Guia metodológico para a pesquisa em ciências sociais

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FLYVBJERG, Bent. Making Social Science Matter, why social inquiry fails and how it
can succeed again. Cambridge: Cambridge University Press, 2001, 204 p.
Introdução:
-Guerras entre ciências em torna da objetividade e da subjetividade. São úteis somente na
perpetuação de estratégias políticas e ideológicas que caracterizam o que Charles Lindblom e
Michel Foucault chamaram de « política da verdade » (« truth politics »).
-Neste livro, o autor apresenta uma saída para o dilema subjetivismo-objetivismo a partir de
uma interpretação contemporânea do conceito aristotélico de phronesis, regularmente
traduzido como prudência ou sabedoria prática.
-As ciências sociais deram-se uma tarefa impossível quando começaram a espelhar-se nas
ciências naturais e tentaram produzir teoria explanatória, previsível e epistemológica. O autor
acredita que, tal como estão dados os termos da chamada « Guerra das Ciências », a ciências
sociais não têm saída. Ele tenta defender a hipótese de que, enquanto phronesis, as ciências
sociais superam as ciências naturais : da mesma forma que as ciência sociais não puderam
contribuir significativamente com construtos explanatórios e previsíveis, as ciências naturais
não lograram contribuir na análise reflexiva e na discussão de valores e interesses, que são
conditio sine qua non para o desenvolvimento político, econômico e cultural de toda
sociedade, e que se encontram no centro da definição de phronesis.
A perda da virtude: Aristóteles nunca incluiu a dimensão do poder em sua definição de
phronesis. Hans-Georg Gadamer também não incluiu o poder em suas análises sobre a
phronesis (Truth and Method, London: Sheed and Ward, 1975). O autor crê que, nas
sociedades modernas, não seja mais possível separar o conflito e o poder das análises sociais e
políticas. O contexto é fundamental para entender o que as ciências sociais são e podem ser.
A teoria e a epistemologia são possíveis no campo das ciências sociais? Podem as ciências
sociais e políticas ser tão « científicas » quanto as ciências naturais ? Para responder a estas
questões, o autor começa por analisar a virtuosidade dos aprendizados humanos, classificando
os estágios em:
1) Noviço
2) Iniciante avançado : ele se diferencia do anterior por ter experiências reais e concretas
3) “Competent Performer”: com mais experiência, ele aumenta o número de elementos
reconhecíveis. Ele tem a capacidade de interpretar e julgar (interpretação e
julgamento). Tem mais habilidade (skill) que razão (reasoning). As experiências
adquiridas são transformadas emilustrações que alimentam seu raciocínio. Ele pensa
com os pés no real.
4) “Proficient Performer”: estão profundamente envolvidos em suas atividades. Sua
percepção evoluiu com base em atividades e experiências anteriores. Ele experimentou
atividades similares anteriores. O envolvimento intuitivo profundo na realização de
uma atividade interage com sua capacidade de decidir analiticamente.
5) “Expert”: não somente as situações são reconhecidas intuitivamente, mas também as
decisões são tomadase e as estratégias são definidas sincrônica e holisticamente. A
performance do virtuose é realizada, neste caso, sem esforços. Trata-se da tomada de
decisão intuitiva, que tem sido negligenciada enquanto objeto das ciências, talvez
porque a evolução científica tende a enfatizar a racionalidade analítica como sua
ferramenta exclusiva. Os “experts” deliberam sem usar regras explícitas da
racionalidade.
Estas categorias de aprendizado foram desenvolvidas por Hubert e Stuart Dreyfus (Mind over
Machine: The Power of Human Intuition and Expertise in the Era of the Computer, New
York, Free Press, 1986). Elas apresentam um salto qualitativo da terceira para a quarta e
quinta categorias. O salto implica o abandono do pensamento com base em regras para o
raciocínio com base na intuição e no contexto. A ação com base na lógica é substituída pela
ação com base na experiência.
