Revista Eletrônica da Faculdade Metodista Granbery http://re.granbery.edu.br ‐ ISSN 1981 0377 Curso de Pedagogia ‐ N. 9, JUL/DEZ 2010 MAÇONARIA E EDUCAÇÃO: o debate sobre a instrução popular na Tribuna da Glória – RJ (1873-1880)1 Milena Aparecida Almeida Candiá2 RESUMO O objetivo central de meu estudo tem sido compreender de que forma as Conferências Populares da Glória tornaram-se um espaço privilegiado para a circulação e concretização de um projeto educacional maçônico. Experiência que teria, a meu ver, garantido, em certa medida, ações concretas em prol da expansão da escolarização popular na Corte entre os anos de 1874 e 1889, dentre as quais cito a fundação da Associação Promotora da Instrução (1874), que protagonizou, entre outras iniciativas, a criação da Escola Senador Corrêa e do Museu Escolar Nacional (1883) – tendo mais tarde a segunda instituição ganhado a denominação de Pedagogium (1890), ao ser incorporado às primeiras experiências educacionais da República.3 Além disso, tenho buscado compreender o papel da organização maçônica no movimento associativista do final do século XIX, na cidade do Rio de Janeiro, divisando em que medida o princípio de associação serviu como norte para a consolidação das propostas de expansão da escolarização popular neste período. PALAVRAS-CHAVE: Maçonaria. Educação Popular. Conferências Públicas. 1 Este artigo apresenta alguns resultados de minha pesquisa de doutorado, a qual tem como temática de investigação a atuação da Maçonaria e de seus maçons no cenário cultural e educacional brasileiro, no período de transição entre Império e República. A pesquisa tem trilhado as iniciativas maçônicas em torno da defesa e da expansão da escolarização popular no país, bem como as estratégias de difusão e circulação de seu ideário político e educacional no período recortado. 2 Doutoranda do Programa de Pós‐Graduação em Educação da UFF; 3 O Museu Pedagogium, criado em 1890, por Benjamim Constant (Dec. nº 667, de 16 de agosto de 1890), foi considerado uma das mais importantes iniciativas republicanas no campo educacional. Sua consolidação teria se dado, sobretudo, pela atuação de Joaquim José de Menezes Vieira, seu primeiro diretor (1890-1896). A gestação da ideia de concretização da instituição, de acordo com Bastos (2008), teria se dado já na década de 1880, e da qual a República foi herdeira. Segundo Bastos (2008), seu projeto de criação é de autoria de Franklim Ramiz Galvão, quando atuou como Inspetor da Instrução Primária e Secundária, quando teria requisitado a biblioteca e o material clássico da extinta Associação Mantenedora do Museu Escolar (1883) e de sua coirmã, a Associação Promotora da Instrução (1874). Figura como membro fundador de ambas as instituições o Conselheiro Manoel Francisco Corrêa, o organizador das Conferências Populares da Glória. Cabe ressaltar, ainda, que tanto Menezes Vieira quanto Ramiz Galvão foram conferencistas na Tribuna da Glória. Pretendo abordar este assunto no quarto capítulo da tese. (Sobre o Pedagogium, ver: BASTOS, Maria Helena Câmara, O Pedagogium registros de memórias da educação no Brasil (18901919). Anais do VII Congresso Luso-brasileiro de História da Educação, Porto, 2008) RESUMO La finalidad central de mi estudio es compreender de que manera las “Conferências Populares da Glória” quedaranse como um espacio conveniente para concretizarse um proyecto educacional masónico. Experiencia que tendría garantizado acciones concretas en la expansión de la escolarización popular en la Corte em medio los años 1874 y 1889. Yo menciono la “Fundação da Associação Promotora da Instrução (1874) que llevó la criación de la “Escola Senador Cortez” y de el “Museu Escolar Nacional (1883) – esto último ganó la denominación de “Pedagogium” em el año de 1890 habiendo sido añadido en las primeras experiencias de educación de la República. Además tengo buscado compreender la importância de la organización masónica e el movimiento asociativista de el final del siglo XIX em la ciudad de Rio de Janeiro. Busco tambien saber como el principio de la asociación se prestó como norte para la consolidación de la propuesta de expansión de la educación escolar popular en esta misma época. PALAVRAS LLAVE: Educación masónica. Conferencias publicas. As Conferências públicas, tomadas como espaços de debate e de circulação de ideias, tornaram-se uma prática bastante difundida na segunda metade do século XIX. No Brasil, o debate que se deu fora da Imprensa e da tribuna parlamentar esteve inicialmente situado nas associações científicas e literárias que despontavam no país no início dos anos de 1830. Posteriormente, já no Segundo Reinado, com o processo de consolidação dos mecanismos de arbitramento para os conflitos das elites políticas, configura-se um ambiente mais propício às práticas de debates públicos (CARVALHO, 2007). O primeiro ciclo de conferências públicas emerge, como observa Carvalho (2007), em 1849, com a crise gerada pela dissolução do Gabinete Liberal e a ascensão dos conservadores em 1848. Os liberais da capital organizaram conferências com o intuito de definir as estratégias do partido para a campanha eleitoral do ano seguinte. Tais eventos contaram com a presença de chefes liberais da Regência, como Teófilo Ottoni, Alves Branco, além de políticos da geração do Segundo Reinado, como Sales Torres Homem. Com algumas exceções, entre as quais o autor cita as posições sustentadas por Carlos Bernardino de Moura, estas conferências giraram basicamente em torno do debate eleitoral. O