INR. Com a progressão da doença hepática, outros fatores da coagulação podem ser afetados, alargando o tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPa). Nesses casos, diversos trabalhos na literatura têm indicado a utilização profilática de Plasma Fresco Congelado antes de cirurgias, para que o TP e TTP atinjam níveis satisfatórios, visando a uma intervenção com menor risco hemorrágico possível. Considera-se necessária a transfusão profilática de Plasma Fresco Congelado em cirurgia eletiva quando o INR for superior a 1,8, e/ou em TTPa prolongado, em pelo menos 1,5 vezes (>1,5). Cirurgias simples, como extração de um único dente erupcionado, podem ser realizadas com INR de até quatro, com plaquetometria de 50.000 plaquetas/mm de sangue. Cirurgias mais complexas, como a extração de dois ou mais dentes inclusos podem ser realizadas com INR de até dois, com plaquetometria de 80.000 plaquetas/mm de sangue. Outros fatores hemostáticos sistêmicos, como fator VII recombinante e concentrado de complexo protrombinico, também podem ser utilizados profilaticamente na correção de coagulopatias. Diversos hemostáticos locais foram relatados para a utilização em odontologia. O selante de fibrina, a celulose oxidada, o cianoacrilato, o gel de plasma rico em plaquetas e bochechos de acido tranexamico têm sido utilizados eficientemente e com segurança, seja isoladamente ou em combinações entre si. A celulose oxidada e o enxaguatório bucal com ácido tranexamico a 4,8% custam menos e são mais facilmente acessíveis ao clinico. Os protocolos de utilização do enxaguatório variaram entre dois e sete dias, demonstrando-se eficientes. Tratamento odontológico pós-transplante hepático O tratamento odontológico nos pacientes pós-transplantados tem como objetivo a manutenção e motivação de uma boa saúde bucal, a detecção e tratamento precoce de infecções orais e o reconhecimento e tratamento de lesões orais associadas à imunossupressão. Acompanhamentos periódicos para avaliação oral de rotina devem ser estabelecidos, reforçando-se a importância da escovação oral e uso do fio dental. Os pacientes devem ser orientados a procurar o cirurgião-dentista, caso apareça qualquer alteração na cavidade oral. O tratamento odontológico do paciente transplantado pode ser dividido em três períodos: o período do pós-transplante imediato, o período em que o paciente transplantado permanece estável e o período em que este apresenta rejeição. O período pós-transplante imediato é o período de maior risco para a rejeição do transplante. Nessa etapa, que pode durar de três a seis meses, o paciente encontra-se em um regime de imunossupressão máxima, ficando sujeito às infecções oportunistas. O tratamento odontológico eletivo não deve ser realizado nesse período, salvo em situações de urgência, direcionadas para o controle das infecções, dor ou hemorragias, da forma mais conservadora possível, após interconsulta com a equipe médica. Na fase pós-transplante estável, o enxerto está cicatrizado e o risco de rejeição do órgão decresce. Espera-se que a função hepática não apresente alteração e que os marcadores bioquímicos e hematológicos tenham voltado para os limites normais; porém, a contagem plaquetária pode permanecer reduzida. Nesse período, tratamentos odontológicos eletivos podem ser efetuados com segurança, devendo-se sempre realizar uma interconsulta com a equipe médica para verificar a estabilidade do paciente e solicitar exames laboratoriais para pesquisar possíveis alterações. Nessa fase, a manutenção da boa saúde bucal e da motivação do paciente precisam ser enfatizadas em consultas periódicas trimestrais. Toda infecção oral deve ser tratada de modo agressivo, para evitar maiores complicações. Em paciente sob terapia imunossupressora com glicocorticóide, submetido a tratamento odontológico invasivo, deve ser verificada a necessidade de suplementação de corticóide, em virtude da possibilidade de supressão de eixo adrenal pelo uso contínuo de corticosteroides. O uso de profilaxia antibiótica, segundo o protocolo da Associação Americana de Cardiologia, utilizado para a prevenção da endocardite infecciosa, deve ser realizado para procedimentos odontológicos invasivos. Manifestações orais de pacientes transplantados podem estar relacionadas à imunossupressão ou a reações adversas às drogas imunossupressoras. As manifestações orais em pacientes imunossuprimidos podem ser divididas em infecciosas e neoplásicas. Estima-se que de 6 a 42% desses pacientes desenvolvam infecções fúngicas em cavidade oral; dentre essas, a candidose é a mais comum. Dentre as infecções virais, o Citomegalovirus (CMV) e os vírus do Herpes Simples (HSV), da Varicela Zoster (VZV) e de Epstein-Barr (EBV) são responsáveis por infecções prevalentes em pacientes sob terapia imunossupressora. Tais infecções podem gerar lesões ulcerativas dolorosas e recidivantes, muitas vezes comprometendo a qualidade de vida do paciente. O EBV também pode estar relacionado à leucoplasia pilosa oral, que tem sido fortemente associada a pacientes imunocomprometidos em virtude da infecção pelo HIV; porém, a associação entre o EBV e a leucoplasia pilosa em pacientes em terapia imunossupressora é relatada na literatura. O real significado da progressão dessa lesão em pacientes transplantados não está bem estabelecido, a qual pode indicar apenas um grau alto de imunossupressão. A hiperplasia gengival pode ser agravada