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Revista das Faculdades Integradas Claretianas – N. 2 – janeiro/dezembro de 2009
CLÁUSULAS ABERTAS NO CÓDIGO CIVIL 2002 E SUA INTERPRETAÇÃO
JURISDICIONAL NOS CONTRATOS
Ludjane Aparecida Marconi Corrêa
Faculdades Integradas Claretianas de Rio Claro
[email protected]
Michele Cristina M. Schio Ceccatto
Faculdades Integradas Claretianas de Rio Claro
[email protected]
Resumo
Objetiva o presente artigo, interpretar jurisdicionalmente, nos aspectos doutrinários e jurisprudenciais, as
cláusulas abertas (gerais) que foram consideravelmente ampliadas no novo Código Civil, isto é, cláusulas
relativas à boa fé, aos bons costumes, à função social, à probidade, etc., que permitem ao Estado – Juiz, uma
melhor adequação das normas ao caso concreto. Por serem cláusulas de conteúdo impreciso, vago, impõe ao
magistrado uma liberdade na sua interpretação e aplicação.
Palavras – chave: cláusulas abertas, boa fé, função social do contrato, interpretação, poder-dever do juiz
1 Introdução
O tema escolhido aborda as modificações do Código Civil 2002 em relação à codificação anterior, no que
tange à inserção de cláusulas abertas ou cláusulas gerais, o que possibilita ao juiz, uma interpretação mais
ampla, e menos submissa à letra da lei. Enfoca-se neste trabalho a interpretação jurisdicional concernente aos
contratos, especificamente nas cláusulas gerais da boa-fé objetiva e sua função social. Há neste sentido muita
discussão, se com a inserção destas cláusulas não se estaria abrindo uma possibilidade de ferir mortalmente a
segurança jurídica tão fortemente buscada em nosso ordenamento, ou se estaria ocorrendo realmente a justiça
aos casos concretos apresentados na esfera judicial. Através de pesquisas doutrinárias e jurisprudenciais,
procurou-se enfocar algumas noções sobre a exegese decorrente sobre o tema, fazendo uma breve colocação
sobre a forma e apresentação do Código Civil de 1916, as reais alterações ocorridas no Código Civil de 2002,
especificamente no atinente à intensa socialização do direito com enfoque nos contratos e conseqüente alteração
de seus princípios básicos, buscando adentrar na interpretação jurisdicional, e conseqüente modificação do papel
dos juízes como atuais criadores do direito na busca da concreção da justiça.
2 A interpretação dos contratos no Código Civil de 1916
Cumprindo disposição constante na primeira Constituição Brasileira, a Constituição Imperial de 25 de
março de 1824, em seu artigo 179, inc. XVIII, para que houvesse a organização de um Código Civil fundado nas
sólidas bases da Justiça e Equidade, Clóvis Bevilácqua, jurista, filósofo e historiador brasileiro, apresenta, muitos
anos
depois,
após
longos estudos, em 1899, projeto, que somente passados dezesseis anos de debate, transformou-se no Código
Civil brasileiro, Código esse que foi promulgado em 1.º de janeiro de 1916, vigente a partir de 1.º de janeiro de
1917, quando já não estava mais em vigor a Constituição Imperialista. Nascido sob a influência da Revolução
Francesa, adotava as características do “Estado Liberal”, era um diploma considerado atualizado para sua época,
de cunho puramente individualista, conservador e patrimonialista, impedia o arbítrio judicial defendendo uma
submissão do juiz à lei, enfim, havia o pressuposto de que o conjunto normativo era perfeito. Por ser um sistema
fechado, desprezava os usos e costumes locais, privilegiando a regra estabelecida na lei.
Relativamente aos contratos, a justiça era feita cumprindo-se as cláusulas do contrato. Ruy Rosado de
Aguiar Junior, citado por Hentz (2008), destaca a ausência quase que absoluta de cláusulas gerais no Código
Civil de 1916, o que para ele significa, na prática, "o afastamento da possibilidade de aplicação judicializada dos
contratos de acordo com uma preocupação de realizar a justiça material".
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Nesta mesma linha, Hentz (2008) afirma que “os princípios norteadores do direito contratual adotados
pelo Código Civil de 1916, foram o da (i) liberdade contratual; (ii) obrigatoriedade do contrato (pacta sunt
servanda); e (iii) relatividade dos efeitos contratuais”. Pode-se acrescentar neste contexto, o princípio da
intangibilidade dos contratos, onde não se admitia, em decorrência do principio da autonomia das vontades,
qualquer interferência, nem mesmo do Estado, ao conteúdo dos contratos.
