Economista do Ano: Maílson da Nobrega (Ex

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Leia o Discurso do Ministro Maílson da Nóbrega, eleito Economista do Ano de
2013 e conheça os vencedores em outras categorias.
A Ordem dos Economistas do Brasil, em parceria com o Conselho Regional de
Economia de São Paulo, realizou ontem a entrega do Prêmio Economista do
Ano de 2013.
Os eleitos e demais homenageados são:
Economista do Ano: Maílson da Nobrega (Ex-Ministro da Fazenda,
atualmente sócio da Tendências Consultoria)
Economista Chefe: Nilson Teixeira (Credit Suisse)
Economista Homenageado: Eliana Cardoso (FGV-SP)
Jornalista Econômico: Denise Campos de Toledo (Jovem Pan e SBT)
Menção Honrosa: Marilda Sotomayor – (FEA/ USP)
Medalha Nº 1 - Ministro Celso Furtado: Fundação Bradesco - na área da
Educação
DISCURSO PRONUNCIADO PELO MINISTRO MAILSON DA NOBREGA,
VENCEDOR DO PREMIO ECONOMISTA DO ANO DE 2013
Caros economistas, minhas senhoras
e meus senhores.
Gostaria de começar com um
agradecimento aos meus pais. Até
hoje me impressiono como um
alfaiate e uma costureira de uma
cidadezinha pobre do interior da
Paraíba, Cruz do Espírito Santo,
decidiram
investir
na
minha
educação.
Agradeço à minha família, com a qual reparti as decepções e as alegrias de
minha história.
Agradeço ao Banco do Brasil, onde absorvi lições de ética e responsabilidade,
que seriam fundamentais na minha vida.
Agradeço aos que me incutiram o inesgotável prazer de aprender.
Agradeço aos servidores com os quais compartilhei dissabores e vitórias, na
luta pela modernização institucional das finanças públicas.
Agradeço aos meus pares economistas, que me escolheram para tão honroso
prêmio.
Agradeço, por último, aos que hoje vieram prestigiar essa comemoração.
Minhas amigas e meus amigos,
O motivo da escolha do Economista do Ano não é o mesmo para cada um dos
premiados. Quero crer que esta homenagem é o reconhecimento de meu
papel na construção de instituições do país e na defesa da racionalidade na
gestão econômica, que tenho expressado em livros, artigos, palestras e
debates.
Tive a sorte de participar de momentos difíceis da história econômica de
nosso país. Presenciei as duas crises do petróleo, a crise da dívida externa, e
o desmoronamento do modelo de substituição de importações e do nacionaldesenvolvimentismo. Participei dos esforços para enfrentar essas
tempestades.
Na busca de saídas para enfrentar a nova realidade, eu e uma pequena equipe
percebemos o quanto eram atrasadas as instituições de finanças públicas
brasileiras. Os economistas mais jovens e os que ainda estão na faculdade,
como meu neto, talvez não se deem conta do quanto o Brasil mudou nesse
campo.
O Banco do Brasil fazia às vezes de Tesouro Nacional e até de autoridade
monetária. O Banco Central financiava o agronegócio e as exportações, e
supria o Banco do Brasil de recursos sem limite, via uma “conta de
movimento”. O Orçamento Monetário, por onde fluíam esdrúxulas operações
e subsídios de toda natureza, não passava pelo crivo do Congresso Nacional
nem aparecia no Diário Oficial. Transparência zero. Legitimidade nenhuma.
Trabalhamos duro para eliminar esse atraso. Nem sempre fomos bem
compreendidos. As resistências foram muitas. Felizmente, tudo isso ficou
para trás. Tive a honra de ser o ministro da Fazenda que presidiu os atos
finais dessa grande reforma, à qual mais tarde se acrescentaria a Lei de
Responsabilidade Fiscal. A partir desses estudos, comecei a aprofundar meus
conhecimentos sobre o papel das instituições no desenvolvimento.
Minhas amigas e meus amigos,
Permitam-me lhes trazer outras reflexões, estas sobre a situação atual do
país, e lhes dizer por que continuo otimista.
Não é fácil o momento que o Brasil vive. Esgotam-se as fontes de dinamismo
que asseguravam a aceleração do crescimento: (1) os ganhos de
produtividade derivados de reformas estruturais; (2) a ociosidade de fatores
de produção; (3) a bonança externa, advinda da emergência da China como
principal importador de nossas commodities, da prosperidade mundial e da
liquidez abundante.
