Artigo Raízes JCarlos Jan 2010

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Raízes do Ensino Comunicativo de Línguas
José Carlos Paes de Almeida Filho
Universidade de Brasília
RESUMO: Dois movimentos contrastantes de ensino de línguas marcaram o início da
década 1970, a saber, o movimento audiolingual no Brasil e o nocional-funcional
(precursor do cumunicativismo) na Europa Ocidental. Por meio de pesquisa
bibliográfica de caráter histórico, este artigo visa a apresentar algumas condições que
reunidas e amadurecidas permitiram a emergência de uma tradição comunicacional em
alternativa à gramatical no cenário mundial e brasileiro. Como resultados, verificamos
que apesar de a década de 1970 representar a ponta do iceberg do movimento
comunicativo de aprendizagem e ensino de línguas, o séculos XIX e XX ofereceram
várias condições precursoras desse movimento identificáveis em trabalhos de
europeus, indianos, americanos e brasileiros.
Palavras-Chave: Aprendizagem e Ensino de Línguas; História do Ensino de Línguas;
Movimento Comunicativo; História do ensino comunicativo
ABSTRACT: Two contrasting movements in the Área of Learning & Teaching
Languages marked the beginning of the 1970’s, namely, the audiolingual variant of the
Grammatical Approach in Brasil and the notional-functional approach in Western
Europe. By way of a qualitative, bibliographic research project, this carticle seeks to
bring out some of the concurring conditions permitted the emergence of a
communicational language teaching tradition as an alternative to grammatical teaching
both overseas as in Brasil. As a result, we have observed that despite de 70’s decade
may offer various methodological ideas ahead of its time in Europe, contributions
coming from India, the US and Brasil added enthusiasm for explorations of
communicative potential for Language Learning and Teaching.
Key-words: Learning and teaching languages, history of the learning and teaching of
languages, communicational movement, history of communicative language teaching.
1. Raízes históricas do ensino comunicativo
No começo dos anos 70, no século passado, o mundo do ensino de línguas
estava vibrando com os acordes do movimento metodológico estrutural
audiolingual, uma vertente de grande apelo da nossa velha e transformista
abordagem gramatical. O grosso do ensino de idiomas no Brasil nessa época
se guiava por um cerne de padrões gramaticais pré-definidos da língua-alvo
que iam ser apresentados nas salas numa confirmada e santa ordem, banhados
em contextos de situações e diálogos, sem explicações de suas naturezas
regradas, mas amplamente praticados, repetidos, para depois reaparecerem
numa produção guiada e controlada dos aprendizes. A fórmula praticada desse
modelo obedecia a três fases reconhecidas na sigla APP (apresentação, prática
e produção).
Os livros didáticos desse período foram amenizados pelas abundantes
ilustrações dos pontos de ensino disfarçados de linguagem normal em uso
cotidiano. As aulas, depois, iriam se pautar por um aquecimento produtivo da
turma, um elemento motivador da produção constantemente comandada e
valorada pelos atentos e dinâmicos professores. Inúmeras sequências de
repetições buscavam implantar os pontos de ensino e o vocabulário que se
pedia na memória (ainda que um tanto curta) dos aprendizes. Envolvidas em
muita oralidade, as lições eram ensaiadas e muitos exercícios desfiados com o
intuito de se chegar ao domínio da nova língua.
O auge metodológico dessa variante estrutural audiolingual da abordagem
gramatical no Brasil coincidiu com a emergência na Europa ocidental, no início
dos anos 70, principalmente na Inglaterra, de um contramovimento que trazia
em sua filosofia concepções contrastantes de língua/linguagem, de aprender e
de ensinar línguas que se denominou nocional, nocional-funcional e, finalmente,
comunicativo. O conceito de língua preferia vê-la como ação social comparada
a blocos sintáticos descritos por linguistas cada vez mais especializados e
entusiasmados com o poder criador sintático movido por regras
transformacionais exibido por qualquer falante nativo de uma língua. Ensinar
uma nova língua era identificado como produzir vivências relevantes já na
língua-alvo, embaladas por funções comunicativas num primeiro momento e o
aprender foi se convertendo num desejo de se transformar em adquirir uma
firme capacidade de uso desse idioma-alvo.
Já tinha ocorrido críticas sobre princípios audiolinguais na década anterior (anos
60) do século 20. Os artigos de Newmark (1960) e de Newmark & Reibel
(1968) são ótimos exemplares dessa crítica nos Estados Unidos indicando a
interferência indevida dos estudos gramaticais no ensino de línguas. No ano de
1966, Noam Chomsky, o grande linguista gerativo-transformacional,
desestimulou com grande lucidez num evento importante de linguistas nos
Estados Unidos, a aplicação generalizada de idéias linguísticas no ensino de
línguas sob a alegação de que uma teoria de língua não era o mesmo que uma
teoria da aprendizagem de uma (nova)língua. Mas a cena psicológica
estadunidense tinha sido dominada pelo behaviorismo por mais de cinquenta
anos e agora era o estruturalismo que se impunha pelas mãos da Linguística. O
casamento dessas duas vertentes de força intelectual deu frutos no
audiolingualismo para o ensino de Línguas desde os anos 60. Era esperado que
uma inovação contrastada na área de Aprendizagem e Ensino de Línguas
(AELin) da Linguística Aplicada fosse bem menos viável nos Estados Unidos do
que na Europa.
