análise de conjuntura temas de economia aplicada

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Nº 321 Junho / 2007
FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS
issn 1234-5678
análise de conjuntura
Em Nota de Conjuntura, Rodrigo Celoto e Fernando Homem de Melo afirmam
que o crescimento acabará forçando o setor público a melhorar a
regulação de processos críticos ao setor privado.
Rodrigo Rodrigues Celoto realiza um balanço do desempenho das finanças públicas
nacionais, durante o primeiro quadrimestre do ano de 2007.
Roberto Luis Troster, ante as alterações no cenário econômico internacional, problematiza a eficácia do gradualismo do Banco Central e analisa as possibilidades de
mudança na condução da política macroeconômica brasileira.
Hélio Nogueira da Cruz analisa a composição e a evolução da pauta comercial
brasileira, apontando seus possíveis desdobramentos sobre
estrutura produtiva nacional.
temas de economia aplicada
Antonio Lanzana e Luiz Martins Lopes diagnosticam o equilíbrio externo e as baixas
taxas de inflação como condição necessária, porém insuficiente para o crescimento
do produto e do emprego nacional.
Thomas Palley, a partir das relações econômico-financeiras entre China e EUA, avalia
os impactos políticos da divergência entre interesses nacionais, de um lado, e
interesses das grandes corporações, de outro.
Rafael Henrique Rodrigues Moreira, no primeiro artigo de uma seqüência de dois,
discute a questão da autonomia e da regulação aplicadas às agências reguladoras.
Daniela Corrêa e Gilberto Tadeu Lima finalizam a série de três artigos descrevendo as
experiências de internacionalização da Marcopolo e do Grupo Gerdau que corroboraram as hipóteses teóricas discutidas anteriormente pelos autores.
Cristina Reis e Fernanda Cardoso apresentam, neste primeiro artigo, a trajetória do
desenvolvimento da Austrália, do Canadá e da Argentina (desde suas independências
até a década de 30), enfatizando suas formas de inserção internacional, bem como
seus quadros políticos e econômicos.
Bruno de Paula Rocha inicia uma série de três artigos, analisando, para os Estados
brasileiros, a inter-relação entre mercados financeiros e crescimento econômico.
Nº 321
JUNHO DE 2007
ANÁLISE DE CONJUNTURA
INFORMAÇÕES FIPE É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL
DE CONJUNTURA ECONÔMICA DA FUNDAÇÃO
nota de conjuntura .......................................................................................................... 3
Rodrigo Rodrigues Celoto, Fernando Homem de Melo
issn 1234-5678
finanças públicas . ........................................................................................................... 5
Rodrigo Rodrigues Celoto
política monetária ........................................................................................................... 7
CONSELHO CURADOR
Hélio Nogueira da Cruz (Presidente)
André Franco Montoro Filho
Andrea Sandro Calabi
Joaquim José Martins Guilhoto
Ricardo Abramovay
Maria Cristina Cacciamali
Simão Davi Silber
Roberto Luis Troster
setor externo......................................................................................................................10
Hélio Nogueira da Cruz
DIRETORIA
DIRETOR PRESIDENTE
Carlos Antonio Luque
TEMAS DE ECONOMIA APLICADA
12 ............ crescimento e ambiente pró-investimento e oportunidades de trabalho
DIRETOR DE PESQUISA
Eduardo Haddad
Antonio Lanzana, Luiz Martins Lopes
18 ...................................................................................... the profit vs country dilemma
Thomas Palley
20 ........................................................ a construção de um novo modelo institucional
para as agências reguladoras brasileiras
DIRETOR DE CURSOS
Marcos Eugênio da Silva
PÓS-GRADUAÇÃO
Dante Mendes Aldrighi
Rafael Henrique Rodrigues Moreira
24 .................. o sucesso de empresas brasileiras na internacionalização produtiva:
as experiências da Marcopolo e do Grupo Gerdau
SECRETARIA EXECUTIVA
Domingos Pimentel Bortoletto
Daniela Corrêa, Gilberto Tadeu Lima
31 ....... determinantes da inflexão das trajetórias de desenvolvimento econômico:
estudo dos casos de Austrália, Canadá e Argentina – parte I
SUPERVISÃO EDITORIAL E PRODUÇÃO
Eny Elza Ceotto
Cristina F. B. Reis, Fernanda G. Cardoso
37 ................... testando a causalidade entre sistema financeiro e desenvolvimento
econômico em um painel para o Brasil
EDITOR CHEFE
Gilberto Tadeu Lima
Bruno de Paula Rocha
CONSELHO EDITORIAL
Ivo Torres
Lenina Pomeranz
Luiz Martins Lopes
José Paulo Z. Chahad
Maria Cristina Cacciamali
Maria Helena Pallares Zockun
Simão Davi Silber
AS IDÉIAS E OPINIÕES EXPOSTAS NOS ARTIGOS SÃO DE RESPONSABILIDADE
EXCLUSIVA DOS AUTORES, NÃO REFLETINDO A OPINIÃO DA FIPE
ASSISTENTE
Maria de Jesus Soares
PROGRAMAÇÃO VISUAL E COMPOSIÇÃO
Sandra Vilas Boas
análise de conjuntura
Rodrigo Celoto (*)
Fernando Homem de Melo (**)
nota de conjuntura: os problemas
relativos ao crescimento econômico1
a explosão desse mercado, à medida que a taxa de
juros desaba.
Outra conseqüência do crescimento econômico é o
aumento explosivo dos preços dos ativos. Este fenômeno geralmente reforça o crescimento ao diminuir
o custo de capital para as empresas, facilitando muito
a captação de recursos para investimento.
Muitos analistas ainda criticam o fato de que o setor
privado está liderando o processo de crescimento.
Ora, essa é a grande vantagem desse novo ciclo de
crescimento do Brasil. Nas décadas anteriores (lembremos dos anos setenta), a iniciativa do setor público
foi fundamental e geralmente era o pontapé inicial do
ciclo de crescimento. Com isso, muitas ineficiências
foram geradas e, agora, pouco a pouco, vão aparecendo, principalmente com a apreciação cambial. Neste
contexto, é bom que o setor privado lidere o processo
de crescimento, pois o setor público não tem o mesmo
dinamismo do setor privado. As mudanças espaciais
a ocorrer na economia brasileira nos próximos 10-20
Neste contexto, tem-se o aumento dos preços dos
imóveis. Isso decorre do aumento da demanda gerada
pelo próprio crescimento, como também devido ao
aumento da liquidez pela oferta de recursos de financiamento em um cenário otimista. No caso brasileiro,
deve-se acrescentar que a inexistência anterior de
um mercado de crédito imobiliário relevante implica
Neste cenário de crescimento econômico, o câmbio
tende a se valorizar, pois os ativos domésticos estão
se valorizando, refletindo a boa expectativa de crescimento dos lucros. Ainda no caso brasileiro, essa
valorização é acentuada pela enorme valorização
dos preços dos bens exportáveis (veja-se os casos
do agronegócio e de bioenergia), assim como pela
confortável posição devido ao baixo endividamento
externo e ao superávit em transações correntes. Isto
mudou radicalmente nos últimos anos.
junho de 2007
Começam a aparecer no Brasil problemas ausentes por
mais de 25 anos. Eles são os problemas relacionados
ao crescimento econômico. Isto é um bom sinal! O
crescimento econômico geralmente é acompanhado
por gargalos de infra-estrutura, que já podem ser
vistos nos aeroportos, portos e sistemas de transporte.
A oferta de infra-estrutura, por sua vez, geralmente
vem a reboque do crescimento (demanda) e não o
contrário. O desafio para um país é diminuir esse
espaçamento temporal. O recente PNLT – Plano Nacional de Logística e Transportes –, anunciado pelo
Ministério dos Transportes, pode ser interpretado
como uma tentativa nessa direção.
anos exigem que o citado PNLT leve isso em consideração.
junho de 2007
O crescimento deverá escancarar vários gargalos
institucionais no Brasil e forçará iniciativas do setor público a melhorar a regulação e a eficiência de
processos críticos para o setor privado. A adequada
regulação dos setores de infra-estrutura se tornará
cada dia mais crítica, assim como o aumento da eficiência de processos do setor público relacionados à
regulamentação ambiental, societária, tributária, civil,
entre outros. Apesar de não evoluir na velocidade
desejada, o crescimento aumenta essa velocidade de
modernização do setor público. É muito mais fácil
corrigir os problemas para se adaptar ao crescimento,
do que corrigir os problemas com o objetivo de se
alcançar o crescimento.
1 As opiniões contidas nesta nota são de responsabilidade dos
autores, mas também expressam as opiniões apresentadas nas
reuniões do Grupo de Conjuntura da FIPE.
(*) Economista do Grupo de Conjuntura da FIPE.
E-mail: [email protected].
(**) Coordenador do Grupo de Conjuntura da FIPE.
E-mail: [email protected].
Rodrigo Rodrigues Celoto (*)
finanças públicas – primeiro
quadrimestre de 2007
1. Tesouro Nacional
tabela 1 – resultado do Tesouro Nacional - R$ milhões
A Receita total do Tesouro apresentou um crescimento
de 13,4%, saltando de R$ 174.49 bilhões no primeiro
quadrimestre de 2006 para R$ 197.87 bilhões no mesmo período deste ano. Somente as receitas do Tesouro
foram de R$ 156.4 bilhões no primeiro quadrimestre
do corrente ano contra R$ 138 bilhões no mesmo período do ano passado, representando um crescimento
de 13,3%. As receitas de previdência cresceram 14,1%,
saltando de R$ 36 bilhões para R$ 41 bilhões.
As transferências, por seu turno, cresceram de R$ 29
bilhões no primeiro quadrimestre do ano passado
para R$ 33.2 bilhões no mesmo período deste ano,
um crescimento de 14,1%. O crescimento da receita
Despesas da Previd. Social
Despesas do Banco Central
Result. Primário Governo Central
Tesouro Nacional
Previdência Social
Banco Central
líquida foi de 13,3%.
O Resultado Primário do Governo Central ficou em
R$ 14.5 bilhões, sendo R$ 48.1 bilhões o superávit do
Tesouro Nacional, R$ 14 bilhões o déficit da previdência social e R$ 195 milhões o déficit do Banco Central.
O resultado primário do governo central foi de 4,34%
do PIB, um aumento em relação ao resultado de 4,11%
do PIB no mesmo período de 2006.
2006
2007
% 07/06
Receita Total
Receitas do Tesouro
Receita da Previdência
Receita do Banco Central
174.492 197.879
138.022 156.395
35.997 41.070
473
414
13,4%
13,3%
14,1%
-12,5%
Transferências
Receita Líquida
Despesa Total
Despesas do Tesouro
Pessoal e encargos
Custeio e Capital
Transfer. ao Banco Central
29.130 33.246
145.363 164.633
115.780 130.754
66.797 75.028
33.279 37.216
33.330 37.650
188
161
48.504 55.118
480
609
14,1%
13,3%
12,9%
12,3%
11,8%
13,0%
-14,2%
13,6%
26,9%
Resultado Primário Governo/PIB
29.582 33.879
14,5%
14,3%
42.096 48.122
(12.507) (14.048)
12,3%
(7)
(195) 2810,4%
4,11%
4,34%
5,6%
Fonte: STN
2. Necessidade de Financiamento do Setor Público –
Primeiro Trimestre de 2007
junho de 2007
A despesa total cresceu 12,9% no primeiro quadrimestre contra igual período do ano passado, saltando de
R$ 115.8 bilhões para R$ 130.7 bilhões. As despesas
com Pessoal e Encargos sociais foram de R$ 37.2 bilhões no período, as com benefícios previdenciários
foram de R$ 55.1 bilhões e com custeio e capital foram
de R$ 37.6 bilhões. Os três itens de despesa acima
apresentaram, respectivamente, uma elevação de
11,8%, 13,6% e 13%.
Jan-Abr
O superávit primário dos primeiros três meses do ano
foi de R$ 27.3 bilhões (4,68% do PIB) contra R$ 21 bilhões
(3,89% do PIB) no mesmo período do ano passado.
O governo central aumentou seu superávit de R$ 12.2
bilhões (2,26% do PIB) para R$ 18.4 bilhões (3,15% do
PIB). As estatais saíram de um superávit primário de
R$ 2,9 bilhões (0,53% do PIB) para um déficit de R$
0.7 bilhões (0,12% do PIB).
Os juros nominais nos primeiros três meses do ano
totalizaram R$ 38.8 bilhões (6,67% do PIB) contra
R$ 44.2 bilhões (8,2% do PIB) no mesmo período de
2006. Os gastos com juros do governo central caíram
de 6,9% do PIB no primeiro trimestre do ano passado para 5,28% do PIB no mesmo período do ano em
curso. As estatais aumentaram seus gastos com juros
de 0,09% do PIB para 0,11% do PIB e os governos regionais aumentaram seus gastos com juros de 1,38%
do PIB para 1,49% do PIB.
O déficit nominal decorrente foi de R$ 11.5 bilhões
(1,99% do PIB) contra um déficit de R$ 23.2 bilhões
(4,30 % do PIB) no mesmo período do ano anterior.
O governo central fechou esses três primeiros meses
do ano com um déficit nominal de 2,13% do PIB, os
governos regionais com um superávit de R$ 0,16%
do PIB e as empresas estatais com um déficit de 0,1%
do PIB.
Necessidades de financiamento do setor público
R$ milhões Correntes
junho de 2007
Discriminação
Nominal
Governo central
Governo federal1/
Bacen
Governos regionais
Governos estaduais
Governos municipais
Empresas estatais
Empresas estatais federais
Empresas estatais estaduais
Empresas estatais municipais
Juros nominais
Governo central
Governo federal1/
Bacen
Governos regionais
Governos estaduais
Governos municipais
Empresas estatais
Empresas estatais federais
Empresas estatais estaduais
Empresas estatais municipais
Primário
Governo central
Governo federal
Bacen
INSS
Governos regionais
Governos estaduais
Governos municipais
Empresas estatais
Empresas estatais federais
Empresas estatais estaduais
Empresas estatais municipais
2006
Jan-Mar
Ano
2007
Jan-Mar
23 194
25 042
21 149
3 893
1 513
1 089
423
-3 361
-2 547
- 874
60
44 175
37 238
33 336
3 903
7 419
6 132
1 286
- 482
- 841
310
50
-20 981
-12 196
-22 084
-9
9 897
-5 906
-5 043
- 863
-2 878
-1 706
-1 183
11
11 577
12 416
10 206
2 210
- 908
- 346
- 562
70
1 037
- 969
1
38 851
30 794
28 694
2 100
8 673
7 691
982
- 616
-1 115
445
54
-27 274
-18 378
-29 671
110
11 183
-9 581
-8 037
-1 544
686
2 152
-1 414
- 52
69 883
74 475
65 760
8 716
16 606
13 740
2 867
-21 199
-17 954
-3 419
174
160 027
125 827
117 283
8 544
36 322
30 110
6 212
-2 121
-4 410
2 060
229
-90 144
-51 352
-93 589
172
42 065
-19 715
-16 370
-3 345
-19 077
-13 544
-5 479
- 55
% PIB
2006
Jan-Mar
4,30
4,64
3,92
0,72
0,28
0,20
0,08
-0,62
-0,47
-0,16
0,01
8,19
6,90
6,18
0,72
1,38
1,14
0,24
-0,09
-0,16
0,06
0,01
-3,89
-2,26
-4,09
0,00
1,84
-1,10
-0,94
-0,16
-0,53
-0,32
-0,22
0,00
Ano
2007
Jan-Mar
3,01
3,21
2,83
0,38
0,71
0,59
0,12
-0,91
-0,77
-0,15
0,01
6,89
5,42
5,05
0,37
1,56
1,30
0,27
-0,09
-0,19
0,09
0,01
-3,88
-2,21
-4,03
0,01
1,81
-0,85
-0,70
-0,14
-0,82
-0,58
-0,24
0,00
1,99
2,13
1,75
0,38
-0,16
-0,06
-0,10
0,01
0,18
-0,17
0,00
6,67
5,28
4,92
0,36
1,49
1,32
0,17
-0,11
-0,19
0,08
0,01
-4,68
-3,15
-5,09
0,02
1,92
-1,64
-1,38
-0,26
0,12
0,37
-0,24
-0,01
Fonte: BCB
1/ Inclui o INSS. * Dados preliminares. (+) déficit (-) superávit.
(*) Economista do Grupo de Conjuntura da FIPE.
E-mail: [email protected]
Roberto Luis Troster (*)
política monetária
Não existe uma política econômica universal aplicável
a qualquer contexto. Uma condução virtuosa, numa
determinada situação, pode se tornar defeituosa
depois de um tempo, em razão de transformações
na realidade. Abundam exemplos de como a demora
em ajustes, quando as condições se alteram, tornam
contraproducentes políticas econômicas que antes
eram virtuosas.
