EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE MINAS GERAIS PRE/R/2013 – RE – P RECURSO ELEITORAL N. 508 -43.2012.6.13.0328 RECORRENTE: Ministério Público Eleitoral RECORRIDO: Nivaldo José de Andrade, candidato a Prefeito, não eleito RECORRIDO: Jorge Hannas Salim , candidato a Vice -Prefeito, não eleito RECORRIDO: Aline Aparecida Gonçalves RELATOR: Juiz Maurício Pinto Ferreira O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL , por intermédio da PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL , devidamente instado a se manifestar, o faz nos segui ntes termos. Trata-se de recurso interposto de sentença, que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação de investigação judicial eleitoral, proposta pelo Ministério Público Eleitoral, diante de violação ao disposto no art. 73, IV e §10 da Lei nº 9.504/97. O Ministério Público Eleitoral alegou que Nivaldo José de Andrade e Aline Aparecida Gonçalves, à época prefeito e secretária de assistência social de São João Del Rei, foram responsáveis pela distribuição cestas básicas aos eleitores, visando à promoção pessoal do primeiro, sem a observância da legislação municipal que regulamenta esse benefício social. Assim, teriam praticado as condutas vedadas aos agentes públicos previstas no artigo 73, IV e §10 da Lei nº 9.504/97. Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm1 O segundo recorrido, Jorg e Hannas Salim, constou no polo passivo da demanda em virtude da possível cassação do registro ou diploma, que atinge o Prefeito e Vice -Prefeito. A representação foi indeferida liminarmente e, inconformado, o Ministério Público Eleitoral recorreu. A impu gnação foi recebida e os recorridos apresentaram contrarrazões. O recurso foi acolhido por unanimidade, anulando a sentença e determinando o prosseguimento do feito com a devida instrução processual e posterior julgamento do mérito. Dessa forma, os autos retornaram ao primeiro grau. Os representados foram notificados e ofereceram defesa. Foi realizada audiência, ouvindo -se as pessoas arroladas na inicial (fls. 351/357). Em seguida foram apresentadas alegações finais. A sentença recorrida julgou como impro cedentes os pedidos deduzidos na Inicial, considerando que a distribuição de cestas básicas por parte do primeiro e da terceira representada estaria amparada por uma das exceções legais contidas no artigo 73, §10 da Lei 9.504/97. O Ministério Público Ele itoral, em recurso, alega a inexistência de situação excepcional do art. 73, §10 da Lei 9.504/97, tendo em vista que a utilização do programa municipal de doação de cestas básicas foi em desacordo com a determinação legal e regulamentar, configurando promoção pessoal do primeiro representado. Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm2 Em contrarrazões, os recorridos defendem preliminarmente a perda do objeto da presente ação e, no mérito, a manutenção da sentença. Vieram os autos para parecer. É o breve relato. Inicialmente, cumpre apontar que o recurso interposto é próprio, tempestivo e cumpridor dos demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual deve ser conhecido. Preliminarmente, os recorridos alegam a perda do objeto da presente ação, visto que os representados não foram eleitos. Não procede tal afirmação. Vejamos. Embora as eleições já tenham ocorrido e o candidato não tenha sido eleito, há um registro de candidatura que permanece em estado potencial e deveria ter sido cassado como forma de impedi -lo de ser diplomado no caso, por exe mplo, de o candidato vitorioso ser cassado e, preenchidos os requisitos, o segundo colocado ter que assumir o cargo. Pela possibilidade de cassação de registro de candidato não eleito, já se manifestou este tribunal: Recurso. Representação. Captação ilíc ita de sufrágio. Promessa de quitação de financiamentos habitacionais. Procedência. Imposição de impedimento à diplomação. Condenação em Multa. Declaração de inelegibilidade a partir do trânsito em julgado. Eleições 2012. Prefeito e Vice-prefeito, não elei tos. PRELIM INAR. Carência Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm3 superveniente do interesse de agir. Inexistência da perda de objeto da dem anda, se há possibilidade de haver cassação de registro de candidatos não eleitos, bem com o de aplicação de m ulta e de declaração de inelegibilidade . Rejeitada. MÉRITO. comunidade no Promessa sentido de feita quitar a membros de financiamentos imobiliários com finalidade a obtenção de votos. Provas firmes da ocorrência de captação ilícita de sufrágio. Multa aplicada de forma correta diante da gravi dade da con duta ilícita. Inelegibilidade decorrente da Lei Complementar 64, de 18/5/1990 (art. 1º, I, j). Impossibilidade de reforma para pior da sentença neste ponto. Recurso não provido. (TRE-MG - RE: 46914 MG , Relator: MAURÍCI O TORRES SOARES, Data de Julgamento: 07/03/2013, Data de Publicação: DJEM G - Diário de Justiça Eletrônico -TREMG, Data 18/03/2013) Além disso, ainda resta como possível a sanção de multa, como previsto no artigo 73, §4º da Lei nº 9.504/97. P assa-se ao mérito. Trata-se, no presente feito, de discussão quanto a legalidade ou não de doações, com base no programa municipal de doações de cestas básicas, visando a promoção pessoal dos candidatos. A terceira hipótese de exceção prevista no §10 do art. 73 da Lei 9.504/97, dispõe o seguinte: Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm4 Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: (...) § 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de program as sociais autorizados em lei e já em execução orçam entária no exercício anterior , casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. Os recorridos alegam a legalidade da ação, aduzindo que o benefício concedido se enquadra na exceção do § 10, do art. 73, da Lei de Eleições, visto que a doação foi aut orizada e amparada por lei municipal, representando uma política pública que vem sendo realizada desde anos anteriores, ou seja, um programa social em continuidade. Por sua vez, o Ministério Público Eleitoral afirma que a conduta foi praticada em desaco rdo com a determinação legal e regulamentar, para a promoção pessoal do representado, Nivaldo José de Andrade . Consta dos autos que o Decreto Municipal 4580/2011 regulamentou a distribuição de cestas básicas no município. Vejamos: Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm5 Art. 1º – Conforme det ermina o art. 3º, da Lei nº 4573/2011, ficam estabelecidos outros critérios para o cadastramento e quali ficação das pessoas que poderão ser beneficiadas pelo programa instituído por esta Lei, sendo eles: A) Pessoas Cadastradas no CRAS; B) Famílias em est ado de vulnerabilidade social encaminhadas pelo CRAS; C) Cadastradas no Programa Bolsa Famíli a e CAD Único (Famílias que temporariamente vivem em estado de vulnerabilidade social – com avaliação de um profissional da área social ); D) 02 salários míni mos vigentes no país; E) Ter domicílio em São João Del Rei. (fl. 217). Contudo, embora a legislação seja clara e direta, ela foi desrespeitada. Nota -se que o benefício era doado a qualquer pessoa, independentemente de estar ou não cadastrada no programa social do município. Isso demostra a ilicitude da conduta, que não atendeu às determinações regulamentares. É o que podemos constatar da prova testemunhal: “que por duas ocasiões distintas neste ano, no posto de combustíveis onde trabalha , foram distribuídos para várias pessoas vales compras no valor Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm6 de R$40,00 para serem descontados/trocados no Supermercado Agostinho por produtos alimentícios; que nas duas ocasiões várias pessoas foram beneficiadas; que os vales eram oferecidos a qualquer pessoa pessoa residente em São João Del Rei que ali chegasse; que quando o beneficiário não era funcionário do posto, o prefeito não alegava nenhuma razão especial para dar o vale, ou seja simplesmente perguntava se a pessoa queria e, sendo afirmativa a resposta, lhe entregava um vale compra; que o prefeito disse à depoente e à sua colega Flávia que quando elas precisassem poderiam procurá-lo diretamente na Prefeitura que ele lhes daria mais vales compras; que a depoente não está inscrita no programa de Assistência Social; que nessa ocasião, o prefeito chegou a dizer para quem quisesse ouvir: “qual prefeito que doa 200 cestas básicas?” (depoimento de Glória de Oliveira, fl. 352). Grifo nosso. “que o depoente não está inscrito em nenhum programa assistencial do Município” (depoimento de Renato César Neves Silva, fl. 353). Grifo nosso. “que o depoente sabia , através de comentários entre funcionários terceirizados do Fórum, de que Nivaldo fornecia cestas básicas para serem trocados no Supermercado Agostinho; que o depoente não se encontra escrito no Programa de Assistência Social” (depoimento de Lourival do Carmo Ribeiro, fl. 357). Grifo nosso. Portanto, não basta a existência da lei, é preciso que a mesma seja cumprida. Segundo o princípio da legalidade, a Administraç ão Pública só pode fazer o que a lei autorizar. Assim, o Administrador Público não pode agir conforme o impulso da sua vontade, pois dentro da Administração Pública o que deve existir é legalidade e não autonomia da Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm7 vontade. A doutrina de José dos Santos Carvalho Filho 1, com apoio em Sayagués Laso, esclarece a questão: “O princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a at ividade é ilícita. (…) Uma conclusão é inarredável: havendo dissonância entre a conduta e a lei , deverá aquela ser corrigida para elim inar -se a ilicitude. (…) O princípio da legalidade denota exatamente essa relação: só é legítim a a atividade do adm inistrador público se estiver condizente com o disposto na lei ”. Grifo nosso. Assim, no presente caso, para que as doações fossem