segundo ciclo de conferências públicas verificou-se em 1869, mais uma vez, como consequência de uma nova crise política, gerada pela queda do 2 Gabinete Liberal. Um grupo de descontentes com a política do Império e distante dos quadros dirigentes do liberalismo fundou os clubes radicais em 1868. O primeiro foi estabelecido no Rio de Janeiro sob a liderança do senador, por Goiás, José Inácio Silveira da Mota. A partir desta iniciativa, vários clubes radicais foram organizados no país, com destaque para o Clube Radical Paulistano, um dos mais atuantes. Cita-se ainda o clube de Recife, o de Campinas e outros em cidades nas províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Esse grupo preocupado em promover debates públicos, acabou por reeditar a experiência de 1849. Assim, no decorrer do ano de 1869, foram realizados vários debates, que ficaram conhecidos como as “Conferências Radicais”. Essas conferências foram inicialmente organizadas na Corte e, logo em seguida, também em São Paulo e Recife. O debate centrou-se nas críticas à organização política do Império, que se desdobraram nas propostas de extinção do Poder Moderador, da Guarda Nacional e do Senado vitalício, na independência do Judiciário, entre outras. Apesar da conotação política, reformas de liberalização da sociedade são defendidas, como as liberdades de ensino, de crença e de comércio, tendo os radicais defendido, também, a abolição da escravidão (CARVALHO, 2007, p. 34). Os conferencistas “radicais” eram, na sua maioria, jovens da geração do Segundo Reinado; figurando como mais novo do grupo, Rui Barbosa, com apenas 20 anos de idade. Vários desses conferencistas se converteram ao republicanismo no ano seguinte, foi o caso de Francisco Rangel Pestana, Henrique Limpo de Abreu, Bernardino Pamplona, Silveira da Mota. No grupo dos radicais identifiquei, ainda, dois que atuaram mais tarde na Tribuna da Glória: José Liberato Barroso4 e (Pedro) Antônio Ferreira Vianna, sendo o primeiro também maçom. 4 Nasceu em Aracati, 21 de setembro de 1830, filho de Joaquim Liberato Barroso e Francisca Luduvina Barroso. Fez os estudos superiores em Recife, na Faculdade de Direito: bacharelou-se em 1852, doutorou-se em 1857 e, cinco anos depois, aprovado em concurso, passou a integrar o corpo docente. Foi Deputado Provincial e Deputado-geral pela sua província. Ocupou cargo de Ministro do Império e presidiu a província de Pernambuco em 1882. Quando Ministro, teve a delicada missão de referendar os contratos de casamento das Princesas Isabel e Leopoldina e foi agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Ernestina, da Casa Ducal da Saxônia. Um dos fundadores e Presidente da Sociedade de Aclimação do Rio de Janeiro, cujos objetivos se assemelhavam aos das entidades ecológicas de nossos dias. Entre os trabalhos que publicou devem ser mencionados: Dissertação na Defesa de Tese para Tomar o Grau de Doutor em Direito; Criação da Vila do Aracati; Observações Sobre o Artigo 61 da Constituição Política do Império; necrológio do Desembargador Antônio José Machado; Não se pode dar Conflito entre o 3 Carvalho (2007) aponta, ainda, no ano seguinte ao término das Conferências Radicais, as conferências realizadas por Quintino Bocaiúva, em julho de 1870. A temática de suas preleções girou em torno da defesa do casamento civil, da separação da Igreja e do Estado e do papel da mulher na sociedade, temas recorrentes na agenda de discussão da Maçonaria naquele período. Fato que não nos surpreende, por ter sido Quintino Bocaiúva membro atuante da Maçonaria “republicana”, do Grande Oriente dos Beneditinos. No entanto, assinala Carvalho (2007), a iniciativa mais exitosa e de maior duração foi sem dúvida a das Conferências Populares da Glória, tendo sido a primeira iniciativa de êxito a de promover debates abertos sobre temas de interesse público. Instituídas em 23 de novembro de 1873, sob a coordenação do Conselheiro Manoel Francisco Correia (1831-1905) 5, seu idealizador, essas conferências estenderam-se até a República. Realizadas em um salão das escolas públicas da Freguesia da Glória, no Rio de Janeiro, tiveram o intuito, segundo seu organizador, de estabelecer um espaço para a divulgação da ciência, das artes e da cultura em geral. De acordo com os levantamentos minuciosos de Fonseca (1996) e Carula (2007), no período de 1873 a 1880 foram realizadas um total de 354 conferências com a participação de cerca de 90 conferencistas, os quais eram, em sua maioria, médicos e bacharéis reconhecidos em outros círculos letrados e institucionais. Muitos deles atuavam junto ao Conselheiro, seja no parlamento, na Associação Promotora da Instrução, na Sociedade de Direito e a Moral; Índices Alfabéticos do Código Criminal e do Código Comercial; Compilação das Leis Provinciais do Ceará; Questões Práticas de Direito Criminal; A Instrução Pública no Brasil (volume de 310 páginas); A Letra de Câmbio Segundo o Direito Pátrio; Contratos e Obrigações Mercantis e O Espírito do Cristianismo (conferência realizada no Grande Oriente Unido do Brasil). Escreveu e traduziu novelas do francês, inglês, alemão e espanhol. Defendeu o fim do cativeiro negro, participando de atividades da Sociedade Abolicionista Cearense. Morreu no Rio de Janeiro, 2 de outubro de 1885.http://www.ceara.pro.br/acl/Patronos/LiberatoBarroso.html Foi membro do Grande oriente dos Beneditinos (Ver almanak73 p.399) 5 Nasceu a 1º de novembro de 1831, na cidade de Paranaguá (PR); faleceu em junho de 1905, no Rio de Janeiro. Bacharel em Direito pela