O quadro após a crise cambial era de pressões inflacionárias, escassez de capitais, risco externo elevado,
volatilidade e depreciação cambial. Uma situação
em que a prescrição correta, para conduzir a política
monetária, foi de um regime de metas de inflação,
taxas de juros altas e gradualismo nas reduções dos
juros. A atuação do Banco Central foi consistente com
o diagnóstico, e apesar das dificuldades, conseguiu
estabilizar os preços e coordenar as expectativas de
inflação, criando as condições para a retomada do
crescimento. O rigor na condução do atual regime
monetário foi um avanço institucional importante,
O ponto que este artigo quer ressaltar é que, nos últimos tempos, a realidade macroeconômica mudou
rapidamente, e demanda dois ajustes: uma redução
contundente de juros e uma fixação das metas mais
ambiciosa. É tempo de avançar. A dinâmica de juros
e preços é outra e os indicadores mostram que não
há necessidade de taxas de juros tão elevadas. O processo de controlar os preços está numa outra fase. A
inflação ficou abaixo da meta no ano passado, vai ficar
abaixo neste e no próximo ano, o risco Brasil despencou, há um superávit em conta corrente e um afluxo
abundante de capitais externos, a dívida pública está
controlada, a volatilidade financeira está reduzida e
os preços das exportações brasileiras estão em alta.
No atual cenário, as estimativas para a taxa neutra
de juros estão em centradas em 8,5% ao ano; com
este valor, não haveria pressões que comprometessem o cumprimento da meta de inflação. A taxa de
juros neutra caiu: o esforço para reduzir o patamar
inflacionário está terminado, há uma maior abertura
comercial que absorve aumentos de demanda com
importações maiores, o grau de estabilidade é maior,
o País está a alguns meses do Investment Grade e o nível
de reservas é elevado.
junho de 2007
A combinação de política monetária e cambial brasileira adotada em 1994, no início do Plano Real, ilustra
o fato. Num primeiro momento, a valorização cambial
e os juros altos serviram para estabilizar a moeda e
acelerar o crescimento. Depois de um tempo, as condições da economia mudaram, demandando ajustes;
entretanto, a insistência em manter a mesma orientação foi problemática e ocasionou a crise cambial de
1999, com danos irrecuperáveis para o crescimento e
que custou ao País dezenas de bilhões de dólares, um
desperdício. A falha na política adotada em 1994 não
esteve em sua concepção e implantação, um sucesso
reconhecido, mas na demora em se adaptar ao novo
cenário. O que era um remédio havia se tornado um
veneno.
que substituiu uma história de confiscos, planos econômicos mirabolantes e mudanças de moeda e impôs
credibilidade à autoridade monetária.
O quadro macroeconômico se apresenta consistente
com uma taxa de juros mais baixa: no cenário externo, há baixa volatilidade, liquidez abundante e sem
pressões de preços; o Real continua seu processo de
valorização, os índices de preços e seus núcleos estão
consistentes com uma inflação abaixo da meta e as
expectativas para este ano e os próximos também.
junho de 2007
Entretanto, a taxa Selic está em 12%. Há uma diferença
de 3,5% que provoca desequilíbrios indesejáveis,
como uma pressão adicional na valorização do câmbio, com impactos negativos na competitividade da
indústria, um ônus no custo do crédito, um aumento
nas aplicações especulativas de investidores externos
e um aumento da dívida pública brasileira; enfim,
há uma dissipação de crescimento. São custos que se
justificam em situações de incerteza inflacionária e
riscos exacerbados; não é mais o caso.
Mesmo considerando que a taxa básica está em seu
valor mais baixo nas últimas décadas, continua sendo
uma das mais altas do mundo e a realidade impõe
uma redução rápida. O cenário externo positivo, a
maior abertura comercial e financeira, a disciplina
fiscal e a inexistência de riscos inflacionários tornaram contraproducente uma taxa de juros tão elevada
como a atual.
O gradualismo do Banco Central deixou de ser uma
virtude e se transformou num defeito. Um choque
de juros neste momento não apresenta riscos e traz
benefícios palpáveis para a economia. O gradualismo
foi um meio para estabilizar a moeda, e a estabilidade
é apenas um meio para promover o crescimento e
melhorar a distribuição de renda.
A segunda demanda da realidade é a fixação da meta
de inflação para 2009. No próximo dia 28 de junho, o
Conselho Monetário Nacional fixará a meta de inflação para 2009 e ratificará a de 2008 em 4,5%. A decisão
condicionará a política monetária no próximo biênio
e pode também consolidar uma fase importante do
Real. Enquanto uma meta ambiciosa demais limita o
crescimento, uma frouxa demais alimenta as expectativas desnecessariamente.
O regime de metas, combinado com o câmbio flexível
e a disciplina fiscal, teve início há oito anos, substituindo o da “âncora cambial” no ápice da crise externa. Seu
objetivo era fixar a diretriz para a atuação do Banco
Central. Sua implantação foi complicada em razão
dos choques de oferta – crise de energia, impactos do
default argentino e dos escândalos contábeis etc. – e da
estrutura de preços internos – indexação elevada e canais de transmissão de política monetária estreitos.
Sua condução conseguiu combinar transparência com
autonomia nas decisões e flexibilidade para absorver
crises com rigor em perseguir objetivos. Os resultados
são positivos e a independência operacional do Banco
Central do Brasil foi obtida por mérito.
Até o início deste governo não havia uma meta de
longo prazo explícita. Entretanto, o presidente do
Banco Central e o então ministro da Fazenda fixaram
a meta de longo prazo em 4%, em 2003. Os resultados
obtidos até agora mostram que é factível terminar a
década com a inflação estabilizada nesse patamar. O
momento é oportuno para fixar a meta de 2009 nesse
valor, com ganhos de bem-estar.
A diferença entre repetir os 4,5% de 2007 e 2008 e
baixar para 4% é emblemática, pois afirma o compromisso com uma inflação mais baixa, com a eliminação
dos fatores que a tornam latente, e em especial a indexação, bem como com o cumprimento da meta de
inflação de longo prazo. Os custos de transição são
mínimos e os ganhos expressivos.
O quadro conjuntural é oportuno para reduzir a meta
em 0,5%. A inflação está arrefecendo, a taxa de captação externa está no patamar histórico mais baixo, o
Real está valorizado e a dinâmica da dívida pública
está sob controle. A taxa de juros interna está em queda, e independente de a meta de 2009 estar em 4% ou
4,5%, em algum momento, em 2008, a taxa de juros
básica nominais interna será de um dígito. Os custos
de transição, considerando a credibilidade alcançada,
são baixos e os benefícios consideráveis.
Nos últimos anos, a aplicação do regime de metas
de inflação no Brasil apresenta resultados notáveis;
as expectativas apontam que a inflação ficará abaixo
da meta este ano e no próximo. Houve uma melhora
nos mecanismos de transmissão: o canal do crédito foi
alargado, a parcela pós-fixada da dívida foi reduzida
e o Copom ganhou credibilidade.
A queda da inflação tem impactos positivos de bemestar: há uma diminuição nas taxas reais e nominais
de juros, bem como na arrecadação do imposto inflacionário, a absorção de choques de oferta tem custos
menores, há uma dispersão menor de preços, a volatilidade financeira é menor, a oferta de crédito é mais
abundante, a possibilidade de surpresas inflacionárias
diminui consideravelmente e, por fim, traz impactos
positivos na desconcentração da renda.
Perpetuar a meta de 4,5% sinaliza a manutenção do
imposto inflacionário, de juros reais mais elevados, de
salários reais menores e o abandono de cumprimento
da meta de longo prazo de 4%. Há uma dissipação de
crescimento. É paradoxal, mas o anúncio de uma meta
mais frouxa, considerando o atual quadro conjuntural,
significa menos crescimento e juros reais mais altos
por mais tempo.
índice de preços a ser utilizado, o tamanho da banda,
a acomodação a choques, a independência do BC, a
composição do Copom e os instrumentos de política
monetária.
Há uma outra agenda complementar para baixar as
taxas de juros dos tomadores de empréstimos e inclui,
além da redução dos juros básicos, a eliminação dos
depósitos compulsórios, a racionalização da tributação de operações financeiras, o fim dos subsídios
cruzados, a diminuição dos custos de observância, a
melhoria do quadro institucional e o aparelhamento
do judiciário.
É imperativo baixar os juros e mantê-los baixos definitivamente. As taxas elevadas concentram a renda e
freiam o crescimento. É tempo de ousar.
A moeda é depositária da confiança social por suas
funções de reserva de valor, unidade de conta e meio
de pagamento, e a taxa de juros é a relação entre o
presente o futuro. É uma construção social que se
ganha com dificuldade e se perde rapidamente. Baixar
os juros exige perseverança.
junho de 2007
O regime de metas de inflação foi um avanço institucional importante que substituiu uma história de
confiscos, planos econômicos mirabolantes, mudanças
de moeda etc. com metas críveis coordenando expectativas e minimizando os custos sociais de absorção
de choques. Há espaço para avançar mais.
As metas de inflação de países industrializados que
adotaram o regime estão centradas num patamar inferior: cerca de 2%. Entretanto, é conveniente consolidar
a taxa de 4% por alguns anos e depois avançar.
A agenda do futuro da moeda inclui a diminuição da
incerteza jurisdicional, o aprimoramento dos mecanismos de transmissão, o abandono do ano calendário
gregoriano, a composição do crédito, a dinâmica fiscal, a ampliação do Conselho Monetário Nacional, o
(*) Fipe. E-mail: [email protected]
Hélio Nogueira da Cruz (*)
junho de 2007
setor externo
A economia mundial tem apresentado forte expansão,
particularmente nos últimos anos. O desempenho
das economias centrais, em particular dos Estados
Unidos, e também dos países emergentes, com destaque para a China, tem sido muito favorável. O PIB
mundial elevou-se de US$ 22 trilhões em 1990 para
US$ 48 trilhões em 2006. Por outro lado, o comércio
internacional tem apresentado expansão ainda mais
US$ 42 bilhões no ano. As informações disponíveis
para as três primeiras semanas de junho apontam
superávit de US$ 1,72 bilhão, valor compatível com
essas estimativas.
elevada. As exportações mundiais elevaram-se de
US$ 3,4 trilhões em 1990 para US$ 11,7 trilhões em
2006. Muitos países emergentes, incluindo a China e o
Brasil, têm apresentado superávits comerciais bastante
elevados, que têm permitido expressiva acumulação
de reservas cambiais.
interligados.
O Brasil tem aproveitado o crescimento do intercâmbio comercial e financeiro internacional. Desde o início dos 1990 o Brasil vem promovendo a liberalização
comercial e reduzido as barreiras à mobilidade do
capital financeiro internacional. Entretanto, a taxa de
crescimento da economia doméstica tem sido inferior
ao crescimento do PIB mundial e substancialmente
inferior à dos países emergentes e do BRIC. Desde
2001 tem crescido o superávit da Balança Comercial,
que apresentou os valores de US$ 2,6 bilhões naquele
ano. Em 2005 e 2006 este superávit superou US$ 44
bilhões.
Com forte valorização do real, as importações têm
aumentado mais que as exportações. No acumulado
deste ano, as exportações têm crescido 20% e as importações 25,4%. Nos últimos 12 meses, o superávit
comercial totalizou US$ 47,86 bilhões, superior ao
saldo de US$ 46,07 bilhões verificado em igual período em 2006. As exportações alcançaram US$ 148,31
bilhões e as importações foram de US$ 100,31 bilhões
nos últimos doze meses. As previsões dos especialistas apontam para superávit comercial superior a
10
A evolução do PIB brasileiro tem sido marcada por
significativa alteração na estrutura da produção e
do intercâmbio internacional, fenômenos bastante
A pauta de exportações do País tem-se alterado a
favor dos produtos básicos, que incluem os produtos
metalúrgicos, papel e celulose, petróleo etc., que têm
se beneficiado da crescente demanda internacional.
Os baixos custos associados aos recursos naturais e
ao bom domínio tecnológico têm oferecido condições
favoráveis importantes em numerosos setores, como
os minerais e o agronegócio. Possivelmente, os novos
investimentos internacionais nas áreas de siderurgia,
papel, etanol etc. deverão se dirigir, em boa parte, ao
Brasil, desde que as restrições de infra-estrutura não
representem gargalos demasiado estreitos. Ou seja, a
tendência é de ampliação da produção desses itens, que
deverão conquistar maior participação na produção
local e na pauta de exportações. A valorização do real
tem sido compensada, no caso dos produtos básicos,
pelos preços elevados no mercado internacional. As
exportações de produtos industriais mais sofisticados,
de alta e média tecnologias, têm apresentado redução
de participação na pauta de exportações.
O crescimento das importações, estimulado pela valorização do real, também tem promovido alterações
na composição da produção industrial do Brasil. O
crescimento das importações brasileiras de máquinas
e de outros bens de capital, assim como componentes
intermediários, tem tornado o aparato produtivo local
mais semelhante aos padrões internacionais. As im-
portações de bens finais, particularmente nos setores
intensivos em mão-de-obra, como os têxteis e calçados, têm exercido forte pressão competitiva entre os
produtores locais, tanto nos mercados internacionais
como no mercado doméstico.
Desta forma, a indústria de transformação brasileira
tem apresentado modificações na sua participação
dentro do PIB e na sua composição interna. A evolução
da produção industrial tem sido restrita, apresentando
taxas de crescimento inferiores à do PIB, o que implicou participação de apenas 18,4% do PIB em 2007,
porcentual abaixo dos 20% apresentado no passado
recente. No período entre o segundo trimestre de
2004 e o primeiro trimestre deste ano a indústria
de transformação cresceu 7,5%, ao passo que o PIB
evoluiu 11,7%.
O desafio para o País, que nunca apresentou um período tão longo de relativa folga de divisas decorrentes,
sobretudo dos superávits comerciais, é estabelecer
políticas que sejam compatíveis com o novo quadro
das contas externas e suas possíveis alterações num
prazo mais longo.
Certamente, por algum tempo ainda, principalmente
enquanto o crescimento da economia mundial for
vigoroso, a pressão sobre os produtos intensivos em
recursos naturais será elevada, o que deve manter
os preços internacionais favoráveis destes bens que
o Brasil oferece em boas condições de competitividade. Mas este cenário pode se alterar mais adiante.
A reversão do ciclo internacional pode deprimir a
A expansão da demanda doméstica poderá se constituir em significativo estímulo para a produção local.
A recuperação dos investimentos, após longo período de reduzida expansão da capacidade instalada,
deverá ser feita visando ao adensamento das cadeias
produtivas e à ampliação e modernização do parque
produtivo instalado. Em numerosos setores, como o
automobilístico, opera-se próximo da plena utilização
da capacidade instalada, exigindo investimentos para
a ampliação do parque produtivo. O direcionamento
dos novos investimentos determinará, em larga medida, o futuro do setor industrial, tanto em termos de
sua magnitude como de sua composição.
O horizonte mais favorável à recuperação dos investimentos produtivos que se verifica nos últimos meses
decorre, sobretudo, da melhoria dos fundamentos macroeconômicos. O nível elevado das reservas cambiais,
a redução da taxa de juros e o controle da inflação
têm contribuído para o cenário positivo. O Plano de
Aceleração do Crescimento – PAC tem-se revelado
tímido e insuficiente diante das necessidades do País.
É necessário, sobretudo, estabelecer qual a estrutura
produtiva que o País entende como a mais adequada
para o longo prazo e passar a construí-la.
junho de 2007
Observa-se, num prazo mais longo, que a composição
do setor industrial alterou-se significativamente. Cresceu a participação do setor básico em 9% nos últimos
10 anos, e se reduziu a contribuição das atividades
de maior conteúdo tecnológico, que se retraíram 16%
nos últimos 10 anos, onde se concentra boa parte
dos empregos melhor remunerados. Estes setores
incluem os produtores de bens como máquinas e
equipamentos, informática, produtos químicos e
material eletrônico.
demanda destes produtos de exportação, tornandose necessária a produção local de inúmeros produtos
que vinham sendo importados. A cautela recomenda
que se garanta uma base de produção local, particularmente de setores manufaturados, que apresentaram
padrões de competitividade satisfatórios. A atenção
com a produção local de produtos de maior intensidade tecnológica também deve ser prioritária, consolidando avanços significativos ocorridos no passado,
como acontece na indústria aeronáutica e segmentos
do setor de bens de capital. É bom ter sempre presente
que o crescimento da economia brasileira permanece
abaixo da evolução da economia mundial, o que mostra os limites da trajetória atual.
(*) Professor da FEA-USP.
E-mail: [email protected]
Os artigos da seção Análise de Conjuntura foram escritos entre 17/06 e 19/06/07.
11
temas de
economia aplicada
Antonio Lanzana (*)
Luiz Martins Lopes (*)
junho de 2007
crescimento e ambiente pró-investimento
e oportunidades de trabalho
A política econômica que vem sendo adotada pelo
Brasil desde 1999 (câmbio flutuante, metas de inflação
e geração de superávits primários no setor público)
trouxe resultados muito favoráveis em termos do
controle da inflação e da situação externa. A inflação
atual (3,1% em 2006) coloca o País entre os emergentes mais bem posicionados no mundo e as reservas
internacionais (US$ 130 bilhões atualmente) são as
maiores de nossa história.