e desencadeada pelo acúmulo de placa. Assim, o cirurgião-dentista deve enfatizar a necessidade da higiene oral para o paciente. Quando necessária, uma gengivectomia pode ser realizada, devendo- se sempre enviar o material removido para exame histopatológico, uma vez que malignidades desenvolvidas em região de relatadas. hiperplasias gengivais medicamentosas já foram Está estabelecido que a terapia imunossupressora pode predispor o paciente ao desenvolvimento de neoplasias malignas que até 16% dos pacientes transplantados hepáticos desenvolverá algum tipo de câncer. Dentre as neoplasias malignas de cavidade oral, as neoplasias linfoproliferativas, o sarcoma de Kaposi e o carcinoma de células escamosas são as lesões mais comuns. As neoplasias linfoproliferativas são principalmente pelos linfomas não Hodgkin, relacionadas com a infecção representadas podendo estar As neoplasias linfoproliferativas são representadas principalmente pelos linfomas não Hodgkin, podendo estar relacionadas com a infec ção pelo EBV em casos de imunossupressão intensa ou desordem na proliferação de linfócitos associada à imunossupressão prolongada. O sarcoma de Kaposi oral tem sido historicamente relacionado à infecção pelo HIV, entretanto, relatos dessa neoplasia em pacientes sob terapia imunossupressora são comuns. Em pacientes sob terapia imunossupressora, casos de carcinoma de célilas escamosas (CEC) de cavidade oral evoluir mais rapidamente, apresentando um comportamento mais agressivo. Algumas dessas lesões evoluem de leucoplasias regulares, de aparência clínica pouco agressiva. O cirurgião-dentista desempenha um papel importante no diagnóstico precoce dessas neoplasias para que o tratamento adequado seja instituído o mais rápido possível. O paciente transplantado com rejeição do órgão deve ter seu tratamento odontológico eletivo adiado, até se encontrar estabilizado. Durante a rejeição aguda, a saúde geral do paciente torna-se bastante comprometida, sendo o tratamento odontológico direcionado apenas para urgências. Durante a fase de rejeição crônica, deve-se lembrar que sinais e sintomas da insuficiência hepatocelular, costumam surgir e que procedimentos invasivos podem desencadear hemorragias. Nesses pacientes em fase de rejeição, a profilaxia antibiótica deve ser utilizada, em procedimentos odontológicos de urgência, pelos seguintes motivos: saúde geral comprometida, maior susceptibilidade ao desenvolvimento de sepse após procedimentos que causem bacteremias, risco de desenvolvimento de ascite e peritonite bacteriana espontânea. Farmacologia transplantes aplicada às hepatopatias e pós- O paciente assintomático de hepatite viral não apresenta mudanças significativas na farmacocinética e farmacodinâmica de drogas utilizadas no tratamento odontológico de rotina; entretanto, devemse evitar fármacos com grande potencial hepatotóxico e prover atenção especial aos fármacos utilizados no tratamento da doença viral. Quadro 1 – Drogas utilizadas no tratamento das hepatites virais Agravo Fármaco Mecanismo Repercussões de ação Hepatite B Interferon convencional Lamivudina Inibidor nucleosídeo da Citocina Perda de peso, alopecia, retinopatia, dermatite, neuropatia sensorial periférica, vasculite neuropática, neuropatia desmielinizante inflamatória crônica, anemia, leucopenia, trombocitopenia, distúrbios neuropsiquiátricos (depressão e suicídio), distúrbios imunomoduladora surgimento da síndrome flu-like, caracterizada por febre mialgias, mal estar cefaleia, insônia e nervosismo. Esse fármaco deve ser evitado em pacientes portadores de doenças imunologicamente mediadas (líquen plano, pênfìgo, penfigoide, eritema multiforme e lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide) uma vez que pode exacerbar a doença. Diarreia, lipoatrofia, náuseas, cefaleia, insônia e fadiga. Raros casos de neuropatia, miopatia pancreatite e síndrome de Panconi. polimerase viral Agravo Fármaco Tenofovir Hepatite B Entecavir Adefovir Mecanismo de ação Repercussões Nefrotoxidade (tubulopatia proximal) com elevação da Inibidor creatinina serica, síndrome de nucleotídeo de Fanconi, diabetes insipidus polimerase nefrogênica, hipofosfatemia, viral hiperfosfatúria e aminoácidúria, alteração do metabolismo ósseo, redução de densidade óssea (alteração nos níveis séricos de cálcio e fosfato) Diarreia, náuseas, cefaleia, insônia e fadiga. Sem Inibidor evidencias clinicas de nucleosídeo da polimerase toxicidade motocondrial (comum aos outros inibidores viral nucleosídeos, que causam neuropatia, miopatia e acidose lática). Nefrotoxicidade com elevação Inibidor da creatinina sérica (lesão do nucleosídeo epitélio tubular) associada à da polimerase albwninúria, com ou sem viral hipofosfatemia. Agravo Fármaco Mecanismo de Repercussões ação Perda de peso, alopecia, retìnopatia, dermatite, neuropatia sensorial periférica, vasculite neurática, neuropatia desmielinizante iramatória crónica, leucopenia, trombocitopenia, Hepatite B Interferon Citocina distúrbios neuro),siquiátricos depressão e (convencional imunomoduladora suicídio, distúrbios enócrinos e surgimento da síndrome flu-like, caracterizada por febre, e peguilhado) mialgias, mal-estar, cefaleia, insónia e nervosismo. Este fármaco deve ser evitado em pacientes portadores de doenças autoimunes (líquen plano, pênfigo, penfigóide, eritema multiforme, lúpus eritematoso sistêmico, artrite rematoide) urna vez que pode exacerbar a