UNIVERSIDADE PAULISTA REANÁLISE DA MIGRAÇÃO DE CÉLULAS B-1 NO FOCO INFLAMATÓRIO AGUDO Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Patologia Ambiental e Experimental da Universidade Paulista – UNIP, para obtenção do título de mestre em Patologia Ambiental e Experimental. TATIANA MARA MONTEIRO PAIXÃO SÃO PAULO 2013 TATIANA MARA MONTEIRO PAIXÃO REANÁLISE DA MIGRAÇÃO DE CÉLULAS B-1 NO FOCO INFLAMATÓRIO AGUDO Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Patologia Ambiental e Experimental da Universidade Paulista – UNIP, para obtenção do título de mestre em Patologia Ambiental e Experimental, sob orientação do Prof. Dr. Mario Mariano. SÃO PAULO 2013 Paixão, Tatiana Mara Monteiro. Reanálise da migração e da diferenciação de células B-1 no foco inflamatório agudo / Tatiana Mara Monteiro Paixão - 2013. 30 f. : il. color. + CD-ROM. Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de PósGraduação em Patologia Ambiental e Experimental da Universidade Paulista, São Paulo, 2013. Área de Concentração: Imunopatologia. Orientador: Prof. Dr. Mario Mariano 1. Célula B-1. 2. Migração. 3. Diferenciação. 4. Inflamação. Título. II. Mariano, Mario (orientador). I. TATIANA MARA MONTEIRO PAIXÃO REANÁLISE DA MIGRAÇÃO DE CÉLULAS B-1 NO FOCO INFLAMATÓRIO AGUDO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Patologia Ambiental e Experimental da Universidade Paulista – UNIP, para obtenção do título de mestre em Patologia Ambiental e Experimental. Aprovado em: BANCA EXAMINADORA ________________________________/_/___ Prof.Dr. Mario Mariano Universidade Paulista – UNIP ________________________________/_/___ Profa.Dra. Maria Anete Lallo Universidade Paulista - UNIP _________________________________/_/___ Profa. Dra. Ana Flávia Popi Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP PAIXÃO,T.M.M. REANÁLISE DA MIGRAÇÃO DE CÉLULAS B-1 NO FOCO INFLAMATÓRIO AGUDO RESUMO As células B-1 são encontradas predominantemente nas cavidades pleural e peritoneal de camundongos. Sua origem e função ainda não são completamente conhecidas. Elas apresentam marcadores de superfície de linhagens mielóide e linfóide e migram para focos inflamatórios, comportando-se como células fagocíticas. A reavaliação da migração constituiu o objetivo deste trabalho. Para isso, foram utilizados camundongos das linhagens BALB/c e BALB/xid. Estes, imunodeficientes em linfócitos B-1, receberam essas células marcadas com CFSE por transferência intraperitoneal adotiva. Lamínulas circulares de vidro foram implantadas no tecido subcutâneo dos animais para a formação de um foco inflamatório agudo inespecífico. Após diferentes tempos, os camundongos foram sacrificados e os implantes removidos. As células aderentes nas lamínulas, obtidas por raspagem, receberam anticorpos para marcação das seguintes moléculas de superfície: CD19, CD23, CD11b e F4/80. Foram, então, analisadas em citômetro de fluxo. Os resultados mostram que células B-1(CD19+CD23- CD11b+) migram para o foco inflamatório induzido e foram detectadas após 6, 24 e 48 horas do implante das lamínulas em camundongos BALB/c e em 48 horas após, em animais xid com células transferidas. O aumento da expressão de F4/80 em células CD19+ sugere o início de diferenciação de B-1 em fagócitos mononucleares. Os dados demonstraram que células B-1 migram da cavidade peritoneal para um foco inflamatório agudo inespecífico e diferenciam-se neste em células fagocíticas. Palavras- chaves: Célula B-1. Migração. Diferenciação. Inflamação. PAIXÃO,T.M.M. RE-EVALUATION OF THE MIGRATION OF B-1 CELLS IN AN ACUTE INFLAMMATORY LESION ABSTRACT The B-1 cells are found predominantly in the peritoneal and pleural cavities of mice. Their origin and function are not yet fully known. They exhibit surface markers of lymphoid and myeloid lineages and migrate to inflammatory foci, behaving as phagocytic cells. The revaluation of this migration was the objective of this work. For this, we used mice of BALB/c and BALB/xid. The latter, immunodeficient in B-1 lymphocytes, were labeled with CFSE by intraperitoneal adoptive transference. Round glass coverslips were implanted in the subcutaneous tissue of animals to induce a nonspecific acute inflammatory focus. After different times, mice were sacrificed and the implants removed. Cells adherent on the implanted coverslips were obtained by scraping with the aid of a rubber policemen, and labeled with monoclonal antibodies to the following surface molecules: CD19, CD23, CD11b and F4/80 and analyzed in a flow cytometer. Results show that B-1 cells (CD19+CD23CD11b+) migrate to the inflammatory foci being detected after 6, 24 and 48 hours after the implantation of the coverslips in BALB/c mice 48 hours. Increased expression of CD19 F4/80+ cells suggests early differentiation of B-1 cells in mononuclear phagocytes. Our data demonstrate that B-1 cells migrate from the peritoneal cavity to a nonspecific acute inflammatory focus and differentiate into phagocytic Keywords: Cell B-1. Migration. Differentiation. Inflammation. cells. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Citometria de Células CFSE+ em lavado peritoneal de camundongos BALB/xid injetados intraperitonealmente com o sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes de camundongos BALB/c, marcadas com 5 μM de CFSE. Animal não injetado (a), 24 (b) e 48 (c) horas após implante de lamínulas. Gate de células CFSE+CD19+CD11b+.......................................................................17 Figura 2 - Citometria de células CD19+CD23- recuperadas das lamínulas implantadas em camundongos BALB/xid injetados intraperitonealmente com o sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes de camundongos BALB/c, marcadas com 5 μM de CFSE. Animal não injetado (a), 24 (b) e 48 horas (c) após implante de lamínulas........................................................................................18 Figura 3 - Número absoluto x 103 de células B-1 (CD19+ CD23-) recuperadas das lamínulas implantadas em camundongos BALB/xid injetados com o sobrenadante de cultura de células peritoneais aderentes de camundongos BALB/c em 24 e 48h após implante........................................................................................18 Figura 4 - Citometria de células CD19+CD23- recuperadas de lamínulas implantadas no dorso de camundongos BALB/c e a mediana de intensidade de CD11b+ dessas células, às 6 (a), 24 (b) e 48 horas (c).......................................................................19 Figura 5 - Número relativo e absoluto (x103) de células CD19+CD23- recuperadas de lamínulas implantadas em camundongos BALB/c às 6, 24 e 48 horas após procedimento cirúrgico...............................................................................................20 Figura 6 - Mediana da intensidade de fluorescência da expressão de CD11b de células CD19+CD23- recuperadas de lamínulas implantadas em camundongos BALB/c às 6, 24 e 48h ............................................................................................... 20 Figura 7 - Citometria de células CD19+F4/80+ recuperadas de lamínulas implantadas no dorso de animais BALB/c às 6 (a), 24 (b) e 48 horas (c) após cirurgia................ 21 Figura 8 - Células CD19+F4/80+ recuperadas de lamínulas implantadas em camundongos BALB/c às 6, 24 e 48h após implante.................................................21 Figura 9- Número absoluto (x103) de células CD19+CD23- recuperadas de lamínulas implantadas no dorso de camundongos BALB/c e BALB/xid. Comparação entre BALB/xid, BALB/xid mais sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes de BALB/c e BALB/c, às 48 h após procedimento cirúrgico.....................22 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 7 1.1. Células B-1, migração e diferenciação ......................................................... 10 2. OBJETIVOS ....................................................................................................... 12 3. MATERIAIS E MÉTODOS.................................................................................. 13 3.1. Animais ........................................................................................................ 13 3.2. Implante de corpo estranho .......................................................................... 13 3.3. Células peritoneais aderentes ...................................................................... 13 3.4. Marcação com CFSE e injeção intraperitoneal ............................................ 14 3.5. Recuperação das células aderidas à lamínula e lavagem peritoneal ........... 14 3.6. Imunofenotipagem das células recuperadas das lamínulas e peritônios análise por citometria de fluxo ............................................................................... 