Em 2003, o presidente Lula abraçou sadios princípios de gestão
macroeconômica. Continuou o ciclo de reformas, de que resultaram a nova
Lei de Falências e mudanças relevantes no mercado de crédito. Milhões de
famílias passaram a ter acesso à casa própria e ao crédito pessoal e de
consumo. O maior crescimento da economia permitiu elevar o emprego e
ampliar os programas sociais. As desigualdades diminuíram. Mas as reformas
estancaram em 2005.
O governo não aproveitou a janela de oportunidades que se abrira e
descuidou da preparação do país para momentos menos favoráveis.
A bem sucedida reação à crise financeira mundial de 2008 deu ao governo a
falsa impressão de que novos tempos permitiam ressuscitar velhas ideias. O
nacional-desenvolvimentismo ressurgiu das cinzas. O governo imaginou que
estimular o consumo – estratégia válida logo depois da quebra do Banco
Lehman Brothers – seria a chave para promover a expansão sustentável da
atividade econômica. Cuidar da oferta seria uma tarefa apenas do crédito
subsidiado do BNDES.
A política econômica se concentrou em estímulos à demanda, sobretudo a
partir de 2011, mediante afrouxamento monetário, ampliação do crédito nos
bancos oficiais, desonerações tributárias tópicas e expansão fiscal. Adotouse uma contabilidade criativa para fazer crer que o governo cumpria metas
fiscais. Aumentaram de forma assustadora os créditos do Tesouro ao BNDES.
O desmonte de instituições fiscais é lastimável.
O ex-ministro Antonio Palocci costumava afirmar que o governo gostaria de
cometer somente erros novos. Reconhecia o aprendizado com os erros
antigos. O atual governo parece ter abraçado a agenda oposta. Prima em
cometer erros velhos.
Escolha de “campeões nacionais”; expansão insustentável dos gastos
públicos; ressurgimento do protecionismo e da política de substituição de
importações; restabelecimento do controle de preços, como no caso da
gasolina e do diesel, que prejudica a Petrobrás e os produtores de etanol;
intervenção na economia, como na desastrada mudança das regras do jogo
na energia elétrica. E por aí vai.
Essa é a “Nova Matriz Econômica”. Não tinha como dar certo. Bastava olhar
para trás. Temos assistido à redução do potencial de crescimento, ao
desestímulo ao investimento, às pressões inflacionárias e à piora do balanço
de pagamentos. O país corre o risco de perder a classificação de grau de
investimento.
A demanda se intensificou nos serviços, grande absorvedor de mão de obra,
mas de produtividade mais baixa. O mercado de trabalho se estreitou,
permitindo ganhos reais de salários acima da produtividade. O custo unitário
do trabalho subiu, ao tempo em que se deterioravam a infraestrutura, o
sistema tributário e a legislação trabalhista. Por tudo isso, a indústria perdeu
competitividade. A valorização cambial não é a causa, como muitos dizem,
mas contribuiu para essa situação.
Erros velhos, práticas antigas. O processo de rent seeking parecia ter sido
derrotado pelos novos tempos da abertura da economia, da estabilidade
macroeconômica e da Lei de Responsabilidade Fiscal. Não foi o caso. Voltou
a ser mais vantajoso investir tempo na busca de vantagens em Brasília do
que em eficiência e inovação. O clientelismo deu novamente as caras.
Não há como esconder manobras e custos. Esse é um dos benefícios das
novas instituições brasileiras. Elas permitem detectar erros. De todos os
lados, surgem análises competentes sobre os equívocos da política
econômica. Um deles é o excelente artigo de Marcos Lisboa e Zeina Latif
sobre democracia e crescimento, que explica nossas idiossincrasias, analisa
os avanços das últimas décadas, aponta os erros do presente e lança luzes
sobre os desafios para o futuro.
Apesar de tudo, há razões para manter a esperança. Instituições sólidas
funcionam como “alarmes de incêndio” para sinalizar riscos institucionais e
macroeconômicos. Não há ambiente para a continuidade, por muito tempo,
de experimentos inconsequentes.
Utilizo, aqui, o conceito de instituições de Douglass North, isto é, as regras
do jogo – formais e informais – que alinham incentivos para a interação entre
os agentes econômicos e para a atividade de assumir riscos, investir e inovar.
O estudo das instituições dos últimos quarenta anos – que propiciou o prêmio
Nobel de Economia a muitos pesquisadores – é apropriado para entender a
nova realidade brasileira.
As instituições abrangem não apenas os componentes do Estado – como os
três poderes –, mas também os partidos políticos e as organizações públicas
e privadas. Incluem a imprensa livre e as crenças da sociedade. Nossas
instituições já criam restrições ao voluntarismo e à irresponsabilidade no
governo e na classe política.
