EUTANÁSIA: CONDENADOS À VIDA

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Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza
GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Etec “JORGE STREET”
TRABALHO DE CONCLUSÃO DO CURSO TÉCNICO EM SERVIÇOS
JURÍDICOS
EUTANÁSIA: CONDENADOS À VIDA
Karina Serain
Luise Nathaly Aguillar
Orientador: Profº Soraya
São Caetano do Sul/SP
2014
Karina Serain
Luise Nathaly Aguillar
EUTANÁSIA: CONDENADOS À VIDA
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado como pré-requisito
para obtenção do Diploma de
Técnico em Serviços Jurídicos.
São Caetano do Sul/SP
2014
2
Agradecimento
Agradece-se à todos envolvidos no trabalho, todos que diretamente ou
indiretamente contribuíram conosco. A Wallace Ferreira Santos, por sempre
nos ajudar com o trabalho editando vídeos e nos dando apoio por todo esse
tempo. A Marcela de Castro por nos contar a historia de sua avó. Denise
Aguillar Martinez, por sempre nos passar seu conhecimento cada vez mais. A
Waldir Magalhães por nos orientar nesta jornada, sempre nos dando conselhos
e apontando melhoras. Mas principalmente a Sebastião Aguillar, por nos
inspirar para esse trabalho, por nos emocionar e por nos mostrar que nunca se
deve desistir do que queremos.
3
Resumo
A eutanásia não é um tema novo, contudo sempre foi muito mal visto perante
a sociedade que envolve questões morais, religiosas e jurídicas.
No seu significado mais simples, a eutanásia é um meio de misericórdia, mas
sua prática em animais que não estão mais aptos a continuar a vida de forma
digna é aceito e praticado em nossa sociedade.
Existem diversos tipos de eutanásia que são estudados mais a fundo no
decorrer da pesquisa, porém tem de se entender que cada tipo tem uma forma
específica de ser concretizada porém todos visam o mesmo objetivo, dar uma
morte digna.
No decorrer da história, é possível perceber que a eutanásia sempre esteve
presente, desde em tribos menos civilizadas até grandes metrópoles, sempre
existiu essa ideia de misericórdia, acabar com a dor de quem não possuía mais
solução, logo conclui-se que sempre houve essa percepção de que viver em
uma cama de hospital não é uma vida, é apenas existir.
Os principais argumentos contra a eutanásia se baseiam em conceitos
religiosos como ―quem nos deu a vida foi Deus e apenas ele pode tirar‖, junto
com a Constituição Federal de 1988 que protege o direito a vida, acima até
mesmo do direito a vida digna. Porém quando se mexe com a vida, lida-se com
a individualidade do ser humano, não com uma religião ou um documento
jurídico.
Já o lado mais ―humano‖ pensa que viver é um direito e não uma obrigação,
que não se deve viver apenas para existir. A Constituição Federal de 1988
também diz que ninguém deve ser mantido em tratamento desumano ou
degradante, e a forma de vida que o soicitante leva é degradante, é um
tratamento desumano. Sendo assim, temos um argumento a favor do mesmo
local muito forte.
4
A eutanásia é um desejo tão requisitado que mesmo sem ser legalizada
houveram diversos casos e pedidos na justiça, tendo eles grande apoio social,
havendo força na mídia. Porém como sabem que na justiça elas não irão
conseguir que seu último desejo seja feito, muitos optam por suicídio ou uma
eutanásia ilegal, podendo alguns sofrerem para fazer o ato, como no caso de
Rámon Sampedro que passou 28 anos na justiça espanhola e no final fez as
escondidas dolorosamente.
Palavras-chave: Eutanásia, dignidade, morte
5
ABSTRACT
Euthanasia is not a new topic, but has always been very frowned upon in
society that involves moral, religious and legal issues.
In its simplest meaning, euthanasia is a means of mercy, but his practice on
animals that are no longer able to continue life in a dignified manner is accepted
and practiced in our society.
There are several types of euthanasia that are studied thoroughly the
research , but you have to understand that each type has a specific way of
being implemented but all seek the same goal, to give a dignified death .
Throughout history , one can see that euthanasia has always been present
since at least civilized tribes to large metropolises , there has always been this
idea of mercy , end the pain of those who had no more solution , then it follows
that there has always been this perception that living in a hospital bed is not a
life , it's just there .