Faculdade de São Paulo; Presidente de Província, Conselheiro de Estado Extraordinário, Deputado e Senador (1877-1889) pela província do Paraná e Ministro dos Negócios Estrangeiros no gabinete de Rio Branco; Chefe da Diretoria Geral do Tribunal de Contas (governo de Floriano Peixoto). Como Chefe da Diretoria Geral de Estatística, dirigiu o primeiro recenseamento da população do Império. Sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, membro fundador da Associação Promotora da Instrução (1874), da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro (1883). Ver BLAKE, 6º volume p. 84-86. Ver ainda: http://www.senado.gov.br/senadores/senadores_biografia.asp?codparl=2062&li=16&lcab=18771878&lf=16 4 Geografia do Rio de Janeiro ou no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; estando esses intelectuais, de alguma maneira, engajados com a causa da educação. Para Carula (2007), tais preleções, tomadas pela elite letrada carioca como um novo espaço de sociabilidade, transformaram-se em um locus privilegiado de formação de opinião pública. Segundo a autora, a tribuna da Glória ganhara destaque na imprensa, que trazia artigos sobre as ideias ali difundidas pelos intelectuais presentes naquela tribuna, visibilidade que teria garantido, em certa medida, a legitimidade deste novo espaço de sociabilidade, colaborando, assim, para a disseminação e cristalização das ideias apresentadas. Sua divulgação pela imprensa teria permitido, ainda, a diluição das contundentes críticas expostas pela comunidade católica, deixando transparecer o acirramento do embate ideológico entre Igreja e pensamento liberal, evidente no período. Para Bastos (2002), as conferências da Glória podem ser consideradas como uma modernização intelectual que procurava corresponder às mudanças socioeconômicas do período. Elas estiveram intimamente vinculadas à ampliação do mercado editorial, em especial no campo educativo, como também à expansão das iniciativas de criação das bibliotecas populares e pedagógicas no final do século XIX. Diante do exposto, busquei neste trabalho evidenciar o engajamento de intelectuais maçons6 que atuaram na idealização e efetivação das Conferências Populares da Glória. Sustento a hipótese de que essas conferências teriam servido como um espaço privilegiado de circulação de um ideário educacional maçônico. Em especial, o projeto de expansão da escolarização popular por intermédio da mobilização da sociedade pelo princípio da associação. Como suporte empírico, tenho recorrido à imprensa maçônica, em especial, o Boletim do Grande Oriente do Brasil (1871-1880), à revista Conferências Populares, publicada em 1876, o Almanak Laemmert (1870 6 A atuação desses maçons é compreendia neste trabalho a partir das noções de intelectual e engajamento propostas por Sirinelli (2003), que compreende a especialização e o reconhecimento de um intelectual em uma dada sociedade a partir de suas ações nesta mesma sociedade. Dito de outro modo, o status de um intelectual só se legitima pelo seu engajamento e por suas intervenções nos debates da cidade, colocando-se a serviço das causas que defende (SIRINELLI, 2003). 5 1889), além do Jornal do Commercio do Rio de Janeiro. Apresento a seguir os primeiros resultados de minha pesquisa, guardando a devida atenção ao caráter preliminar dos mesmos. OS PEDREIROS LIVRES NA TRIBUNA DA GLÓRIA O trabalho de Carula (2007) já nos aponta uma possível interseção entre as Conferências Populares da Glória com a Maçonaria. Para a pesquisadora, a Imprensa, ao dar visibilidade às Conferências, na década de 1870, colaborou para a disseminação e legitimação das ideias apresentadas naquela tribuna, o que teria repercutido também de forma polêmica. Representada pelo jornal O Apóstolo, a Igreja Católica, desde o início, posicionou-se frontalmente contra tal iniciativa. Foi a partir do periódico que a Igreja procurou evidenciar a relação entre as Conferências e a Maçonaria. Para os católicos do O Apóstolo, a realização desses eventos representava mais uma afronta dos maçons contra a Igreja (CARULA, 2007, p. 32-33). A autora reforça esta interseção ao registrar, em seu levantamento, a ocorrência de preleções públicas organizadas pelo Grande Oriente do Brasil; iniciativa que teria ocorrido anteriormente às Conferências da Glória. Segundo o levantamento da autora, alguns dos oradores que discursaram no salão do Grande Oriente também estiveram presentes na tribuna da Glória, como Tristão de Alencar Araripe7, Luiz Corrêa de Azevedo, José Liberato Barroso, José Antonio Fernandes Lima, João Pizzaro Gabizo, Augusto Cezar Miranda de Azevedo, Rodrigo Octavio, 7 Filho do tenente coronel Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, o presidente do grande conselho provincial na república do Equador, como tal assinado na ata lavrada a 26 de agosto de 1821 na cidade de Fortaleza, capital do Ceará, e dona Ana Tristão de Araripe, nasceu na cidade do Icó a 7 de outubro de 1821. Bacharel em ciências sociais e jurídicas pela faculdade de S. Paulo, tendo feito parte do respectivo curso na de Olinda, dedicou-se à magistratura, em que exerceu vários cargos, até o de ministro do supremo tribunal de justiça e do supremo tribunal federal, em que se empossou, sendo agraciado com o título de conselho do Imperador D. Pedro II e condecorado com o oficialato da ordem da Rosa. Representou sua província natal em várias legislaturas da assembleia geral, presidiu as províncias do Pará e do Rio Grande do Sul, e foi ministro da fazenda no governo do