doença. Ribavirina Coinfecção Interferon VHB + peguilado VHD Vómitos, diarreia, anemia hemolítica, Nucleosídeo fraqueza muscular, anorexia e perda de sintético (ação peso, insônia, congestão nasal, tosse e virostática) prurido. Perda de peso, alopecia, retínopa tia, dermatite, neuropatia sensorial periférica, vasculite neuropática, neuropatia Citocina ímunomoduladora desmielinizante inflamatória crónica, anemia, leucopenia, trombocitopenia, distúrbios neuropsiquiátricos (depressão e suicídio) distúrbios endócrinos e surgimento da síndrome de Flu-like caracterizada por febre, mialgias, mal estar, cefaleia, insônia e nervosismo. Este fármaco deve ser evitado em pacientes portadores de doenças autoimune (líquen plano, pênfigo, penfigoide, eritema multiforme, lúpus eritematoso sistêmico, artrite reumatoide) uma vez que pode exacerbar a doença. O fígado constitui o principal órgão metabolizador da maioria dos fármacos existentes. Muitas drogas comumente utilizadas em clínica médica e odontológica são metabolizadas por enzimas do citocromo P-450 microssonal nos hepatólicos. Assim, embora a infecção pelos vírus das hepatites não resulte em mudanças bruscas na metabolização desses fármacos, a cirrose hepática decorrente de uma infecção viral tem um efeito complexo na depuração, biotransformação e farmacocinética de uma ampla variedade de drogas. Isso faz com que esses pacientes tenham um metabolismo hepático imprevisível, o que pode ocasionar efeitos atípicos das drogas prescritas em odontologia. Dependendo da severidade da disfunção hepática, modificações na dosagem ou no intervalo de tomada de medicações são recomendadas. Não há regra para avaliação de modificação de dosagem de drogas em pacientes com doença hepática; entretanto, um guia geral de adequação foi sugerido. Uma redução (30% a 50%) da dose de fármacos de metabolização hepática pode ser realizada, desde que se acompanhe a resposta clínica terapêutica e efeitos colaterais desses fármacos. Essa adequação deverá ser realizada se um ou mais dos itens abaixo se fizerem presentes: - AST ou ALT elevados mais de quatro vezes acima do normal. - Elevação de bilirrubina sérica acima do valor de referência. - Albumina sérica abaixo do valor de referência. - Sinais de ascite ou encefalopatia associado à falha hepática. Adicionalmente, o cirurgião-dentista deve evitar ou reduzir o uso de fármacos que possuem metabolismo hepático e que são prescritos durante tratamento odontológico (Quadro 2). Drogas utilizadas em odontologia: Farmáco: Acetaminofeno Paracetamol Comentário: Seu uso deve ser evitado, devido à sua ação hepatotóxica. Pode, entretanto, ser utilizado com cautela em pacientes com cirrose, sem exceder a dose máxima (4g/dia), administrada por um período inferior a duas semanas. Os pacientes necessitam ser instruídos para evitar o consumo de etanol durante a terapia medicamentosa. Farmáco: Ácido Acetilsalicílico Comentário: Seu uso deve ser evitado em pacientes com cirrose, pois além de a metabolização dessa droga encontrar-se reduzida, ocorre um decréscimo na síntese de proteínas plasmáticas (falha hepática), o que causa aumento na fração livre dessa droga, com aparecimento de toxicidade. O efeito antiplaquetário desse fármaco pode predispor o portador de cirrose ao sangramento, uma vez, que nesse paciente, já existe uma redução na produção de diversos fatores de coagulação. Adicionalmente, a presença de plaquetopenia, varizes esofágicas, sangramento gástrico e úlcera péptica são comuns em pacientes com hipertensão portal (devido a cirrose). O uso dessa droga pode potencializar o dano à mucosa gástrica e produzir sangramento digestivo. Farmáco: Anti-inflamatórios não esteroidais Comentário: Seu uso deve ser feito com cautela em pacientes com cirrose, pois além de a metabolização dessa droga encontrar-se reduzida, ocorre um decréscimo da síntese de proteínas plasmáticas (falha hepática), o que causa aumento na fração livre dessa droga, com apareci mento de toxicidade. Adicionalmente, a presença de plaquetopenia, varizes esofágicas, sangramento gástrico e úlcera péptica são comuns em pacientes com hipertensã o portal (devido a cirrose). O uso dessa droga pode potencializar o dano à mucosa gástrica e produzir sangramento digestivo. Farmáco: Anestésicos locais do grupo amida (lidocaína, mepivacaína) Comentário: Seu uso deve ser feito com cautela em pacientes com cirrose (menor dose necessária para exercer um bom efeito clínico). A maioria dos anestésicos locais do tipo amida é metabolizada primariamente no fígado (com exceção da articaína, da qual cerca de 90-5% são metabolizados no plasma). Apesar de o uso de anestésicos locais (do grupo amida) ser seguro, o cirurgiãodentista deve estar ciente de que concentrações tóxicas de tais drogas são alcançadas mais facilmente nesses pacientes. Farmáco: Antibióticos Betalactâmicos Comentário: Os fármacos desse grupo podem ser utilizados de forma segura em pacientes com cirrose, possuindo eliminação predominantemente por filtração renal e excreção tubular. Assim, penicilina, ampicilina, amoxicilina, cefalexina e cefazolina são bem tolerados em pacientes cirróticos. Farmáco: Antibióticos do grupo das lincosaminas (clindamicina) Comentário: Seu uso deve ser evitado em pacientes com cirrose. O metabolismo desse fármaco tornase muito prolongado em caso de comprometimento hepático. Adicionalmente, essa droga é hepatotóxica e contribui para o mecanismo