O princípio da autonomia da vontade consiste no poder de escolha dos contratantes em celebrar ou não o
contrato (liberdade de contratar), bem como fixar conforme suas convicções, os seus termos (liberdade
contratual). Ao tratar do assunto Bierwagen (2003) destaca a diferença entre liberdade contratual e liberdade de
contratar
i
. Pelo princípio da obrigatoriedade dos contratos (pacta sunt servanda), o contrato deve
obrigatoriamente ser cumprido, pois entre as partes, o contrato é lei, exige-se para tanto, a igualdade das
partes, pessoas livres que disporiam como quisessem as suas vontades, e para tanto, se responsabilizavam por
elas. Já o princípio da relatividade dos efeitos, vem firmar que todo o estipulado no contrato só terá efeito entre
os contratantes, não atingindo terceiros, seguindo o modelo clássico do contrato, cuja finalidade era a satisfação
de necessidades individuais das partes (Bierwagen, 2003).
Assim, as partes podiam convencionar o que quisessem respeitando os limites da ordem pública, o
contrato tinha força de lei e não beneficiavam e nem prejudicavam terceiros.
Se por um lado, estes princípios foram consagrados para garantir a ampla liberdade dos contratantes,
por outro lado, o exercício desta liberdade, em face do poderio econômico das grandes indústrias que aplicavam
unilateralmente suas condições, levava à escravidão de alguns menos favorecidos, mitigando, assim, a liberdade
de escolha, pois estes não conseguiam suprir suas necessidades se àquelas não se rendessem. Nesse sentido, há
jurisprudências:
Ementa: COBRANÇA - Contrato de fornecimento de gases e cessão de locação de equipamentos - Ré
que, pretendendo a rescisão contratual, efetua notificação de apenas 31 (trinta e um) dias antes do término
contratual, quando existia cláusula estabelecendo o prazo mínimo de denúncia de 60 (sessenta) dias Descumprimento de cláusula contratual, pois o contrato faz lei entre as partes contratantes (pacta sunt
servanda), devendo ser fielmente cumprido - Também, obrigação da Ré pagar a diferença entre o consumo
mínimo e efetivamente consumido, consoante cláusula contratual - Obrigação, igualmente, de pagamento da
multa contratual estipulada - Ação de cobrança procedente - Recurso provido. Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, 2007
Ementa: ... - REVISÃO CONTRA TV AL - PROCEDÊNCIA VARIAÇÃO CAMBIAL - CÓDIGO DE DEFESA DO
CONSUMIDOR E TEORIA DA IMPREVISÃO - INAPLICABILIDADE À ESPÉCIE - "PACTA SUNT SERVANDA" RECURSO PROVIDO Ao firmarem o contrato as partes assumem de comum acordo as obrigações nele pactuadas,
devendo ser fielmente cumprido, sob pena de execução patrimonial contra o inadimplente. Exegese do aforismo
"pacta sunt servanda. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, 2001
Com o passar do tempo, criou-se um enorme descompasso entre a lei e a realidade. Fatos sociais
emergentes e novas tendências comportamentais dos indivíduos fizeram com que a sociedade dependesse de
adaptações da ordem jurídica efetivadas pelos juízes e juristas formadores de jurisprudências, para resolução de
seus interesses e defesa de seus direitos, passando o Código Civil a ser uma referência na descoberta de
sentenças que fossem consideradas justas aos casos concretos existentes. (Zuliani, 2002)
Enfim, ocorre que desde o advento da Constituição Federal de 1988, diploma amplamente social e com
valores fundamentalmente coletivos, evoluiu-se para uma socialização do direito e conseqüentemente dos
contratos.
i Distinção em que se fundamenta projeto de alteração ao art. 421 do Novo Código Civil (Proj. Lei 6.960/2002), onde se propõe substituir a expressão “liberdade de
contratar” por “liberdade contratual, e também, eliminar a expressão “em razão” , alterações estas que constituem aperfeiçoamento do texto legal.
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3 Alterações gerais no Novo Código Civil
O Novo Código Civil orientou-se por princípios sociais, éticos e operacionais; princípios estes gerais ou
transpositivos, isto é transcendentais (metafísicos) e estruturantes dos distintos domínios do ordenamento
jurídico; tendo o legislador optado por inserir cláusulas gerais, como da boa fé objetiva, da função social do
contrato, da função social da propriedade, possibilitando assim, uma maior adaptação do pensamento e do
comportamento social ao ordenamento jurídico, destacando-se, neste sentido, o papel dos operadores do direito,
especialmente os juízes, que devem contextualizar o verdadeiro sentido da lei à realidade atual, para só aí,
aplicá-la ao caso concreto. (Carvalho, 2008)
Cristina Tereza Gaulia, citada por Carvalho (2008), sustenta que “a modernidade jurídica nascida da
Constituição de 1988 requer juízes que sejam criadores do Direito e livres intérpretes da lei, tendo por objetivo a
busca da justiça a ser aplicada em benefício da paz social”. Reitero os dizeres, argumentando ainda, que a
aplicação da justiça, deve ser feita em benefício da pessoa humana.
Com uma estrutura atual de sistema aberto, flexível, enriquecido, por princípios e cláusulas gerais antes
referidas, o Novo Código Civil contribui para uma interpretação jurídica mais harmônica com a renovação por
que passa o Direito, permitindo ao intérprete uma liberdade de criação, dando ao Juiz maior poder de decisão.