Ainda há muito a fazer. Precisamos aprender muito. Por exemplo, perceber
que o dinheiro do governo vem de todos nós. Saber que benefícios sociais
insustentáveis conspiram contra a viabilidade fiscal, a estabilidade monetária,
o desenvolvimento e o bem-estar.
Voltemos às instituições. O Brasil tem hoje uma democracia vibrante e
consolidada, apesar das falhas inerentes à sua pouca idade. Ninguém pede o
retorno ao autoritarismo. Queremos radicalizar a democracia. Queremos mais
eficiência do governo. Queremos melhores serviços públicos. Queremos mais
ética e menos corrupção. Queremos um Estado autônomo dos grupos de
interesse e imune à ação coletiva deletéria. Queremos o fim de políticas que
geram benefícios visíveis para poucos e custos difusos para muitos.
O Brasil constrói o que Francis Fukuyama definiu com “ordem política
virtuosa”, que deriva de três fundamentos: (1) Estado forte, no sentido
institucional e não no do intervencionismo econômico; (2) Estado de Direito,
isto é, o governo das leis e não dos homens, no qual se assegure direitos de
propriedade e respeito aos contratos; (3) accountability, que leva o governo
a prestar contas, justificar escolhas, responder pelo uso dos recursos dos
contribuintes, e submeter-se periodicamente ao voto popular.
Dois pilares dessa nova realidade são as novas crenças da sociedade –
particularmente a intolerância à corrupção e à inflação – e a imprensa livre.
Sem exceção, todos os escândalos políticos a partir da democratização
vieram à tona pela ação do jornalismo independente. A liberdade de imprensa
se nutre da preservação do sigilo da fonte e da quebra de barreiras à
divulgação dos desmandos, da roubalheira e da incompetência.
As recentes manifestações constituem uma demonstração dessa esplêndida
realidade. Já não são certos partidos políticos que dominam as ruas, mas uma
classe média não cooptada, ciente de seus direitos e disposta a promover
movimentos legítimos em favor de mudanças pela melhora dos serviços
públicos e pela decência no governo.
Há razões para otimismo, malgrado as decepções. Li muito sobre as
manifestações, mas destaco a análise da socióloga Lourdes Sola. Para ela,
“uma das características surpreendentes é a força gravitacional de um
movimento liderado por jovens de uma classe média diversificada, em que
manifestantes de classes C e D marcharam junto aos das classes A e B”. Sua
conclusão é semelhante à minha. Os movimentos “refletem algumas das
qualidades da nossa democracia. Uma delas é a multiplicidade de instituições
que limitam os poderes das elites político-partidárias: a relativa autonomia
do Sistema de Justiça; as instituições que produzem indicadores e
prospecções tecnicamente competentes, divulgados por uma mídia
razoavelmente competitiva”.
O Brasil vai continuar nos trilhos, ainda que de forma lenta e medíocre. Os
desafios estão em promover as mudanças para aumentar ganhos de
produtividade, criar incentivos corretos ao investimento e à inovação, e
assegurar a melhora dos serviços de infraestrutura. A modernização do
sistema tributário e da legislação trabalhista são partes dessa agenda.
Nos riscos que turvam um pouco o meu otimismo está o tema da relação
entre demografia e previdência social. São notórias as dificuldades de abordálo com realismo, mas isso precisa ser feito com franqueza e rigor. Caso
contrário, nossos filhos e netos pagarão pelo desleixo das gerações atuais.
Nosso maior desafio é a educação. Precisamos de uma revolução gerencial
para melhorar a qualidade, ampliar o acesso à universidade e remunerar bem
os professores de acordo com seu desempenho. O fim da gratuidade no
ensino superior para os ricos é parte indissociável desse processo.
Infelizmente, nossas heranças culturais, que esperam tudo ao governo,
trabalham em prol de novos equívocos. São os casos das propostas de
aplicação obrigatória de 10% do PIB em educação e de destinação, a ela, de
recursos do petróleo. Corremos o risco de aumentar os desperdícios e não de
melhorar a qualidade da educação.
Ao citar esses desafios, parece que discorro sobre uma lista de utopias.
Acontece que nenhuma sociedade teve êxito sem pensar em utopias, sem
buscar a realização de sonhos. Como disse o Papa Francisco em sua recente
visita ao Brasil, “a utopia não é sempre ruim. A utopia é respirar e olhar
adiante”.
Tudo dependerá de liderança política, da sorte e do acaso, como aconteceu
em conhecidos exemplos históricos, mas o Brasil está no caminho. Dá para
sonhar. É preciso sonhar.
Muito obrigado a todos.
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