de lesão no hepatócito . Farmáco: Antibióticos do grupo dos macrolídeos (azitromicina) Comentário: Seu uso deve ser feito com cautela em pacientes com cirrose, pois essa droga possui eliminação hepá tica e está associada (de forma rara) a necrose hepática e falha hepática. Farmáco: Antibióticos do grupo dos macrolídeos (claritromicina) Comentário: Seu uso deve ser feito com cautela em pacientes com cirrose, pois a farmacocinética dessa droga torna-se alterada na presença de insuficiência hepática. Entretanto, esse fármaco parece ser seguro e não necessitar de ajuste de dose em paciente com cirrose e função renal normal. Farmáco: Antibióticos do grupo dos macrolídeos (eritromicina) Comentário: Seu uso deve ser feito com cautela em pacientes com cirrose, pois essa droga possui excreção hepática e sua meia_-vida aumenta na presença de insuficiência hepática. Adicionalmente, disfunção hepática (aumento das enzimas hepáticas, hepatite colestática e hepatite hepatocelular) tem sido associada ao uso desta droga. Farmáco: Antibióticos metronidazol Comentário: Seu uso deve ser feito com adequação em pacientes com cirrose, pois o metabolismo dessa droga se encontra comprometido na insuficiência hepática. É recomendado um aumento no intervalo de tomada dessa droga, de 6 em 6 para 12 em 12 horas, levando em consideração a dose normal de apresentação de SOOmg. Farmáco: Analgésicos narcóticos Comentário: Seu uso deve ser feito com adequação em pacientes com cirrose, pois drogas que deprimem o sistema nervoso central pode agravar o quadro de encefalopatia hepática que pode surgir no curso da cirrose. Assim, faz-se necessário um aumento no intervalo das doses dessas drogas e seu uso crônico deve ser evitado. Em caso de encefalopatia hepática, não utilizar tais fármacos. Adicionalmente, o uso de analgésicos narcóticos não deve ser combinado com o uso de outros analgésicos hepatotóxicos como o acetaminofeno, pois ambas as drogas sofrem conjugação com o ácido glicurônico; em pacientes cirróticos, a depleção desse sistema pode ser rápida e causar um aumento na hepatotoxicidade de fármacos associados, como o acetaminofeno. Farmáco: Ansiolíticos (benzodiazepínicos) Comentário: Seu uso deve ser feito com adequação em pacientes com cirrose, pois drogas que deprimem o sistema nervoso central pode agravar o quadro de encefalopatia hepática que pode surgir no curso da cirrose. Em caso de encefalopatia hepática, não utilizar esse fármaco. Adicionalmente, o metabolismo dessa classe de droga torna-se reduzido, o que leva a um acúmulo do fármaco e sedação excessiva. É aconselhável reduzir a dose dessa droga ou aumentar seu intervalo de tomada em pacientes com insuficiência hepática. Além disso, sempre que possível, devem-se utilizar fármacos que não formam metabólitos com atividade farmacológica significante (alprazolam e lorazepam). . Apesar de não existirem, ainda, evidências que suportem a recomendação de profilaxia antibiótica antes de procedimentos odontológicos de rotina em pacientes com doença hepática avançada ou com cirrose hepática, pacientes com histórico de peritonite bacteriana espontânea, ascite ou condições clínicas que possam se deteriorar após procedimentos invasivos devem realizar a profilaxia antibiótica antes de cirurgias odontológicas, sempre evitando o uso de clindamicina. O cirurgião-dentista deve, ainda, estar atento às possíveis interações medicamentos e efeitos colaterais produzidos pelas várias drogas prescritas durante tratamento odontológico com os fármacos utilizados para o tratamento de complicações geradas a partir da cirrose, dentre as quais se destaca o uso de: - beta-bloqueadores não seletivos para o controle de hipertensão portal e sangramento digestivo; - diuréticos como espirolactona, amilorida e furosemida para controle de ascite; - antibióticos (vancomicina, neomicina, quinolonas, metronidazol) para redução da população bacteriana intestinal produtora de amônia, auxiliando assim no tratamento da encefalopatia hepática; - vasopressores como agonistas alfa-adrenérgicos e derivados da vasopressina para o tratamento da síndrome hepato-renal. Por muitos anos, as drogas utilizadas como imunossupressores foram os corticosteroides, a ciclosporina (inibidor de calcineurina) e a azatioprina (antimetabólico). Entretanto, na última década, outros agentes têm sido utilizados para esse propósito, porém, com menos efeitos colaterais e boas respostas clínicas, destacando-se os novos inibidores de calcineurina (tacrolimo), os novos antimetabólicos (micofenolato mofetil) e os anticorpos monoclonais e policlonais. Drogas imunossupressoras: Imunossupressor Mecanismo Implicações na Saúde Bucal de Ação Corticosteroides Inibidor de calcineurina (ciclosporina) Inibidor de calcineurina (tacrolimo) Inibidor de calcineurina (taerolimo) Antimetabólicos (Azatioprina) Antimetabólicos (ciclofosfamida) Múltiplo Pacientes sob uso crônico de corticoide podem apresentar insuficiência adrenal e necessitar de suplementação com corticoide antes de procedimento cirúrgico (Avaliar Quadro 4 e o Anexo "Esquema de Suplementação"). Hiperplasia gengival e cefaleia. A Inibe produção associação com macrolídeos de interleucina (eritromicina) e antifúngicos 2 (IL-2) (cetoconazol e fluconazol) pode reduzir a metabolização da ciclosporina e aumentar sua toxicidade. A combinação com tegretol pode reduzir os níveis de ciclosporina. Cefaleia. A associação com Inibe produção macrolídeos (eritromicina) pode de interleucina- reduzir a metabolização do tacrolimo e aumentar sua toxicidade. 