Não há como se interpretar o Código hoje vigente, com a mentalidade abstrata e formalista predominante na
codificação anterior. (Amaral, 2008)
Houve uma reestruturação e revisão dos princípios constitucionais, ou seja, dos fundamentos que servem
de base ao ordenamento jurídico. Impera no Novo Código Civil, o princípio social ou da socialidade, contido na
função social que deverá por ordem legal, impor-se a todos os contratos, onde os valores coletivos se
sobressaem aos valores individuais, sem prejuízo, no entanto, do valor da pessoa humana, em manifesta
oposição aos valores individualistas presentes na codificação anterior.
Nesse sentido vemos também a aparição do novo conceito de posse no real uso do bem de raiz havido
como moradia e fonte de produção, a chamada posse-trabalho, que reduz o prazo de usucapião de um imóvel de
15 anos para 10 anos, se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado
obras ou serviços. Há também, as limitações impostas ao direito de propriedade, que deve ser exercido de modo
a não acarretar prejuízo ao bem estar social, isto é, exercido de acordo com as finalidades econômicas e sociais,
visando a preservação do ambiente, do equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico e evitando a
poluição do ar e das águas, bem como, também poderá ser privado da coisa o proprietário, se o imóvel for de
extensa área, na posse ininterrupta e de boa fé, por mais de cinco anos, de grande número de pessoas, que
tenham realizado em conjunto ou não, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico
relevante. Especificamente no concernente aos contratos, estabelece a função social dos contratos, haja vista a
interpretação mais favorável aos aderentes no contrato de adesão, quando existentes cláusulas ambíguas ou
contraditórias, bem como nulidades de cláusulas que estipulem renúncia de direitos inerentes à natureza do
negócio.
O princípio Ético, ou da Eticidade, positivado nos artigos 113, 187 e 422 do Código Civil, é bem
disciplinado por Amaral (2008):
“sobreleva os critérios ético-jurídicos em relação aos critérios lógico-formais, no processo de concreção
jurídica. O juiz é chamado a criar a norma para o caso concreto, pela mediação de princípios e regras do
sistema, de conformidade com valores dominantes.”
E destaca também, citando Miguel Reale, que este princípio concebe a confiança de que o equilíbrio
econômico dos contratos é a sustentação ética do direito obrigacional, aproximando-o do princípio da boa-fé.
Já, o Princípio da Concretude, ou da Operabilidade, norteia no sentido de que a interpretação jurídica não
deve ter como finalidade descobrir o alcance da norma, mas, sim construir a norma-decisão específica para o
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caso real, tendo em vista o ser humano in concreto, não o sujeito de direito abstrato, hoje repudiado pelo
espírito do novo Código (Amaral, 2008).
É de se observar, entretanto, que o princípio “pacta sunt servanda”, ou seja, a obrigatoriedade de
cumprimento dos contratos continua sendo observado, embora limitado pelos princípios da boa fé objetiva e da
função social, tendo ocorrido para sua regulação o dirigismo contratual, isto é, a intervenção do Estado para
corrigir abusos. Como bem diz, ilustre Ministro do STJ, Aguiar Junior (2000):
“O contrato passou a ser visto não apenas como instrumento de regulação de vontade, meio de
administrar interesses privados, exercício da autonomia privada, poder de dispor de seus
interesses, mas também como instrumento de ordenação da economia, um meio de realizar os fins
do Estado, Menos serve para construir e realizar a vontade do indivíduo, mas para construir e
contribuir a que a sociedade possa atingir os seus fins econômicos, que são importantes, mas
também para alcançar os fins éticos e sociais buscados pelo Estado, conforme o que está ordenado
na Constituição”.
Neste sentido, há jurisprudências:
“DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO
RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. LOCAÇÃO. PRORROGAÇÃO
AUTOMÁTICA. FIANÇA. VALIDADE. CLÁUSULA PREVENDO A RESPONSABILIDADE DO FIADOR ATÉ A EFETIVA
ENTREGA DAS CHAVES DO IMÓVEL. EXISTÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS. 1. O princípio do pacta sunt
servanda, embora temperado pela necessidade de observância da função social do contrato, da probidade e da
boa-fé, em seu prisma objetivo, ainda continua plenamente válido em nosso ordenamento jurídico. Assim, têm
os contratantes plena liberdade de pactuar normas a gerarem efeitos entre si, desde que estas não venham a
ofender interesses sociais previstos na Constituição. 2. O fato de o contrato de locação ter sido celebrado sob a
vigência da Lei 6.649/79, por si só, não afasta a responsabilidade dos fiadores pelos débitos locatícios
posteriores ao vencimento do contrato de locação, tendo em vista a existência de cláusula expressa em que
concordaram em garantir a locação até a efetiva entrega das chaves do imóvel locado. 3. Embargos de
declaração rejeitados. Superior Tribunal de Justiça, 2008
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE. RELATIVIZAÇÃO DO
PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COBRANÇA. POSSIBILIDADE, DESDE QUE
NÃO CUMULADA COM NENHUM OUTRO ENCARGO, SEJA MORATÓRIO OU REMUNERATÓRIO. VALOR DA
CONDENAÇÃO E CUSTAS. FIXAÇÃO NA FASE DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A
revisão dos contratos é possível em razão da relativização do princípio pacta sunt servanda, para afastar
eventuais ilegalidades, ainda que tenha havido quitação ou novação. 2. Permite-se a cobrança da comissão de
permanência, desde que não cumulada com nenhum outro encargo, seja moratório ou remuneratório.