Essa situação se reflete nos índices de desemprego, os
quais se encontram em níveis mais elevados do que os
observados no período anterior ao Plano Real, como
se pode observar por meio dos dados do DIEESE,
relativos ao desemprego na Grande São Paulo.
gráfico 1– desemprego na Grande São Paulo
30
20
12
10
2006
2005
2004
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1990
1989
1988
1987
0
1986
O mesmo sucesso, porém, está longe de ser encontrado quando se analisa a evolução do nível de
atividade. O fraco desempenho do PIB no período
1999/2006 (2,7% a.a.) traz, de imediato, três grandes
preocupações. Em primeiro lugar, nota-se que a economia mundial cresceu 4,3% a.a. nesse período, o
que significa dizer, num cenário global, que estamos
ficando relativamente mais pobres, e nos distanciando
dos emergentes, que crescem à razão de 7% ao ano.
Em segundo lugar, dado que a população brasileira
aumentou nesse período entre 1,3% e 1,4% a.a., nosso
crescimento de riqueza per capita alcançou inexpressíveis 1,3% ao ano. E, por fim, levando-se em conta que
a população economicamente ativa (e que realmente
precisa de emprego) cresce 2,0% a.a., e ainda que a
elasticidade emprego/produto encontra-se entre 0,4 e
0,5, fica claro que o País não vem conseguindo gerar
os empregos necessários para evitar o agravamento
do quadro social.
Fonte: DIEESE/SEBRAE.
Além da questão quantitativa, há que se destacar também a questão qualitativa do mercado de trabalho. O
País não somente não gera volume suficiente, como
também não cria empregos de qualidade. O que se
tem observado é um crescimento de emprego no setor
serviços, mas muito mais com característica de “inchamento” (camelôs, empregos informais, “flanelinhas”
etc...) do que propriamente empregos de qualidade
como, por exemplo, nas áreas de turismo, educação,
serviços médicos, e assim por diante. Mesmo a ele-
vação recente dos empregos com carteira assinada,
mostrada pelos dados do CAGED, é caracterizada
pela expansão dos empregos de menor remuneração
e redução de empregos com maior remuneração.
As causas do baixo dinamismo da economia brasileira e os conseqüentes impactos sobre o mercado de
trabalho podem ser encontrados na própria equação
do modelo geral de crescimento do País, que é dado
por:
∆Υ I Υ = •
Υ
Υ Κ
(1)
em que:
∆Υ
= taxa de crescimento potencial do País.
Υ
I
= taxa de investimento.
Υ
Y
= relação produto-capital (produtividade da ecoK
nomia).
Porém, ao mesmo tempo que se analisa a forma
como o setor público equilibrou suas contas, identifica-se um dos principais fatores limitantes de um
crescimento mais acelerado do produto potencial. A
explosão das despesas correntes do governo fez com
que o ajuste se concentrasse, de um lado, no aumento da carga tributária (saiu de 25% do PIB nos anos
oitenta para 35% atualmente) e, de outro, na redução
dos investimentos públicos. Mesmo considerando que
a dinâmica do crescimento é dada pelo setor privado,
essa forma de ajuste contribui para “derrubar” a taxa
de investimento no País. Isto pode ser observado desagregando-se a equação (1), entre setor privado (p)
e público (g). Assim ter-se-ia:
∆Υ  Ig Ip   Υg Κg Υp Κp  =
+
•
•
+
•
Υ  Y Υ   Κg Κ Κp Κ 
(2)
em que:
I
= é a taxa de investimento (em g e p).
Υ
Υ
= relação produto-capital (em g e p).
K
Κg = participação do setor público no estoque de
Κ
capital (p do setor privado).
Os efeitos da forma de ajuste fiscal podem ser encontrados em vários componentes dessa equação:
Além da ampliação dos investimentos e elevação da
produtividade, é importante identificar medidas que,
no contexto de maior crescimento, maximizem as
oportunidades de trabalho, o que não é sinônimo de
ampliação de empregos com carteira assinada. Com
este objetivo, pode-se identificar três áreas de ação: a
questão do regime fiscal, o ambiente regulatório e a
simplificação da vida empresarial no País.
a) De forma direta, percebe-se que a redução do
investimento público (Ig) contribui para a queda
do investimento total, a menos que houvesse uma
compensação do investimento privado (Ip), o que
efetivamente não está ocorrendo.
No que se refere ao primeiro aspecto, a geração de
superávits primários expressivos desde 1999 e a conseqüente redução dos déficits operacional e nominal
têm sido importantes para diminuir as incertezas
sobre o País, levando inclusive ao declínio do risco,
mesmo para cobrir a depreciação de Kg; a situação
das rodovias é um bom exemplo neste sentido.
junho de 2007
Analisando-se os componentes da equação, nota-se
que a taxa de investimento do País é extremamente
baixa (16% do PIB em 2006), e se mantida nessa condição, garante crescimento em torno de apenas 3% ao
ano. De outro lado, embora seja reconhecida a natural
dificuldade de se mensurar a evolução da produtividade, é possível identificar, de forma clara, medidas
que podem ser adotadas para elevá-la.
com reais perspectivas do Brasil se tornar “Investment
Grade” já em 2008.
b) O reduzido valor de Ig está contribuindo para diminuir a produtividade do capital no setor público
 Yg  , na medida em que Ig parece insuficiente até


 Kg 
 Yg 
c) A deterioração de   reduz a produtividade do
 Kg 
Y 
capital total da economia   .
K
13
d) Além disso, impacta negativamente o investimento
privado na medida em que Ip é complementar a
Ig; as incertezas sobre a disponibilidade de infraestrutura (energia elétrica, transporte, portos etc...)
afetam o nível de Ip.
e) A reduzida taxa de Ig diminui a produtividade do
 Yp 
capital do setor privado   de duas formas: a
 Kp 
ausência de infra-estrutura aumenta os custos do
setor privado (condições das estradas, dos aeroportos, ...) e obriga muitas empresas a criarem sua
própria infra-estrutura, saindo dos respectivos
“core business”.
f) De forma indireta, a elevação da carga tributária
também contribui para o declínio na medida em
que reduz a rentabilidade dos investimentos e
junho de 2007
aumenta a informalidade.
Esse quadro mostra a necessidade de se mudar o
regime fiscal no Brasil, com a redução das despesas
correntes do governo e conseqüente aumento da poupança pública. A desagregação das despesas correntes
do governo ajuda a identificar as áreas onde se poderia
concentrar tal redução. Isto pode ser feito a partir da
equação de poupança do setor público:
Sg = RT − Dc (3)
em que:
Sg = poupança do setor público.
RT = receita tributária.
Dc = despesas correntes.
Ou, alternativamente:
Sg = RT − [Da + Dp + Dj + Di + Dpe + Do ] (4)
em que:
Da = despesas assistenciais.
Dp = despesas com previdência.
Dj = despesas com juros.
Di = despesas correntes associadas aos investimentos
(complementar).
14
Dpe = despesas com pessoal e encargos (exceto as
despesas associadas a Di).
Do = outras despesas.
Para a contenção das despesas correntes não está se
propondo redução na área assistencial (Da), mas o
redirecionamento das mesmas no sentido de alcançar sua real finalidade. O objetivo não é suplementar
educação e renda para as classes mais favorecidas
e sim viabilizar o atendimento para aqueles que se
encontram em nível de subsistência (o programa
Bolsa-Família atende essa condição). Como destaca
Stiglitz,1 há um papel para o governo na redução da
desigualdade, que é, por exemplo, o de propiciar educação e renda para os trabalhadores mais pobres.
Esses gastos, além de distributivos, têm impacto positivo no crescimento, pela melhora do poder de compra
e pelo efeito da educação. Esses objetivos são alcançados de forma mais eficiente do que defendem alguns
analistas, por meio do efeito de “transbordamento”,
em que a redução de tributos é concedida às classes de
renda mais elevadas com o objetivo de atingir, num
segundo momento, as classes menos favorecidas por
meio do crescimento.
Nas despesas da previdência (Dp), por sua vez, encontram-se várias distorções do gasto público. O nível
atual de Dp (12% do PIB) é um dos mais elevados do
mundo, distorção esta que se torna ainda mais grave
quando se considera a estrutura etária do País, caracterizada pela presença de pequena porcentagem de
idosos. As distorções são muitas: a) não há idade mínima para a aposentadoria (no caso do INSS), enquanto
que na maior parte do mundo a idade é de 60 ou 65
anos; b) os aposentados são reajustados pelo salário
mínimo, o que significa dizer que mesmo não trabalhando recebem ganhos de produtividade (o repasse
simples da inflação seria razoável e justa); c) não faz
sentido discriminar as condições de aposentadoria
por sexo, principalmente levando-se em conta que as
mulheres têm expectativa de vida mais longa que os
homens; d) o excessivo dispêndio com aposentadoria
faz com que o País gaste mais com idosos do que com
as crianças carentes (de acordo com Néri, 2 de 1991 a
2005 o aumento da renda per capita dos brasileiros
com mais de 60 anos foi quase seis vezes maior que o
aumento da renda per capita das crianças brasileiras
com menos de dez anos).
demanda agregada, mas que não gera produto potencial. Ao contrário, limita a capacidade de expansão da
economia, pela falta de infra-estrutura e conseqüente
redução do patamar de investimento que, por sua
vez, limita a capacidade de crescimento do produto
potencial.
As despesas com juros deverão continuar se reduzindo nos próximos anos, até mesmo pela conquista
da estabilidade. Essa queda, porém, pode ser mais
acelerada com corte de despesas correntes, que daria
maior liberdade à política monetária.
É importante destacar que a mudança do regime
fiscal, apesar de imprescindível para uma retomada
mais acelerada do crescimento, será um processo
mais demorado. E, mesmo quando realizada, embora
permitindo uma elevação da taxa de crescimento, não
será suficiente para o crescimento dinâmico. Para superar, de forma mais rápida, o problema, é necessário
atrair o setor privado para a área de infra-estrutura
(queda de Ig compensada, ao menos parcialmente,
pela elevação de Ip).
Alguns analistas argumentam que parte da expansão das despesas correntes está associada ao próprio
investimento público, dada a complexidade entre
ambos (Di). Embora o argumento possa ser válido em
algumas áreas do País, o reduzido nível de Ip não justificaria tal expansão em termos globais. Ao contrário,
o que se observa é uma total mudança na composição
das despesas públicas entre gastos correntes e de investimento. Na década de setenta, os gastos correntes
apresentavam quatro vezes os investimentos, número
este que saltou para 35 vezes nos dias atuais.
Argumenta-se que a elevação do custeio do governo
tem contribuído para aumentar o nível de emprego,
dada a elevada relação emprego-produto no setor
público. É importante destacar, porém, que o emprego
deve ser criado a partir da geração de produção, o que
garante a expansão contínua de novas oportunidades
de trabalho. O que se observa atualmente é a criação
de empregos pelo setor público, por aumentos excessivos do gasto de custeio do governo, que aumenta a
junho de 2007
Na área de despesa com pessoal e encargos (Dpe),
pelo menos duas medidas poderiam contribuir para
sua redução. De um lado, eliminar os fatores de elevação autônoma da folha (anuênios, qüinqüênios,
promoções automáticas etc...) que, na maior parte das
esferas de governo, representam elevações superiores
aos reajustes concedidos “oficialmente”. De outro, é
preciso caminhar no sentido de proibir a criação de
novos municípios e estados. Desde a promulgação
da Constituição de 1988 foram criados mais de 500
municípios no País.
A incapacidade financeira do setor público de realizar
os investimentos em infra-estrutura obriga o governo
a compartilhar dessa responsabilidade juntamente
como setor privado. Ocorre, porém, que o setor privado somente pode ser atraído para atuar na área de
infra-estrutura (onde o retorno privado é menor que
o social) se houver clima favorável aos investimentos, o que passa por uma perspectiva de retorno e
estabilidade das “regras do jogo”. Para isso, a questão
regulatória assume um papel fundamental, e aí se
encontra uma segunda grande limitação ao crescimento. As críticas do setor empresarial nessa área são
inúmeras: a) ausência de regulamentação adequada
em toda a área de infra-estrutura (energia elétrica,
transportes, logística, saneamento etc...); b) dificuldade na obtenção de licenças ambientais; c) constantes
mudanças nas regras existentes; d) instabilidade nas
regras de funcionamento das agências reguladoras; e
e) indefinição quanto ao papel da iniciativa privada e
do poder público nos investimentos de infra-estrutura
do País, como ocorreu recentemente com as concessões rodoviárias.
Um terceiro aspecto a ser explorado refere-se à
necessidade de facilitar a vida empresarial do País,
tanto no que se refere à ampliação dos investimentos
das empresas de grande porte como pela criação de
empresas de menor porte. Afinal, a falta de oportu-
15
nidade de trabalho é também conseqüência da falta
de empreendedores.
junho de 2007
Em relação a esse aspecto, é importante destacar
estudo recentemente divulgado pelo Banco Mundial
sobre o ambiente de negócios nos países. No estudo
(“Doing Business”), o Banco classifica a eficiência dos
países medindo burocracia, custo e tempo para abrir
e fechar um negócio, legislação trabalhista e carga
tributária. Numa amostra de 155 países, o Brasil é o
119º colocado, ficando atrás de países como Nigéria,
Albânia e Sri-Lanka e muito atrasado até mesmo em
relação a outros países da América Latina [Chile (25º),
Colômbia (66º), Peru (71º) e Argentina (77º)].
Merece destaque neste estudo a questão da legislação
trabalhista, em que o Brasil registra uma das piores
colocações. Isto porque a legislação trabalhista apresenta uma série de inconvenientes: a) trata igualmente
todos os trabalhadores, independentemente das condições do mercado de trabalho e de bens, condições
essas que são muito heterogêneas; b) contribui, até por
conseqüência, para aumentar o grau de informalidade
do emprego; c) reduz a competitividade do produto
nacional; d) o excesso de regulamentações tira flexibilidade do mercado de trabalho, que seria fundamental
para reduzir os custos das transformações impostas
por mudanças constantes do mercado de bens, principalmente em virtude da globalização.
É necessário adotar medidas que permitam superar
essas limitações. Neste sentido, sugere-se: a) definir na Constituição apenas os direitos básicos dos
trabalhadores (que contemplassem, por exemplo, a
cláusula social da OIT), deixando os demais itens à
livre negociação entre empresários e trabalhadores; b)
alterar a base de contribuição previdenciária da folha
de salários para o valor adicionado.
A simplificação da legislação trabalhista e a mudança
da base de incidência dos encargos sociais representariam importantes passos no sentido da dinamização do mercado de trabalho. Outras medidas com o
mesmo objetivo podem ser encontradas na equação
16
da geração de empregos, separando o setor privado
em grandes empresas (e) e empresas de pequeno
porte (me).
∆Ν Νg
∆Υg Ne
∆Υe Nme
∆Yme
(5)
=
• Eg •
+
• Ee •
+
• Eme •
Ν
N
Υg
N
Υe
N
Yme
em que:
∆Ν
= taxa de crescimento do emprego total.
Ν
Νg
= participação no emprego (“g” no setor público,
N
“e” nas grandes empresas e “me” nas empresas
de pequeno porte).
Eg = elasticidade emprego-produto (“g” no setor
público, “e” nas grandes empresas e “me” nas
empresas de pequeno porte).
∆Υg
= taxa de crescimento do produto (“g” no setor
Υg
público, “e” nas grandes empresas, e “me” nas
pequenas e médias empresas).
Concentrando a análise na equação (5), pode-se verificar que a contribuição das empresas de pequeno e
médio porte para o crescimento do emprego é dada
por
Nme
∆Υme
, isto é, pelo produto da partici• Eme •
N
Υme
pação do segmento no emprego, pela relação emprego-produto e pela taxa de crescimento desse mesmo
segmento. A contribuição dessas empresas poderia ser
mais significativa, uma vez que a tendência natural
é de maior expansão do setor serviços, exatamente
onde se encontram as empresas de menor porte. Além
disso, é natural que a relação emprego-produto seja
maior nesse segmento do que nas grandes empresas
(isto é, Eme > Ee).
Partindo dessa perspectiva, seria importante, para se
alcançar um maior dinamismo na geração de empregos, a criação de um ambiente favorável à expansão
dos pequenos negócios, o que efetivamente não tem
sido observado. A adoção de uma política macroeconômica consistente é condição necessária, mas não
suficiente, para a expansão dos negócios. É preciso
criar um estado de espírito favorável à empresa e
ao empresário, isto é, um ambiente que permita o
desenvolvimento do espírito empresarial, por meio
do investimento.
As empresas de médio e pequeno porte têm desempenhado papel importante em outros países, mas têm
encontrado dificuldades de ocupar um maior espaço
no Brasil. Além das dificuldades de ordem financeira
(juros elevados e ausência de fontes de financiamento)
e tributária (carga excessiva, e freqüentes mudanças
na regra do jogo, como vem ocorrendo freqüentemente com o aumento da tributação sobre as empresas de
serviços), nota-se que o excesso de regulamentação
tem sufocado o segmento.