A palavra razão (do latim: ratio, calcular ou raciocinar) tornou-se no mundo ocidental identica
ao pensamento analítico, ou seja, à separação consciente do todo em partes. O autor lembra
que o « competent performer » é racional ; o « proficient performer » está em transição, ao
passo que o « expert » age de modo a-racional. É bem verdade que tais categorias são um
tanto mecanicistas, deterministas e não levam em conta aspectos relacionados à criatividade, à
inovação e ao poder. Habermas já reagiu a este « modelo » de Dreyfus dizendo que seu
objetivo último é o de recolocar em questão a civilização ocidental, com o que Dreyfus
concordou…salientando que seu objetivo não é negar a racionalidade, mas relativizá-la (evitar
que seja tão amplamente dominadora) diante de outras competências possíveis do ser humano.
Não se trata de pensar a razão ou a intuição, mas ambas de acordo com o contexto apropriado.
Ambas lado a lado, de modo complementar. Isso porque o paradigma racionalista é muito
excludente, sobretudo nos campos mais práticos e profissionalizantes (como na gestão,
« policy analysis », nas organizações, na engenharia). Todos estes são campos em que as
atividades mais práticas são importantes, mas cuja epistemologia e didática têm sido
controladas pelas ciências epistêmicas racionalistas. Isso não ocorre, porém, no Direito:
porquanto o Direito não pode ser desconectado de seu contexto! Nos outros campos, a
perspectiva racionalista foi elevada a condição de suficiência exclusiva.
Nietzsche afirmava que Sócrates havia sido um erro ! Porque, ao afirmar a supremacia da
razão, negou o papel dos instintos e dos conhecimentos « incorporados ». Vide :The Gay
Science . Vide: The Twilight of the Idols.
A teoria é possível nas ciências sociais ?
Nas ciências naturais, diz o autor, há uma simplicidade lógica nas explicações, além de uma
produção relativamente cumulativa de conhecimentos e previsões baseadas em teorias
independentes de contextos (gerais). Desde a obra de Thomas Kuhn, muitos outros
pensadores já relativizaram a chamada « universalidade hermenêutica » das ciências naturais:
Paul Feyerabed, Richard Rorty, Harold Garfinkel, Hans-Georg Gadamer, Habermas,
Giddens…
As ciências sociais seriam pré-paradimáticas (termos de Kuhn)? Richard Rorty afirma que
tanto a natureza quanto a sociedade podem ter períodos de cumulatividade, estabilidade,
previsão, mas que também podem conhecer momentos de confusão e turbulência (Philosophy
and the Mirror of Nature).
Os fenomenólogos vão dizer que a diferença entre as ciências naturais e as ciências sociais
não podem estar exclusivamente marcadas pela evolução e história. Não se trata somente de
um pré-momento, mas de uma distinção mais fundamental. As ciências naturais estudam
objetos físicos (minha pergunta: mas e a biologia ?!), ao passo que as ciência sociais analisam
o humano auto-reflexivo e deve levar em conta as mudanças das interpretações dos objetos de
estudo. O objeto é sujeito nas ciências sociais. Para a hermenêutica, a compreensão é diferente
da explicação. O contexto determina e é determinado pela auto-compreensão do pesquisador.
Por exemplo, dirá Garfinkel que o pesquisador tem de explicitar e responsabilizar-se
subjetivamente pelo método de produção dos conhecimentos. A produção do conhecimento é
também um objeto de estudo (como toda e qualquer atividade humana). Foucault vai
complexificar ainda mais a análise, uma vez que dirá que há uma dupla-hermenêutica o
pesquisador dá sentido (meaning giver) a objetos sem sentido (meaningless objects). Foucault
(The Order of Things: an Archaeology of the Human Sciences. New York, Vintage, 1973)
afirma:
“The human sciences find themselves treating as object what is in fact their condition of
possibility. They are always animated, therefore, by a sort of transcendental mobility. They
never cease to exercise a critical examination of themselves. They proceed from that which is
given to representation to that which renders representation possible, but which is still
representation. So that, unlike other sciences, they seek not so much to generalize themselves
or make themselves more precise as to be constantly demystifying themselves” (p.344).