consideradas lícitas e enquadradas na exceção prevista no art. 73, §10 da Lei 9.504/97, era necessário que fossem obser vados os requisitos legais, quais sejam, os previstos na Lei Municipal 4573/11, regulamentada pelo Decreto Municipal 4580/11. A jurisprudência deste Egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Minas Gerais caminhou nesse sentido, senão vejamos: Recurso eleitoral. Representação. Conduta vedada. Distribuição gratuita de bem, valor ou benefício pela Administração Pública. Procedência. Existência de decreto municipal regulamentando a entrega de cestas alimentícias. Distribuição pelo recorrente de cestas básicas sem observar o programa social previamente autorizado em lei. Ferimento do princípio da isonomia entre os candidatos. Desequilíbrio do pleito. Conduta vedada 1 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 20ª, ED., Rio de Janeiro: Lumen Juris. Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm8 caracterizada. Recurso a que se nega provimento. (TRE-MG - RE: 5090 MG , Relator: GUTEMBERG DA MOTA E SILVA, Data de Julgamento: 09/12/2008, Data de Publicação: DJEMG - Diário de Justiça Eletrônico-TREMG, Data 11/02/2009). Grifo nosso. Com efeito, vê-se claramente que os recorridos incidiram em conduta vedada, uma vez que, em ano eleitoral, distribuíram cestas básicas sem observar o programa social previamente autorizado em lei. Além disso, a prova testemunhal demonstrou o intuito de promoção pessoal dos recorridos, restando comprovada a violação ao art. 73, IV da Lei 9.504/97. Vejamos: “ que nessa ocasião, o prefeito chegou a dizer para quem quisesse ouvir: “qual prefeito que doa 200 cestas básicas?” (depoi mento de Glória de Oliveira, fl. 352). Cumpre ressaltar que com relação às condutas vedadas previstas no 73 da Lei das Eleições, pela peculiaridade do caso concreto e com base no princípio da proporcionalidade, poderá o julgador decidir pela aplicação ou não da cassação do registro ou diploma. Assim, no presente caso concreto, patente que a doação do benefício atendeu a grande número de pessoas, em período próximo ao pleito eleitoral, tem -se que a conduta teve o potencial de favorecer os candidatos. É que, com o grande número de doações, várias pessoas foram influenciadas a optar pela continuidade da administração do Prefeito, candidato à reeleição, criando -se uma espécie de vínculo entre o candidato Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm9 e o cidadão beneficiado pela conduta. Portanto, com base na ofensa ao equilíbrio da eleição, deve -se proceder à cassação do registro dos candidatos. Por fim, quanto à inelegibilidade de ve-se obtemperar que, em uma análise prefacial, efetivamente não há, na Lei 9504/97, previsão legal de declaração de inelegibilidade em razão de conduta vedada. Entretanto, o art. 1º, inciso I, alínea j, da LC 64/90, com a redação dada pela LC 135/10, estabelece que: “Art. 1º São inelegíveis : I - para qualquer cargo : (...) j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção eleitora l, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em cam panhas eleitorais que im pliquem cassação do registro ou do diplom a, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição ; (...)” (grifo nosso). Dessa forma, havendo decisão transitada em julgado ou acórdão proferido por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, que condene determinado cidadão por conduta vedada, a inelegibilidade é efeito que se produz ipso iure das disposições normativas acima reportadas. Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm10 Este TRE, então, deve impor a cominação da inelegibilidade, que seria um preceito meramente expletivo, eis que trata -se de consequência jurídica que se produziria mesmo que o acórdão não a comine expressamente. No que se refere, todavia, às sanções de inelegibilidade e multa, urge realçar a impossibilidade de sua aplicação ao candidato a Vice Prefeito, tendo em vista que, tratando -se de reprimenda, a extensão de seus efeitos deve restringir -se apenas aos agentes responsáveis pela prática da conduta vedada. Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL , por intermédio da PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL, se manifesta pelo provimento parcial do recurso, para cassação do registro de candidatura dos representados. Além disso, aplicação de multa e declaração da inelegibilidade, apenas, do primeiro representado, Nivaldo José de Andrade, e da terceira representada, Aline Aparecida Gonçalves, pelo período de 8 (oito) anos. Belo Horizonte, 05 de dezembro de 2013. Eduardo Morato Fonseca Procurador Regional Eleitoral H:\PRE\Estagiarios\Renato\AIJE\Conduta Vedada\508-43 - São João Del Rei - Conduta Vedada - art. 73, § 10.doc Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm11 Normal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.do tmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotmNormal.dotm12