Diante dessas evidências, pode-se sugerir algumas
medidas para reduzir a “burocracia” e liberar o espírito empreendedor no Brasil: a) autorização e concessão
automática para pleitos ou solicitação de documentos
com o setor público; b) simplificação das exigências
sanitárias e de microambiente; c) cobrança de multas
somente a partir da segunda visita do fiscal; d) desenvolvimento dos fundos de aval; e) estímulo ao autoemprego, com a possibilidade da pessoa física atuar
na vida empresarial com registro na prefeitura, por
prazo determinado; f) isenção de imposto de renda
A análise desenvolvida ao longo deste texto mostra
que a consistência da política macroeconômica (inflação baixa e equilíbrio externo) é uma condição
necessária, mas não suficiente, para o crescimento
em ritmo dinâmico. É também preciso, sem dúvida,
um ambiente pró-investimento e oportunidades
de trabalho (políticas microeconômicas e ambiente
de negócios a favor da produção e da aceleração do
crescimento).
Embora o País apresente progressos importantes na
área econômica ao longo dos últimos anos, ainda há
um caminho importante a perseguir no sentido de
acelerar o crescimento do produto potencial, e para
taxas semelhantes às observadas nos demais países
emergentes. E o País deve ter pressa. Afinal, por
quanto tempo a economia mundial vai continuar
propiciando clima tão favorável ao crescimento? E é
preciso também ter pressa porque o PIB e os empregos
perdidos jamais serão recuperados.
1 Stiglitz, J. E. Os exuberantes anos noventa. São Paulo: Companhia
das Letras, 2003.
2 Neri, Marcelo. Jornal “O Estado de São Paulo” de 28/05/2005, p.
A-10.
junho de 2007
Embora a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas,
que estará em vigor em julho deste ano, represente
um avanço, muitas dificuldades ainda permanecem.
As dificuldades vão desde a abertura, passam pelo
desenvolvimento e permanecem no fechamento. Na
abertura, nota-se que as exigências são excessivas, não
há respostas por parte do setor público para pleitos
importantes para o desenvolvimento das atividades,
as taxas são muito elevadas e existem muitas restrições para o enquadramento como pequena empresa.
No desenvolvimento dos negócios, as empresas de
pequeno e médio porte se defrontam com obrigações
incompatíveis com seu tamanho, são tratadas pelos
fiscais como se fossem empresas de grande porte e
ainda se defrontam com fiscalização punitiva e não
orientadora. E no encerramento, as exigências continuam excessivas. A conseqüência desse quadro é um
desestímulo à abertura de novos negócios e aumento
da informalidade.
nas fases iniciais dos pequenos empreendimentos.
(*) Professores da FEA-USP.
E-mails: [email protected]; [email protected]
17
Thomas Palley (*)
the profit vs. country dilemma
junho de 2007
Vladimir Ilyich Ulyanov, alias Lenin, was the leader
of the 1917 Bolshevik revolution in Russia. One of his
best known quotes is “The capitalists will sell us the
rope with which we will hang them.” Today, Lenin
must be chuckling in his Moscow mausoleum as he
watches US business dealings with China.
Lenin’s sarcastic quip identified how desire for profit
can sometimes undermine class interest. In today’s
era of globalization a similar logic can hold for the
national interest. Thus, with corporations looking to
maximize their global profits, what is good for profit
can sometimes be bad for country.
US – China relations provide a case study of the “profit
vs. country” dilemma. Current US – China economic
relations are marked by huge trade deficits and a
steady migration of manufacturing to China. This
structure was established in the 1990s at the behest
of multi-national corporations and big retailers such
as Wal-Mart. The former saw China as providing an
unequaled low cost production platform from which
to export to the US, while the latter saw China as a
source of low cost imports.
Together, these business interests pushed permanent normal trading relations for China, and they
also explain the US Treasury’s willingness to accept
China’s under-valued exchange rate. That is because
an under-valued yuan holds down the cost of goods
sourced from China and increases profits on production exported from China.
For China, the new arrangements have contributed
to spectacular economic success. Companies sourcing
and exporting from China have also reaped handsome profits. However, for the US economy it has been
18
a different story. Manufacturing has steadily bled jobs
as companies have closed factories in the face of low
cost Chinese competition, and production and investment have shifted to China. That has tempered wages
and investment spending, which helps explain the
weak economic recovery and unsatisfactory expansion. It has also eroded the US industrial base while
expanding China’s, thereby creating new national
security problems
Through its trade surpluses, China has accumulated
1.2 trillion dollars of foreign exchange reserves – mostly held in US treasury bills. Recently, China announced it will invest some of those funds in American
equities, signaling the beginning of a new chapter that
promises to further entrench existing policy.
This is because the new initiative will deepen Wall
Street’s support for current policy by offering the
prospect of huge fees and capital gains from re-investing China’s reserves. Consequently, Wall Street
will now throw its full weight behind existing policy
since the Street recognizes China needs continuing
trade surpluses if it is to invest its foreign exchange
holdings in risky assets such as equities. That augurs
badly for the US and Main Street.
Wall Street’s greatest influence is at Treasury, which
has been the leader in designing US – China economic
policy. The strong dollar policy originated at Treasury
in the 1990s, and Treasury has persistently refused to
label China a currency manipulator for fear of triggering irresistible public pressure for real action.
On top of this, Treasury Secretary Paulson – a Goldman Sachs alumnus – is actively advocating policies that risk compounding the damage to the US
economy. Thus, Treasury has consistently pushed
China to open its financial markets and let money
exit, and China has been doing just that. This benefits
Wall Street since money flows there, but it reduces
pressure on China to appreciate its currency. Worse
than that, the yuan could even depreciate if enough
Chinese wealth holders decide to exit to diversify
their portfolios against economic and political risk.
That would be disastrous for the US economy, but
good news for Wall Street.
are smart and can run government well – after all they
are rich. Put the two together, and it is easy to see why
business executives move seamlessly from Wall Street
and corporate boardrooms to top government policy
offices on Pennsylvania and Constitution Avenues.
That suggests the supply of rope will remain plentiful
and Lenin may have the last laugh.
The profit vs. country dilemma is compounded by the
political power of corporations, which has enabled
them to capture policy. In earlier eras such capture
promoted domestic monopoly and corruption in government procurement and tax policy. Today, it still
does that (look at the Bush administration), but now
it also enables corporations to push policies placing
their interests ahead of country. That is the lesson of
China.
This is a huge danger, yet it is off the political radar.
One reason is that business funds both Republicans
and Democrats, thereby silencing both. A second reason is that much of the public believes businessmen
junho de 2007
Free market societies need separation between market
and government, intermediated by constitutional democracy. In the 20th century many countries suffered
from excessive government control over market activities, and they paid a heavy price. In the 21st century
America risks paying a heavy price from the reverse
problem of allowing excessive corporate influence
over government.
(*) Founder Economics for Democratic & Open Societies Project.
Tel: 202-249-2317. E-mail: [email protected];
www.thomaspalley.com
19
Rafael Henrique Rodrigues Moreira (*)
a construção de um novo modelo
institucional para as agências
reguladoras brasileiras
junho de 2007
Este é o primeiro de uma seqüência de dois artigos a
respeito da discussão de uma nova lei para disciplinar
as agências reguladoras, com vistas ao aperfeiçoamento dos novos formatos institucionais de gestão criados
a partir do Plano Diretor de Reforma do Estado, em
1995.
A criação das agências reguladoras no início dos
anos 1990, a partir de uma nova direção do formato
institucional da administração pública brasileira por
intermédio da adoção dos processos de privatização
e desregulamentação das atividades privadas do
Estado, ampliou o debate sobre os elementos de autonomia e regulação aplicados a estes novos institutos
do direito administrativo brasileiro.
Conforme Ribeiro (2006) expõe, o descompasso entre as privatizações, a edição do marco regulatório
relativo às atividades privatizadas e a criação das
agências reguladoras têm sido apontados como a causa
fundamental dos problemas atribuídos à estrutura
do marco regulatório brasileiro. As discussões acerca
da autonomia das agências reguladoras acabam por
tratar de forma sintética variáveis importantes para o
desempenho de tais órgãos da administração pública
brasileira, tais como o controle social sobre a atuação
delas, a forma de relacionamento institucional entre
os ministérios e as agências ligadas a eles e a forma
de execução orçamentária atrelada à arrecadação de
impostos e taxas específicas dos setores regulados. A
própria criação das agências reguladoras, em descompasso com um premente redesenho da organização
administrativa do Estado, representou o início de entraves para a convivência das políticas setoriais emanadas pelos ministérios e o cumprimento de contratos
estabelecidos e avaliados pelas agências reguladoras,
20
até porque a autonomia política e administrativa conferida às agências reguladoras tinha a finalidade de
protegê-las contra ingerências políticas ou pressões
dos setores regulados. Com o fito de minimizar tais
efeitos, adotou-se um modelo institucional próximo
ao estabelecido nos países anglo-saxões, isolando os
reguladores do mercado dos órgãos formuladores de
políticas.
Dessa forma, ocorreu a criação de agências reguladoras em 3 estágios, conforme constata Martins (2004).
No primeiro estágio, compreendido no período 19951998, verificamos a criação de agências reguladoras
típicas de infra-estrutura, em áreas como petróleo,
energia e telecomunicações. Na segunda geração
(1999-2000) temos a criação de agências voltadas para
o setor de saúde (saúde suplementar e vigilância sanitária) e de fiscalização do sistema hidroviário. Por fim,
na terceira geração (2001-2005) ocorreu uma diversificação dos setores abrangidos pela regulação, o que
inclusive trouxe à baila a discussão acerca da necessidade de criação de agências reguladoras. Nesta fase
foram criadas agências para o cinema e audiovisual,
transportes terrestres e aquaviários e aviação civil. A
grande discussão sobre a criação de agências perpassou o plano das estruturas de órgãos tradicionais que
desempenham funções semelhantes às das agências
reguladoras, tais como a Superintendência de Serviços Privados (SUSEP), o Departamento Nacional de
Produção Mineral (DNPM) e a Comissão de valores
Imobiliários (CVM), para citar alguns casos.
Porém, a partir de 2003 ocorre uma inflexão na posição do governo em relação a este modelo, tendo
sido proposto à época a criação de uma lei geral para
as agências reguladoras, cujo projeto ainda está em
tramitação no legislativo, tendo sido emendado diversas vezes. (Projeto de Lei (PL) nº 3.337/2004). Este
projeto refuta a idéia de insulamento adotada para
as agências reguladoras e preconiza um controle do
tipo burocrático-formal, devolvendo à Presidência da
República e aos ministérios diversas prerrogativas
antes atribuídas às agências. O projeto propunha a
generalização dos mecanismos de controle social, a
redefinição das atribuições de ministérios e agências
e determinava os limites de controle da defesa da
concorrência entre os órgãos típicos do governo para
tal atribuição e as agências reguladoras.
tendo em vista a regulamentação das ações gerais das
agências reguladoras, dando a elas maior autonomia
administrativa e financeira. O texto é apresentado
abaixo, tendo sido aprovado em primeiro turno, incorporando as emendas dos senadores A. Mercadante
e Ney Suassuna, alterando o posicionamento original
do texto da Constituição Federal (1988) do artigo 174-A
para o artigo 175-A, conforme descrito abaixo:
Dê-se ao art. 175-A da Constituição, nos termos do art.
1º da PEC nº 81, de 2003, a seguinte redação:
“Art. 1º .............................................................
Neste ponto, um dos temas de grande controvérsia
diz respeito à autonomia política e administrativa
conferida às agências reguladoras, delimitando as
competências entre agências e outros órgãos da administração pública. Em que pese a visão de maior pe-
Neste sentido, como os investimentos em infra-estrutura diminuíram no período 2003-2006, e o governo
brasileiro passou a buscar um aumento do crescimento do PIB, os investimentos em infra-estrutura como
meio de criar as condições para maior desempenho
econômico passaram a ser um dos temas mais discutidos pelo governo, sociedade civil e entes regulados.
Ademais, ampliou-se a discussão a partir da edição do
Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que
possuía em suas bases grande monta de investimentos
em infra-estrutura.
Assim, definiu-se um projeto de emenda à constituição (PEC nº 81/2003) com origem no Senado Federal,
sujeitas a regime autárquico especial, destinadas ao
exercício de atividades de regulação e fiscalização, inclusive aplicação de sanções, com vistas ao funcionamento adequado dos mercados e da exploração
e prestação dos serviços e bens públicos em regime de autorização, concessão ou permissão, harmonizando
interesses dos consumidores, do poder público, empresas e demais entidades legalmente constituídas, observarão, em sua constituição e funcionamento,
os seguintes princípios:
I – proteção do interesse público;
II – defesa da concorrência e do direito do consumidor;
III – promoção da livre iniciativa;
IV – prestação de contas;
V – universalização, continuidade e qualidade dos
junho de 2007
netração da sociedade nos processos decisórios emanados pelas agências reguladoras, o PL significa um
retrocesso no modelo de arquitetura organizacional
inicialmente desenhado para as agências reguladoras,
o que pode gerar efeitos deletérios para a sistemática
e segurança regulatórias. Ao impor a figura de um
“ouvidor espião” e ao reduzir o espaço de atuação das
agências ao transferir para os ministérios setoriais o
poder de outorga e as políticas estratégicas voltadas
para os serviços públicos, tem-se a alta probabilidade
de politizar as ações técnicas que devem permear a
atuação de um ente regulador.
Art. 175 – A. As agências reguladoras, entidades
serviços;
VI – impessoalidade, transparência e publicidade;
VII – autonomia funcional, decisória, administrativa e financeira;
VIII – decisão colegiada;
IX – investidura a termo dos dirigentes e estabilidade durante os mandatos;
X – notória capacidade técnica e reputação ilibada
para exercício das funções de direção;
XI – estabilidade e previsibilidade das regras;
XII – vinculação aos atos normativos e a contratos.
21
Parágrafo único: Lei regulamentará o disposto
neste artigo, inclusive quanto ao controle externo
e supervisão das agências reguladoras pelo poder
executivo. (NR)”
junho de 2007
Observando o andamento da PEC n.º 81/2003, caso
a proposta de criação do art. 175-A seja aprovada,
nós teremos dois novos conceitos (agora constitucionalmente consolidados) no ordenamento jurídico
brasileiro:
a) regulação lato sensu da atividade econômica, previsto no caput do art. 174, compreendido como a
função exercida pelo Estado por intermédio de
diversos agentes, seja da administração direta
– como a Secretaria da Receita Federal –, seja da
administração indireta – como o IBAMA, a CVM
e a SUSEP. Esse conceito de Estado-regulador
pressupõe o exercício das funções de fiscalização
(poder de polícia administrativa), incentivo e planejamento;
b) agências reguladoras, entendidas como entidades
sujeitas a regime autárquico especial, destinadas ao
exercício de atividades de regulação e fiscalização,
inclusive aplicação de sanções, com vistas ao funcionamento adequado da exploração e prestação
dos serviços públicos em regime de autorização,
concessão ou permissão.
A idéia expressa na justificativa das emendas dos
senadores Aloísio Mercadante e Ney Suassuna foi
exatamente a de restringir o conceito de agência
reguladora às entidades ligadas aos setores de infraestrutura, de regulação de rede, a chamada regulação
tradicional, voltada à prestação de serviços públicos
delegados, isto é, o Estado terá agências reguladoras
(nomen juris agora exclusivo) para regular aquelas
atividades que outrora explorava diretamente e que
agora intervém de forma indireta, mediante contratos de concessão ou atos de permissão e autorização
administrativa.
Para ser restritiva, e não dar status de agência reguladora à SUSEP, CVM, IBAMA e outras entidades,
a PEC alterou a idéia original, atrelando o conceito
22
de agência reguladora aos serviços públicos delegados, retirando a proposta de criação do art. 174-A e
transpondo o seu conteúdo para o novo art. 175-A,
sistematicamente disposto, na Constituição, na parte
reservada aos serviços públicos delegados.
A idéia é clara e foi expressa nas justificativas, como
podemos observar na exposição do senador Ney
Suassuna:
“cumpre destacar que sua redação é abrangente,
permitindo que se depreenda que toda atuação estatal
nas atividades econômicas deverá ser operada por
meio de agências reguladoras.
Afinal, várias entidades exercem atribuições de
“regulamentação, habilitação e fiscalização, inclusive
aplicação de sanções” em setores diversificados da
economia que não são próprios para a instituição
de agências reguladoras.
Como exemplo, podemos citar a fiscalização exercida
pelos Ministérios do Trabalho e da Fazenda por meio
dos Fiscais do Trabalho e dos Auditores Fiscais da
Receita Federal, pelo Banco Central do Brasil no
mercado mobiliário e no Sistema Financeiro Nacional e pelo Ibama relativamente ao meio ambiente.
Em relação à regulamentação, além de muitos outros
casos, podemos citar a competência da Secretaria
da Receita Federal para regulamentar as atividades
tributárias por intermédio de instruções normativas.
Daí, pode-se inferir que se tais pressupostos fossem
ampliados para toda Administração Pública surgiriam sérios obstáculos para o seu funcionamento e
dificuldade para se encontrar um adequado desenho
institucional, além de um aumento de despesa
derivado da criação de agências reguladoras para
praticamente todos os setores de sua atuação.”
Ao avaliarmos a questão pela ótica econômica, no
que tange à teoria econômica, vale dizer que “a justificativa econômica tradicional para a regulação diz respeito
à maximização da eficiência em mercados caracterizados
pela concentração de poder econômico (e.g., monopólio ou
oligopólio) e naqueles onde as barreiras à entrada são significativas. Outras justificativas econômicas para a regulação
são as falhas de mercado relacionadas com as externalidades,
a correção de assimetrias de informação e poder, e a intervenção para facilitar a transição para regimes de mercado,
assim como a insuficiente provisão de bens públicos, e.g.,
onde há necessidade de promoção da universalização de
acesso aos serviços.”