The main arguments against euthanasia are based on religious concepts like
"who gave us life was God and only he can take," along with the 1988 Federal
Constitution which protects the right to life, above even the right to dignified life.
But when you play with life, dealing with the individuality of the human being,
not a religion or a legal document.
The most "human" side thinks that life is a right, not an obligation , it should
not live just to exist. The 1988 Federal Constitution also says that no one should
be kept in inhuman or degrading treatment , and the way of life that leads the
person asking is degrading , inhuman treatment is . Thus we have an argument
in favor of it very strong place.
Euthanasia is a desire so asked that even without being legalized there were
many cases and claims in court , they have great social support , with strength
in the media . But as you know that in justice they will not get her last wish is
made , many opt for suicide or euthanasia illegal , and some may have to do
6
the act , as in the case of Ramón Sampedro who spent 28 years in the Spanish
courts and at the end made painfully hidden .
Keywords : Euthanasia , dignity , death
7
Sumário
1.Introdução ..................................................................................................... 11
2.O que é a eutanásia ...................................................................................... 12
3.A Eutanásia na História ................................................................................. 13
4.Eutanásia x Morte assistida x Ortotanásia e Sedação Paliativa .................... 17
5.Principais argumentos a favor ....................................................................... 19
6. Principais argumentos contra ....................................................................... 22
7.Caso Eutanásia no Brasil e no Mundo .......................................................... 24
7.1 Rio de Janeiro ................................................................................................... 24
7.2 São Paulo.......................................................................................................... 24
7.3 Paraná .............................................................................................................. 25
7.4 Estados Unidos ................................................................................................. 26
7.5 França ............................................................................................................... 34
7.6 Italia .................................................................................................................. 36
9. Curiosidade .................................................................................................. 39
10. A eutanásia, o direito à vida e sua tutela penal .......................................... 40
11. O Direito à vida ........................................................................................... 40
12. Eutanásia no Brasil .................................................................................... 42
12.1 Lei Mario Covas .............................................................................................. 42
12.2 O que a doutrina diz ........................................................................................ 43
13. As conseqüências jurídicas da eutanásia................................................... 47
14. Projeto de Lei 125/96 ................................................................................. 48
15. A eutanásia no Direito Comparado ............................................................ 49
16. Sobre o Código de Ética Médica ................................................................ 51
17. Análise do Filme “Mar Adentro” .................................................................. 52
18. Holanda ...................................................................................................... 56
19. Dignidade ................................................................................................... 59
20. Conclusão .................................................................................................. 61
21. Bibliografia.................................................................................................. 64
8
Anexo 1. ........................................................................................................... 67
Anexo 2. ........................................................................................................... 70
Anexo 3 ............................................................................................................ 79
Anexo 4 ............................................................................................................ 81
Anexo 5 ............................................................................................................ 82
Anexo 6 ............................................................................................................ 84
Anexo 7 ............................................................................................................ 86
Anexo 8.............................................................................................................91
9
Indice de Figuras
Figura 1 - Eutanasia ................................................................................................... 12
Figura 2 - Cesar .......................................................................................................... 13
Figura 3 - Eutanásia Ativa ........................................................................................... 17
Figura 4 - Ortotanasia ................................................................................................. 18
Figura 5 - Terri Schiavo .............................................................................................. 28
Figura 6 - Terri ............................................................................................................ 29
Figura 7 – Schiavo jovem ........................................................................................... 29
Figura 8 - Chantal ....................................................................................................... 35
Figura 1– Sebire...........................................................................................................31
Figura 10 - Eluana ...................................................................................................... 37
Figura 11 - Welby ....................................................................................................... 38
Figura 12 - Mario Covas ............................................................................................. 43
10
1.Introdução
Quando se pensa ou fala-se em eutanásia, logo surgem as opiniões a favor
ou contrária essa situação, surgem pessoas falando da condenação e do
pecado que é querer acabar com a sua vida, e pessoas falando de como não é
justo estar preso em um corpo, que isso não é vida. O fato é que, o ser humano
tende a falar sobre isso de forma egoísta, e não realmente pensar no que o
outro está passando, pensa de forma política e por isso diz que o direito a vida
não deve ser desrespeitado.