14 3.7. Análise estatística ........................................................................................ 15 3.8. Delineamento Experimental ......................................................................... 15 4. RESULTADOS ................................................................................................... 16 5. DISCUSSÃO ...................................................................................................... 23 6. CONCLUSÃO ..................................................................................................... 25 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 26 7 1. INTRODUÇÃO No início da década de 80, em humanos com leucemia linfocítica crônica de células B e em alguns linfomas de camundongo, foram observados linfócitos B expressando a molécula de superfície CD5, chamados, inicialmente, de células B Ly-1 (MANOHAR et al., 1982). A presença dessa molécula, em uma população normal de linfócitos B, também foi observada nas cavidades serosas de roedores (CALIGARIS-CAPPIO et al., 1982; HAYAKAWA et al., 1984; HAYAKAWA et al., 1986). Em 1992 (KANTOR), criou-se uma nova classificação de células B, dividindoas em dois subgrupos: B-1 (CD5+ - antes descrito Ly-1) e B-2. Os linfócitos B-1 se diferem do convencional (B-2) em relação a sua distribuição tecidual, fenótipo, morfologia e função (HAYAKAWA et al., 1983). São encontrados predominantemente nas cavidades pleural e peritoneal de camundongos (HAYAKAWA et al., 1984; HAYAKAWA et al., 1986), em quantidade menor no baço e praticamente ausentes em nódulos linfáticos (MARCOS et al.,1989; FORSTER et al.,1991; KROESE et al., 1992). Em relação às características fenotípicas, expressam tanto marcadores de linhagem linfóide – IgD, IgM high,CD 19, B220 low - quanto de mielóide - CD11b low e não apresentam CD23 como ocorre em células B-2 (KANTOR et al.,1993). São subdivididos em B-1a com a molécula de superfície CD5 e B-1b que não a apresentam (KANTOR et al., 1992; STALL et al., 1992). O quadro abaixo ilustra os marcadores expressos pelos diferentes subtipos de linfócitos B: B-1a, B-1b e B-2. Quadro 1: Marcadores de expressão das células B-1a, B-1b e B-2 Células Marcadores B-1a CD19+, CD23-, CD11b+/- , CD5+, B220low, IgMhi, IgDlow B-1b CD19+, CD23-, CD11b+/-, CD5-, B220low, IgMhi, IgDlow B-2 CD19+, CD23+, CD11b-, CD5-, B220hi, IgMlow, IgDhi Células que foram denominadas B-1c, presentes na cavidade peritoneal de camundongos, apresentando os mesmos marcadores dos linfócitos B-1a, com 8 exceção da molécula CD11b (HASTINGS et al., 2006), não parecem ser um novo subtipo de célula B-1 e sim, estágios menos diferenciados de B-1a e B-1b (GHOSN et al., 2008). Como as células em questão possuem características mielóide e linfóide, abre-se um cenário de discussões a respeito de sua origem. Há duas hipóteses: a primeira, atribuída a Haughton et al. (1993), diz que todos os subtipos de células B têm um progenitor comum e a linhagem da célula depende da influência da seleção de antígenos. Demonstraram que células B-2 cultivadas com anti IgM (imunoglobulina M) e IL-6 (interleucina-6) assumem o fenótipo B-1. Baseado nessas observações, concluíram que o fenótipo da célula B-1 ocorre quando a célula B-2, ainda não totalmente diferenciada, expressa IgM em sua superfície e se estimulada por antígenos timo independentes, pode diferenciar-se em células B-1. A segunda e mais aceita, por Herzenberg e Kantor (1993), sugere que as células B-1 não provêm de precursores da medula óssea como as B-2, mas de células que rearranjam seus genes de imunoglobulinas durante os períodos de vida fetal e neonatal. Em seus experimentos, células do fígado e do omento fetal foram capazes de reconstituir preferencialmente linfócitos B-1 em camundongos irradiados. Células da medula óssea adulta geravam principalmente células B-2. A hipótese de precursores distintos ganhou evidência, desde que foi identificado um progenitor na medula óssea que reconstitui principalmente células B1 em camundongos SCID (Imunodeficiência severa e combinada), tanto em fetos quanto em adultos e é diferente do precursor de células B-2. Nos animais adultos, porém, o potencial para gerar células B-1 é consideravelmente diminuído (MONTECINO-RODRIGUEZ et al., 2006; BARBER et al., 2011). No aspecto morfológico, os três subtipos de linfócitos B (B-2, B-1a e B-1b) também têm características distintas. As células B-1b possuem projeções da membrana plasmática, núcleo