marechal Deodoro, ocupando depois o cargo de ministro da justiça e negócios interiores. É sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro e de outras associações de letras, e escreveu: Relações do Império do Brasil: compilação jurídica. Rio de Janeiro, 1874, 375 pags. In-4º. Males presentes por Philopoemen. Pernambuco, 1864, 64 pags. In 4º. BLAKE, 7º VOLUME, PAGS 320-324 6 episódio que reforçaria uma possível ligação desses conferencistas com a Maçonaria.8 Apesar de Carula (2007) não aprofundar tais assertivas, seu trabalho serviu como ponto de partida para minhas investigações. De fato, pelo que pude levantar até o presente momento, dos conferencistas listados anteriormente pela autora, que estiveram presentes nas Conferências do Grande Oriente, somente os dois últimos não foram identificados como maçons. Os demais aparecem de forma recorrente nas fontes consultadas como filiados aos dois Grandes Orientes existentes no período.9 Do que pude levantar, fica claro que era prática bastante difundida na década de 1870 a ocorrência de conferências dentro da Maçonaria, sejam aquelas organizadas no âmbito de Lojas ou por grupo de maçons fora dos limites da instituição. Vale citar como exemplo, neste período, as Conferências Democráticas do Cassino10, série de preleções realizadas em Lisboa em 1871, organizadas por um grupo de intelectuais, liderados por Antero de Quental. Segundo trabalho de Monteiro (2006), há várias evidências sobre a relação da Maçonaria com a realização dessas conferências. A pesquisadora aponta a ligação de alguns desses intelectuais com tal instituição, como foi o 8 Ver conferencistas maçons Quadro 3. A atuação maçônica no território brasileiro, apesar de ininterrupta, ocorreu em ritmo bastante peculiar. No decorrer de seu processo de institucionalização e expansão no século XIX, cisões e conflitos marcaram a dinâmica desta organização, evidenciando limites e contradições. Tais conflitos tornaram-se mais evidentes com a divisão da Ordem em dois polos de ação, quando, no período entre 1863 e 1883, a Maçonaria transformou-se em um campo de disputa entre diferentes concepções sobre a forma de atuação na sociedade. Observa-se neste período uma acirrada polarização de seu poder central, dividido entre duas Obediências distintas: O Grande Oriente do dos Beneditinos, de orientação republicana, liderado por Saldanha Marinho, e o Grande Oriente do Brasil do Lavradio, de orientação monarquista, liderado pelo Visconde do Rio Branco. Segundo o autor, a primeira Obediência sofria grande influência da corrente maçônica francesa, adepta a uma atuação mais vigorosa e política da maçonaria na sociedade, enquanto, a segunda, com maior influência da corrente inglesa, sustentava a ideia de que a maçonaria deveria se identificar com a fraternidade universal, restringindo sua ação à filantropia, à beneficência e ao aperfeiçoamento moral e intelectual das massas. Essas discordâncias não impediram, em certa medida, que a Maçonaria apresentasse um projeto de ação mais ou menos coeso no período. Para Barata (1999), a “alta política” empreendida por esta instituição pode ser observada a partir de seu engajamento nos grandes temas que agitaram o cenário político e social da época, como o movimento abolicionista e o movimento republicano, como também seu envolvimento em projetos sociais, dos quais a expansão da escolarização popular ganhou centralidade. Sobre isso, ver também Colussi (2003). 9 10 Refere-se a uma série de cinco palestras realizadas no Cassino Lisbonense, no ano de 1871, pelo grupo do Cenáculo, grêmio formado por um grupo de jovens escritores e intelectuais liderados ideologicamente por Antero de Quental e José Fontana, grupo do qual fizeram parte alguns dos maiores escritores da Literatura portuguesa no período, como Eça de Queiroz, Ramalho Ortigão, entre outros. Racionalistas, herdeiros do positivismo de Comte, do idealismo de Hegel e do socialismo utópico de Proudhon e Saint-Simon, em defesa da relevância de um reformismo social para Portugal. Ver Monteiro (2006). 7 caso de Antônio Ennes, autor da peça teatral Os Lazaristas, cuja representação gerou polêmicas, sobretudo por parte da comunidade católica portuguesa e também brasileira, devido à tônica anticlerical dada pelo citado autor à obra.11 Em minha investigação, realizada em publicações do Boletim do Grande Oriente do Brasil entre 1871 a 1880, encontrei diversos registros que evidenciam a preocupação da Maçonaria e de seus maçons com a organização de Conferências. Sob a influência da maçonaria francesa e com uma tônica fortemente anticlerical, esses intelectuais estiveram imbuídos não apenas em difundir os preceitos maçônicos, mas, sobretudo, debater temas pertinentes à época, como o casamento civil, a família, o ensino laico, a educação das classes operárias, o princípio de associação e o papel da mulher na sociedade. Assim, propõem-se: Imitemos os nossos irmãos franceses promovendo em nossas lojas conferências, onde sejam admitidos os profanos, ou seja, então elas feitas em lugares públicos para que todos conheçam o que somos e o que pretendemos, e uma vez por todas respeitem-nos como amigos da humanidade, sem os preconceitos calculadamente instigados pelos modernos jesuítas. É um meio de fazer conhecer em toda a sua pureza em toda a sua glória a Maçonaria que, não deve somente instruir os seus filhos, mas propagar também a instrução em todas as classes.12. No tocante a este propósito, nota-se que, a despeito de registros desta iniciativa em outras Lojas do Círculo do Lavradio, os indícios nos apontam para o pioneirismo da Loja Dezoito de Julho na organização de conferências maçônicas na corte, desde 1871. Tal evidência tornou-se relevante para a presente investigação, uma vez que eram membros atuantes desta Loja vários Conferencistas da tribuna da Glória. Além do próprio Conselheiro Manoel Francisco Correia, idealizador e organizador das conferências Populares, cito, ainda, como membros efetivos da Loja, o Desembargador Tristão de Alencar 11 Em sua pesquisa, Monteiro (2006) buscou reconstituir historicamente o impacto ideológico provocado pela censura da representação da peça Os Lazaristas, no Brasil, em 1875. Nesse trabalho a pesquisadora trouxe à luz fortes indícios do vínculo da Maçonaria brasileira com as produções culturais em fins do século XIX. MONTEIRO (2006). 