A intenção é mostrar a realidade, quem realmente está certo? É realmente
justo julgar que o outro viva ou deixe de viver? Ninguém julga alguém por
querer viver, então porque há esse preconceito no contrário? Há a necessidade
de mostrar o que as pessoas passam, como elas vivem, seus desejos, o motivo
de isso ser ou não errado, como a justiça enxerga a situação, se há chances
disso se reverter e haver um consenso que agrade as pessoas, que não as
deixe no sofrimento, pois ninguém aguenta dor física, e quem pede eutanásia
não tem apenas isso, mas vem com um conjunto de dor psicológica.
Ninguém sabe pelo que o outro está passando pra ter o direito sobre a vida
dele, e isso deve ser mostrado, a dor e os impedimentos, tudo isso deve ser
espalhado como meio de informação, e é isso que este pesquisa traz,
informação para que as pessoas ao menos considerem e pensem antes de
dizerem cegamente que ―alguém deve ser preso a vida‖.
11
2.O que é a eutanásia
Eutanásia vem do grego euthanatos, que significa Morte bela ou morte sem
dor.
O termo foi proposto por Francis Bacon, em 1623, em sua obra "Historia vitae
et mortis", como sendo o "tratamento adequado as doenças incuráveis".
É uma forma de adiantar a morte de um doente incurável, sem que essa
pessoa sinta dor ou sofrimento. O ato é praticado por um médico com o
consentimento do doente, ou da sua família.
Figura 2 - Eutanasia - http://3.bp.blogspot.com/xMk_4HuJpiQ/Uap4wovi33I/AAAAAAAAIoY/5Sn-FntPjDk/s1600/euthanasia.jpg
12
3.A Eutanásia na História
Muitos povos como os Celtas, por exemplo, tinham por hábito que os filhos
matassem seus pais quando estes estivessem velhos e doentes. Além dos
celtas, os Germanos matavam os enfermos. Na Birmânia, eram enterrados
vivos os doentes incuráveis, enquanto que os Eslavos e Escandinavos,
apressavam a morte de seus pais enfermos. Em Atenas, o senado tinha
poderes de facultar a eliminação dos velhos e incuráveis, dando-lhes ―conium
maculatum‖ (bebida venenosa) em banquetes especiais.
Segundo Giuseppe Del Vecchio
“Os gestos dos Césares, voltando para baixo o polegar (“pollice verso”) nos
circos romanos, equivalia à prática da eutanásia. Os infelizes gladiadores,
mortalmente feridos nos combates viam, assim, abreviados os sofrimentos pela
compaixão real.”
Figura 3 - Cesar - http://blogs.transparent.com/latin/files/2011/05/thumbsdown1.jpg
Napoleão Bonaparte, na campanha do Egito, pediu ao médico que matasse
os soldados atacados pela peste, tendo o cirurgião respondido que o médico
não mata, a sua função é curar.
13
Na Índia os doentes incuráveis eram levados até a beira do rio Ganges, onde
tinham as suas narinas e a boca obstruídas com o barro. Uma vez feito isto
eram atirados ao rio para morrerem.
A discussão a cerca dos valores sociais, culturais e religiosos envolvidos na
questão da eutanásia vem desde a Grécia antiga. Por exemplo, Platão,
Sócrates e Epicuro defendiam a ideia de que o sofrimento resultante de uma
doença dolorosa justificava o suicídio. Em Marselha, neste período, havia um
depósito público de cicuta a disposição de todos. Aristóteles, Pitágoras e
Hipócrates, ao contrário, condenavam o suicídio. No juramento de Hipócrates
consta:
"eu não darei qualquer droga fatal a uma pessoa, se me for solicitado, nem
sugerirei o uso de qualquer uma deste tipo". - Hipócrates
Estas discussões não ficaram restritas apenas a Grécia. Cleópatra VII criou
no Egito uma "Academia" para estudar formas de morte menos dolorosas.
A discussão sobre o tema, prosseguiu o longo da história da humanidade,
com a participação de Lutero, Thomas Morus (Utopia), David Hume (On
suicide), Karl Marx (Medical Euthanasia) e Schopenhauer.
Na Europa, muito se falou de eutanásia associando-a com eugenia (O estudo
dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as
qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente).