Para que se analise a necessidade da existência de
agência reguladora, conforme destaca o texto da PEC,
primeiramente é essencial identificar a necessidade
de regulação, ou seja, do estabelecimento de meios
para exercer o controle social por meio de regras
explicitadas em leis decretos, concessões, contratos e
decisões de órgãos reguladores. O principal critério a
ser observado quando da decisão sobre a necessidade
da regulação refere-se à hipótese de existência de
falhas de mercado que justifiquem a sua intervenção
[conforme exposto acima]. Apenas nos casos que exista necessidade de regulação, de modo geral, caberá a
existência da agência reguladora. “Esta definição conceitual é fundamental para evitar que corporações burocráticas
ou grupos econômicos venham pressionar, futuramente, o
governo para a instituição de agências em seus setores de
atuação.” (Emenda à PEC nº 81/2003).
As repercussões são muitas e práticas. No próximo
artigo demonstraremos os problemas na definição de
um marco regulatório da forma como proposto inicialmente e discutido nas linhas anteriores. Veremos que
muitas agências poderiam perder o status de agência
reguladora, com implicações para os mercados os
quais elas regulam. Discutiremos também como este
modelo ampliaria o poder de atuação das agências,
bem como se dará o relacionamento entre elas e os
seus ministérios setoriais vinculados.
Referências Bibliográficas
Brasil. Projeto de Lei no 3.337/2004. Dispõe sobre a gestão, a organização e
o controle social das Agências Reguladoras, altera a Lei nº 9.986, de 18 de
julho de 2000 e dá outras providências. Disponível em <http://www.
presidencia.gov.br/CCIVIL_03/Projetos/Quadros/quadro_PL/
2004.htm>. Acesso em: 25 de abril de 2007.
_____. Senado Federal. Do parecer da CCJ - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal referente a PEC-81
de 2003 aprovado em 14/02/2007. Relator: Demóstenes Torres.
2007.
Martins, H. F. Reforma do Estado na era FHC: diversidade ou fragmentação da agenda de políticas de gestão pública. Rio de Janeiro:
EBAPE/FGV, 2004.
Ribeiro, L. D. A (in)definição do modelo institucional das agências
reguladoras no Brasil. Res Publica, v. 5, n. 1, p. 81-96, 2006.
junho de 2007
Assim, a atividade regulatória por meio de órgãos
reguladores independentes deveria se restringir
apenas aos mercados que possuem as características
expostas acima e, especialmente, em serviços públicos
em regime de autorização, permissão ou concessão no
âmbito da União .
Banco Central que, além de responsável pela política
monetária, exerce a fiscalização do Sistema Financeiro Nacional e da Comissão de Valores Mobiliários
(CVM) sobre o mercado de capitais.”
A justificativa apresentada pelo senador Aloísio Mercadante também é enfática, ao destacar:
“Com essa nova redação, excluem-se da proposta
outras atividades estatais que poderiam ser
enquadradas como “atividades regulatórias”,
como, por exemplo, atos de fiscalização, regulamentação e habilitação, característicos do
poder de polícia do Estado e que são exercidos
pela Administração Pública direta ou indireta.
Ilustrativos são os poderes de fiscalização exercidos
pelos Ministérios do Trabalho, por meio dos fiscais do
trabalho, dos auditores fiscais da Receita Federal, do
(*) Mestre em economia pela FEA/USP, Especialista em Regulação da
Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL).
E-mail: [email protected].
O autor agradece ao Prof. Dr. Gilberto Tadeu Lima pela
sugestão de publicação neste boletim Informações FIPE.
23
Daniela Corrêa (*)
Gilberto Tadeu Lima (**)
o sucesso de empresas brasileiras na
internacionalização produtiva: as
experiências da Marcopolo e do
Grupo Gerdau
junho de 2007
1. Introdução
A seqüência de três artigos que finda com este focaliza
as experiências de internacionalização das empresas
brasileiras Marcopolo e Grupo Gerdau. No primeiro
artigo (Corrêa e Lima, 2007a) realizamos uma caracterização geral do investimento direto brasileiro no
exterior (IDBE), de acordo com dados obtidos por meio
do Censo de Capitais Brasileiros no Exterior, do Banco
Central do Brasil (BCB). No artigo seguinte (Corrêa e
Lima, 2007b) são feitas análises de determinantes da
internacionalização produtiva e dados gerais sobre a
internacionalização das empresas brasileiras. Neste
último artigo, por sua vez, abordam-se as experiências de internacionalização da Marcopolo e do Grupo
Gerdau.
2. A Experiência da Marcopolo e do Grupo Gerdau
A Marcopolo e o Grupo Gerdau já têm posição consolidada no mercado internacional, estando entre as
grandes empresas mundiais de seus setores representativos. Atualmente, parte significativa da produção
e das receitas dessas empresas provém de suas atividades no exterior.
Marcopolo
A Marcopolo é uma das principais fabricantes mundiais de carroceria de ônibus e recentemente passou
também a atuar nos segmentos de veículos comerciais
leves (LCV), peças e componentes, e no de produtos
plásticos. O processo de produção da Marcopolo
está estruturado de maneira totalmente verticalizada, sendo a empresa responsável pela produção de
24
poltronas, janelas, portas, ar-condicionado, e todos
os demais componentes dos ônibus e carrocerias. A
empresa foi fundada em 1949, em Caxias do Sul, Rio
Grande do Sul, e em 1961 a Marcopolo já exportara
seu primeiro ônibus para o Uruguai, quando ainda era
uma pequena empresa. Atualmente, a empresa tem
fábricas próprias no Brasil, em Portugal, na Argentina,
no México, na Colômbia, na África do Sul e na Índia,
além de ter um contrato de transferência de tecnologia com a Iveco na China. Sua produção é vendida
no Brasil, e exportada para mais de oitenta países. A
atual capacidade de produção é de 110 ônibus/dia, com
um quadro funcional composto por cerca de 11.000
trabalhadores no Brasil e 5.650 no exterior.
A linha de produtos da empresa abrange os modelos
rodoviários, os microônibus, e a linha Volare, constituída de diversos modelos de veículos, comercializados
completos, sendo cada produto projetado e desenvolvido internamente de acordo com as necessidades próprias de nichos específicos de mercado. A fabricação
de carrocerias é realizada em três unidades no Brasil,
sendo duas em Caxias do Sul (RS) e outra em Duque
de Caxias (RJ). Em São José dos Pinhais (PR), a Marcopolo mantém a controlada MVC – Componentes
Plásticos Ltda., fabricante de componentes plásticos de
alta tecnologia, com duas unidades fabris no Brasil e
uma no México. Em 2005, a Marcopolo participou com
42,8% da produção brasileira de ônibus e carrocerias
e entre 6,0% e 7,0% da produção mundial.
No que se refere à produção mundial da companhia,
as 16.456 unidades fabricadas em 2005 representaram
uma evolução de 3,3% sobre a produção de 2004, exercício encerrado com um crescimento de 11,0% sobre
2003. Da produção total, 7.311 unidades, ou 44,4%,
foram comercializadas no mercado doméstico, e as
restantes 9.145, ou 55,6% do total, foram exportadas
ou fabricadas e comercializadas pelas unidades no
exterior. O Gráfico 1 indica a evolução da produção
comercializada no mercado externo, tanto via exportações como por meio da comercialização nos países
onde estão localizadas as subsidiárias de empresa
brasileira.
gráfico
1 – produção
comercializada
Gráfico
1: Produção
comercializada
no exterior no
exterior
Produção exterior/exportações
(unidades físicas)
9145
5628
5670
7049
8200
do modelo urbano Viale, a Marcopolo Portugal foi
reposicionada, e busca agora aumentar sua participação em toda Europa.
Atualmente a Marcopolo Portugal exporta para países
como Bélgica, Holanda, Inglaterra, Islândia, Escócia,
França e Espanha, mercados nos quais são necessários anos de experiência e história para absorver suas
particularidades. O mercado europeu de ônibus tem
se mantido estável nos últimos anos, e o número de
competidores é elevado, fatores que, conjugados, resultaram em uma operação relativamente pequena
no país, onde são produzidas apenas 20 unidades por
mês, em média.
Em 1991, a Marcopolo iniciou o seu processo de internacionalização com a instalação de sua primeira
fábrica fora do Brasil, localizada na cidade de Coimbra,
em Portugal. De acordo com a empresa, em razão da
participação do país no bloco econômico da Comunidade Européia, nos seus primeiros anos de atuação,
a Marcopolo Portugal concentrou-se na prospecção
de mercados, pesquisando as necessidades do consumidor europeu, para posteriormente desenvolver
um produto que atingisse os índices de satisfação do
usuário final nos conceitos de design, funcionalidade,
conforto e segurança. Outros modelos da marca Marcopolo foram sucessivamente ajustados para atender
às normas dos países europeus, e em 2004, com
linhas de produção renovadas e com o lançamento
Em 2000, dando continuidade ao processo de internacionalização da empresa, a Marcopolo firmou
joint venture com a maior fabricante de carrocerias da
Colômbia, a Carrocerias Superior, conhecida como
Superbus, e constituiu a Superpolo. Instalada na zona
industrial ao sul de Bogotá, nas antigas instalações
da Superbus, a tecnologia e responsabilidade técnica
foram, então, adaptadas ao sistema Marcopolo de
produção. Atualmente a Superpolo, com 50% de
participação da Marcopolo e 50% Superbus, fabrica
produtos específicos para a região do Pacto Andino, e
tem um bom desempenho naquele mercado. A fábrica,
que produziu 375 unidades em 2001, no ano de 2005
chegou a produzir 1.894 unidades. Uma nova fábrica
foi inaugurada no de 2006, com capacidade de pro-
2001
2002
2003
2004
2005
2006*
* estimativa.
*estimativa
Fonte:
elaboração
pópria com
base em
dados
Fonte:
elaboração
própria
com
baseinstitucionais
em dados(www.marcopolo.com.br)
institucionais (www.
marcopolo.com.br).
junho de 2007
No exercício de 2005, a receita líquida consolidada
alcançou R$ 1.709,1 milhões, 6,5% superior à de 2004.
O mercado interno contribuiu com R$ 760,8 milhões,
0,3% superior à do exercício anterior e com 44,5% da
receita líquida total. As exportações e negócios no
exterior alcançaram R$ 948,3 milhões, ou 55,5% da
receita do exercício, e um crescimento de 12,0% em
relação a 2004.
A fábrica mexicana, por outro lado, é a operação
internacional mais bem-sucedida da Marcopolo. A
Polomex foi fundada em 1999, na cidade de Aguas
Calientes, no México. Em 2001, a Evobus, divisão da
DaimlerChrysler, adquiriu 26% de participação de
seu capital societário, e a partir de então a linha de
produção foi transferida para a cidade de Monterrey,
na unidade fabril da Mercedes-Benz México. Esta
operação viabilizou a produção e entrega aos clientes
de produtos com garantia unificada e integral, uma
vez que carroceria e chassi tornaram-se objetos de
uma venda conjunta. A produção em 2001 foi de 1.423
unidades, e em 2005 chegou a 3.200 unidades. A localização da empresa no México oferece à Marcopolo
acesso direto a outro mercado comum, o NAFTA.
0
25
junho de 2007
dução de 15 ônibus por dia, que permitirá à empresa
produzir até 4.000 veículos por ano.
Também no ano de 2000, a Marcopolo firmou uma
parceria com a Scania South Africa Pty Ltd., localizada na cidade de Pitersburg, na África do Sul, para
o fornecimento de tecnologia e gestão industrial na
produção do ônibus urbano Torino para aquela região.
No final de 2001, a empresa instalou fábrica própria
na cidade de Johanesburgo. O sistema de transporte
segue o sistema RHD (direção do lado direito), e os
produtos Marcopolo são adaptados para atender a
esta especificidade. Em 2001, a fábrica produziu 120
unidades, e fechou 2005 com uma produção de 406
unidades, ano em que o desequilíbrio cambial rand/
dólar prejudicou as atividades da empresa no país.
As perspectivas de crescimento para os próximos
anos, porém, mostram-se favoráveis, de acordo com
informações da própria empresa. A fábrica instalada
na África do sul aproveita-se do mercado comum
não-oficial, o Cone Sul da África. Esta, aliás, é uma
preocupação demonstrada pela empresa: procurar
instalar suas filiais em países inseridos em algum tipo
de mercado comum.
A Marcopolo entrou no mercado chinês em 2001, por
meio de um contrato de licenciamento com a Iveco, e
tem planos de criação de uma fábrica de componentes nos próximos anos. O mercado chinês tem uma
demanda extremamente elevada, mas a competição
também é bastante acirrada, e há uma série de restrições quanto à atuação. Essas restrições, que vão
desde restrições de cunho legal até a acessibilidade ao
mercado (no sentido de tornar o produto conhecido)
apontam para a necessidade de realização de uma
aliança estratégica naquele país, que ao que tudo
indica não será realizada com a atual parceira.
No início de 2006, a Marcopolo, por meio de sua controlada Ciferal Indústria de Ônibus Ltda., firmou uma
joint-venture com a maior montadora russa de veículos,
a Ruspromauto. A empresa operará na montagem e
comercialização de ônibus rodoviários para atender
ao mercado russo e ao de exportação. O investimento
previsto é de US$ 6,5 milhões. A Ciferal participará
26
com 50% do capital social e a Ruspromauto com outros 50%, sendo a gestão compartilhada pelas duas
empresas. Na joint-venture, a Marcopolo fornecerá
a tecnologia para a montagem das carrocerias, e a
Ruspromauto fornecerá os chassis e as instalações
industriais para a nova empresa. A operação foi iniciada em setembro, e está prevista a produção de 200
unidades até o final deste ano. A previsão para 2007
é produzir cerca de 450 unidades e atingir entre 750
a 1.000 veículos em três anos. Os componentes para
fabricação dos ônibus serão, em uma primeira fase,
exportados do Brasil, mas ainda em 2006 a joint- venture pretendia iniciar o processo de desenvolvimento
e aquisição de componentes na Rússia.
O movimento mais recente de internacionalização
da empresa resultou na penetração da Marcopolo no
mercado indiano. Trata-se da joint-venture realizada
entre a Marcopolo e a Tata Motors, a maior companhia
indiana no setor automotivo, para a montagem e comercialização de ônibus rodoviários, urbanos, minis
e microônibus, com o objetivo de atender à demanda
indiana, além de produzir para a exportação. A joint
venture representa investimentos iniciais de US$ 13,3
milhões, com 51% de participação da Tata Motors e
49% da Marcopolo – sendo a gestão compartilhada
pelas duas empresas – e estará baseada na Índia. A
Tata Motors fornecerá o chassi e será responsável
pela comercialização dos ônibus completos. A Marcopolo, por sua vez, contribuirá com sua experiência
internacional, processos e sistemas para produção
de ônibus e também com a tecnologia em projetos e
desenvolvimento de novos modelos.
Pela Tabela 1, que apresenta dados da produção total
consolidada para os anos de 2004 e 2005, verifica-se
que a produção no exterior já responde por quase 35%
do total produzido pela empresa. Mais significativo,
talvez, seja ressaltar que enquanto a produção no Brasil recuou 6,5% em 2005, em relação ao ano anterior,
no exterior, ela apresentou uma expansão de quase
30%, fato que corrobora a importância da estratégia
de expansão rumo ao exterior da empresa. A variação
de mais de 50% na produção da fábrica mexicana é o
maior destaque do período.
tabela 1 – Marcopolo - produção mundial consolidada
Empresas/ Ano
BRASIL
Marcopolo
Ciferal
SUBTOTAL
Eliminação KD’s* exportados
TOTAL NO BRASIL
EXTERIOR
México
Portugal
África do Sul
Colômbia
TOTAL NO EXTERIOR
TOTAL GERAL
2005
11.301
3.123
14.424
3.586
10.838
3.200
224
300
1.894
5.618
16.456
2004
11.494
3.085
14.579
2.990
11.589
2.102
176
406
1.665
4.349
15.938
Variação (%)
-1,7%
1,2%
-1,1%
19,9%
-6,5%
52,2%
27,3%
-26,1%
13,8%
29,2%
3,3%
Fonte: Elaboração própria; dados da empresa.
* produtos inteiros ou suas partes.
Gerdau
A Tabela 2 fornece um bom indicativo do grau de
internacionalização do Grupo Gerdau. Os números
relativos à produção no exterior, assim como o de usinas localizadas fora do Brasil, são maiores do que os
números internos. Em relação ao destino das exporta-
tabela 2 – distribuição geográfica das atividades
Brasil
Exterior
Toneladas de aço bruto*
Toneladas de produtos laminados*
Usinas siderúrgicas
Centros de serviços de corte e dobra
Unidades de transformação e seções
especiais
9
5,5
11
12
9,7
10,5
21
44
6
17
Pontos de venda comercial e centros de
serviços para ações planos
74
2
Fonte: Elaboração própria, com base no Gerdau Fact Sheet,
23/11/2006.