12 Ver Boletim do Grande Oriente do Brasil, maio de1872, p. 182. 8 Araripe, os médicos Dr. Luiz Correia de Azevedo, Dr. Soeiro Guarany e Francisco Antônio de Carvalho (Júnior). Inicialmente essa Oficina realizou algumas discussões sobre pontos filosóficos de interesse maçônico, com o intuito de induzir seus membros aos estudos dos “mistérios” da Ordem. Posteriormente, tais discussões constituíram-se na principal ordem do dia dos trabalhos da Loja, franqueando suas sessões aos obreiros das outras oficinas do Círculo. Mais tarde, esses eventos extrapolaram os limites internos, abrindo-se para o público profano, com a presença também do público feminino. Sobre tal iniciativa, assinalou o articulista do Boletim do Grande Oriente do Brasil, em seu 2º número, em janeiro de 1872: Fazemos voto para que ela não esmoreça em tão louvável intuito: com tais esforços consegue-se robustecer a têmpera do espírito em lutas lealmente travadas e do embate das armas da inteligência do estudo sempre faíscam centelhas de saber e de ciência, incentivo muito mais nobre sem dúvida do que as discussões pessoais e mesquinhas que apenas concorrem para que o gelo da descrença e do desânimo invada o coração dos verdadeiros Filhos da Viúva. (Grifos do autor). 13 Ainda não foram encontrados registros que justifiquem a iniciativa de intelectuais maçons de criar um novo espaço para a realização de conferências públicas, uma vez que tais eventos já eram difundidos por lojas maçônicas. Como veremos a seguir, alguns desses intelectuais também estiveram à frente da criação e administração da Associação Promotora da Instrução, sociedade a qual coube, mais tarde, a organização das Conferências Populares da Glória. A hipótese que levanto, ao considerar o contexto de crise entre Maçonaria e Igreja no período, é a de que se buscou, a partir da efetivação da Tribuna da Glória, garantir, ao mesmo tempo, a ampliação e popularização de tais práticas culturais quanto a sua legitimidade, garantida pelo caráter de neutralidade das mesmas, já que neste espaço “teoricamente” era vedada qualquer discussão de ordem política ou religiosa. No mês de dezembro de 1873, o Boletim noticia a realização da 1ª Conferência Popular da Freguesia da Glória, proferida pelo Conselheiro Manoel Francisco, cujo tema versou sobre o ensino obrigatório. Em consonância com 13 Idem, Janeiro de 1872, p. 68. 9 as ideias apresentadas naquela tribuna, o articulista, ao elogiar a iniciativa patriótica do irmão, traça alguns comentários, os quais revelam a relevância dada à expansão da educação popular: Aqueles que consideram o dever como uma santa faculdade da liberdade do homem, porque é esse dever o resultado da compreensão dos direitos, todos seus, não devem parar ante a expressão ensino obrigatório, porque significa ele apenas só o dever de saber, o que é de todos os cidadãos da comunhão da civilização. O Estado deve ensinar, assim como o cidadão deve saber. Se, pois, o Estado tem essa obrigação por que não deve o cidadão ter outra obrigação? O mais nobre de todos os impostos é sem dúvida o ensino obrigatório; porque por meio dele aprende o cidadão a conhecer seus direitos assim como se inicia em todos os santos deveres a cumprir em sociedade e na família. Não basta esperar que o homem do trabalho mande seu filho para a escola, que é a universidade do ensino primário; convém impor essa obrigação, e, aliás, com aquele lógico rigor de que se serve a lei. Vastíssimo será o círculo das liberdades humanas, quando a instrução se espalhar mais geralmente; vastíssimas serão as aspirações legítimas daqueles que se libertam da ignorância e entram no mundo de luz da inteligência esclarecida. [...] Nós, sonhando liberdades de toda a casta, só esquecemos a verdadeira, a positiva liberdade do homem, isto é, o saber. Para consegui-lo, pois, convém dar à instrução pública uma forma rigorosa e com a máxima possibilidade de bom êxito; isto só o consegue o ensino obrigatório.14 Outro indício que reforça a possível interseção entre a Maçonaria e o projeto de realização das Conferências Populares revela-se na disposição das lojas Dezoito de Julho e de sua filial Igualdade Beneficência, de realizarem doações, no ano de 1874, para a Associação Promotora da Instrução, instituição criada em janeiro de 1874 no salão das Conferências Populares, por iniciativa do Conselheiro Correia e de um grupo de intelectuais composto por conferencistas, alguns identificados como maçons da já citada Loja Dezoito de Julho. Assim, procurei no item seguinte, traçar os resultados preliminares de minha investigação sobre a atuação desses intelectuais em prol da expansão da escolarização popular no período. 