Precedentes. 3. Incabível a fixação imediata do valor da condenação, o que ocorrerá em sede cumprimento da
sentença. 4. Agravo regimental improvido”. Superior Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 2007.
4 Cláusulas Gerais
Segundo Gustavo Tepedino, citado por Carvalho (2008), cláusulas gerais são: “normas que não
prescrevem certa conduta, mas, simplesmente definem valores e parâmetros hermenêuticos. Servem assim
como ponto de referência interpretativo e oferecem ao intérprete os critérios axiológicos e os limites para a
aplicação de demais disposições normativas.”
Corroborando, temos o conceito de Aguiar Júnior (2000a):
“são normas jurídicas, que contém um princípio ético orientador do juiz na solução do caso
concreto, autorizando-o que estabeleça, de acordo com aquele princípio, a conduta que deveria ter
sido adotada no caso. Pressupõe uma técnica judicial diversa da que usamos comumente para
aplicar a regra que tipifica a conduta, feita mediante simples subsunção, para exigir um trabalho
judicial prévio e criador da própria regra concreta do caso.”
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E ainda observa o autor, que pode subsistir certa insegurança relativamente à indefinição da solução da
questão, o que nos submete à questão dos contrapontos de segurança jurídica de um lado, e a espera de justiça
concreta de outro, do sistema fechado imune às interferências externas, portanto, estático e falho, e o sistema
aberto para a evolução, que se liga a outros sistemas normativos, aos princípios e preceitos constitucionais.
O principal objetivo das cláusulas gerais é possibilitar a flexibilização das normas, sem, no entanto ferir a
segurança jurídica; e sua adoção pelo legislador, requer especial atenção do intérprete e aplicador. Para
identificá-las, basta observar se a norma especifica as hipóteses em que serão aplicadas, se isto ocorrer, não
será cláusula geral, pois esta se vale de linguagem aberta e vaga. Em decorrência desta abertura, ela propicia
uma atuação judicial mais ampla, justa e criadora, daí a necessidade da especial atenção (Carvalho, 2008).
Dentre as principais cláusulas gerais adotadas no Novo Código Civil, dar-se-á enfoque principalmente as
da boa-fé objetiva e função social do contrato.
4.1 Boa-fé objetiva
O artigo 422 do Novo Código Civil dispõe que “os contratantes são obrigados a guardar, assim na
conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé.”
Não obstante, deve-se fazer deste artigo uma interpretação extensiva, no entendimento de que em todas
as fases do contrato, desde sua formação, fase pré-contratual, onde cumpre observar, por exemplo, o dever de
informação, de explicação, de segredo, até sua efetiva execução, nesta incluindo a fase pós-contratual, onde se
agregam seus efeitos, irretratabilidade, confidencialidade, cabe a observância do princípio da boa-fé.
Nas palavras de Tucci (2002):
“A boa-fé objetiva constitui um princípio geral, aplicável ao direito das obrigações, através do qual
se produz nova delimitação do conteúdo objetivo do negócio jurídico, especialmente o contrato,
mediante inserção de deveres e obrigações acessórios, ou produzindo a restrição de direitos
subjetivos, ou ainda através da aplicação de método hermenêutico integrativo, para interpretação
da declaração de vontade, sempre com vistas a ajustar a relação jurídica à função econômicosocial determinável no caso concreto.”
Não se pode confundir com a boa-fé instituída pelo Código Civil de 1916, onde se entendia como de boafé, o que era concebido em estado de ignorância, ou seja, o elemento subjetivo. A boa-fé aludida neste Novo
Código trata-se de boa-fé objetiva, o que significa ter as partes contratantes que observar certos deveres, certas
regras de conduta, agir com lealdade, honestidade e ética, princípios que norteiam a relação contratual. A boa-fé
está adstrita aos deveres de cooperação, de zelo, que se deve observar tanto o contratante quanto o contratado,
no cumprimento do contrato (Carvalho, 2008).