Esta proposta buscava justificar a eliminação de deficientes, pacientes
terminais e portadores de doenças consideradas indesejáveis. Nestes casos, a
eutanásia era, na realidade, um instrumento de "higienização social", com a
finalidade de buscar a perfeição ou o aprimoramento de uma "raça", nada
tendo a ver com compaixão, piedade ou direito para terminar com a própria
vida.
Em 1931, na Inglaterra, o Dr. Millard, propôs uma Lei para Legalização da
Eutanásia Voluntária, que foi discutida até 1936, quando a Câmara dos Lordes
a rejeitou. Esta sua proposta serviu, posteriormente, de base para o modelo
14
holandês. Durante os debates, em 1936, o médico real, Lord Dawson, revelou
que tinha "facilitado" a morte do Rei George V, utilizando morfina e cocaína.
O Uruguai, em 1934, incluiu a possibilidade da eutanásia no seu Código
Penal, através da possibilidade do "homicídio piedoso". Esta legislação
uruguaia possivelmente seja a primeira regulamentação nacional sobre o tema.
Vale salientar que esta legislação continua em vigor até o presente. A doutrina
do Prof. Jiménez de Asúa, penalista espanhol, proposta em 1925, serviu de
base para a legislação uruguaia.
Em outubro de 1939 foi iniciado o programa nazista de eutanásia, sob o
código "Aktion T 4". O objetivo inicial era eliminar as pessoas que tinham uma
"vida que não merecia ser vivida". Este programa materializou a proposta
teórica da "higienização social".
A Igreja Católica, em 1956, posicionou-se de forma contrária a eutanásia por
ser contra a "lei de Deus". O Papa Pio XII, numa alocução a médicos, em 1957,
aceitou, contudo, a possibilidade de que a vida possa ser encurtada como
efeito secundário a utilização de drogas para diminuir o sofrimento de pacientes
com dores insuportáveis, por exemplo. Desta forma, utilizando o princípio
do duplo efeito, a intenção é diminuir a dor, porém o efeito, sem vínculo causal,
pode ser a morte do paciente.
Em 1968, a Associação Mundial de Medicina adotou uma resolução contrária
a eutanásia.
Em 1973, na Holanda, uma médica geral, Dra. Geertruida Postma, foi julgada
por eutanásia, praticada em sua mãe, com uma dose letal de morfina. A mãe
havia feito reiterados pedidos para morrer. Foi processada e condenada por
homicídio, com uma pena de prisão de uma semana (suspensa), e liberdade
condicional por um ano.
Em 1980, o Vaticano divulgou uma Declaração sobre Eutanásia, onde existe
a proposta do duplo efeito e a da descontinuação de tratamento
considerado fútil.
15
Em 1991, a Igreja Católica, através de uma Carta do Papa João Paulo II aos
bispos, reiterou a sua posição contrária ao aborto e a eutanásia, destacando a
vigilância que as escolas e hospitais católicos deveriam exercer na discussão
destes temas.
Em 1996, foi proposto um projeto de lei no Senado Federal (projeto de lei
125/96), instituindo a possibilidade de realização de procedimentos de
eutanásia no Brasil. A sua avaliação nas comissões especializadas não
prosperou.
Em maio de 1997 a Corte Constitucional da Colômbia estabeleceu que
"ninguém pode ser responsabilizado criminalmente por tirar a vida de um
paciente terminal que tenha dado seu claro consentimento". Esta posição
estabeleceu um grande debate nacional entre as correntes favoráveis e
contrárias.
Em novembro de 2000 a Câmara de Representantes dos Países Baixos
aprovou, com uma parte do plenário se manifestando contra, uma legislação
sobre morte assistida. Esta lei permitirá inclusive que menores de idade
possam solicitar este procedimento. Falta ainda a aprovação pelo Senado, mas
a aprovação é dada como certa. Esta lei apenas torna legal um procedimento
que já era consentido pelo Poder Judiciário holandês. A repercussão mundial
foi muito grande com forte posicionamento do Vaticano afirmando que esta lei
atenta contra a dignidade humana.
16
4.Eutanásia x Morte assistida x Ortotanásia e Sedação Paliativa
Eutanásia ativa é quando causa-se a morte de um paciente em estado
terminal, sendo o ato feito a pedido do próprio paciente e é feita respeitando
uma série de condições.
Uma das condições seria que no ato, provoca-se a morte sem sofrimento do
paciente, e tem como objetivo e finalidade a misericórdia.