lobulado com pontes de cromatina e com proporção núcleo/citoplasma baixa, retículo endoplasmático bem desenvolvido e mitocôndria menos, diferenciando-se das B convencionais (ABRAHAO et al.,2003). Estas, descritas como pequenas células redondas possuem densa cromatina e citoplasma escasso. As células B-1a possuem características morfológicas mais próximas dos linfócitos B-2 (ABRAHAO et al.,2003). Referente à produção de imunoglobulinas, as células B-1 possuem a capacidade de sintetizar e secretar as do tipo M (IgM) (HAYAKAWA et al., 1984) de 9 baixa especificidade e com reatividade a antígenos próprios. Provavelmente, são as principais fontes de IgM natural sérica, como foi proposto por Herzenberg et al. (1986), por meio de experimento contra o vírus influenza, em que anticorpos provenientes de células B-1 garantiram a primeira “linha de defesa” contra infecções, mas não foram capazes de controlar grandes cargas virais, necessitando da presença de anticorpos mais específicos como os derivados de células B-2 (BAUMGARTH et al., 2000). Muitos plasmócitos IgA+ (imunoglobulina A) da lâmina própria intestinal são derivados de precursores de células B-2. As pesquisas demonstraram que metade desses plasmócitos IgA+ são derivados de células B-1 peritoneais (KROESE & BOS, 1999). Os linfócitos B-1 mostram suas atividades tanto na imunidade inata quanto na adaptativa, já que podem além de secretar imunoglobulinas (HERZENBERG et al.,1986), apresentar antígenos (VIGNA et al., 2002) e oferecer memória imunológica (LORENZO et al.,2007). Além disso, secretam citocinas pró e anti-inflamatórias, como TNF–α (Fator de Necrose Tumoral-α) e IL-10 (interleucina-10), respectivamente (O´GARRA, 1992). Esta, liberada quando em co-cultivo de macrófagos e células B-1, regula negativamente a atividade de fagocitose dos macrófagos, demonstrando um papel imunossupressor (POPI et al., 2004). Também através da produção de IL-10, a quantidade de células B-1 no camundongo adulto parece ser auto-renovada (O´GARRA et al., 1992). Essa auto-renovação de linfócitos B-1 é aparentemente independente de células progenitoras e de estímulo proliferativo, ao contrário de células B2 (DARNELL et al., 1994). Proliferam-se espontaneamente em culturas estacionárias de células peritoneais aderentes de camundongos. (ALMEIDA et al.,2001). Nos processos inflamatórios crônicos específicos, as células B-1 são essenciais à formação de células gigantes por corpo estranho (BOGSAN et al., 2005), estão presentes na composição do granuloma (VIGNA et al., 2006) e aumentam a taxa de crescimento e metastatização de melanomas murinos in vivo (PÉREZ et al., 2008). Participam do processo de cicatrização (OLIVEIRA, 2009) e atuam em importantes respostas mediadas por células T, como rejeição de aloenxertos e reações de hipersensibilidade imediata e tardia (MARTINS, 2009). O comportamento das células B-1 frente a diversas doenças infecciosas, também é intrigante. Animais BALB/xid, (X-linked immunodeficiency – imunodeficiência ligada ao cromossomo X, que regula a expressão de uma tirosina 10 quinase), que são desprovidos de células B-1, mostram melhor resposta efetora e evolução clínica contra a infecção por T. cruzi quando comparados aos camundongos controle, que apresentam essas células (MINOPRIO et al.,1993). Os camundongos BALB/xid também têm uma sobrevivência maior que os selvagens quando infectados intratraquealmente por P. brasiliensis (POPI et al., 2008). 1.1. Células B-1, migração e diferenciação Em 1972, surgiu o conceito de Sistema Mononuclear Fagocítico (VAN FURTH et al.), em que todos os macrófagos, tanto os residentes em tecidos saudáveis quanto os presentes no foco de uma resposta inflamatória, são derivados de monócitos da medula óssea. Através de estímulos quimiotáticos, monócitos migram para tecidos e se diferenciam em macrófagos (YAMASHIRO et al., 1998). O desenvolvimento de monócitos e a sua diferenciação em macrófagos dependem do fator estimulador de colônia de macrófagos (M-CSF) (NAITO et al., 1991). O fato de células B-1 serem obtidas de cultura de células peritoneais aderentes de camundongos e que se diferenciam espontaneamente em fagócitos mononucleares, independente de monócitos, interroga o conceito de Sistema Mononuclear Fagocítico (ALMEIDA et al. ,2001; POPI et al., 2009). Outros experimentos, como alguns descritos abaixo, também questionam esse conceito. Camundongos osteopetróticos, em