A Europa dos anos 70 vivia outro clima. Embalava com força nesse período o
sonho de unidade européia conhecido à época como Mercado Comum Europeu
e depois transformado em Comunidade Européia. A área da Linguagem no
Velho Continente, exemplificada por nomes como os de Firth nos anos 40 e de
Halliday (1970, 1973), jamais abandonara o interesse pela semântica, pelo
significado nos estudos de línguas como ocorreu nos Estados Unidos com
linguista líderes como Harris e Bloomfield a partir dos anos 40 e com Chomsky,
em seguida, nos anos 50 e 60.
A emergência de um projeto político para unir os países da Europa continha
desafios, entre eles o da diversidade de línguas e culturas que passariam a
gozar de uma proximidade maior nos contatos, nas viagens, nos negócios e na
política. A consequência era ter de ensinar e aprender as línguas européias dos
participantes. A tarefa de aprender línguas acrescentava dúvidas se era
possível um projeto de massa com os métodos gramaticais estruturais da
época. Uma população crescentemente idosa de aposentados com desejos de
viajar e de aprender línguas estaria bem servida com os meios tradicionais? Os
longos anos de estudos para se obterem resultados pífios não falavam a favor
da continuidade. Os profissionais e pesquisadores da área de AELin e da
Linguística Aplicada buscaram novos aportes teóricos para construir suas novas
respostas.
2. O florescimento do ensino comunicativo de línguas
Desde o começo do século 19, algumas idéias filosóficas fundamentais
começaram a apoiar as novas diretrizes metodológicas oriundas do
pensamento de Hegel, na Alemanha, tinham estabelecido a natureza social do
conhecimento produzido em mentes igualmente sociais. Isso levou a
concepções posteriores da verdade como um esforço relativo entre
participantes sociais com o fim de estabelecer um termo negociado aceito pelas
partes. Na linguística, a ascensão da sociolinguística testemunhou o alcance
das ideias construídas por Hegel no século anterior. As contribuições de Dell
Hymes (a partir de 1967), principalmente o conceito de competência
Comunicativa, inspirado em Roman Jakobson (funções da linguagem) fundado
na escola de Praga, na hoje República Checa, calçaram o chão teórico do
ensino de línguas. Os estudos de Austin, na Inglaterra, sobre os atos de fala
também trouxeram munição conceitual essencial para proposições de um
planejamento comunicativo nocional funcional calcado em funções. Autores
ingleses como David Wilkins (1971, 1976) e Henry Widdowson (1978) se
incumbiram de consolidar bases importantes com as quais ensinar e aprender
línguas dentro de uma alternativa ortodoxia que se anunciava: a da Abordagem
Comunicativa. Esse foi o conceito filosófico de conjunto de idéias e conceitos
sobre o que é língua, aprender e ensinar língua que orienta as ações de
professores, planejadores de cursos, autores de materiais e produtores de
exames que animou o movimento comunicativo ou comunicacional, na sugestão
ressignificadora de comunicação como ação linguajeira entre pessoas sociais
construindo sentidos na interação proposta na Índia por Nagore Prabhu nos
anos 90.
No Brasil, inauguramos o movimento comunicativo com a realização inédita de
um evento científico-profissional, o Seminário Nacional sobre o Ensino
Comunicativo de Línguas, realizado na Universidade Federal de Santa Catarina,
em Florianópolis, em outubro de 1978. No ano anterior, em junho de 1977,
defendi dissertação de mestrado fruto de uma pesquisa aprovada pela
Universidade de Manchester, na Inglaterra exatamente sobre as bases para um
planejamento comunicativo nocional-funcional de um curso de língua (Almeida
Filho, 1977). O conteúdo da dissertação foi o tema abordado na abertura do
Seminário seguido de discussão pelos presentes, muitos tomando contato com
as bases do comunicativismo precisamente nesse evento pioneiro.
3. Concluindo
Vemos neste sucinto quadro histórico produzido, que algumas condições foram
reunidas e amadureceram para permitir a emergência de uma tradição
comunicacional alternativa à gramatical, de tão longa cepa no campo da AELin.
O protagonismo de autores fundantes do Reino Unido, dos Estados Unidos e da
República Checa tornaram possível as primeiras manifestações auto-conscientes
do movimento comunicativo de ensino de línguas pivotado pela abordagem
comunicativa e sua plêiade de conceitos correlatos como tópicos, temas,noções
semântico-gramaticais, funções comunicativas e realizações de funções. A
existência de uma taxonomia ou sistema terminológico descritivo já representa
um indício substancial de implantação de modelo paradigmático de fazer o
ensino de línguas. Sem o apoio de um quadro teórico indiciado pela taxonomia
disponível não se sustentaria o movimento comunicativo de que tratamos neste
texto.
Referências
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