2 (IL-2) Inibe produção Cefaleia. A associação com de interleucina-2 macrolídeos (eritromicina) pode (IL-2) reduzir a metabolização do tacrolimo e aumentar sua toxicidade. Inibe biossíntese de punnas Inibe biossíntese de purinas e pirimidinas Náusea, vómito, anorexia, diarreia e leucopenia. Estomatite, náusea, vômito, diarreia, cefaleia e leucopenia. lmunossupressor Mecanismo de Implicações na Saúde Bucal Ação Antimetabólicos (metotrexato) Inibe biossíntese de purinas e pirimidinas Antimetabólicos (micofenolato mofetil) Inibe biossíntese de pirinas Antimetabólicos Inibe biossíntese de pirinas (micofenolato sódico) Anticorpos monoclonais policlonais Náusea, vômito e leucopenia. A combinação com anti-inflamatórios não esteroidais pode ser fatal e a associação com sulfonamidas aumenta sua toxicidade. Náusea, vômito, cefaleia, diarreia e prováveis interações com aciclovir. Náusea, vômito, diarreia, dispepsia de cefaleia, visão borrada, taquicardia e provável predisposição a infecções virais (como por citomegalovírus) e fúngicas. Cefaleia, náusea, vômito, trombocitopenia, taquicardia, e Opsonização de dispneia e predisposição a infecções linfócitos virais (herpes) e fúngicas (candidose). Inibidores da ação Inibe a ação da Náusea, artralgia, cefaleia e vômito. de IL-2 (sirolimo) interleucina-2 Esquemas terapêuticos imunossupressores, acompanham o paciente durante toda a vida. geralmente, A imunossupressão é grande na fase de indução (fase póstransplante imediato) em virtude das altas doses de imunossupressores administrados, tornando-se menor na fase de manutenção (fase pós-transplante tardio), com a redução da dose dos fármacos imunossupressores. Esses regimes de tratamento reduzem a resposta imunológica e aumentam o risco de infecção da flora normal (que normalmente é não patogênica) e de patógenos presentes no meio ambiente. Assim, alguns autores recomendam a avaliação da necessidade de profilaxia antibiótica antes de procedimentos cruentos realizados pelo cirurgião-dentista. Outros cuidados devem ser realizados no que diz respeito à terapia imunossupressora. Assim, o recurso a antiinflamatórios não esteroidais (AINES) deve ser cauteloso, pois esses fármacos podem potencializar o dano a mucosa gastrintestinal (ulcera gástrica e refluxo ácido), o qual já é uma condição comumente associada ao uso crônico de imunossupressores da classe dos corticóides. Ainda, os AINES são nefrotóxicos e podem potencializar o dano renal provocado por fármacos imunossupressores, como ciclosporina e tacrolimo. Suplementação de corticóide: Classificação de risco Esquema de adequação Pacientes em uso de corticoides em dias alternados para doença não relacionada com as adrenais (5-60mg de prednisona ou equivalente, em dias alternados). Procedimento no dia da dose: PACIENTES DE BAIXO RISCO -Idealmente, ministrá-la no início da manhã; - Dobrar a dose de corticoide no 1° dia até o máximo de 60mg de prednisona; - Utilizar dose de manutenção no 2° dia; - Voltar ao esquema normal no 3° dia. Pacientes que realizaram tratamento com corticoide por mais de 10 dias, utilizando 20mg ou mais de prednisona ou equivalente, tendo interrompido o tratamento há menos de duas semanas. PACIENTES DE RISCO MODERADO Cirurgias menores - 20-40mg de prednisona no dia da cirurgia; - 10-20mg no 2º dia; - Suspender ao 3º dia. Cirurgias maiores - 60mg no dia da cirurgia; - 30mg no dia seguinte; - Suspensão ao 3° dia. Pacientes em dose de manutenção para doença adrenal (10-20mg prednisona/dia). Estresse moderado - Dobrar a dose até o máximo de 60mg; PACIENTES DE ALTO RISCO - Dose de manutenção no segundo dia. Estresse intenso - Suplementar a dose diária para 60mg/ dia; - Reduzir a dose em 50% ao dia até a dose de manutenção. A dose do corticoide encontra-se expressa em mg de prednisona. Procedimentos sob anestesia geral, assim como dor pós-operatória, aumentam a necessidade de suplementação. Atendimento odontológico de rotina para portadores do HIV Uma parte importante do tratamento dos portadores do HIV e pacientes de AIDS é o estabelecimento de um relacionamento de confiança. Obtendo um bom histórico médico e odontológico junto ao paciente, ouvindo-o e discutindo com ele essas questões, o profissional estará demonstrando preocupação e cuidado com a sua saúde integral. Frequentemente, os sinais iniciais de imunodeficiência associados ao HIV ocorrem na cavidade bucal. Quando o profissional suspeitar da associação de uma manifestação bucal com a infecção pelo HIV, deve orientar o seu paciente para a necessidade imediata de uma avaliação médica. O tratamento odontológico deve prosseguir conforme a necessidade do paciente, procurando-se coordenar este tratamento com os aspectos médicos de cada caso. O paciente deve sempre ser informado sobre a confidencialidade da sua situação de saúde, e que o seu caso será discutido apenas com o médico ou com pessoa diretamente envolvida no seu tratamento. Algumas recomendações importantes para abordar a história do paciente, com detalhes, de forma positiva e não preconceituosa: - Reforçar sempre que a informação é confidencial. Explique o motivo das perguntas, da importância das mesmas para o diagnóstico e futuro tratamento. - Não iniciar a anamnese com perguntas relacionadas à sexualidade ou ao uso de drogas. Estas perguntas