que há mutação na região que codifica o gene cfms resultando em deficiência na produção de monócitos e completa ausência de macrófagos, foram utilizados em um experimento, demonstrando que, após estímulo com lipopolissacarídeo (LPS), fagócitos peritoneais (independentes de MCSF) eram derivados de células B-1. No mesmo estudo, o tratamento de animais BALB/c com clodronato para a depleção de monócitos e macrófagos, confirmou a participação de fagócitos derivados de B-1 como componentes da população do peritônio. Camundongos BALB/xid com transferência adotiva intraperitoneal de células B-1 CFSE+ (carboxifluoresceína succinimidil diacetato éster) também foram utilizados e, após estímulo intraperitoneal com LPS, apresentaram fagócitos CD11b+F4/80+CFSE+ reafirmando a diferenciação dessas células (POPI et al. (2012). Os linfócitos B-1a do baço, quando co-cultivados com fibroblastos, podem se tornar fagócitos (BORRELLO & PHIPPS, 1995; BORRELLO & PHIPPS, 1996), assim 11 como as células B-1b recultivadas. Estas se aderem, espraiam e se diferenciam em células mononucleares fusiformes, apresentando capacidade fagocítica, tanto via receptor para a porção Fc de imunoglobulina, como para receptor de manose (ALMEIDA et al., 2001). Ao se tornarem fagócitos, deixam de expressar marcadores linfóides, mas mantém os marcadores mielóides. O mesmo fenômeno ocorre com fatores de transcrição (POPI et al., 2009). Almeida et al. (2001) demonstraram que as células B-1 são capazes de sair da cavidade abdominal e migrar para um foco inflamatório agudo. Após a cultura e crescimento de células B-1 in vitro, estas foram marcadas com timidina triciada e inoculadas na cavidade peritoneal de camundongos. Depois da remoção de lâminas de vidro, implantadas previamente no tecido subcutâneo desses animais, foram feitas análises histoautoradiográficas que provaram a migração das células marcadas para o corpo estranho. Em um estudo realizado para analisar a atividade fagocítica dos linfócitos B-1, em que bactérias foram injetadas intraperitonealmente, Jixin et al. (2012) revelaram, que a maioria dos fagócitos peritoneais derivados de B-1 que continham S. aureus eram CD11b+ e CD5- , indicando que as células B-1b têm maior capacidade fagocítica em relação às células B-1a. Os pesquisadores, ao compararem a quantidade de fagócitos CD11b+ em relação aos CD11b- contendo bactérias, verificaram que existiam mais linfócitos CD11b- in vivo do que in vitro, sugerindo que a expressão dessa molécula pode facilitar a migração das células B1. Considerando as questões acima, que mostram as funções contraditórias dos linfócitos B-1, ora colaborando na resposta imune efetora - tanto na secreção de anticorpos quanto na atividade fagocítica, ora imunossuprimindo a atividade de células do sistema imune, além de seu fenótipo promíscuo, foi proposta uma investigação mais profunda do papel dessas células, enfocando sua migração e diferenciação na resposta inflamatória, reproduzindo parcialmente o experimento de Almeida et al. (2001) analisando as células presentes no foco inflamatório por citometria de fluxo. 12 2. OBJETIVO Verificar a migração das células B-1 da cavidade peritoneal para o foco inflamatório agudo induzido por corpo estranho; 13 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1. Animais Foram utilizados camundongos fêmeos das linhagens BALB/c e BALB/xid com 8 e 5,5 semanas de idade, respectivamente, provenientes do CEDEME (Centro de Desenvolvimento de Modelos Experimentais da UNIFESP) e mantidos em micro isoladores no biotério da Disciplina de Imunologia, com ração e água autoclavados fornecidos ad libitum. Os procedimentos, que envolveram animais de experimentação, foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Paulista-UNIP, sob no 154/13. 3.2. Implante de corpo estranho As lamínulas de vidro, com 13 mm de diâmetro, foram implantadas no tecido subcutâneo da região dorso-lateral dos animais sob anestesia intramuscular (quetamina 80 mg/kg e xilazina 15 mg/kg– Vetnil) , conforme descrito por Mariano & Spector (1974). 