O conceito de boa-fé foi introduzido no ordenamento com a preocupação, principalmente, de resguardar
na relação contratual, a parte considerada mais frágil. Sua origem vem do Direito Romano, e é a partir do século
XX, quando se busca verdadeiramente uma solução justa perante um caso concreto, é que se encontra a boa-fé,
que reúne ao mesmo tempo uma reivindicação ética de respeito e cooperação com o outro. Trata-se de um
conceito amplo, ao qual se pode vincular qualquer regra sancionadora. A boa fé tem como funções principais
auxiliar na interpretação dos contratos (adjuvandi), suprir omissões que por ventura ocorram no acordo de
vontades, ou seja, acrescentar o que nele não está escrito (supplendi) e, ainda, corrigir o que for necessário
para ocorrer a justiça (corrigendi). Cumpre a ela também, ampliar obrigações, no sentido de integrá-las com
obrigações de respeito e preservação do direito de outrem; mitigar obrigações assumidas e operar modificações
quando o exigirem novas circunstâncias; além de seu uso como critério hermenêutico. (Loureiro, 2002)
Não obstante o uso dessa norma de caráter principiológico nos contratos deve-se observar também a
recepção da teoria da boa-fé pelo Código de Defesa do Consumidor, antecedendo o Novo Código Civil por cerca
de dez anos, ensejando a ampla difusão desta idéia no meio jurídico brasileiro. É entendimento de muitos
doutrinadores, que este princípio impera em todo o direito do consumidor (Tucci, 2002). Assim, cumpre informar
o estabelecido em seu art. 4.º, III: “a harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e
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compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de
modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da CF), sempre com base na
boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores”.
Nesse sentido, jurisprudências:
EMENTA:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL
PROMETIDO LIVRE E DESEMBARAÇADO. INSTITUIÇÃO POSTERIOR DE SERVIDÃO DE USO. DEVER DE
LEALDADE. VEDAÇÃO. Não pode ser oposta ao promitente comprador que ainda não obteve Escritura Pública a
instituição e inscrição posterior de servidão de uso de poço artesiano. CC/03 - Art. 422. Os contratantes são
obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boafé. Fere o dever da lealdade e da boa-fé instituir gravames ao imóvel pretendido vender sem a anuência do
promitente comprador. Preliminares rejeitadas, apelação improvida. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande
do Sul, 2008a
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO
DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE IMPORTAÇÃO. CLÁUSULA RESOLUTIVA. COMPRA E VENDA CONFIGURADA.
PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NO TRATO NEGOCIAL. 1. O princípio da boa-fé e probidade no trato negocial, conforme
preceitua o art. 422 do CC, deve se estender não só durante as tratativas, mas também na formação do
contrato. Depreendendo-se que ao convencionar condições suspensivas no pacto em questão, tentou a
demandante imputar a ré o risco integral do contrato. 2. As partes avençaram o pagamento das mercadorias
pela autora, na data da saída da fábrica, e o cliente exportador pagaria a postulante trinta (30) dias após o
embarque, sendo que a demandante recebeu um desconto no valor das mercadorias em função dessa
negociação. Ao tentar aumentar sua margem de lucro, a parte autora assumiu o risco da negociação, não
podendo agora pleitear que a demandada assuma o prejuízo decorrente de mal sucedida negociação de
exportação, cujo pedido de fabricação de milhares de calçados foi simplesmente cancelado pelo cliente
importador. 3. Ambas as partes devem suportar os riscos do negócio, a autora, que teve que arcar com o
pagamento de cerca de oito mil pares de sapatos, posteriormente os revendendo a um preço menor, e a
demandada, que fabricou cerca de cinco mil pares de sapato sem poder exportá-los, conforme era sua
expectativa, revendendo-os abaixo do preço de custo. 4. Honorários advocatícios readequados, não ensejando o
aviltamento dos valores a serem pagos ao profissional do direito e proporcionando-lhe a justa remuneração para
o caso em exame. Negado provimento ao apelo da demandada e dado parcial provimento ao recurso da autora.
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 2008b
EMENTA:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. RESCISÃO CONTRATUAL.
TELEFONIA CELULAR. A ré ofereceu a prestação de um serviço que não atendeu ao que fora ofertado à
demandante, não agindo com a lealdade contratual esperada, descumprindo, assim, o disposto no art. 422 do
CC. A autora comprovou ter entregue os aparelhos à demandada em face da insatisfação em relação ao serviço
ofertado, tendo em vista a deficiência de sinal e cobertura das linhas, assim como em decorrência de cobranças
indevidas, diferentemente do que foi contratado. Mantida a sentença que acolheu o pleito de rescisão contratual.
APELAÇÃO NÃO PROVIDA. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 2008c.
4.2 Função social do contrato
São três as principais funções do contrato, econômica, quando representa um instrumento de circulação
de riquezas e transmissão de bens; regulatória, enquanto reúnem direitos e obrigações voluntariamente
tomadas pelas partes e, social, ao passo que seu exercício aponta para a satisfação de interesses sociais.
Diferentemente do modelo clássico de contrato, na atual concepção a função social do contrato é elemento
indispensável para a garantia do justo equilíbrio social (Bierwagen, 2003).
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Em vista do disposto no artigo 421 do Código Civil, “a liberdade de contratar será exercida em razão e
nos limites da função social do contrato”, cumpre ainda observar na relação contratual a preservação de um
contrato justo, onde se considere as diferenças econômicas, sociais e culturais entre os contratantes, tudo, sem
afetar absolutamente, a autonomia da vontade, a liberdade de contratar. Nesse sentido o que se visa é impedir
que um contratante possa se prevalecer de sua posição superior para impor sobre o outro, condições injustas, ou
seja, a dominação dos mais fracos pelos mais fortes. Na realização de um contrato, deve-se cuidar pela
igualdade na distribuição de riquezas, assegurando que não haja alteração patrimonial das partes contratantes,
em razão do cumprimento do contrato, que não deve jamais ser razão de enriquecimento sem causa. O contrato
deve atender aos princípios básicos de nossa sociedade, qual seja a dignidade da pessoa humana, os valores
sociais do trabalho e da livre iniciativa, a igualdade, a solidariedade e circulação de riquezas, e, quando houver
violação a esses fatores, não estará cumprindo com sua função social (Loureiro, 2002).