A importância do contexto:
Bourdieu e Hubert Dreyfus sempre chamaram a atenção para o fato de que o estudo dos
indivíduos e da sociedade nunca poderia ser « normalizado » no sentido Kuhniano do termo
em função das relações entre a teoria científica ideal e as atividades humanas.
Para Sócrates, a teoria deveria ser: explícita (dita no detalhe e com clareza para que quaisquer
seres racionais possam entendê-la), universal (aplicável em todos os lugares e em todos os
tempos) e abstrata (sem necessitar exemplos concretos).
Descartes e Kant complementam : ela deve ser discreta (formulada somente com a ajuda de
elementos independentes do contexto) e sistemática (deve constituir um todo, no âmbito do
qual as partes se articulam por meio de regras e normas regulares).
A ciência moderna completa : a teoria deve ser completa e previsível.
O fato de as ciências sociais articularem-se ao contexto não significa que elas não possam ser
explicativas e previsíveis. Mas a importância do contexto relativiza este requisito. Os quatro
argumentos possíveis são os seguintes :
-
O argumento pré-paradigmático: Richard Rorty (no início de seus escritos). as ciências
sociais tornar-se-ão ciências normais no futuro, mas isso é uma possibilidade. Por isso,
não se devem aplicar os pressupostos da ciência normalizada no âmbito das ciências
sociais.
-
O argumento hermenêutico e fenomenológico: Anthony Giddens e Harold Garfinkel.
O estudo das ciências sociais deve basear-se na auto-interpretação situacional das
pessoas. Valem os estudos enquanto interpretações.
-
O argumento da contingência histórica: Michel Foucault. As ciências cumulativas e
estáveis que estudam o comportamento humano não são possíveis porque são objeto e
sujeito ao mesmo tempo.
-
O argumento das habilidades tácitas (Dreyfus e Bourdieu): as ciências sociais são
dependentes do contexto (a prática segue uma lógica que não é lógica, diz Bourdieu).
Perigo do reconhecimento do contexto: relativismo científico e nihilismo. Mas o autor sugere
a busca dos “Es” (both-and) e não dos “OUs” (either-or) nas ciências sociais.
Valores na pesquisa social e política
Para Aristóteles, a tarefa mais importante dos estudos sociais e políticos era desenvolver a
racionalidade-valor da sociedade em relação com a sua racionalidade científica e técnica.
Mas, como lembra Habermas, na evolução das ciências sociais, a racionalidade de valor vem
dando lugar à racionalidade instrumental. A virada « racional » apagou a nossa possibilidade
de repensar a forma como a racionalidade poderia ser repensada e reformulada.
Episteme: concerne a produção de saberes universais que são invariáveis no tempo e no
espaço, graças à atuação da racionalidade analítica. Corresponde ao ideal científico moderno
expresso na ciências naturais. Este ideal tornou-se dominante com Sócrates, Platão e o
Iluminismo.
Techne: « craft » e arte, atividade, dependente do contexto, variável. Segue a racionalidade
instrumental e pragmática. Orientada para a produção.
Phronesis: ética, deliberação sobre valores com referência à práxis. Pragmática, variável e
dependente de contextos. Orientada para a ação. Baseada na racionalidade prática de valores.
Focalizada no particular. O julgamento de valor prima sobre a produção de coisas. As três
questões centrais para a ciência fronética são: aonde vamos? é desejável irmos? o que deveria
ser feito?
Mas Bent F. adiciona uma quarta pergunta: quem ganha e quem perde? E por meio de que
mecanismos?