3.3. Células peritoneais aderentes As células peritoneais aderentes foram cultivadas seguindo a descrição de Almeida et al. (2001) com algumas adaptações. Foram coletadas da cavidade peritoneal de camundongos BALB/c por meio de lavagem com 8mL de meio de cultura RPMI 1640 (Sigma, Saint Louis, MO). A suspensão celular foi mantida por 40 minutos, em estufa a 37º C e com atmosfera de 5% de CO 2. Após esse tempo, o sobrenadante foi desprezado e acrescido RPMI suplementado de 10% de soro fetal bovino às células aderentes na garrafa de cultura. Estas foram cultivadas por 5 dias em estufa (5% de CO2 e 37º C). Após esse período, o sobrenadante, enriquecido em células B-1, foi coletado para experimentação. As células foram marcadas com CFSE (Molecular Probes). 14 3.4. Marcação com CFSE e injeção intraperitoneal As células, em RPMI, foram incubadas com CFSE (Molecular Probes) 5μM e deixadas por 15 minutos a 37oC no escuro. Após esse tempo, foram lavadas duas vezes com meio completo - acrescido de 10% de soro fetal bovino. Para serem injetadas, foram ressuspensas em RPMI na concentração de 2,1X106 células marcadas/ ml. 3.5. Recuperação das células aderidas à lamínula e lavagem peritoneal As lamínulas foram raspadas com cell scraper (BD Falcon) para recuperação das células aderidas, lavadas em PBS/BSA 1%, filtradas em cell strainer (BD Falcon) para separar possíveis grumos celulares e incubadas com anti-Fc. Após 20 minutos no escuro e no gelo, foram lavadas com PBS/BSA1% e acrescidas de anticorpos. Foram realizadas lavagens com PBS 1% da cavidade peritoneal de camundongos BALB/xid que receberam, intraperitonealmente, células marcadas com CFSE por meio de transferência adotiva. Após centrifugação, as células foram ressuspensas em PBS/BSA 1%, incubadas com anti-Fc e acrescidas dos anticorpos para análise. 3.6. Imunofenotipagem das células recuperadas das lamínulas e peritônios análise por citometria de fluxo Após a obtenção das células peritoneais e das lamínulas de animais BALB/xid como descrito anteriormente, seu fenótipo foi analisado, incubando-as com anticorpos específicos para cada marcador. Foram utilizados os seguintes anticorpos (eBioscience): anti-CD19 conjugado a PECY7, anti-CD23- biotinilado Strepto APC, anti-CD11b conjugado a PERCP . O painel de anticorpos utilizados para imunofenotipagem das células recuperadas das lamínulas de animais BALB/c foi: anti-CD19 conjugado a PECY7, anti-CD23 conjugado a PE, anti-CD11b conjugado a PERCP e anti-F480 conjugado a APC. 15 As células marcadas foram deixadas no gelo e no escuro por 15 minutos e em seguida, lavadas e centrifugadas. Foram ressuspensas em PBS 1% e submetidas à análise por citometria (Attune – Applied Biosystem). 3.7. Análise estatística Os resultados foram analisados pelo teste ANOVA, aplicado pelo programa GraphPad InStat. Foram considerados estatisticamente significantes os dados com valores de p menores do que 0,01 (p < 0,01) e menores do que 0,05 (p< 0,05). 3.8. Delineamento Experimental As células marcadas com CFSE (2x106 células por animal) foram injetadas na cavidade peritoneal de 7 animais BALB/xid e, após 1 hora, os mesmos foram anestesiados com quetamina e xilazina e sofreram processo cirúrgico para a implantação de duas lamínulas de vidro circulares, com 13mm de diâmetro, na região dorso-lateral. Três animais passaram pelo mesmo processo cirúrgico, porém sem a injeção intraperitoneal de células para servirem de controle “branco”. Após 24 (4 animais injetados e um, não) e 48 horas (3 animais injetados e 2, não) da cirurgia, os animais foram sacrificados na câmara de CO2 . Para recuperação das células que se aderiram às lamínulas foi utilizado Cell Scraper. O lavado peritoneal desses animais também foi realizado para se verificar a presença dessas células marcadas. Para a avaliação da população celular, foi utilizado citômetro de fluxo (Attune – Applied Biosystem). Em 6 animais BALB/c, foram implantadas as lamínulas circulares no dorso, sem nenhuma célula transferida intraperitonealmente e retiradas com 6 ( Pool de 2 animais), 24( 2 animais) e 48 horas ( 2 animais) após cirurgia. 