Normalmente executada por parente próximo da vítima e, em alguns casos,
pelo médico que a acompanha.
Nota-se que a criação do risco, em tal situação, corre por conta do próprio
agente, e, não do paciente.
Figura 4 - Eutanásia Ativa - http://www.direttanews.it/wp-content/uploads/eutanasia4150x150.jpg
Morte assistida (suicídio assistido ou morte medicamente assistida)
ocorre
quando um terceiro não pratica a eutanásia, ele auxilia para que o ato
aconteça, quem realmente consuma o ato é o próprio paciente.
Há de se notar que na morte assistida a criação do risco é gerada pelo
próprio paciente. O agente (o terceiro), nesse caso, apenas auxilia, não
17
originando o ato criador do risco. Nisso é que a morte assistida difere da
eutanásia, quem pratica o ato efetivamente.
A
ortotanásia
(também
chamada
de
eutanásia
passiva
e
que,
etimologicamente, significa morte no tempo certo) ocorre quando pacientes em
fase terminal que estão tendo sua vida prolongada por meio de equipamentos
ou tratamentos, tem seus aparelhos desligados ou limitados. O desligamento
de aparelhos configura,ortotanásia.
Figura 5 - Ortotanasia - http://euacheiprimeiro.com/wpcontent/uploads/2013/03/Euatan%C3%A1sia-Assassinato.jpg
Por fim, a sedação paliativa consiste em suavizar, por meio de
medicamentos, a dor do paciente. Ela procura evitar (ou diminuir) o sofrimento
da pessoa em estado terminal. Mas nesse caso não se antecipa o momento da
morte. Nas três situações acima descritas (eutanásia ativa, morte assistida e
ortotanásia) há antecipação do momento da morte. Isso não ocorre na sedação
paliativa. Porém ela não é tida como uma solução perfeita, pois há um tipo de
eutanásia que pode vir a decorrer da sedação, sendo esta a eutanásia de
duplo efeito, que ocorre quando há utilização de altas doses de remédio com
intuito de aliviar a dor, porém este tratamento acaba indiretamente acelerando
a morte de um paciente em estado terminal, então uma sedação paliativa
poderia por consequência acabar causando uma eutanásia de duplo efeito.
18
5.Principais argumentos a favor
O homem começa a morrer na idade
em que perde o entusiasmo.
(Balzac)
Em diversos lugares do mundo muitas pessoas se posicionaram a favor da
eutanásia, como por exemplo em 1973 na Alemanha, onde 53% da população
se declarou a favor, e no ano de 1977 cerca de 57% e em 1984 passou a ser
66%. No ano de 1987 a 1988 na Inglaterra, 72% e na França, 76%
Em 1974, três cientistas, Linus Pauling, Gerog Thomson e Jacques Monod
foram os primeiros subscritores do ―Manifesto em favor da eutanásia
humanitária‖, publicado na revista ―The Humanist‖ de Julho/Agosto de 1974,
nele são explanados os principais argumentos a favor desse grupo, confira a
seguir:
1.Direito de morrer - se por um lado a sociedade proclama
o direito à vida como um valor absoluto e inviolável, não
menos
importância
parece
ter
a
proclamação
da
autonomia e da liberdade do homem que poderá, isto é, a
liberdade de negar qualquer direito, inclusive o direito à
vida, desde que a sua escolha seja realmente voluntária,
ou seja, não sujeita a uma pressão externa. Os
defensores da eutanásia associam assim ao direito de
viver com o direito de morrer dignamente, que viver é um
direito e não uma obrigação.
2. A vida humana é pois pautada por escolhas pessoais,
inclusivamente
para
morrer.
um acontecimento clínico
para
Morrer
se
deixa
de
transformar
ser
numa
decisão pessoal.
19
É
defendida
a
sua
prática
com
base
nos
seguintes argumentos:
1. O objectivo da medicina é aliviar o sofrimento dos
doentes
2. Atualmente, deve haver respeito pelo doente face à
evolução da tecnologia. Passamos de um quadro
sociológico em que se morria em casa para o processo
de morrer nos hospitais bem equipados, onde muitas
vezes é prolongado, de forma desumana, o processo
agónico,ou seja, o fato do paciente estar agonizando em
um hospital seria considerado como uma falta de
respeito ao paciente.