A função social depende ainda do cumprimento de certos interesses chamados sociais ou coletivos, que
estão além das partes e que podem ser atingidos pelo contrato.
Tais interesses que abrangem os chamados interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos,
romperam com o clássico conceito da relatividade dos efeitos dos contratos, quando reconhecido o seu valor
sobre a coletividade, porém passaram a ser considerados limitadores do exercício da liberdade contratual. O
atendimento à função social do contrato pode ser observado sobre duas óticas: individual-coletiva, quando
garantida a igualdade de condições aos contratantes, gerar um bem estar coletivo, e, coletivo-individual, que
com o amparo do grupo social, garante-se a igualdade e a liberdade individuais (Bierwagen, 2003).
EMENTA:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. REVISÃO DE CONTRATO.
PRESENÇA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 282 DO CPC. INÉPCIA DA INICIAL AFASTADA. SENTENÇA
DESCONSTITUÍDA. 1. As partes devem observar os requisitos a que aludem os arts. 421 e 422, ambos do CC,
quando da efetivação do pacto, ou seja, atentar aos princípios da função social do contrato e da boa fé. 2. Dessa
forma, havendo desequilíbrio na relação contratual ou ofensa aos princípios informadores deste, cabe a
propositura de demanda para a averiguação de tais circunstâncias, a fim de que seja cumprido o disposto nas
normas precitadas. 3. Ademais, no caso em exame, restaram explicitados o pedido e a causa de pedir,
consubstanciados na revisão do contrato para o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro e forma de
adimplemento pretendida pela demandante. 4. Portanto, ao contrário do preconizado na sentença de primeiro
grau, a inicial atende aos requisitos do art. 282 do CPC, a fim de ser analisado o pleito formulado. Dado
provimento ao recurso para desconstituir a sentença de primeiro grau. Prejudicada a análise da preliminar de
cerceamento de defesa. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 2008d.
5 Poder dever do Juiz
Para exercer plenamente a jurisdição que lhe foi outorgada pelo Estado, visando dirimir conflitos e
estabelecer a efetividade da Justiça, o Juiz tem poderes-deveres, os quais estão dispostos no Código de Processo
Civil, em seus artigos 125 ao 133, estabelecendo que o mesmo deve dirigir o processo assegurando às partes
igualdade de tratamento, velar pela rápida solução do litígio, prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à
dignidade da Justiça, tentar a qualquer tempo, conciliar as partes, não poderá se eximir de sentenciar ou
despachar alegando lacunas da lei recorrendo se necessário à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do
direito, e decidir por equidade somente nos casos previstos em lei. Deve também decidir a lide nos limites em
que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões não suscitadas no processo, cabendo-lhe determinar as
provas necessárias à instrução do processo apreciando-as livremente e atendendo aos fatos e circunstâncias
constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes, mas os motivos que lhe formaram o convencimento
devem ser indicados em sentença. Responderá ainda, por perdas e danos quando proceder com dolo ou fraude
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no exercício de suas funções, ou ainda, quando se recusar, omitir ou retardar sem justo motivo, providência que
deva tomar.
Portanto, é defeso ao juiz proferir o “non liquet”, com base em lacunas, omissões, ou obscuridades da
lei. Deve sempre resolver a lide utilizando-se para tanto, de outros meios, como a analogia, os costumes e os
princípios gerais do direito. Há lacunas na lei, mas não no direito e a integração daquelas se dá por duas formas:
auto-integração, que se faz pela analogia, uma solução rígida favorecendo a conservação, que tem como foco a
lei, sujeitando a justiça à certeza dos fatos e instituída de preceitos abstratos; e heterointegração que ocorre
pelos costumes, princípios gerais do direito e equidade, sendo esta uma solução fluida, favorecendo a evolução
do direito, que tem como ponto central o juiz, que faz prevalecer a justiça à certeza e composta de preceitos
concretos (Nery Junior, e Nery, 2002).
Poderá o juiz, para um aproveitamento justo da lei, procurando uma solução mais justa possível, aplicar
a analogia, isto é, outra norma legal prevista para situação semelhante, caso não haja regra expressa na lei,
aplicável ao caso concreto. O juiz se servirá do direito positivo, porém dando uma interpretação extensiva,
julgando assim que o legislador dixit minus quam voluit, isto é, disse menos do que intencionava dizer. Já os
costumes também poderão ser aplicados na solução de lides quando praeter legis, ou seja, de acordo com o
sistema jurídico positivado, vale lembrar, portanto, que no Brasil, há a primazia de norma escrita. Também são
utilizados na solução de litígios, os princípios gerais do direito, que são regras consagradas na ciência do direito,
isto é, direito comparado, a história do direito, os grandes lineamentos dos institutos jurídicos, princípios
jurídicos não positivados.