14 Ver Boletim do Grande Oriente do Brasil, dezembro de 1873, p. 892 a 894. 10 AS CONFERÊNCIAS POPULARES E A ASSOCIAÇÃO PROMOTORA DA INSTRUÇÃO (1874) Das diversas conferências que tiveram como tema a educação, observase a tônica dada ao papel das associações particulares como elementos de difusão da instrução popular, temática que esteve presente de forma bastante sistemática nas preleções do Conselheiro Manoel Francisco Correia. Em seu discurso, ao se referir à instrução pública como um assunto do maior interesse social e de progresso individual, demonstra sua preocupação com o estado lastimável em que se encontrava esse ramo da administração. Segundo o orador, para uma nação prosperar não bastaria apenas cuidar dos “melhoramentos materiais”, mas era indispensável também cuidar do desenvolvimento intelectual da nação, uma vez que tais elementos não podiam ser tomados de forma dissociada. Desse modo, amparado em levantamentos estatísticos sobre a realidade educacional do país e da realidade financeira das províncias, sustentou a necessidade da reunião de todos os esforços possíveis para que, em matéria de instrução, o país saísse da letargia em que se encontrava. Diante disso, argumenta o orador: O que cumpre então fazer para alterar profundamente uma situação que não pode trazer crédito ao Brasil? Cumpre que associações particulares operem virilmente a transformação que os algarismos estão exigindo neste ramo de serviço, cujo atraso não pode deixar de ferir o sentimento de pundonor nacional. Muitas vezes, essas posições foram sustentadas por um discurso persuasivo, como o que se segue: É chegado o momento de erguer o brado para que se manifeste em toda parte a iniciativa particular em matéria de ensino. Eu solto esse brado, [...], e possa ele encontrar eco simpático no coração de meus compatriotas, que estará realizado um dos meus mais ardentes votos. 15 15 Ver Conferências Populares, livro 1, janeiro de 1876, p. 7-8. 11 E, assim, reforça o orador que “aquele que se isola em censurável egoísmo, não procurando senão o bem-estar individual mutila o nobre fim da criatura humana, a quem a Divina Providência, para dar-lhe maior realce, fez a um tempo membro de uma família e cidadão de um Estado” (CORREIA, 1876).16 Diria que o Conselheiro Correia utilizou a tribuna da Glória como espaço de mobilização de seus pares no sentido de sustentar ações para a concretização de projetos de expansão da escolarização popular, dos quais faziam parte a criação e manutenção de escolas e bibliotecas. Nessa direção, como parte desta iniciativa, em janeiro de 1874, no espaço das Conferências, foram criadas duas associações voltadas para educação popular. A Associação Promotora da Instrução de Meninos e a Associação Promotora da Instrução de Meninas. Sobre isso, publicou o Jornal do Commercio, em 1º de janeiro de 1874: Instalou-se hoje, às 11 horas da manhã, no edifício das escolas da Glória, duas associações, uma de senhoras e outra de cavalheiros, que tomam a si o patriótico empenho da difusão do ensino popular. Esperamos que as províncias imitem este nobre exemplo... A Associação Promotora da Instrução de Meninos teve como presidente o próprio Conselheiro Manoel Francisco Correia, mantendo-se neste cargo mesmo com a junção das duas associações em 1881. De acordo com os dados até agora levantados, há fortes indícios de que Correia permaneceu nesta função até a extinção da associação no início da República. Outros conferencistas fizeram parte desta associação, seja como membros de sua Administração ou de seu Conselho. Cita-se aí, além do próprio Conselheiro Correia, presidente da associação, os conferencistas Luís Joaquim Duque-Estrada, Dr. Afonso Celso de Assis Figueiredo, o Conselheiro Tristão de Alencar Araripe, Dr. Feliciano Bittencourt e o professor Manoel Jesuíno Ferreira, tendo esse último ocupado o cargo de Superintendente das 16 Idem, p. 9. 12 aulas do Curso Noturno de São Cristovão, estabelecimento mantido por esta associação. O Curso Noturno Gratuito de S. Cristovão foi fundado em 1875, no morro do Pedregulho, bairro de São Cristovão, transferindo-se logo em seguida para a Praça D. Pedro I, neste mesmo bairro, local onde funcionou por vários anos. No ano de sua fundação teve como diretor o Dr. Joaquim José de Amorim de Carvalho. Em 1877, assume esta função o Dr. Manoel Cândido da Veiga e Souza. Neste mesmo ano o Almanak publicou o seguinte registro sobre o curso: [...] Associação Promotora tem procurado, tanto quanto lhe permitem suas forças, o maior impulso possível a fim de que o curso ocupe em breve um dos primeiros lugares entre os estabelecimentos dessa ordem. Acha-se em organização uma biblioteca que será oportunamente franqueada ao público. Com o intuito de que sejam as aulas aproveitadas por todas as classes da sociedade, funciona uma aula exclusivamente destinada a escravos. As aulas funcionam todos os dias das 4 horas da tarde às 9 horas da noite, ensinando-se as seguintes matérias: instrução primária, português, francês, aritmética e geografia. A matrícula em geral, no presente ano de 1877, já atinge ao número de 70, nas diversas aulas inauguradas em janeiro. (grifos meus).17 A publicação traz, ainda, os nomes dos professores responsáveis pelas aulas oferecidas: Professor de instrução primária: Francisco das Chagas Pereira de Oliveira, aulas de francês: Dr. Augusto Moreira da Silva; de Aritmética: Francisco de Assis Silva Lorena e de Geografia, interinamente, seu diretor, Manoel Cândido V. Souza. Nos três anos seguintes, o Almanak repete basicamente o mesmo texto, sendo que no ano de 1880 não consta mais a aula destinada aos escravos e nem os nomes dos professores, tendo, neste mesmo ano e no seguinte, o diretor assumido interinamente todas aquelas disciplinas. Ao analisar o texto da publicação citada anteriormente, alguns pontos tornam-se significativos para minha pesquisa, os quais acabam por suscitar novas perguntas e direcionamentos. O funcionamento de uma aula exclusiva para escravos nos chama a atenção. Ainda que desconheçamos o público 17 Ver ALMANAK LAEMMERT, 1877, p. 502. 