*unidade: milhões de toneladas.
O marco inicial do processo de internacionalização
do grupo Gerdau remonta a 1980, quando o Grupo
adquiriu a Siderúrgica Laisa, no Uruguai. O crescimento internacional avançou para o Canadá, em
1989, com a siderúrgica Courtice Steel, em Cambridge,
província de Ontário. Três anos mais tarde, em 1992,
a Gerdau começou a produzir aço no Chile, por meio
da Siderúrgica AZA. Em 1995, o grupo reforçou sua
posição no Canadá, por meio da aquisição da segunda
planta industrial no país, a MRM Steel, em Winnipeg,
Manitoba. Em 1997, o grupo começou a operar na
Argentina com sua primeira unidade própria: a laminadora de aços longos Sipsa – Sociedad Industrial
Puntana S.A.
junho de 2007
A Gerdau, empresa fundada em 1901, é atualmente a
maior produtora de aços longos das Américas e o 14º
maior grupo siderúrgico do mundo, com uma capacidade instalada de 19,6 milhões de toneladas de aço
por ano. Está presente no Brasil, Argentina, Canadá,
Chile, Colômbia, Espanha, Estados Unidos, Peru,
Uruguai, México e República Dominicana, contabilizando 38 unidades siderúrgicas. O foco de atuação
da empresa é o setor siderúrgico, e atende aos mercados da construção civil, indústria e agropecuária. A
maioria de suas operações é baseada no conceito de
market mills, segundo o qual os insumos são comprados
localmente e os produtos entregues predominantemente nas mesmas regiões onde são produzidos, daí
a necessidade de expandir o número de plantas em
diferentes localidades. Em 1995, iniciou-se um processo de reestruturação societária do Grupo, concluído
em 1997, em que foram incorporadas 28 empresas, e
as seis companhias de capital aberto foram reduzidas
a apenas duas: a Gerdau S.A. e a holding Metalúrgica
Gerdau S.A., imprimindo maior transparência no
relacionamento com o mercado de capitais.
ções, destaca-se a participação do continente asiático,
que em 2005 respondeu por 44% das exportações do
Grupo. Na seqüência vêm os países da América do Sul,
com participação e 19%, América Central, 13%, Europa, 11%, África e América do Norte, que representam,
respectivamente, 8% e 5% do destino das exportações.
Em relação aos indicadores de faturamento, cerca de
51,8% de toda a receita de faturamento do ano de
2005 teve origem no Brasil, 42,5% nos Estados Unidos e Canadá, e 5,7% na Argentina, Chile, Colômbia
e Uruguai.
Em maio de 1998, o Grupo aumentou sua participação
no mercado argentino, por meio da associação com
a laminadora Sipar Aceros S.A. Em 1999, a Gerdau
inaugurou uma nova siderúrgica no Chile – a Gerdau
Aza – com capacidade instalada de 360 mil toneladas
de aço por ano. Em setembro do mesmo ano, a estra-
27
junho de 2007
tégia de expansão internacional do grupo atingiu um
novo patamar, com o controle da AmeriSteel, segunda
maior produtora de vergalhões dos Estados Unidos e
terceira em barras e perfis, com capacidade de produção de 2 milhões de toneladas de aço.
28
Em janeiro de 2002, o Grupo Gerdau assumiu a
Siderúrgica Birmingham Southeast, contabilizando
sua quinta usina nos Estados Unidos. A conclusão do
negócio aumentou sua capacidade de produção de 2,7
milhões de toneladas de aço/ano. Em agosto, o Grupo
Gerdau e a Co-Steel anunciam acordo, concluído em
outubro, para a fusão das operações siderúrgicas na
América do Norte. A nova organização passou a denominar-se Gerdau Ameristeel Corporation, cabendo
à Gerdau 67,5% das ações e o controle da gestão. A
fusão criou uma siderúrgica com 10 usinas nos EUA
e Canadá, com produção de 6,8 milhões de toneladas
anuais de itens acabados, além de uma joint venture no
segmento de aços planos, cujo mercado-alvo é o leste
do território americano.
Em 2004, o Grupo Gerdau anunciou a assinatura do
contrato de compra e venda para a aquisição de todos
os ativos da Potter Form & Tie Co., líder no suprimento
de vergalhões cortados e dobrados e outros materiais
para a indústria de concreto armado no Meio-Oeste
norte-americano. Em julho, a Gerdau Ameristeel
Knoxville investiu US$ 12 milhões em um programa
de modernização, para garantir a plena capacidade
de operação da usina, localizada no Tennessee. Dois
meses depois, a Gerdau Ameristeel, responsável
pelas operações do Grupo nos Estados Unidos e no
Canadá, assinou um contrato para assumir quatro
usinas produtoras de aços longos da North Star Steel.
Com a operação, o Grupo Gerdau intensificou sua
participação no processo de consolidação do setor siderúrgico norte-americano, possibilitando aos clientes
maior cobertura geográfica e uma linha mais ampla
de produtos. Com as novas unidades, a capacidade
instalada do Grupo na América do Norte aumentou
em 1,7 milhões de toneladas de aço por ano, passando
para 8,3 milhões de toneladas.
Ainda em 2004, a Gerdau Ameristeel anunciou a assinatura do contrato de compra e venda para aquisição
de todos os ativos da Gate City Steel, Inc. e da RJ Rebar,
Inc., líderes no suprimento de vergalhões cortados e
dobrados, no Meio-Oeste e no Sul dos EUA. No início
de novembro, o Grupo concluiu a aquisição dos ativos
da North Star Steel. A Gerdau Ameristeel Corporation,
por meio de sua subsidiária operacional nos Estados
Unidos, Gerdau Ameristeel US Inc., adquiriu da
Cargill Incorporated, e subsidiárias, os ativos fixos e
o capital de giro de quatro usinas produtoras de aços
longos; três unidades de processamento de fio-máquina; e uma unidade produtora de corpos moedores em
aço para a indústria de mineração, proporcionando
aos clientes a expansão da cobertura geográfica e uma
linha de produtos mais abrangente. Em dezembro daquele ano, o Grupo ampliou sua atuação internacional
para mais um país na América do Sul, a Colômbia,
assinando um acordo para tornar-se acionista das
empresas Diaco S.A. e Siderúrgica del Pacífico S.A.
– Sidelpa, num processo de aquisição escalonada das
participações do Grupo Mayagüez e da The Latinamerican Enterprise Steel Holding, detentores do controle
majoritário das companhias.
No ano seguinte, em setembro, o Grupo Gerdau
consolidou o controle acionário da Sipar Aceros, laminadora de aços longos localizada na Província de
Santa Fé, na Argentina, com a aquisição de 35,98%
das ações da empresa, elevando sua posição para
74,44% do capital social da companhia. Dois meses
depois, o Grupo anunciou a ampliação de duas usinas
siderúrgicas localizadas na Colômbia, prevendo um
crescimento na produção de 50% em três anos, passando de 400 mil toneladas para 600 mil toneladas.
As duas unidades estão voltadas ao mercado interno
e atendem aos setores da indústria e construção civil.
Em novembro de 2005, o Grupo Gerdau, o Grupo Santander e executivos espanhóis anunciaram a aquisição
da Corporación Sidenor S.A., principal produtora de
aços especiais, forjados e fundidos da Espanha. A
Sidenor atende principalmente ao mercado europeu,
com destaque para a indústria automotiva. Possui três
usinas siderúrgicas no norte do país e duas unidades
de forja para estampa. A empresa também detém
58,44% de participação na Aços Villares, atuante no
segmento de aços especiais e detentora de plantas
siderúrgicas nas cidades paulistas de Mogi das Cruzes,
Pindamonhangaba e Sorocaba. Esta nova participação acionária representou a entrada da Gerdau no
mercado da União Européia e significa a abertura
de um importante canal entre os grandes produtos
automobilísticos internacionais.
Em março de 2006, o Grupo anunciou a aquisição dos
ativos da Callaway Building Products, com sede em
Knoxville, Tennessee, nos Estados Unidos. A Callaway
fornece vergalhões cortados e dobrados à indústria da
construção civil no leste dos Estados de Tennessee e
do Kentucky e também nos Estados da Carolina do
Norte, Virgínia e Geórgia. No mesmo mês, a Gerdau
Ameristeel anunciou a aquisição da Fargo Iron and
Metal Co., com sede em Fargo, Dakota do Norte. A
Fargo atende à indústria siderúrgica na área de armazenamento e processamento de sucata.
Em novembro de 2006, a Gerdau Ameristeel concluiu
a aquisição de uma participação majoritária na jointventure formada com a Pacific Coast Steel, Inc. e a
Bay Area Reinforcing. Esta joint venture, chamada de
Pacific Coast Steel, é uma das maiores fornecedoras
de aço cortado e dobrado dos Estados Unidos, especializada em serviços de corte e dobra e montagem de
produtos de aço em diversos projetos de construção
Neste ano de 2007, mais duas operações internacionais
foram realizadas pelo grupo: a aquisição do controle do Grupo Feld, holding da siderúrgica mexicana
Tultitlán,1 em março, e a formação de uma aliança
estratégica com a empresa Industrias Nacionales, C.
por A. (Inca), da República Dominicana, no mês de
maio. A Tultitlán está localizada na Cidade do México,
e tem capacidade instalada de 350.000 toneladas de
aço e 330.000 toneladas de laminados, com produção
voltada para o mercado interno. O México é o terceiro
maior produtor de aço no continente americano. O valor desembolsado pela totalidade das ações do grupo
Feld foi de US$ 259 milhões, e o acordo está sujeito à
aprovação dos órgãos de regulação da concorrência
mexicana.
Na República Dominicana, o Grupo Gerdau adquiriu
30,45% de participação societária na holding Multisteel
Business Holdings Corp, que possui 98,57% da Inca.
Esta operação faz parte da estratégia do grupo de
crescer nas Américas, segundo seu diretor-presidente
André Gerdau Johannpeter.2 A Inca é uma laminadora
de aços longos, e fabrica ainda malhas de aço, arames
galvanizados, telas, pregos e grampos, além de tubos e
conexões de PVC. A empresa vende anualmente cerca
de 400 mil toneladas de produtos de aço.
junho de 2007
Em junho, o Grupo conclui a aquisição da totalidade
das ações da Sheffield Steel Corporation, de Oklahoma (EUA), siderúrgica que produz aços longos, e
vende, a cada ano, aproximadamente 550 mil toneladas de aço. Entre os principais produtos da Sheffield
Steel estão os vergalhões e as barras, utilizadas na
construção civil. No mesmo mês, o Grupo obteve o
controle acionário da Empresa Siderúrgica del Perú
(Siderperú), com a compra de 50% do seu capital social
mais uma ação. A Siderperú, com fábrica localizada
na cidade de Chimbote, ao norte de Lima, é a maior
siderúrgica do país, com vendas anuais de aproximadamente 360 mil toneladas de produtos acabados e 2
mil colaboradores.
na Califórnia e Nevada. Além disso, a Corporación Sidenor alcançou um acordo definitivo para a aquisição
da totalidade das ações de emissão da GSB ACERO,
S.A., empresa que produz aproximadamente 200 mil
toneladas de aços especiais por ano, localizada em
Guipúzcoa, Espanha.
A internacionalização do Grupo Gerdau contribuiu fortemente para os bons resultados atingidos no primeiro
trimestre deste ano. De acordo com dados divulgados
pela empresa, 3 o faturamento de janeiro a março, R$
7,5 bilhões, superou em 13,5% os R$ 6,6 bilhões registrados no mesmo período de 2006. Esse crescimento
seria justificado principalmente pela incorporação de
cinco novas empresas a partir do segundo trimestre
de 2006 – sendo quatro nos Estados Unidos4 e uma no
Perú (Siderperú). Além disso, a Corporación Sidenor,
companhia espanhola da qual o grupo detém 40% de
participação, passou a controlar a GSB Acero.
29
3. Considerações Finais
junho de 2007
Marcopolo e Gerdau podem ser consideradas pioneiras no processo de internacionalização produtiva em
seus ramos de atividade. Como mencionado anteriormente, o primeiro passo da Gerdau rumo ao exterior
foi dado ainda na década de 1980, com a aquisição de
uma siderúrgica no Uruguai, e o da Marcopolo, em
1991, com a entrada no mercado português. Ao longo
dos anos, essas empresas diversificaram de forma
significativa seu posicionamento global, e já contam
com unidades espalhadas por diversos continentes.
Atualmente, cerca de 55% da receita da Marcopolo e
48% do faturamento da Gerdau são provenientes de
suas atividades no exterior.
As trajetórias desenvolvidas pelas empresas corroboram algumas proposições dos autores que estudaram
o processo de internacionalização produtiva das
empresas, conforme apresentado em Corrêa e Lima
(2007b). A representatividade das empresas no âmbito
nacional, por exemplo, é um condicionante relevante
da entrada das empresas no mercado internacional,
como sugeriram Iglesias e Veiga (2002). Tanto Marcopolo quanto Gerdau eram grandes empresas nacionais, e já haviam iniciado a atividade exportadora
quando decidiram iniciar sua internacionalização
produtiva.
2 Segundo a assessoria de imprensa do Grupo Gerdau (Sala de
Imprensa, 25/05/2007). www.gerdau.com.br.
3 Sala de Imprensa, 03/05/2007.
4 Callaway Building Products, Fargo Iron and Metal Company,
Sheffield Steel e a joint venture Pacific Coast Steel.
Referências Bibliográficas
Cantwell, J.; Tolentino, E. Technological accumulation and Third World
Multinationals. University of Reading, 1990. Mimeografado.
Chudnovsky, D.; Lopez, A. (eds.). Las multinacionales latinoamericanas:
sus estrategias en un mundo globalizado. Buenos Aires: Fondo
de Cultura Económica, 1990.
Corrêa, D.; Lima, G. T. Internacionalização produtiva de empresas
brasileiras: caracterização geral e indicadores. Boletim Informações
Fipe, N. 319, abril, 2007a.
_______. Internacionalização Produtiva de empresas brasileiras:
determinantes e comportamento recente. Boletim Informações
Fipe, N. 320, maio, 2007b.
Iglesias, R.; Veiga, P. M. Promoção de exportações via internacionalização das firmas de capital brasileiro. In: Pinheiro, A. C.;
Markwald, R.; Pereira, L. V. (orgs.), O desafio das exportações. Rio
de Janeiro: BNDES, 2002.
Em relação à localização dos primeiros investimentos no exterior, a experiência da Gerdau sustenta a
hipótese de Chudnovsky e Lopez (1999), de que em
uma primeira etapa, as empresas sediadas em países
em desenvolvimento tendem a investir em países de
nível semelhante de desenvolvimento, mas o caso
da Marcopolo, por sua vez, sustenta a proposição de
Cantwell e Tolentino (1990), que diz que as empresas
dos PEDs são capazes de desenvolver tecnologias
inovadoras que as capacitem a investir em qualquer
mercado.
1 E também da Ferrotultitlán, S.A. de C.V. e da Arrendadora Valle
de México, S.A. de C.V. A Ferrotultitlán, S.A. de C.V. é uma comercializadora de produtos de aço e a Arrendadora Valle de México,
S.A. de C.V. uma empresa imobiliária que tem em seus ativos os
terrenos e prédios da Siderúrgica Tultitlán, S.A. de C.V.
30
(*) Economista pela FEA-USP e Mestranda em Economia pelo
IE-UFRJ. E-mail: [email protected].
(**) Professor do Departamento de Economia da FEA-USP.
E-mail:[email protected].
Cristina F. B. Reis (*)
Fernanda G. Cardoso (**)
determinantes da inflexão das trajetórias
de desenvolvimento econômico: estudo
dos casos de Austrália, Canadá e
Argentina – parte I
1. Introdução
Fundamentado numa retomada histórico-analítica
da trajetória socioeconômica da Austrália, do Canadá
O artigo será apresentado em duas partes, que serão
publicadas em distintas edições do presente boletim.
Na primeira, serão relatadas brevemente as histórias
de desenvolvimento desses países desde o momento
em que deixaram a condição de colônia até a década
de 1930. A apresentação de cada trajetória econômica destacará os respectivos modelos de inserção
internacional – fatores externos – e seus aspectos
políticos e econômicos – fatores internos. A segunda
parte analisará comparativamente essas trajetórias de
desenvolvimento econômico, enfatizando os fatores
determinantes para que tais países tenham atingido
resultados tão diversos.
Noel Butlin (1956) chamou a condução da colonização inglesa na Austrália de socialismo colonial. Este
termo é usado para designar o caráter de intervenção
positiva do governo, cuja pretensão principal seria
a formação de capital via relação particular entre
governo e instituições privadas, como prevaleceu na
economia australiana a partir da segunda metade do
século XIX. A Austrália apenas recebeu este nome
após o Commonwealth em 1901. Até então, eram seis
colônias autônomas entre si – New South Wales, Tasmania, Victoria, South Austrália, Western Austrália e Northern
Austrália –, mas subordinadas à Coroa inglesa.