Neste sentido, dispõe o artigo 5.º da LICC “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela
se dirige e às exigências do bem comum.”
Não está pacífico na doutrina brasileira, onde se busca saber se está de acordo ou não com o regime
democrático, o alcance do poder do juiz de determinar provas que serão produzidas podendo esta se dar “ex
officio” indeferindo aquelas que entenda serem inúteis ou protelatórias, e valorando-as de acordo com o sistema
de persuasão racional (livre convencimento motivado). É entendimento de parte da doutrina, como Moacyr
Amaral Santos e Vicente Greco Filho, citados por Câmara (2007), que este poder deve ser supletivo à iniciativa
das partes, sempre coerentemente com a sistemática do Código, observando a igualdade das partes, e utilizado
somente quando houver a necessidade de melhor entendimento da verdade pelo juiz, sem o que não conseguiria
proferir a sentença, convicto de sua decisão, uma vez que regra geral as partes é que devem produzir as provas.
Entende-se que com este poder o juiz poderia estar beneficiando uma parte em detrimento de outra, e que em
sendo assim, este poder só deveria ser utilizado em procedimentos de interesse público, ou de maneira
complementar a alguma prova já requerida pela parte, quando esta for insatisfatória para o seu convencimento.
Há ainda autores que entendam ser de caráter necessariamente supletivo esta iniciativa probatória do juiz, sob
pena de violação de sua imparcialidade. Em oposição a este entendimento José Roberto dos Santos Bedaque,
também citado por Câmara (2007), entende que poderá o juiz determinar a produção de provas, em qualquer
caso, devendo o disposto no art. 130, ser interpretado de forma mais ampla possível, e prossegue:
“Assim sendo, a atividade probatória também deve ser exercida pelo magistrado, não em
substituição das partes, mas junto com elas, como um dos sujeitos interessados no processo. A
maior participação do juiz na instrução da causa é uma das manifestações da ‘postura
instrumentalista que envolve a ciência processual’. Esta postura favorece, sem dúvida, a
eliminação das diferenças de oportunidades em função da situação econômica dos sujeitos.
Contribui, enfim, para a ‘efetividade do processo’, possibilitando que o instrumento estatal de
solução de controvérsias seja meio real de acesso à ordem jurídica justa”.
Corroborando com esta opinião, Câmara (2007) cita Fredie Didier Junior, Paula Sarno Braga e Rafael
Oliveira que assim se manifestam:
“Nada obstante, ainda se perceba, na doutrina, na jurisprudência e na própria legislação, certa
resistência à iniciativa probatória do magistrado, fruto da reminiscência histórica de um tempo em que se tinha
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uma visão eminentemente privatista do direito processual, pode-se dizer que hoje, com o desenvolvimento de
uma visão oposta, que enxerga o processo civil sob um ângulo mais publicista, a tendência é de se conferir ao
Estado-juiz os mais amplos poderes instrutórios”.
É claro, assim, se usarmos o direito comparado, que os limites dos poderes instrutórios do juiz, variam
demais de um ordenamento jurídico para outro, ou seja, alguns ordenamentos entendem serem possíveis
amplos poderes ao juiz, como o caso da Itália e Suíça, outros limitam tais poderes, e.g., o sistema norteamericano, porém é impossível negar o caráter democrático de qualquer deles.
Entretanto, não há como negar o desenvolvimento e incrementação dos poderes do magistrado com o
novo amoldamento das cláusulas gerais do Código Civil 2002, pela necessidade de interpretação – aplicação criação pelo juiz. Há uma tendência, ou melhor, característica de que a produção normativa não leva ao ideal de
segurança jurídica pregado historicamente. Entretanto, vale lembrar que entre a efetividade e a segurança, a
efetividade vem ganhando espaço. A segurança jurídica e os valores que representa são essenciais ao
ordenamento, não pode ser esquecida, porém o que se busca é dar uma maior ênfase de efetividade na
segurança ou de segurança na efetividade. Nesse sentido diz (Bueno, 2007): “não se compreende possa ser
mais o juiz dos dias atuais a mera “boca da lei”, deve ele, no seu ofício, bem capturar para bem aplicar, nos
casos concretos, os valores que estão dispersos pela sociedade e no próprio Estado, nas mais variadas facetas
de sua atuação especializada. O juiz, pois, tem que se voltar para a sociedade para bem aplicar o direito.”
Destaca ainda o autor, que a distinção entre lei e fato é falsa, pois entende que não há lei sem fato que
gere sua aplicação. Um conceito vago, um princípio, uma cláusula geral, pressupõe para sua aplicação e até
mesmo para sua interpretação, um fato. Existe proposta de que em função desta simbiose entre fato e lei, que o
tradicional silogismo jurídico, onde a premissa maior é a lei, a premissa menor o fato, e a conclusão é a
subsunção da lei ao fato, seja invertida, pois é entendimento que a compreensão do fato deva ser essencial, ou
seja, a premissa maior, até mesmo para a identificação da lei a ser aplicada.