13 atendido por este Curso, o texto nos revela a intenção, por parte da associação, de marcar sua posição diante da escolarização de uma parcela da população cuja condição cativa contradiz à condição de classe social denotada pelo texto. O que se revela por trás da intenção de registrar tal proposta? Teria a associação levado a cabo esta iniciativa? Quais as concepções que nortearam esta proposta? Quem eram os sujeitos que a associação buscava realmente atender? Vale, ainda, ressaltar os conteúdos oferecidos pelo curso, que, em certa medida, amplia seu atendimento para além da formação elementar, ao oferecer matérias como o francês e a geografia. Outro aspecto relevante é a preocupação em criar uma biblioteca popular, projeto este que, segundo meu levantamento, parece ter sido concretizado apenas em 1884, tendo como primeiro Bibliotecário Dr. Antonio da Cunha Barbosa. Em relação à Associação Promotora da Instrução de Meninas, até o momento não foram encontrados registros que evidenciem a atuação desta instituição como mantenedora de estabelecimentos voltados para a instrução. Apenas no ano de 1875, publicou-se a aprovação, pela presidência desta Associação, da abertura de um internato gratuito para meninas e a fundação de uma biblioteca no mesmo internato. No entanto, não encontrei registros sobre este estabelecimento.18. No início da década de 1880, ocorre a fusão das duas associações, pelo decreto nº 8229, de 26 de agosto de 1881, passando a denominar-se Associação Promotora da Instrução. Neste mesmo ano são iniciadas as obras de construção de prédios próprios para as escolas mantidas pela associação, tendo como engenheiro responsável Antônio de Paula Freitas. Além do curso noturno de São Cristovão, são registradas, a partir deste ano, mais duas escolas mantidas pela associação: A Escola da Glória, que mais tarde ganhou a denominação de Escola Senador Correia, e a Escola de Santa Izabel, que funcionou na Rua do Boulevard 28 de setembro, na Vila Izabel, tendo como superintendente de suas aulas Carlos Américo dos Reis. 18 Idem, 1875, p. 466. 14 Em 1882, ainda sob a direção de Manoel Cândido da Veiga e Souza, o Curso de São Cristovão passa a funcionar em prédio próprio ainda inacabado, na Praça D. Pedro I, nº 7.19 Outras mudanças são empreendidas no curso, entre elas cita-se a ampliação das aulas. Além das já citadas anteriormente, são oferecidas também aulas de geometria, inglês, doutrina cristã, latim e religião. Além disso, nota-se a frequência de ambos os sexos, sendo que, no ano de 1884, o curso registrou para o sexo masculino 245 alunos e para o sexo feminino 95 alunas matriculadas, apresentando-se como estabelecimento misto20. A escola Senador Correia, construída a partir de recursos agenciados por uma comissão21, inaugurou suas aulas noturnas a dois de abril de 1883, sob a direção de Ubaldino do Amaral. As matérias lecionadas eram geografia, aritmética, história do Brasil, gramática portuguesa, leitura, francês e doutrina cristã. Neste ano registrou-se o número de 346 alunos matriculados nas diversas aulas da escola. Pelo que pude levantar, diferentemente do curso de São Cristovão, não eram oferecidas, na escola Senador Correia, aulas de instrução primária. A Escola Senador Correia tem sua instalação definitiva em prédio próprio, em sessão solene de 11 de setembro de 1888, no Largo do Machado, Catete. No Almanak do ano seguinte, 1889, a Associação registra o mesmo endereço como sua sede. Traz, ainda, a informação de que todos os prédios das escolas mantidas pela Associação estavam concluídos, possuindo mobílias especialmente encomendadas para elas. Na década de 1880, outras associações também aparecem de forma menos sistemática em meu levantamento, das quais destacamos a Associação Propagadora dos Cursos Noturnos e Associação Protetora da Instrução da Freguesia do Engenho Velho. Nas administrações dessas duas instituições aparecem nomes que estiveram presentes também na administração da Associação Promotora, como também conferencistas e maçons. Na primeira, localizamos como Presidente Honorário o Barão Homem de Mello, que em 19 Tudo indica que a finalização das obras deste prédio ocorreu no ano de 1887, tendo naquele ano como diretor o Sr. Alexandre da Silva Vaz e como Superintendente das aulas o Dr. Francisco de Assis Mascarenhas. Idem, 1887, parte IV, p. 1574. 20 Idem, 1884, parte IV, p. 1249. 21 Sobre essa comissão, ver: ALMANAK LAeMMERT, 1883, parte IV, p. 1321. 