Este tipo de pesquisa e conhecimeno em ciência social a reapxoima da filosofia…
O poder do exemplo
Case study: “The detailed examination of a single example of a class of phenomena, a case
study cannot provide reliable information about the broader class, but it may be useful in the
preliminary stages of an investigation since it provides hypotheses which may be tested
systematically with a larger number of cases” (citado na página 66, a partir de um dicionário
de sociologia). O autor problematiza 5 compreensões que ele considera problemáticas a partir
desta definição:
 O conhecimento geral, teórico (independente de contextos) é mais valioso que o
conhecimento concreto e prático;
 Não é possível generalizar a partir de um caso, por isso os estudos de caso não podem
contribuir ao desenvolvimento científico;
 O estudo de caso é mais apropriado para generar hipóteses, no início (nas primeiras
etapas) de um processo de pesquisa, enquanto outros métodos são mais adequados
para a construção teórica ;
 O estudo de caso contém um fator favorável (um preconceito, bias) à verificação, ou
seja, ele serve para confirmar as hipóteses pre-concebidas do pesquisador;
 Não é possível construir teorias a partir de casos.
O estudo de caso é controverso porque ele se coloca a contra-corrente da tradição teórica
platônica. Sócrates, nos Diálogos (entre Meno e Euthyphro), nega a importância dos
conhecimentos concretos, práticos e dependentes de contextos.
Aristóteles, na descrição do que seria a phronesis, lembra que : « it (phronesis) must also take
cognizance of particulars, because it is concerned with conduct, and conduct has its sphere in
particular circumstances” (p. 71)
BF defende a idéia de que, nas ciências sociais, é necessário dar prioridade à indução… (ele
tende a estabelecer uma contradição, a meu ver descabida, entre indução e dedução).
A relevância do conflito e do poder para as ciências sociais
The fundamental concept in social science is Power, in the same sense in which Energy if the
fundamental concept in physics (Bertrand Russel), citado na p. 88.
Os trabalhos de Habermas (consenso) e Foucault (conflito) resumem as principais tensões
sobre o poder nas ciências sociais. Habermas, a partir de Kant, é o filósofo da moralidade do
consenso, ao passo que Foucault, a partir de Nietzsche, é o filósofo na história real. Não
devem ser vistos como oposições, mas um como a sombra do outro, o complemento
necessário para entender e limitar a racionalização e o abuso do poder. Habermas combate o
contextualismo, o relativismo e o nihilismo. Ele acredita na modernidade, mas defende que os
meios para chegar a ela devem ser repensados. Ele acredita que é necessário fazer a transição
da análise da subjetividade (o espírito do mundo de Hegel, a classe social de Marx) para a
intersubjetividade (teoria da ação comunicativa e ética do discurso). O projeto de
modernidade deve partir dos processos de compreensão recíproca. Esses processos são para
Habermas universais. O sujeito em Habermas é o homo democraticus. O princípio da
universalização é para ela a ética do discurso (todos devemos aceitar as normas), segundo 5
etapas (análise processual de Habermas):
---- nenhuma parte afetada pelo que está sendo discutido deve ser excluída do discurso
(princípio da generalização); (aqui discurso = norma, ética)
-----todos os participantes devem ter igual possibilidade de acesso para apresentar e criticar
demandas de validação no processo de construção do discurso (princípio da autonomia);
------os participantes devem estar aptos e com vontade de simpatizar com as demandas de
validação de outros participantes (princípio ideal dos papéis assumidos);
-------as diferenças em termos de poder dos participantes devem ser neutralizadas a ponto de
evitar riscos possíveis para a obtenção do consenso (princípio da neutralidade do poder);
--------os participantes devem explicar abertamente seus objetivos e intenções e, nesse sentido,
desistir da ação estratégica (princípio da transparência).
BF adiciona (com tom irônico) um sexto princípio: o tempo ilimitado para a negociação. Do
ponto de vista empírico, Habermas vê nos novos movimentos sociais expressões da
racionalidade comunicativa e da mudança da esfera pública. O essencial de sua teoria centrase na racionalidade processual. Para as normas de funcionamento, ele é top-down,
universalista (todos devem respeitar o direito e as normas estabelecidas), ao passo que o
conteúdo do que é direito e verdade deve passar pelo processo bottom-up (situacionista) e ser
definido pela interação e a deliberação entre os atores.