Nesse aspecto, entendimento de Gozaíni (2007):
“Em suma, estamos ante um cambio de paradigmas, La pregunta sigue siendo la del inicio ¿han
cambiado los pilares Del derecho procesal? O solamente necesitan reforzar sus cimientos al conjuro
de los modelos novedosos de controvérsias.
Por eso, asi como em El derecho constitucional se há pensado que desde el neocontitucionalismo
se avizoran algunas respuestas para esta suerte de cambio em La formación de los valores
constantes y trascendentes que proclaman lãs Normas Fundamentales, donde los derechos
humanos y La jurisprudência de los tribunales que los interpretan, provocan uma influencia
innegale em lãs funciones de los demás poderes (em especial el ejecutivo y parlamentario);
también creemos que existe um neoprocesalismo, que com iguales estándares de seguimiento y
observación, tiendem a crear emplazamento renovado para nuestra ciência.”
6 Conclusão
A intervenção do Estado na Economia se dá pelo legislador, com a lei, e pelo governo (Executivo), com
atos individuais ou normativos. Mas, além destas duas, há ainda a intervenção do Estado pelo juiz, que se dá
com a aplicação de cláusulas gerais no âmbito obrigacional, especialmente a cláusula geral da boa-fé. (Aguiar
Junior, 2000b).
Com o Código Civil de 1916, nos deparávamos com um código fechado, individualista, de caráter
conservador, onde se pensava que todos os conflitos se resolveriam com as leis já positivadas, supunha-se ser
um sistema jurídico perfeito, onde o papel do juiz era ser mero aplicador da lei, e a ela submisso.
Especificamente nos contratos, a vontade era a lei entre as partes, ou seja, fazia-se justiça cumprindo fielmente
o que nos contratos era estabelecido. A realidade foi modificando este pensamento, e clamava por um novo
código onde realmente se pudesse fazer justiça, em uma dimensão concreta. Surgiu então o Novo Código Civil,
em janeiro de 2002, com aspecto inovador e modificador da velha ordem jurídica, incutido de princípios e
cláusulas gerais e conceitos vagos, que permitem ao intérprete juiz, uma maior liberdade de interpretação e
aplicação de suas normas, sempre adaptada e adequada à solução do caso concreto. É um código considerado
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aberto e flexível, que transformou a missão do juiz, em uma missão criadora, valorativa do caso específico, para
uma melhor decisão em busca da concreção da justiça. Relativamente ao tema deste trabalho, que é voltado à
interpretação dos contratos, temos no novo código, as cláusulas gerais da boa-fé objetiva e da função social do
contrato, limitando o princípio do “pacta sunt servanda”, onde realmente abre a possibilidade de revisão dos
contratos, que se mostrem onerosos ou prejudiciais aos contratantes. É entendimento que nos dias atuais,
exigem-se juízes que exerçam esse poder criativo, preparados e mais atentos à realidade atual, aos usos e
costumes locais. Embora não se trate deste assunto, não se pode olvidar haver muitas críticas, pois esta
abertura implica numa mudança de paradigma e de posições clássicas.
Põe-se de lado o juiz mero aplicador automático da lei, para ir ao encontro com o juiz que se sabe
necessariamente influenciado pelos valores sociais, justos e éticos. O Juiz é hoje, compreendido como elo
fundamental na cadeia de produção normativa, pois além de aplicar o direito o juiz deve ter poderes para
realizar concretamente sua decisão.
Neste sentido, tendo sido adotado pelo Novo Código Civil, cláusulas gerais que lhe dão poder criador de
aplicação aos casos concretos, é claro, sempre precedido da observância de normas que neles se adaptam, têm
o Juiz o dever de se apoiar para a tomada de decisões, em princípios e normas, que o levem a elucidar de forma
clara e objetiva os casos que se lhe apresentem, para propiciar a justiça de forma eqüitativa e isonômica para
todos.
Portanto, do uso de cláusulas gerais, deriva a abdicação da tipicidade, ficando reforçado o poder
revisionista do Juiz, de onde se exige uma magistratura mais preparada para o desempenho de sua função, e
mais atenta aos usos e costumes locais (Aguiar Junior, 2000a).
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04/06/2007
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Decisão: 22/05/2007
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Hatanaka, Órgão julgador: 19ª Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 21/08/2007 Data de registro:
29/08/2007
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação Com Revisão 614823600, Relator(a): Daniel
Peçanha de Moraes Júnio, Comarca: Jundiaí, Data do julgamento: 10/12/2001, Data de registro: 19/12/2001
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70024086175, Décima Nona Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Guinther Spode, Julgado em 15/07/2008a
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70021120738, Décima Segunda Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 27/03/2008b
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70022262240, Décima Segunda Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudio Baldino Maciel, Julgado em 28/02/2008c
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70020409041, Décima Segunda Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 27/03/2008d
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