3. Necessidade de os médicos respeitarem a autonomia
individual.
4. Compreensão dos usos errados dos poderes da vida
e da morte e adaptação às novas situações.
5. O suicídio medicamente assistido é praticado desde
há muitos anos, em privado, devido à boa relação entre
médico e doente.
6. Cada pessoa tem autonomia para decidir por si próprio,
estando na base da escolha pela prática ou não da
eutanásia. A eutanásia não apoia nem defende a morte
em si, apenas faz uma reflexão de uma morte mais suave
e menos dolorosa que algumas pessoas optam por ter,
em vez de viveram uma morte lenta e sofrida.
7.O indivíduo ao escolher a prática da eutanásia tem de
ter
consciência
do
que
está
a
fazer,
havendo
consequentemente a impossibilidade do arrependimento.
É preciso analisar os diversos elementos sociais que o
20
rodeiam, incluindo também componentes biológicas,
familiares e econômicas.
8. A pessoa teria direito à escolha pela sua vida e pelo
momento
da
morte.
9.Quando uma pessoa passa a ser prisioneira do seu
corpo, dependente de outras pessoas para ter as
necessidades mais básicas. O medo de ficar só, de ser
um "fardo" e a revolta levam o paciente a pedir o direito a
morrer com dignidade.
21
6. Principais argumentos contra
Há muitas objeções em relação à prática da eutanásia como elementos
religiosos, éticos e políticos, dependendo da sociedade em que o doente está
inserido. No caso da religião, a principal objeção é o fato de considerarem que
a eutanásia é tida como uma usurpação do direito à vida humana, vida esse
que foi criado por Deus e é esse Deus o único que pode tirar a vida a alguém.
“A Igreja, apesar de estar consciente dos motivos que
levam a um doente a pedir para morrer, defende acima de
tudo o caráter sagrado da vida.” (Pinto, Susana; Silva,
Florido).
Os médicos consideram a vida algo sagrado, portanto da perspectiva da ética
médica, tendo em conta o juramento de Hipócrates a Eutanásia é considerada
homicídio. Cabe assim ao médico, cumprindo o juramento Hipocrático, assistir
o paciente, fornecendo-lhe todo e qualquer meio necessário à sua
sobrevivência. E além disso, há ainda casos de pacientes que desistem da
medicina convencional e depois procurando outras alternativas conseguem se
curar, o que dá a conclusão de quê a eutanásia teria sido um erro caso
aplicada.
“Nunca é lícito matar o outro: ainda que ele o quisesse,
mesmo se ele o pedisse (…) nem é lícito sequer quando o
doente já não estivesse em condições de sobreviver”
(Santo Agostinho inEpístola).
1.Os cuidados paliativos o tratamento da dor e sofrimento humano são a
alternativa contra eutanásia, ou seja, sedação paliativa, porém já foi dito
anteriormente que isso pode acabar resultando em uma eutanásia de duplo
efeito.
22
2.A legalização da eutanásia poderia ser aplicada de uma forma abusiva, tendo
como consequência a morte sem o consentimento das pessoas em causa.
3.A dificuldade de muitas vezes prever o tempo de vida que resta ao doente,
bem como a existência da possibilidade de o diagnóstico médico estar errado o
que levaria à prática de mortes precoces e sem sentido.
4.A possibilidade que existe de o paciente se sentir menos seguro em relação
ao tratamento, devido ao seu médico já ter praticado a eutanásia, levaria a que
a relação médico/paciente viesse a ser afetada de uma forma negativa.
5.O juramento de Hipócrates que obriga o médico a não provocar danos no
paciente seria violado ao ajudar alguém a apressar a vinda da morte o que
poderia causar transtornos a nível psicológico nos médicos.
6.Os familiares ou herdeiros poderiam agir com interesse financeiro e
recomendar ou mesmo incentivar a eutanásia.
7.Em termos de crenças as grandes religiões tais como a Católica afirma que a
vida provém de Deus e só a Ele lhe compete tirá-la, levando a que muitas das
pessoas religiosas rejeitem por completo a prática da eutanásia.
8.O Código Penal considera crime quem ajuda em suicídio ou homicídio
mesmo que a pedido da vitima ou por "compaixão".