Uma das fraquezas maiores de Habermas está na disconexão entre o seu ideal e a realidade.
Ele oferece-nos um discurso sobre a ética do discurso, mas apresenta limites quanto a sua
análise do poder. A comunicação, para Habermas, é ausência de poder ou busca do
consenso ? Ou seria o exercício do poder e da retórica ? Como se expressam concretamente,
no comportamento dos indivíduos, a liberdade da dominação e o exercício do poder ? BF crê
que devemos considerar Habermas como um filósofo utópico, pois os homens são mais
complexos que o homo democraticus de Habermas. Alguns autores críticos de Habermas :
Agnes Heller, Albrecht Wellmer, Herman Lübbe e Niklas Luhmann. Mesmo autores que são
mais próximos do pensamento de Habermas (Seyla Benhabib e Alessandro Ferrara)
começaram a criticá-lo pelo excesso de formalismo, idealismo e pela falta de sensibilidade em
relação ao contexto.
Michel Foucault : um opositor aos ideias e um democrata nietzscheano. Faz uma crítica
prática de Habermas que toma a forma de uma transgressão. Ele não prega o relativismo, mas
a centralidade do contexto dentro de uma ética da situação.
Foucault dizia : “Nada no homem –nem mesmo seu corpo- é suficientemente estável para
servir como base do auto-reconhecimento e para a compreensão do próprio homem”. Foucault
não acredita na universalidade; o contexto histórico e social constitui o melhor contraponto do
relativismo e do nihilismo. Ele quer construir o pensamento a partir do concreto e do real.
Para Foucault, o trabalho político é de criticar o funcionamento das instituições (que parecem
neutras e independentes) a fim de desmascarar e combater a “vilência política” que está
implícita nas suas atuações.
Foucault orienta-se para a phronesis, ao passo que Habermas orienta-se para a episteme. Para
Foucault, a praxis e a liberdade não advêm da teoria e da universalidade, mas da prática, da
resistência, do conflito, da luta. Habermas põe a ênfase na macropolítica dos procedimentos,
ao passo que Foucault salienta a micropolítica substantiva. Foucault não pretende dar
respostas ou instrumentos para um “melhor funcionamento » das instituições (« non-action
oriented »). A genealogia das instituições abre possibilidades para a ação sobre as instituições,
na medida em que ela demonstra que a gênese particular das instituições não está diretamente
associada à necessidade histórica. Foucault, ao dar ênfase à marginalidade e à dominação, é
mais sensível à diferença e à diversidade, à política da identidade.
Habermas propõe uma regulação do poder por meio de sua ética do discurso. Sua contradição
fundamental está no modo como Habermas pensa chegar à comunicação não-coercitiva
(zwanglos). Como evitar a coerção nesse processo? Como evitar que o acordo seja forçado?
Como evitar que a “esfera pública política não-subvertida pelo poder” seja liberada de poder?
Habermas apresenta uma descrição clara do que ele chama de « processo democrático ». Mas
seu problema está no excesso de idealismo (mais kantiano que platônico). Para Foucault, não
se pode suprimir o conflito, porque isso seria igual a suprimir a liberdade. Foucault não
acredita na « vontade geral » de Rousseau tampouco. A democracia garante a existência do
« público », mas não do consenso público. Uma democracia forte garante a existência do
conflito.
Aristóteles : o retorno
1984 : Foucault identifica a phronesis como razão prática. A phronesis permite-nos, para
Foucualt, afastar falsas opiniões e tomar boas decisões. Ele contrapõe a Metafísica (de
Aristóteles) com The Gay Science (de Nietzsche). Ele afirma que sua “genealogia” é
puramente nietzscheana:
-
foco no particular e no concreto;
-
conhecimento dos detalhes e paciência na construção do saber;
-
os pesquisador são distintos de seus objetos, mas são influenciados por práticas
culturais do « campo » (Bourdieu) em que se inserem;
-
as práticas (modos de agir e pensar ao mesmo tempo) são mais fundamentais que os
discursos;
-
o significado dos discursos somente pode ser entendido enquanto parte da história
social em curso;
-
discorda de Derrida (análise discursiva exclusiva do texto: para Derrida, não há nada
além do texto…), pois associa à análise do discurso uma análise de práticas concretas;
-
foco na contextualização e não no relativismo.