16 4. RESULTADOS O sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes (rico em células B-1) de camundongos BALB/c e marcadas com CFSE foi transferido para o peritônio de camundongos BALB/xid. Tanto esses animais, como também camundongos BALB/c, sofreram processo cirúrgico para o implante de lamínulas na região dorsal. Os camundongos BALB/xid possuem imunodeficiência ligada ao cromossomo X, tornando-os desprovidos de células B-1. Logo, o grupo controle (BALB/xid sem transferência adotiva) não apresentou essas células nos lavados peritoneais nem no foco inflamatório induzido pelo implante (Figuras 1 e 2). Células B-1 (CD19+CD23-CD11b+) injetadas nos animais BALB/xid e encontradas fisiologicamente no peritônio de animais BALB/c estavam presentes nas lamínulas, comprovando a migração dessas células da cavidade peritoneal para o foco inflamatório agudo em questão (Figuras 2 e 4) . A diferenciação dessas células nos implantes é sugerida graças às expressões concomitantes de CD19+ , CD11b+ e F4/80+ (Figuras 4 e 7), fenótipo de pré-fagócito de B-1 (GAMBERO et al., comunicação pessoal). CFSE CFSE CFSE b) Peritônio BALB/xid injetado-24h c) Peritônio BALB/xid injetado-48h CD19 a) Peritônio BALB/xid não injetado controle SSC SSC SSC 17 CD11b d) Gate CFSE+ Figura -1 Citometria de células CFSE+ em lavado peritoneal de camundongos BALB/xid injetados intraperitonealmente com o sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes de camundongos BALB/c, marcadas com 5 μM de CFSE. Animal não injetado (a), 24 + + + (b) e 48 (c) horas após implante de lamínulas. Gate de células CFSE CD19 CD11b (d) Os animais BALB/xid com transferência adotiva apresentaram células CD19+ CD11b+ (B-1) CFSE+ no lavado peritoneal, como mostra a Figura 1, em 24 e 48 horas após a cirurgia. Há um aumento de células CFSE+ comparando-se os períodos analisados. Porém, as células CD19+CD23- (Figura 2), obtidas das lamínulas implantadas com 48 horas nesses animais, não apresentaram marcação com CFSE. Tanto os camundongos controle, quanto os injetados em 24 horas, não exibiram células B-1 no foco inflamatório (Figuras 2 e 3). Em 48 horas após o implante, o número dessas células (CD19+ CD23-) têm aumento significativo em relação aos outros dois grupos avaliados (Figura 3). CD19 CD19 CD19 18 CD23 a) BALB/xid –controle CD23 b) BALB/xid injetado- 24h + CD23 c) BALB/xid injetado- 48h - 20 * * 3 15 10 5 h 8 4 2 ra n c BALB/xid não injetado 4 o h 0 b n ú m e r o a b s o lu t o x 1 0 + - C é lu la s C D 1 9 C D 2 3 la m ín u la s B A L B /x id Figura- 2 Citometria de células CD19 CD23 recuperadas das lamínulas implantadas em camundongos BALB/xid injetados intraperitonealmente com o sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes de camundongos BALB/c, marcadas com 5 μM de CFSE. Animal não injetado (a), 24 (b) e 48 horas (c) após implante de lamínulas. Tem po 3 + - Figura - 3 Número absoluto x 10 de células B-1 (CD19 CD23 ) recuperadas das lamínulas implantadas em camundongos BALB/xid injetados com o sobrenadante de cultura de células peritoneais aderentes de camundongos BALB/c em 24 e 48h após implante. *p<0,05 MFI CD19 SSC 19 CD23 CD23 CD11b MFI CD19 (b) Lamínulas BALB/c – 24h SSC CD11b MFI CD19 SSC (a) Lamínulas BALB/c – 6h CD23 CD11b (c) Lamínulas BALB/c – 48h + - Figura - 4 Citometria de células CD19 CD23 recuperadas de lamínulas implantadas no dorso + de camundongos BALB/c e a mediana de intensidade de CD11b dessas células, às 6 (a), 24 (b) e 48 horas (c) 3 20 10 h 8 4 2 4 h h 0 6 + 30 N ú m e r o a b s o lu t o x 1 0 C é lu la s C D 1 9 C D 2 3 la m ín u la s B A L B /c Células CD19+CD23- lamínulas BALB/c 20 Tem po 3 + - Células B-1 Figura - 5 Número relativo e absoluto (x10 ) de células CD19 CD23 recuperadas de lamínulas implantadas em camundongos BALB/c às 6, 24 e 48 horas após procedimento cirúrgico. Figura- 6 Mediana da intensidade de fluorescência da expressão de CD11b de células + CD19 CD23 recuperadas de lamínulas implantadas em camundongos BALB/c às 6, 24 e 48h. *p<0,05 / **p<0,01 Os animais BALB/c apresentaram aumento de células B-1 (CD19+/CD23-) nas lamínulas nos tempos analisados (Figura 5). Também foi crescente a expressão de CD11b nessas células (MFI- Mediana da Intensidade de Fluorescência), com aumento significativo entre 6 e 48h e 24 e 48h (Figuras 4 e 6). 21 (a) Lamínulas BALB/c – 6h (b) Lamínulas BALB/c – 24h Lamínulas BALB/c – 6h + + (c) Lamínulas BALB/c – 48h h + ** 25 3 * N ú m e r o a b s o lu t o x 1 0 20 15 10 5 h 8 4 2 4 h h 0 6 + - C é lu la s C D 1 9 C D 2 3 F 4 /8 0 + la m ín u la s B A L B /c Figura- 7 Citometria de células CD19 F4/80 recuperadas de lamínulas implantadas no dorso de animais BALB/c às 6 (a), 24 (b) e 48 horas (c) após cirurgia Tem po + Figura - 8 Células CD19 F4/80 recuperadas de lamínulas implantadas em camundongos BALB/c às 6, 24 e 48h após implante. *p<0,05 / **p<0,01 As células B-1, presentes no foco inflamatório agudo induzido em animais BALB/c, expressam CD19+CD11b+F4/80+ (Figuras 4 e 7). Em 24 e 48 horas, há aumento significativo de células CD19+F4/80+ em relação ao primeiro tempo analisado (Figura 8). 