15 anos anteriores figura como sócio integrante do corpo administrativo da Associação Promotora da Instrução. Além deste, consta ainda como Presidente Dr. Carlos Leôncio de Carvalho, Bento da Cunha Figueiredo e o Barão de São Félix (Vice-Presidente), este último, membro do Grande Oriente dos Beneditinos.22 Nas publicações do Almanak sobre tal associação não há registros sobre endereço de sua sede nem escolas mantidas pela mesma. Já a Associação Protetora da Instrução da Freguesia do Engenho Velho, com sede na rua S. Francisco Xavier, 7, teria sido fundada oficialmente em 20 de setembro de 1883 e mantinha o Liceu do Engenho Velho, cujas aulas noturnas funcionavam cotidianamente das 6 às 9 horas. Consta como Presidente da mesma instituição o Barão de Ibituruna, também ex-membro da Associação Promotora da Instrução, Alexandre José Soeiro de Faria Guarany (2º Presidente), conferencista e membro da Loja Maçônica 18 de Julho.23 Diante desses indícios, poderíamos levantar como hipótese a ideia de que tais autores faziam parte de uma mesma rede de sociabilidade, na qual sustentaram, de forma sistemática e concreta, o princípio de associação como elemento primordial para o projeto de expansão da escolarização popular naquele período. Neste caso, estariam eles multiplicando suas frentes de atuação? Cabe ainda ressaltar que esta Associação apresentou um padrão diferenciado em relação às outras associações particulares mantenedoras da instrução popular no período, como a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, a Associação Propagadora da Instrução das Classes Operárias da Freguesia da Lagoa e o Liceu de Artes e Ofícios. Sua diferenciação residiria no fato de que ela não recebia subvenções do Estado. Sua sólida organização lhe permitiu angariar recursos para a construção e manutenção de suas escolas, modelo que mais se aproxima ao defendido pelo seu idealizador e presidente, que sempre sustentou o papel da sociedade civil enquanto ente colaborador do Estado, em defesa do desenvolvimento social e econômico de uma nação. Bastos (2008) assinala que esta Associação teria funcionado como coirmã da Sociedade Mantenedora do Museu Escolar Nacional (1883), das quais foram requisitados, por B. Franklin Ramiz Galvão, Inspetor Geral da Instrução Primária e Secundária, a biblioteca e o material clássico do Museu 22 23 Idem, 1881, p. 502. Idem, 1888, parte IV, p. 1586. 16 Escolar Nacional, a fim de integrarem o Pedagogium, museu pedagógico criado na República, em 1890, por Benjamin Constant. Segundo a autora, a Sociedade Mantenedora do Museu Escolar Nacional, criada também por proposição do Conselheiro Manoel Francisco Correia, logo após o encerramento da Exposição Pedagógica, em setembro de 1883, teve a finalidade de fundar e manter Museu Pedagógico do Rio de Janeiro. 24 A identificação dos nomes que compuseram a Diretoria desta Associação, no ano de sua fundação, constitui-se em indício relevante para essa pesquisa, uma vez que vários de seus membros eram filiados à Maçonaria ou guardaram uma estreita ligação com ela. Além da já citada filiação do Conselheiro Manoel Francisco Correia, como 2º Vice-Presidente, também eram maçons o Presidente e o 1º Vice-Presidente da Associação, respectivamente Conde d’Eu e o Senador Visconde do Bom Retiro. Sobre o Conselheiro Leôncio de Carvalho, que ocupou nesta Diretoria o cargo de 1º Secretário, há fortes indícios de sua estreita relação com a Maçonaria, tendo fundado, já em 1882, em São Paulo, com o apoio da maçonaria paulista, a Sociedade Propagadora da Instrução Popular, mais tarde, Liceu de Artes e Ofício.25 Vale, ainda, ressaltar a estreita relação entre autores com direcionamentos políticos aparentemente contrários, visto que o grupo que esteve à frente da organização das conferências e da Associação Promotora da Instrução teve significativa penetração na ordem política imperial. O que contrasta com a trajetória, por exemplo, de Benjamim Constant, republicano 24 Para Bastos (2008), os eventos em torno da criação do Museu Escolar Nacional (1883) e de outros projetos que envolveram a realização de pareceres, conferências, inserem-se na representação da modernidade educacional brasileira expressa já na década de 1870. Tais eventos, de certo modo, reitera a autora, decorrem da participação de seus idealizadores nas exposições internacionais, do contato com publicações e de visitas a instituições educacionais estrangeiras. Práticas que teriam colocado o país em contato com o processo de consolidação da educação como signo de civilização e de progresso. (BASTOS, 2002, p. 2) 25 Fizeram parte desta diretoria também o Conselheiro Franklim Américo de Menezes Dória, como 2º Secretário, e Honório A. Ribeiro, com o seu tesoureiro. Sobre isso, ver BASTOS (2008). Sobre a ligação de Leôncio de Carvalho com a Maçonaria, ver ainda: http://www.itaucultural.org.br/aplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=ma rcos_texto&cd_verbete=3768. 17 histórico e responsável pela criação do Pedagogium, “flor exótica” do projeto educacional republicano (BASTOS, 2008). Os indícios que emergiram na pesquisa vão revelando a complexidade que envolve tal interseção, a qual não pode ser apreendida apenas pela filiação partidária dos autores envolvidos e nos permite compreendê-la como uma rede de sociabilidade, que se articula a partir de afinidades diversas ─ ideológicas, profissionais, familiares, de amizades e associativas. Esses indícios possibilitam, ainda, incluí-la na sociabilidade maçônica, visto que vários destes intelectuais eram maçons ou tiveram uma estreita relação com a Maçonaria, afinidade que teria contribuído para a consolidação de projetos voltados para a difusão da instrução elementar, nas últimas décadas do Império. REFERÊNCIAS ANDRADE, Alex Moreira. Maçonaria no Brasil (1863-1901): Poder, Cultura e Idéias. Dissertação. Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2004. 2 v. BARATA, Alexandre Mansur. Luzes e Sombras: a ação da maçonaria brasileira (1870-1910). 1. Ed. 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