Nas regiões de clima mais temperado desenvolveuse principalmente a pecuária ovina e plantação de
trigo. Estes produtos atendiam à demanda interna
plenamente e o excedente era exportado. Os usos
derivados, como farinha, tecido, manteiga, cerveja,
fomentaram a produção manufatureira. A descoberta
do ouro na segunda metade do século XX acelerou a
urbanização e promoveu uma “marcha para o oeste”
que incentivou a expansão do mercado interno. Esta
expansão propiciou aumento da produção agrícola e
de manufaturas, ampliou a produção de carvão e a
exportação de minérios, além de ter intensificado o
comércio e a provisão de serviços públicos.
junho de 2007
e da Argentina, o presente artigo investiga por que
tais países atingiram resultados econômicos e sociais
tão distintos. A escolha dos países se baseou no fato
de eles terem sido domínios temperados britânicos,
sendo a Argentina um domínio “informal”. Outros
domínios poderiam ser citados, como a Nova Zelândia
e os Estados Unidos, no entanto, optou-se pela Austrália, Canadá e Argentina porque eles estavam em
estágio semelhante de desenvolvimento no momento
de partida da análise. Pretende-se demonstrar que as
estratégias adotadas por suas respectivas elites implicaram distintas dinâmicas internas de crescimento a
partir do início do século XX. Para entender a escolha
das estratégias de desenvolvimento de cada país efetuou-se uma combinação analítica dos condicionantes
externos e internos.
2. A História de Desenvolvimento Econômico da Aus trália
Desde o primeiro século de colonização o governo
mantinha um alto nível de planejamento econômico
e representava equilibradamente as classes mais importantes da sociedade. Investia em infra-estrutura
31
junho de 2007
e setores importantes para a condução do desenvolvimento. A atuação do governo colaborou para a
afirmação do modelo de crescimento conduzido por
exportação primária (cujos principais produtos eram,
em ordem de importância, a lã, o trigo e a carne),
manutenção de alto nível de salários e monopólio
estatal em transporte e comunicação. A administração
colonial também atuava orientando o investimento
privado por meio do seu sistema de taxação, vendas
de terra, venda de debêntures, transações bancárias
e direta competição por capital em Londres. Shaw
(1944) afirma que o governo protegeu a indústria
infante – notadamente a de produtos derivados agrícolas e de consumo diário – principalmente por meio
de tarifas sobre importados.
A terra era um fator abundante e propriedade da Coroa inglesa, que as vendia, arrendava e/ou concedia.
As leis eram mais favoráveis à pequena propriedade,
concedendo condições melhores para quem comprasse este tipo de terreno. A divisão das terras e
sua comercialização foram muito relevantes para a
formação das classes sociais, pois não se permitiu que
uma grande classe latifundiária emergisse. O trabalho era um fator escasso e requeria imigração inglesa
constante para a Austrália. Por falta de trabalhadores
e pelos seus custos elevados, a produção agrícola
requereu aumento de produtividade via inovações
tecnológicas, muitas delas produzidas internamente.
O nível de emprego foi historicamente alto e os salários cresciam a taxas estáveis. A economia aurífera
aumentou o poder político dos trabalhadores, que
exerciam pressão real desde 1840, e a partir de 1870 os
governos coloniais passaram a regular a base mínima
de salários e reajustes.
A oferta de capital nas colônias australianas era feita
preponderantemente por meio de empréstimos da
Inglaterra, uma vez que a moeda de todo o império
era a libra, não emitida localmente. Segundo Butlin,
entre 1860 e 1890 dois terços da formação bruta de
capital foram feitos com capital inglês. A terça parte da
formação de capital restante provinha de exportações,
cujas vendas entre 1861 e 1890 eram cerca de 75% para
a Inglaterra. A Austrália possuía alta propensão a importar, mais ou menos na mesma ordem de valor das
exportações. O Estado e a iniciativa privada tiveram
pesos semelhantes na formação de capital bruto, que
se concentrou em ferrovias e máquinas agrícolas, o
que contribuiu para a expansão da demanda doméstica. O principal investimento do governo eram as
ferrovias, que a partir de 1890 passaram também a
ser a principal fonte de receita, substituindo as tarifas
aduaneiras.
tabela 1 – composição da formação de capital na Austrália (milhares de libras)
Ano
1861
1870
1880
1890
1900
FBC Privada
FBC Governo
Residencial
Agrícola e pastoril
Outros
Ferrovias
Comunicação
Autoridades locais
Outros
1506
2792
3595
7726
851
1198
1205
6054
2965
1725
449
659
2370
3816
714
1252
857
3785
5775
2371
880
473
1455
1776
1631
387
901
1362
3813
2948
541
484
1329
2703
2027
Fonte: Butlin ( 1956).
A especulação financeira proveniente da securitização
de fundos de terras australianos agravou a crise de
capitais deflagrada pela falência do Banco Baring em
1890. O período entre 1890 e 1900 foi marcado pela
crise, que pressionou a campanha a favor da federalização da Austrália. Em 1901 o parlamento inglês
aprovou o Commonwealth e uma nova constituição.
32
O Commonwealth unificou as seis colônias inglesas
no domínio então denominado Austrália. A Coroa
inglesa concedeu autonomia sobre defesa, moeda,
tarifas e relações internacionais. As seis colônias tornaram-se Estados, os quais possuíam autonomia sobre
os gastos públicos, mas deviam repassar um quarto
da arrecadação ao governo federal. Segundo Wright
(2003), após a federalização das colônias a indústria
manufatureira acelerou bastante. Na primeira década
do século XX, o investimento na indústria secundária
mais do que dobrou e em 1914 o valor da produção
industrial já rivalizava com o do setor rural.
Aitken (1956) observa que o Estado canadense desempenhou um papel fundamental no direcionamento e
estímulo do desenvolvimento. O papel desempenhado pelo Estado no desenvolvimento de uma economia transcontinental foi evidente: tais medidas são
conhecidas como “Política Nacional” e se referem ao
sistema de tarifas protecionistas adotadas em 1878 e
à estratégia de expansionismo defensivo adotada pelo
novo governo federal depois de 1867. No cerne da “Política Nacional” estava a determinação de fortalecer
o eixo leste-oeste do Canadá por meio da construção
de uma ferrovia transcontinental. O Canadá central
– as províncias de Ontário e Quebec – seria o centro
manufatureiro e financeiro do novo domínio, e pela
estrada transcontinental os bens manufaturados poderiam ser vendidos do oeste para os mercados das
pradarias, e os produtos agrícolas do leste para as
províncias de Saint Lawrence e Europa.
3. A História de Desenvolvimento Econômico do Canadá
A assistência oferecida pelo governo federal a qualquer companhia contratada para construir a ferrovia
do Pacífico foi originalmente generosa e se tornou
crescente. Não era visto como desejável ou factível
que o governo construísse a ferrovia sozinho. Com a
assistência do governo, uma administração altamente
competente e técnicas de construção já aperfeiçoadas
nos Estados Unidos, a ferrovia da costa do Pacífico foi
terminada com sucesso em 1885.
A colonização européia começou no século XV, quando os britânicos e, principalmente, os franceses se
estabeleceram no Canadá. Com a Guerra da Independência dos EUA, o Canadá recebeu levas de colonos
leais aos britânicos, provenientes das treze colônias
britânicas rebeldes. Nos primórdios da colonização
A defesa contra o expansionismo econômico norteamericano requeria uma expansão transcontinental
no Canadá, mas seus custos, cobertos originalmente
pelo governo e indiretamente pelos consumidores via
maiores tarifas, fizeram da manutenção de tal unidade
econômica nacional tarefa difícil. Entretanto, em 1878,
junho de 2007
A trajetória de crescimento da Austrália entre 1870
e 1913 foi crescente e sustentada, mas não acelerada.
No período, o PIB per capita aumentou 0,9% ao ano.
(Maddison, 1998). Durante a Primeira Guerra, o capital do setor minério extrativista buscou diversificação
investindo em indústrias pesadas estratégicas, como
siderurgia e metalurgia. A política foi marcada pelo
aumento da participação trabalhista. Houve fortalecimento dos sindicatos, formação de indústrias de
base, expansão da atividade mineira, nacionalização
de monopólios etc. Os anos da década de vinte foram
prósperos, principalmente por causa do reaquecimento das exportações de matérias-primas e commodities
e das políticas internas de incentivo à indústria. A
depressão de trinta provocou queda da entrada de
capitais, queda de preços e de salários. Em 1932, a
reunião de Ottawa, Canadá, estabeleceu taxas preferenciais entre os países do Reino que significaram
proteção externa e a interna para a indústria agrícola
(exportação sem taxas para a Inglaterra e fixação
de preços internos, respectivamente), sendo assim
essenciais para a recuperação econômica. De acordo
com Shaw, em 1939 a população australiana era de 7
milhões de habitantes e o PIB de ₤900 milhões (₤130
per capita). O nível de renda e padrão de vida da população era alto. Isto se deveu, principalmente, aos
patamares elevados de salário comparativamente ao
resto do mundo, exceto os outros países temperados
do império. Além disso, o governo garantia os serviços
sociais, notadamente, o sistema de seguros, educação,
saúde e habitação.
européia no Canadá, a principal fonte de renda provinha da caça e do comércio de peles. Em 1812, os
Estados Unidos invadiram o território canadense, na
tentativa de anexar o resto das colônias britânicas na
América do Norte, desencadeando uma guerra, que
no fim resultou na expulsão dos norte-americanos por
tropas britânicas. O medo de uma segunda invasão
americana, aliado ao fracasso britânico em assimilar
os franceses, fez com que a idéia da Confederação
Canadense fosse aprovada pelos britânicos.
33
junho de 2007
o segundo pilar da Política Nacional foi estabelecido:
as tarifas protecionistas. Aqui o poder do Estado foi
aplicado diretamente para levar à unidade econômica
nacional e impedir a expansão norte-americana. Depois da construção da ferrovia, ao diminuir os custos
de transportes, os produtos canadenses ficaram mais
vulneráveis à concorrência dos importados; dessa
maneira, o reconhecimento da necessidade de busca
de uma maior taxa de industrialização tornou-se
crescente. Assim, como bem observa Aitken, tanto na
legislação tarifária quanto na construção da ferrovia
o Estado pós-confederação assumiu um papel ativo
na promoção do desenvolvimento.
No decorrer do século XIX, a economia do Canadá
passou a ser mais dependente da agricultura, pecuária e mineração. A importância da caça diminuiu
drasticamente. Porém, dado o imenso tamanho do
país, a economia do Canadá variava de região para
região. Em Ontário, a principal fonte de renda era a
agricultura e a mineração. A província era então um
dos maiores pólos agropecuários do mundo. Quebec era o centro industrial, ferroviário, portuário e
bancário do Canadá, bem como o maior produtor de
eletricidade. As províncias do Atlântico dependiam
consideravelmente da pesca, e as províncias do centro-oeste, da agricultura – especialmente do cultivo
de trigo. A Tabela 2 apresenta estrutura de exportação
do Canadá.
tabela 2– cinco principais exportações do Canadá (% do
valor total das exportações de determinados
períodos)
Canadá
Trigo e farinha de trigo
Papel de jornal
Madeira
Carne
Peixes
Polpa de madeira
Cinco principais exportações
1920-24
1925-29
1930-34
29,2
6,7
6,2
4,0
3,1
33
9,2
3,7
21,3
14,5
3,7
2,4
3,7
52
3,4
4,2
47,1
49,2
Fonte: Solberg (1981).
Nas primeiras décadas do século XX, Ontário passou
por um rápido processo de industrialização. A província tornou-se um grande centro industrial e bancário,
ainda que Quebec se mantivesse na liderança. A eco-
34
nomia das províncias do Atlântico passou a depender
principalmente da produção de produtos de madeira
e derivados, enquanto que no centro-oeste a principal fonte de renda das províncias continuou sendo a
agricultura. Segundo Aitken, o Estado continuou a
influenciar a taxa e a direção da mudança econômica:
a promoção da indústria de papel e polpa de madeira
no Canadá Central; a construção da via marítima
de Saint Lawrence; e o controle das indústrias de
petróleo e gás natural.
Assim, ainda de acordo com Aitken, a taxa e a direção
do desenvolvimento canadense foram determinadas
principalmente pelas características econômicas de
alguns produtos primários: peixes, pele, madeira de
lei, carne, trigo e minérios. A atuação fundamental
do Estado no desenvolvimento canadense foi a de
facilitar a produção e a exportação de tais produtos.
Com relação ao desenvolvimento econômico, a saída
do status de colônia e o alcance da independência
política significaram a criação de um aparato político competente para desempenhar tais funções de
maneira efetiva.
4. A História de Desenvolvimento Econômico da Argentina
A Argentina começou seu processo de independência
da Espanha em 25 de maio de 1810 – “Revolução de
Maio” –, empenhando-se em guerras contra os espanhóis e seus simpatizantes. Embora a revolução não
tenha obtido uma calorosa acolhida em todo o vicereino, as campanhas militares lideradas pelo general
José de San Martín e Simón Bolívar entre 1814 e 1817
incrementaram as esperanças de independência da
Espanha, que foi declarada finalmente em 9 de julho
de 1816.
De acordo com Bethell (2002), ainda no final da década
de 1870 a qualidade da pecuária continuava insatisfatória, o país importava trigo, a rede de transportes
cobria apenas pequena parte do território, os serviços
bancários ainda se achavam em estado rudimentar e
a entrada de capital e de imigrantes era modesta. O
primeiro censo nacional realizado em 1869 fornecera
provas claras do atraso relativo da Argentina: a densidade era de 0,43 pessoas por quilômetro quadrado.
O deserto parecia indomável, não somente pelas
distâncias impossíveis de transpor, mas também pela
resistência armada de tribos indígenas. Tornou-se
então evidente a necessidade de expandir a fronteira
para acomodar os crescentes rebanhos de carneiros
e facilitar a relocalização do gado. Para tal feito, foi
imprescindível a construção de estradas de ferro e do
desenvolvimento do telégrafo.
O capital era escasso e a necessidade de enormes investimentos em infra-estrutura era crítica. As institui-
ções financeiras nacionais eram poucas. Os nativos
possuíam ativos fixos na forma de grandes extensões
de terras ou casas nas cidades e ativos móveis, tal
como o gado. Havia grande atividade dos grupos
privados (principalmente ingleses), com vínculos
com bancos internacionais, sobretudo no setor ferroviário. Como o Estado era incapaz de prover todos os
recursos financeiros (baseados fundamentalmente
nas taxas alfandegárias) buscou empréstimos na
Europa, sobretudo na Inglaterra.
tabela 3 – investimentos ingleses diretos e em carteiras de títulos na Argentina (em milhões de libras)
1865
1875
1885
1895
1905
1913
Total dos investimentos
2,7
22,6
46,0
190,9
253,6
479,8
Investimentos diretos
0,5
6,1
19,3
97,0
150,4
258,7
Investimentos em títulos
2,2
16,5
26,7
93,9
103,2
221,6
Empréstimos ao governo
2,2
16,5
26,7
90,5
101,0
184,6
3,4
2,2
37,0
Ações de companhias
Fonte: Bethell (2002).
O trigo argentino competia com a produção de milho,
linho e, especialmente, de alfafa, que era um cultivo
básico para a pecuária, observa Bethell. Além disso,
nos pampas argentinos a pecuária era o negócio
do grupo econômico e político mais poderoso. Os
recursos naturais, especialmente da província de
Buenos Aires, foram muito propensos a criar gado
destinado ao mercado de carne. Uma vez resolvido o
problema técnico mediante barcos com refrigeração
e frigoríficos no fim do século XIX, as exportações de
carne argentina iniciaram um período de crescimento
espetacular. A Argentina era a primeira no mundo
em exportações de carnes e cerca de 40% do total das
exportações mundiais provinha dos pampas. Como
em outros aspectos da vida econômica argentina, a
Inglaterra desempenhava um papel central no comércio de carnes.
Entre 1890 e 1900, a produção da agricultura e da
pecuária melhorou consideravelmente. A produção
industrial, graças à capacidade ociosa, sofreu grande
impulso, principalmente por conta da redução de
custos e da conquista de novos mercados. Com isso,
a indústria conseguiu desenvolver-se quando os
mercados se ampliaram graças às estradas de ferro.
Exemplos disso são o açúcar em Tucuman, o vinho
em Mendoza e os moinhos de trigo em Santa Fé e
Córdoba. No período 1900 a 1912, observou-se um
grande aumento da importância dos cereais e da
carne. A estrada de ferro possibilitou o crescimento da
produção em áreas mais remotas. Simultaneamente,
novas técnicas de congelamento e de transporte refrigerado na travessia do Atlântico transformaram a
indústria de carne. Além disso, para engordar o gado
junho de 2007
Ainda segundo Bethell, no final do século XIX e nas
primeiras duas décadas do século XX uma nova onda
expansionista da agricultura invadiu as terras que já
haviam sido cedidas, total ou parcialmente, à criação
do gado. Uma das características desse processo é
que ele não acarretou a substituição da pecuária pela
agricultura; ao contrário, as duas complementaramse. Porém aconteceu que, enquanto no final do século
grandes quantidades de terra estavam sendo abertas à
agricultura à medida que as estradas de ferro criavam
novas ligações com os mercados, não havia número
suficiente de agricultores dispostos – ou até disponíveis – a cultivá-las.