podem ser abordadas quando o profissional sentir (ou julgar) que a relação de confiança com o seu paciente está suficientemente fortalecida. - Lembrar ao paciente que a informação correta permite um tratamento adequado das doenças bucais sem interferir nas condições sistêmicas. Exemplificar como doenças e medicamentos podem afetar a saúde bucal. - Não julgar o seu paciente pela aparência, pois esta não indica sorologia para o HIV/AIDS. Tal atitude apenas fomenta a discriminação. - Respeitar a singularidade do paciente, ouvi-lo e falar com ele utilizando uma linguagem acessível, compatível com o seu nível cultural. Medicamentos frequentemente utilizados no tratamento médico de portadores do HIV e pacientes de AIDS É importante estar familiarizado com estes medicamentos uma vez que eles podem causar efeitos colaterais severos, manifestações na cavidade bucal e ainda outras conseqüências que irão interferir no plano de tratamento odontológico. Além do mais, esses medicamentos podem interagir com medicamentos utilizados pelo cirurgião-dentista para o tratamento de doenças bucais. Efeitos colaterais vão desde anemias e dor de cabeça até depressão severa da medula óssea, sangramento, úlceras da mucosa bucal e degradação do estado geral do paciente. Algumas dessas complicações incluem trombocitopenia e granulocitopenia. Plaquetas abaixo de 20.000/mm3 contra-indicam procedimentos cirúrgicos odontológicos. Granulócitos abaixo de 1.000/mm3 representam necessidade de profilaxia antibiótica antes de procedimentos cirúrgicos e invasivos. Sendo assim, a necessidade de profilaxia antibiótica precedendo o tratamento odontológico deve ser baseada nas condições médicas do paciente, no estadiamento da imunodeficiência e na recomendação do médico responsável pelo seu tratamento. Tratamento odontológico de rotina O tratamento odontológico de rotina do portador de HIV ou doente de AIDS, assumindo-se que ele já possua um diagnóstico e que esteja sendo acompanhado pelo médico, deve respeitar a seguinte sequência de procedimentos: Antes do tratamento do paciente: - Perguntar como está se sentindo; - Revisar a história médica; - Postergar procedimentos invasivos quando houver uma queixa médica não esclarecida; - Fazer todas as anotações necessárias e planejar o procedimento antecipadamente evitando qualquer manipulação do prontuário até o final do tratamento. Exame clínico: - O exame extra-bucal tem o objetivo de detectar qualquer anomalia facial (aumentos de volume, crescimentos tumorais), exame da pele, lábios, palpação de cadeias linfáticas, músculos mastigatórios e testes neurológicos; - O exame intrabucal tem por objetivo a detecção de áreas anormais ou patológicas. O exame dos tecidos moles deve ser completo e sistemático, de tal forma que todas as paredes da boca sejam examinadas. Esse exame deve incluir a mucosa labial, a mucosa jugal, os palatos duro e mole, a língua, o assoalho da boca e a orofaringe. - Todos os achados devem ser anotados e analisados. Todas as vezes que lesões dos tecidos moles forem detectadas, elas deverão ser avaliadas com prioridade, a menos que haja algum problema odontológico de emergência necessitando atenção imediata. Pode-se utilizar técnicas diagnósticas básicas como coloração pelo azul de toluidina, citologia exfoliativa, biópsia, cultura, testes laboratorias e radiografias. - Com a informação obtida, o dentista deverá desenvolver um diagnóstico e um plano de tratamento. O paciente deverá, sempre, receber a informação sobre os problemas bucais e as indicações de tratamento. Decisões sobre o tratamento deverão ser feitas de comum acordo entre o paciente e a equipe de saúde. - Após a resolução de lesões e condições dos tecidos moles, o tratamento odontológico de rotina poderá ser iniciado. Prognóstico do caso no tratamento odontológico de rotina O plano de tratamento odontológico para indivíduos infectados com o HIV e pacientes de AIDS deve considerar, sempre, a saúde geral do indivíduo, o prognóstico do caso. Quando do desenvolvimento do plano de tratamento odontológico, é importante considerar que a atual disponibilidade de terapêutica antirretroviral, a sofisticação das técnicas de diagnóstico e o progresso na prevenção e no tratamento de doenças oportunistas permitem o diagnóstico prematuro do HIV. Desse modo, o que vai determinar o tipo de tratamento a ser instituído será a disposição do paciente em cumpri-lo. Isto é, acudir a consultas longas ou curtas, e cuidar-se protegendo a sua saúde física e mental. De modo geral, o tratamento seguirá a mesma sequência: alívio da dor; restauração da forma e da função; e atendimento das necessidades estéticas. Portadores de HIV e doentes de AIDS têm demonstrado propensão ao desenvolvimento de reações alérgicas a antibióticos, durante a progressão da doença. Dessa forma, recomenda-se cautela no seu uso. Tratamento odontológico preventivo Instituir métodos de higiene bucal para todos os pacientes: devemos ter em mente que vários dos problemas encontrados na cavidade bucal de portadores de HIV e pacientes de AIDS ocorrem devido ao seu estado de imunodeficiência. A impossibilidade de controle pode tornar os problemas bucais crônicos. Sendo assim, a prevenção é um fator importante para a manutenção da saúde bucal dos pacientes. A manutenção de boa higiene bucal é importante na redução do potencial de risco de complicações. Diminuição da secreção salivar - secundária a