As teorias do poder: Dahl (poder comunitário), Baratz/Bachrach (não-decisões e as duas faces
do poder), poder nos marxistas (Poulantzas), as três dimensões de Steven Lukes (a localização
do poder), Foucault (relações de poder: o poder é exercido e não possuído; aonde há poder, há
resistência). As perguntas-chave, para Foucault, a fim de entender o poder são:
-
Quais são as relações de poder mais imediatas e operacionais e como elas se exercem?
-
Como as relações de poder em exercício e em análise afetam as possibilidades de
novas relações de poder (atenuando ou reforçando-as)?
-
Como se inter-relacionam as relações de poder, de acordo com que lógica e seguindo
que estratégia?
-
Como estas inter-relações tornam algumas racionalidades possíveis e outras
impossíveis, e como estas racionalidades contribuem ou se opõem a relações de
poder ?
-
Como podem tais relações de poder desenvolver-se diferentemente ?
Os discursos não são todos sempre emancipatórios ou opressores. Não se relacionam sempre
da mesma forma com o poder. A metodologia de pesquisa deve levar em conta a realidade
complexa dos discursos e sua relação (de opressão e de emancipação) com o poder.
Para Foucault, a preocupação com a verdade é a “questão do Ocidente” (o que ela chama de
“politics pof truth”). Foucault segue Weber na preocupação com a construção do
conhecimento racional, mas distancia-se dele na ênfase que ele dá ao contexto. O pensamento
reflexivo (contexto, subjetividade do pesquisador, racionalidade, teoria) é nesse sentido
fundamental para Foucault.
Guia metodológico para a pesquisa em ciências sociais
“The way to re-enchant the world is to stick to the concrete” (R. Rorty). A partir desse
imperativo metodológico e baseando-se em Pierre Bourdieu, Clifford Geertz, Alasdair
MacIntyre, bem como Rorty, BF afirma que é necessário:
1) Dar ênfase aos valores : buscar um equilíbrio entre a racionalidade instrumental e a
racionalidade substantiva centrada na capacidade dos agentes (indivíduos e
organizações) e da sociedade de pensar e agir em termos substantivos e valorativos.
Para isso, é necessário seguir o contextualismo e a ética situacional;
2) Colocar o poder no centro da análise: quem ganha e quem perde? Por meio de que
relações de poder ? quais são as possibilidades de mudar as relações de poder em
curso ? é desejável mudá-las ? O poder é concebido : como positivo e produtivo (e não
somente negativo e restritivo), como uma rede densa de relações omnipresentes (e não
somente localizado em centros ou instituições, ou uma entidade que possa ser
possuída), ultradinâmico (em movimento, em exercício), como em relação com o
saber (o saber produz poder e o poder produz saber). O central é perguntar-se como
ele é exercido;
3) Manter-se perto da realidade (o pesquisador torna-se parte do fenômeno estudado) ;
4) Dar ênfase a pequenas coisas : « small questions often lead to big answers » (p. 133).
Ênfase a práticas micro-locais;
5) Ver práticas antes dos discursos (o discurso não é a vida, a prática quotidiana é a
vida);
6) Estudar casos e contextos : buscar o conhecimento de circunstâncias particulares, de
casos concretos;
7) Perguntar-se como além de por quê ;
8) Unir a agência (nível do ator) e a estrutura (nível macro);
9) Dialogar com várias vozes (polifonia de vozes) : diálogo (do grego : dia=entre e
logos=razão) = entre razão.
10) Comunicar os resultados da pesquisa aos cidadãos (ponto na conclusão).
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