22 * Células CD19+ CD23Número absolutox103 50 48h 40 30 20 10 /c A LB B st itu BALB/xid íd o + B-1 re co n B A LB /x id B A LB /x id 0 3 + - Figura - 9 Número absoluto (x10 ) de células CD19 CD23 recuperadas de lamínulas implantadas no dorso de camundongos BALB/c e BALB/xid. Comparação entre BALB/xid, BALB/xid mais sobrenadante de cultura total de células peritoneais aderentes de BALB/c e BALB/c, às 48 h após procedimento cirúrgico.*p<0,05 A Figura 9 ilustra aumento significativo de células B-1 recuperadas das lamínulas implantadas entre BALB/xid e BALB/c. 23 5. DISCUSSÃO Os linfócitos B-1 inoculados em camundongos BALB/xid e os presentes fisiologicamente no peritônio de camundongos BALB/c migraram para o foco inflamatório agudo (lamínulas), da mesma forma que Almeida et al. (2001) demonstraram e, neste experimento, por meio da evidência de células CD19+ CD23nas lamínulas . O CFSE é um marcador citoplasmático utilizado em estudos de migração e de divisão celular (in vitro e in vivo) e, a cada divisão, perde metade de sua intensidade de fluorescência (PARISH, 1999). A ausência da marcação das células nas lamínulas, antes presente no peritônio, provavelmente é devido à alta proliferação celular e/ou perda natural de fluorescência. Para possível comprovação da hipótese, seria necessário um teste com células CFSE+ adicionadas a outro marcador de proliferação e cultivadas in vitro. Desse modo, poderia ser analisada tanto a intensidade de fluorescência (MFI) do CFSE quanto do marcador adicionado, após os períodos de 24 e 48 horas, como os utilizados neste estudo. Almeida et al. (2001), em seus experimentos, evidenciaram fagócitos de B-1 marcados com timidina triciada nas lamínulas implantadas em 24 e 48 horas em animais BALB/c e, no segundo tempo analisado, o número dessas células aumentou em 10-14% em relação ao primeiro. Nestes experimentos, também foram observadas células B-1 (CD19+ CD23-) nas lamínulas em BALB/c às 6, 24 e 48h, e o número de células, tanto relativo quanto absoluto, foi crescente entre os períodos considerados. A mediana de intensidade de fluorescência da expressão de CD11b teve aumento significativo (p<0,01 6-24h/ p<0,05 24-48h), demonstrando crescente expressão desse marcador nas células B-1. A expressão dessa molécula pode indicar maior capacidade migratória dessas células quando comparadas às B-1 CD11b- (JIXIN et al., 2012). Em animais BALB/xid com transferência adotiva, foi confirmado o fenótipo CD19+CD23- apenas em 48 horas. Essas células se diferenciam no foco inflamatório, apresentando morfologia de fagócito e são capazes de fagocitar via Fc e receptores de manose (ALMEIDA et al.,2001). Popi et al. (2012) confirmaram população de fagócitos derivados de B-1 (CD11b+ F4/80+ CFSE+),após o estímulo com LPS, na cavidade peritoneal de camundongos BALB/xid, depois da transferência adotiva de células B-1 CFSE+ para 24 o peritônio desses animais, admitindo assim, a diferenciação dessas células em fagócitos. Os macrófagos expressam CD11b e F4/80 mas, não CD19. As células B-2 expressam CD19, mas não CD11b nem F4/80. Gambero et al. (comunicação pessoal) demonstraram que os pré-fagócitos de B-1 apresentam fenótipo CD19+CD11b+F4/80+. O aumento significativo de células CD19+CD11b+ F4/80+ sugere início de diferenciação de B-1 (pré-fagócitos) no foco inflamatório induzido. 25 6. CONCLUSÃO Células B-1 migram da cavidade peritoneal para um foco inflamatório agudo induzido por corpo estranho; A presença de células CD19+CD11b+ F4/80+ no foco inflamatório sugere que células B-1 se diferenciam em fagócito mononuclear no modelo estudado; Células B-1 marcadas com CFSE e injetadas na cavidade peritoneal não foram visualizadas nas lamínulas implantadas. 26 REFERÊNCIAS ABRAHAO, T.B.; FREYMULLER, E.; MORTARA, R.A.; LOPES, J.D.; MARIANO, M. Morphological characterization of mouse B-1 cells. Immunobiology, v.208,p.401411,2003. ALMEIDA, S.R.; AROEIRA, L.S.; FRYMULLER, E.; DIAS, M.A.; BOGSAN, C.S.; LOPES, J.D., MARIANO, M. Mouse B-1 cell derived mononuclear phagocyte, a novel cellular component of acute non-specific inflammatory exudate. Int. Immunol.,v.13,p. 1193-1201,2001. BARBER C.L.; MONTECINO-RODRIGUEZ, E.; DORSHKIND, E. Reduced production of B-1–specified common lymphoid progenitors results in diminished potential of adult marrow to generate B-1 cells. 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