35
havia a necessidade de cultivo de alfafa e milho nas
zonas produtoras de gado da província de Buenos
Aires e nas regiões de Córdoba e La Pampa. Tudo isso
se deu em conseqüência do aumento da exportação
de carne frigorificada e congelada, principalmente
para a Inglaterra.
disso, o caráter essencial da maioria das importações
tornava extremamente difícil cortá-las mesmo em
períodos de depressão. Desta forma, estava claro que
o país precisava encontrar outros veios para retomar
o crescimento.
junho de 2007
5. Observações Finais
Além disso, complementa Bethell, o caráter tecnológico da agricultura teve efeitos importantes:
como empregava mais mão-de-obra, isto acarretou
uma distribuição de renda mais favorável. Implicou
também o assentamento de trabalhadores nas zonas
rurais, a criação de diversos serviços de transporte e
o aparecimento de diversas atividades para fornecer
bens e serviços à população rural. Assim, o crescimento não se limitou ao setor exportador. O aumento
no número de assalariados e o crescimento da renda
real favoreceram a expansão do mercado interno e
propiciaram uma gama crescente de oportunidades
de investimento interno.
Entretanto, como bem destaca Bethell, em 1914 ainda não havia uma alternativa para a economia da
exportação de produtos primários. Apesar do crescimento da indústria, tal expansão não afetara o alto
coeficiente de importação da Argentina. A indústria
local ainda dependia fortemente da procura interna
e das receitas do setor de exportação e da entrada de
investimentos externos. A Argentina possuía poucos
embriões de indústria pesada ou de indústrias de bens
de capital integradas. Ademais, apesar do mercado interno ser rico, este ainda era relativamente pequeno e
os mercados externos eram dominados pelos gigantes
industriais do mundo.
Para concluir, baseando-se em O’Connel (1984), a
Argentina era uma produtora de zona temperada em
competição direta com a produção doméstica, e mesmo com as exportações, de quase todas as economias
do mundo, o que colocava o país numa situação vulnerável às condições de excesso de oferta. A economia
argentina era ainda particularmente vulnerável às
dificuldades da economia britânica: a política econômica tinha uma autonomia muito limitada. Além
36
Uma vez expostas as trajetórias de desenvolvimento
da Austrália, Canadá e Argentina no período compreendido entre a segunda metade do século XIX e a
Segunda Guerra Mundial, a parte II do artigo, a ser
publicada na próxima edição deste boletim, apresentará uma análise comparativa entre eles e apontará os
principais aspectos que provocaram as diferenças de
desenvolvimento econômico entre Austrália e Canadá, de um lado, e a Argentina, de outro.
Referências Bibliográficas
Aitken, H. G. J. Defensive expansionism: the state and economic
growth in Canada. In: Aitken, J. G. H. (org), The state and economic
growth. Papers of a Conference Held on October 11-13, 1956, under the Auspices of the Committee on Economic Growth, 1956.
Bethell. História da América Latina de 1870 a 1930. Vol. IV e V. São
Paulo, Edusp, 2002.
Butlin, N. G. Colonial socialism in Australia, 1860-1900. In Aitken, H.
G. J. (org.), The state and economic growth. Papers of a Conference
Held on October 11-13, 1956, under the Auspices of the Committee on Economic Growth, 1956.
Maddison, A. Monitoring the world economy 1820-1992. Paris: OECD,
1998.
O´Connell, A. Argentina into depression: problems of an open
economy. In: Thorpe, R. (org.), An economic history of XX century
Latin America. 1984.
Shaw, A. G. L. The economic development of Australia. London; New
York: Longmans, Green and co., 1944.
Solberg, E. Argentina y Canadá: una perspectiva comparada sobre
su desarrollo económico, 1919-1939. Desarrollo Económico, v. 21,
n. 82, 1981.
Wright, C. Innovation, continuity and conservatism: Australian
employers and changes in labour management, 1900-1950. UKAustralian Labour History Conference, Manchester, UK, July
16-18th, 2003.
(*) Economista pela FEA-USP e mestranda pelo IE-UFRJ.
E-mail: [email protected].
(**) Economista pela FEA-USP e mestranda pelo IE-UFRJ
E-mail: [email protected].
Bruno de Paula Rocha (*)
testando a causalidade entre sistema
financeiro e desenvolvimento econômico
em um painel para o Brasil1
1. Introdução
Este é o primeiro de três trabalhos que apresentarão os principais resultados da tese “Ensaios sobre
economia bancária e política monetária no Brasil em
uma abordagem regionalizada”. (Rocha, 2007). A
temática apresentada nesta série é focada em alguns
fatos empíricos relacionados aos sistemas financeiros
e às economias regionais brasileiras. Os próximos artigos irão, na seqüência, avaliar os efeitos da política
monetária nos estados brasileiros e discutir alguns
atributos propostos para qualificar o funcionamento
dos sistemas bancários locais. No presente trabalho,
a inter-relação entre sistema financeiro e crescimento
econômico nos estados brasileiros é explorada.
seria possível incorporar um juízo adequado da
importância do sistema financeiro para incrementar
o crescimento econômico. Com as novas teorias de
crescimento e seus novos tratamentos para o desenvolvimento tecnológico e capital humano tornou-se
possível uma maior variedade de políticas que afetariam o crescimento de longo prazo.
Apenas com o surgimento de uma teoria que ampliasse a conceituação trazida na modelagem tradicional
O objetivo deste trabalho é analisar o grau de precedência temporal entre o componente exógeno das
Há certo entendimento acerca da importância de
variáveis reais para a explicação do desenvolvimento
econômico. Em vista disso, fatores tecnológicos, estoque de capital (físico e humano) e preferência entre
lazer e trabalho constituem o ponto central das teorias
tradicionais de crescimento econômico.
junho de 2007
Estudos recentes, no entanto, reforçam a importância
do lado financeiro para uma explicação completa do
fenômeno. Tal interesse se explica por um velho, mas
não totalmente esclarecido, fato estilizado de forte
correlação entre crescimento econômico e variáveis
financeiras. Embora a relação entre estas duas dimensões econômicas seja há muito explorada, é recente o
entendimento da importância do sistema financeiro
como uma das fontes do crescimento econômico.
Porém, mais importante que esta nova abordagem
para o crescimento de longo prazo foi o entendimento
do papel do sistema financeiro no processo de intermediação de recursos. Dois elementos-chave surgem
nesta nova tipificação: o financiamento externo de
projetos de investimentos e os custos de transação
e informacionais associados a esta operação. É a
capacidade de atenuar os custos de transação e de
informação que torna o sistema financeiro essencial
para o barateamento do custo externo de financiamento. Decorre desta intermediação um efeito que
pode não apenas influenciar as taxas de poupança
e, portanto, a taxa de acumulação de capital, mas
também promover maior eficiência alocativa e inovação tecnológica. Assim, a importância deste sistema
reside não só na capacidade de aumentar a captação
de recursos, mas, principalmente, na habilidade em
alterar estas alocações, podendo ter, dessa maneira,
forte impacto sobre o crescimento tecnológico e a produtividade. Nesta direção, mais do que mero reflexo
das condições fundamentais da economia, o sistema
financeiro poderia ter importância na promoção do
desenvolvimento econômico, atuando como força
propagadora dos ciclos de negócio.
37
junho de 2007
variáveis financeiras e o componente exógeno do
nível de desenvolvimento econômico no Brasil. O que
se busca é avaliar a existência de um fato estilizado
básico para esta literatura. Além do exame da relevância do lado financeiro para o nível de atividade, é
crucial, para fins de política econômica, que se saiba
em que sentido se dá a causalidade entre estas duas
dimensões econômicas.
Este trabalho utiliza-se de dados para um painel com
os estados brasileiros entre 1995 e 2002. A estimação
desagregada, de acordo com os mercados bancários
estaduais brasileiros, introduz um ganho relevante
de informação em relação à análise agregada dos
dados. O Brasil é um país marcado por grandes desigualdades regionais, que se traduzem em sistemas
financeiros locais igualmente diferenciados, podendo
mesmo ser o caso de que os mercados relevantes para
a atuação bancária sejam estaduais, com estratégias
de ação definidas regionalmente. Dessa forma, a agregação dos dados omite uma rica fonte de informação
cross-section, que se refere às diferenças nos estados
brasileiros. Com a análise em painel, estas desigualdades e idiossincrasias locais podem ser consideradas
explicitamente na estimação e controladas por meio de
efeitos estaduais específicos, o que representa inequívoco avanço no estudo desta importante questão.
2. Metodologia para Causalidade em Painel
Uma referência clássica para o tratamento da questão da causalidade é Granger (1969). Ao propor uma
conceituação operacional e, portanto, testável para
a idéia de causalidade, este autor deu uma grande
contribuição para a literatura empírica. O conceito,
tal como apresentado no trabalho seminal, sustenta
que se x causa y, a projeção de y é realizada com maior
precisão quando a variável x é utilizada. Se esta variável não tem utilidade para melhorar a predição de
y, então x não “Granger-causa” y.
Seguindo com a lógica trazida nesta conceituação,
para avaliar se x causa y, devemos comparar as
projeções realizadas por um modelo formado pelas
38
defasagens de y e x com uma versão modificada pela
exclusão das defasagens de x. Se x não causa y, é de
se esperar que as previsões produzidas por ambos os
modelos acima sejam similares. Seguindo Granger
e Huang (1997), esta assertiva é testada por meio
da estimação de uma equação de teste, formada por
uma combinação de somas e diferenças dos erros de
projeções dos modelos com e sem defasagens de x. O
teste empreendido é estendido em relação a Granger
e Huang (1997) para tornar robusto o procedimento
relativo aos efeitos específicos não-observáveis e
não-estimados, presentes no painel de indivíduos
incluídos na amostra.
As projeções requeridas para os testes podem ser
realizadas por meio de predições “fora da amostra”
(out-of-sample), em que unidades seccionais são excluídas da amostra usada na estimação do modelo, e
“pós-amostra” (post-sample), excluindo-se T períodos
ao final da amostra de todas as unidades seccionais.
Os resultados apresentados abaixo dizem respeito a
projeções pós-amostrais.
Além de aplicarmos a metodologia de causalidade de
Granger (1969) adaptada para painéis dinâmicos, será
realizado o teste sugerido por Holtz-Eakin, Newey e
Rosen (1988). Tal procedimento consiste em realizar
um teste de Wald para verificar a hipótese de que
os coeficientes associados aos termos defasados da
variável independente são conjuntamente não-significantes. Desta forma, caso o teste permita rejeitar esta
hipótese, podemos dizer que há precedência temporal
por parte da variável independente.
3. Dados
Para a caracterização dos sistemas financeiros regionais serão tomados indicadores relativos à atuação
dos seus respectivos setores bancários. Os bancos
compõem uma parte extremamente importante do
sistema financeiro, atuando no processo de intermediação, com produtos e serviços que contribuem para
a resolução dos problemas de informação e dos custos
de transação, como tratado na seção anterior.
Três proxies são utilizadas para representar os sistemas
bancários estaduais: (i) o volume real de crédito bancário por agência em cada estado; (ii) o volume real
de depósitos bancários totais (a vista e a prazo) por
agência em cada estado e (iii) a soma do saldo de depósitos e do saldo crédito por agência bancária em cada
estado. Os dados foram disponibilizados pelo Banco
Central do Brasil. As informações foram deflacionadas
segundo o IPCA, medido pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE. Como indicador de
atividade econômica foi utilizado o PIB estadual coletado pelo IBGE. Este trabalho utiliza uma amostra
com dados anuais, compreendendo um painel com
todos os estados brasileiros entre 1995 e 2002.
4. Resultados
Os resultados dos testes de causalidade realizados são
resumidos no quadro abaixo. Como podemos observar,
empregando o método de Holtz-Eakin, Newey e Rosen
(1988) e Granger e Huang (1997) para projeção “pósamostra”, os resultados parecem mostrar que crédito e
depósitos bancários, além da soma destes dois indicadores, exercem uma relação causal para a determinação
do produto. Já com a causalidade no sentido contrário,
nota-se que as defasagens da variável crescimento
econômico não são significantes para determinar as
proxies criadas para sistema financeiro. Vale notar que
este resultado é robusto para diferentes defasagens
testadas nos modelos dinâmicos estimados.
quadro 1 – causalidade entre os indicadores financeiros e produto
Crédito Bancário
Freqüência Amostral
Teste Utilizado
Holtz-Eakin, Newey e Rosen (1988)
Granger e Huang (1997)
Anual
Mensal
⇒
⇒
⇔
⇒
⇒
⇒
⇔
⇐
⇒
⇒
⇔
Depósitos Bancários
Holtz-Eakin, Newey e Rosen (1988)
Granger e Huang (1997)
Holtz-Eakin, Newey e Rosen (1988)
Granger e Huang (1997)
⇒ : Indicador financeiro Granger-causa produto e produto não Granger-causa indicador financeiro.
⇐ : Produto Granger-causa indicador financeiro e indicador financeiro não Granger-causa produto.
⇔ : Indicador financeiro Granger-causa produto e produto Granger-causa indicador financeiro.
⇓ : Indicador financeiro não Granger-causa produto e produto não Granger-causa indicador financeiro.
Nota: À semelhança da ampla literatura empírica que trata
deste assunto, o lado financeiro pode ter papel ativo
no desenvolvimento econômico brasileiro, uma vez
que os componentes exógenos das variáveis financeiras mostram-se estatisticamente significantes para a
determinação do produto.
⇓
junho de 2007
Soma de Depósitos Bancários e Crédito Bancário
Uma amostra alternativa pode ser proposta para o
teste da robustez dos resultados acima. Desta forma,
será utilizado um conjunto de dados similares ao
trabalhado até aqui, mas com uma periodicidade
mensal. Estes dados consideram um painel de dez
estados brasileiros, a saber, São Paulo, Minas Gerais,
39
junho de 2007
Rio de Janeiro, Espírito Santo, Rio Grande do Sul,
Santa Catarina, Paraná, Pernambuco, Ceará e Bahia.
O conjunto de unidades analisadas é limitado pela disponibilidade dos dados para avaliar o lado real. Para
este propósito serão utilizados dados de produção industrial mensal do IBGE. Os indicadores financeiros, a
não ser pela periodicidade, são idênticos aos descritos
anteriormente. O período amostral compreende os
meses entre fevereiro de 1997 e agosto de 2003.
Com os dados mensais, tanto os testes de Holtz-Eakin,
Newey e Rosen (1988) quanto os testes de Granger e
Huang (1997) dão suporte, em alguns casos, à hipótese
de que o indicador de produto seja um preditor relevante do sistema financeiro. Em nosso entendimento,
trata-se de um fenômeno inteiramente ligado à freqüência dos dados. A freqüência mensal pode não ser
baixa o suficiente para validar as justificativas teóricas
aludidas na literatura econômica – essencialmente
ligadas a fenômenos de longo prazo – utilizadas para
justificar a relação entre sistema financeiro e crescimento econômico. Este ponto já havia sido levantado
por outros autores, que desencorajam, por este motivo,
o uso de séries de dados mensais ou trimestrais.
5. Considerações Finais
atestada a correlação positiva e robusta, associando
sistema bancário e nível de produto. Além disso, a
causalidade encontrada fornece aos formuladores de
políticas públicas um novo leque de oportunidades
para promover o nível de renda no País. Nesta direção,
podem ser tomadas providências que incrementem
a atividade bancária no Brasil, como, por exemplo, a
promoção da concorrência no setor e a definição de
um marco regulatório adequado, com regras claras
e críveis.
1 Este trabalho é uma versão resumida, com os principais resultados do primeiro capítulo de Rocha (2007). O autor agradece à
preciosa orientação recebida de Márcio Issao Nakane e ao convite
de Gilberto Tadeu Lima para escrever este artigo.
Referências Bibliográficas
Granger, Clive W. J. Investigating causal relationships by econometric models and cross-spectral methods. Econometrica, v. 37,
p. 424-438, 1969.
Granger, Clive W. J; Huang, Ling-ling. Evaluation of panel data
models: some suggestions from time series. U.C. San Diego,
1997. Mimeo.
Holtz-Eakin, Douglas; Newey, Whitney; Rosen, Harvey S. Estimating vector autoregressions with panel data. Econometrica, v. 56,
p. 1371-1395, 1988.
Rocha, Bruno de Paula. Ensaios sobre economia bancária e política
monetária no Brasil em uma abordagem regionalizada. 2007. Tese
(Doutorado), IPE/FEA/USP, São Paulo.
Os testes sugeridos por Holtz-Eakin, Newey e Rosen
(1988) e Granger e Huang (1997) parecem indicar
que há uma causalidade unidirecional, em que os
indicadores financeiros precedem temporalmente a
variável de atividade econômica.
Outro resultado a ser mencionado diz respeito à
evidência de que a causalidade em sentido contrário,
ou seja, o produto Granger-causa sistema financeiro,
aparece quando utilizada uma base de dados mensal.
Esta inversão de resultados pode ser explicada pela
natureza de longo prazo dos fenômenos por trás da
relação entre sistema financeiro e produto. Considerando o curto prazo, o sistema financeiro acaba por
se tornar um mero reflexo das condições reais da
economia.
Estes resultados têm importantes impactos em termos de política econômica. Em primeiro lugar, ficou
40
(*) Doutor em economia, IPE-FEA/USP.
E-mail: [email protected].
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