alterações de glândulas salivares – ou da utilização de medicamentos pode aumentar o risco para cárie e doença periodontal. Apresenta-se a seguinte sugestão de protocolo: - Controle a cada três meses; - Enxágues diários; - Suplementação de flúor em aplicações tópicas, enxágues ou creme dental, particularmente para pacientes com xerostomia e aumento de incidência de cárie. Tratamento odontológico periodontal Pode ser feito da imunocompetente. mesma forma que para o indivíduo Embora raspagem, curetagem e aplainamento da raiz possam causar bacteriemia, efeitos sistêmicos como febre e calafrios, estes não foram observados após o tratamento periodontal de portadores de HIV. Enxágues com solução antibacteriana antes do tratamento e sua manutenção por dois a três dias após o mesmo, parecem reduzir o risco de complicações sistêmicas. Tratamento endodôntico Não tem sido associado ao aumento de incidência de sintomatologia pós-operatória. Entretanto, se essa ocorrer, é suave e pode ser controlada medicação anti-inflamatória e antibióticos, dependendo da sua natureza. Instrumentação meticulosa do canal radicular, respeitando os limites do forame apical, pode reduzir ainda mais a sintomatologia pósoperatória. Procedimentos cirúrgicos Uma preocupação constante quando da manipulação cirúrgica de tecidos em portadores do HIV e doentes com AIDS diz respeito à habilidade de reparação tecidual. De acordo com vários estudos, parece não existir diminuição da capacidade de reparação ou aumento significativo da ocorrência de alveolite. Procedimentos cirúrgicos devem ser realizados tentando-se minimizar a possibilidade de contaminação dos tecidos por agentes patogênicos. Raspagem e polimento coronário e radicular, antes do tratamento cirúrgico, podem auxiliar nesse sentido. Antes da realização de procedimentos cirúrgicos extensos, deve-se avaliar o paciente quanto à presença de tendência a sangramento, anemia e leucopenia, por meio da leitura do prontuário ou consulta médica. Testes laboratoriais auxiliares incluem: - Contagem de plaquetas; - Tempo de protrombina (PT); - Tempo parcial de tromboplastina (PTT); - Taxa de hemoglobina; - Hemograma completo com contagem diferencial. Procedimentos restauradores Devem ser executados de acordo com as técnicas usuais. Opções de tratamento devem ser discutidas com o paciente, incluindo vantagens e desvantagens de cada procedimento. Todos os procedimentos podem ser executados, incluindo: - Restauração com amálgama de prata; - Restauração com resina composta; - Restauração com ionômero de vidro; - Coroas e outros aparelhos protéticos. Consultas de retorno Nas consultas de retorno, a história do paciente deve ser revista. E avaliada a utilização de medicamentos e procedimentos de higiene oral. Aspectos éticos e legais Direito ao exercício da profissão ao cirurgião-dentista portador de HIV Tanto a Constituição Federal quanto a Lei n.º 5081 de 24 de agosto de 1966 amparam e garantem o exercício profissional a quem for habilitado legalmente. Segundo a Constituição, Título II, Capítulo I (Direitos e Garantias Fundamentais – Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade nos termos seguintes:” "Inciso X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito, a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação." "Inciso XIII – É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualidades profissionais que a lei estabelecer." A Lei 5081/66, que regulamenta o exercício da odontologia no Brasil, no seu Artigo 2º, diz que "O exercício da odontologia no território nacional, só é permitido ao cirurgião-dentista habilitado por escola ou faculdade oficial ou reconhecida, após o registro do diploma, nos órgãos competentes e se submeter à fiscalização do Conselho Federal de Odontologia". O Artigo 6º, Inciso I da mesma Lei, confirma que compete ao cirurgião-dentista praticar todos os atos pertinentes à odontologia, decorrentes de conhecimentos adquiridos em cursos regulares ou em cursos de pós-graduação. Portanto, o profissional cirurgião-dentista HIV-positivo também pode exercer a profissão, sem prejuízo da sua saúde e da do seu cliente, desde que reúna condições biopsicossociais para o desenvolvimento do seu trabalho, e atenda as normas de biossegurança e procedimentos recomendados pelo Ministério da Saúde. O Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro, no Parecer n.º 29/95, tem como ementa o seguinte conteúdo: ”De acordo com estudos realizados nos Estados Unidos e Europa, não há risco definido de transmissão do HIV de profissionais de saúde para seus pacientes, caso sejam respeitadas as normas de biossegurança.” Observação: o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90) afirma, no seu Artigo 66, entre outras coisas, que omitir informação relevante sobre a segurança de serviços, constitui crime contra o consumidor, no caso, o paciente. Em tese, o cirurgião-dentista não deveria omitir a informação para o paciente. Mas o Artigo 66 da Lei 8078/90 é contradito pelo Código de Ética Odontológica que, no seu Capítulo III, Artigo 4º, Inciso V, assim trata dos deveres fundamentais dos cirurgiões-dentistas, afirmando que o profissional deve promover a saúde coletiva no desempenho de suas funções, cargos, independentemente de exercer a profissão no setor público ou privado. No seu Capítulo II, que trata dos direitos fundamentais do cirurgião dentista, em seu Artigo 3º, Inciso IV, explicita que o cirurgiãodentista deve se recusar a exercer a profissão em âmbito público ou privado, onde as condições de trabalho não sejam dignas, seguras e salubres. Se o cirurgião-dentista e a entidade pública ou privada seguirem esses artigos do Código de Ética, o que, na prática, significa o cumprimento, pelo cirurgião-dentista, das normas de biossegurança; o paciente estará protegido quanto à sua segurança. Assim sendo, o cirurgião-dentista não estará incorrendo em infração ao Art. 66 do Código de Defesa do Consumidor, pois não estará pondo em risco a segurança do paciente. Mais do que uma questão legal, o que verificamos é uma questão de preconceito. Em todo tipo de discriminação, existe o preconceito, quase sempre decorrente do "medo da doença", o que só se explica pela ignorância sobre como ela se manifesta e se transmite e como evitá-la. A odontologia brasileira está aprendendo a se relacionar com a AIDS. Na rotina dos consultórios odontológicos, os novos aspectos relacionados com a biossegurança – uso sistemático de precauções-padrão – voltam a ser objeto de atenção e conscientização dos profissionais de saúde no trato com todos os seus pacientes, indistintamente; ou seja, conhecendo-se ou não a sorologia do paciente para o HIV. A Bioética surgiu como uma resposta da ética aos novos casos e situações originadas dos avanços da ciência no âmbito da saúde. Em sua subdivisão Ciência da Moral, no que se refere à questão da vida, sustenta-se a aplicação dos princípios de justiça que, em diferentes circunstâncias, nem sempre é fácil ou conclusiva. Não há normas únicas para resolver as diversas situações que se apresentam, mas o interesse demonstrado na aplicação da Bioética revela- nos a significativa atenção dispensada pelo profissional de odontologia às formas corretas de agir. Comunicação ao paciente da sua condição de soropositividade para o HIV Segundo o Código de Defesa do Consumidor, o cirurgião-dentista, seja ele funcionário de serviço público ou privado, ou ainda profissional autônomo, é caracterizado como fornecedor de um serviço de saúde; e o seu paciente consumidor deste serviço ou cliente. O Artigo 66 do mesmo Código, por sua vez, prevê que o fornecedor de um serviço não deve omitir informações relevantes para a segurança do consumidor. Se as normas de biossegurança total (Conselho Regional de Odontologia, Art.3º e 4º) forem respeitadas, não haverá necessidade de o profissional revelar a sua condição sorológica, uma vez que, neste caso, não há risco de infecção para o paciente. Observação: o Código de Ética é preciso ao determinar que sejam respeitadas essas normas, como vestir paramento completo para os seus procedimentos; e que a entidade pública ou privada à qual está vinculado o profissional ofereça condições de trabalho seguras. O cirurgião-dentista pode realizar qualquer procedimento? A Lei 5081/66, que regulamenta o exercício da odontologia, no seu Art. 6, Inciso I, diz que compete ao cirurgião-dentista praticar todos os atos pertinentes à odontologia, decorrentes de conhecimentos adquiridos em curso regular ou em cursos de pós-graduação. Entretanto, fica a critério do profissional envolvido delegar a outros colegas procedimentos altamente invasivos, como traumatologia, cirurgia e periodontia; assim como readaptar-se a outros trabalhos, como radiologia, diagnóstico e saúde coletiva, entre outros. Esses aspectos ético-legais aplicam-se tanto para o cirurgiãodentista funcionário público ou privado, quanto para o cirurgiãodentista autônomo. Considerações Finais Na prática diária dos cirurgiões-dentistas, torna-se clara a necessidade de atenção aos diferentes cenários para o fortalecimento das ações de promoção a saúde e prevenção de doenças. Destacam-se como algumas das atribuições dos cirurgiõesdentistas e de toda a equipe de saúde bucal: - Notificar, orientar e encaminhar para atendimento médico todo indivíduo com suspeita diagnostica de hepatites virais; - Cumprir as normas de biosseguranca nos atendimentos; - Realizar medidas de promoção a saúde bucal por meio de ações educativas; - Manter a integralidade do tratamento em saúde bucal para os portadores das hepatites virais, de modo articulado com todos os níveis de complexidade da assistência; - Atuar conjuntamente com a equipe multiprofissional; - Identificar as manifestações orais relacionadas às hepatites virais; - Atualizar-se permanentemente sobre as hepatites virais, quanto as suas características clínicas, comportamento epidemiológico, tratamento aspectos éticos e psicossociais. Bibliografia - Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. Manual A B C D E das Hepatites Virais para Cirurgiões Dentistas / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais. – Brasília: Ministério da Saúde, 2010. – (Série F. Comunicação e Educação em Saúde) - Ministério da Saúde, Secretaria de Políticas de Saúde, Coordenação Nacional de DST e AIDS. Controle de infecções e a prática odontológica em tempos de AIDS: manual de condutas Brasília: Ministério da Saúde, 2000. - Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. HIV/Aids, hepatites e outras DST / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. – Brasília: Ministério da Saúde, 2006. - Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Hepatites virais : o Brasil está atento / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância Epidemiológica. – 3. ed. – Brasília : Ministério da Saúde, 2008.