9.Na perspectiva da ética médica a vida é considerada como um dom sagrado
sobre o qual o médico não pode ser juiz da vida ou da morte de alguém. Deste
modo a Eutanásia é considerada como um homicídio, pois cabe ao médico
assistir o paciente fornecendo-lhe todo e qualquer meio necessário durante seu
estado no hospital.
23
7.Caso Eutanásia no Brasil e no Mundo
7.1 Rio de Janeiro
Em março de 2004, foi publicado uma reportagem que relatava casos de
eutanásia realizadas no hospital Salgado Filho no Rio de Janeiro, realizados
pelo auxiliar de enfermagem Edson Isidoro Guimarães em 1999. Ele afirma que
fazia isso por compaixão e para aliviar o sofrimento dos pacientes. O método
utilizado consistia na injeção de cloreto de potássio ou no desligamento do
equipamento que fornecia oxigênio aos pacientes. Foram constatados 153
ocorrências deste tipo em seus plantões, sendo as mortes entre as duas e as
quatro horas da manha. Destas, quatro foram comprovadas e assumidas pelo
auxiliar de enfermagem, que foi julgado e condenado a 76 anos de prisão, em
19/02/2000. A sua pena já foi reduzida duas vezes, primeiro para 69 anos e
depois para 31 anos e oito meses. Havia o envolvimento de empresas
funerárias que pagaram entre 40 e 60 dólares norte-americanos por paciente
encaminhado.
7.2 São Paulo
Na publicação "Vidas em Revista", de 08 de março de 2004, foi publicada
uma reportagem onde um cirurgião, Carlos Alberto de Castro Cotti, de São
Paulo, relatou ter realizado várias eutanásias, inclusive involuntárias, em seus
pacientes, desde 1959.
1o
Relato
-
1959:
Um paciente com icterícia, que não conseguia se alimentar e recebia
alimentação "artificialmente". O paciente tinha dores e recebia morfina. "Era um
absurdo mantê-lo vivo naquelas condições", afirmou o cirurgião.
24
2o
Um
Relato
paciente
com
metástases
cerebrais,
pulmonares
1964:
e
intestinais
generalizadas. Quando as metástases ósseas o atingiram a dor era "violenta".
3o
Relato
-
sem
data
especificada:
Um paciente com carcinomatose, com bloqueio de rim. "Foi muito triste porque
era meu amigo, tinha 52 ou 54 anos."
4o
Relato
-
sem
data
especificada:
Uma paciente, com idade entre 65 e 68 anos, foi operada quatro vezes em dois
anos. Na primeira vez foi feita uma jejunostomia. No início ela tinha 70 kg, após
a quarta cirurgia, quando teve uma perfuração intestinal devida a carcinoma,
teve uma peritonite, já estava com apenas 25 kg. Nesta ocasião o cirurgião da
paciente solicitou ao médico que relatou o fato, que fizesse uma injeção de
"M1" (solução a base de fenergan, morfina e outras substâncias) na paciente.
Isto foi feito na própria residência da paciente, após ter sido comunicado aos
filhos. "Eu fui buscar a medicação e nós dois colocamos no soro. Ficamos
aguardando, conversando, por que nós resolvemos que deveríamos estender o
mais que pudéssemos o sono, porque a paciente estava muito consciente. E foi
feito." Uma das repórteres perguntou se a paciente sabia a havia concordado
com o procedimento. A resposta foi a seguinte: "Ela sabia que não podia mais
ser operada, mas não sabia que ia receber o "M1". Quem decidiu isso foi a
família."
7.3 Paraná
Outro caso nacionalmente conhecido é o do médico Ítalo Fernando
Fumagalli, ocorrido na cidade de Marechal Candido Rondon, no Paraná. O
processo criminal em que o médico e as enfermeiras Ângela Simoni Reis e
Melani Heinrich Lohmann, figuram como réus, foi iniciado no ano de 1991, de
acordo com a denuncia pelo menos três pacientes em fase terminal teriam sido
vitimas do médico que também é proprietário do hospital. Cloreto de potássio
era aplicado nos pacientes que, logo depois, morriam de parada cardíaca e
respiratória. Ainda segundo denuncias o procedimento ocorria tendo em vista o
25
alto custo das internações. Fumagalli foi indiciado por homicídio qualificado, a
pena varia de 12 a 20 anos de prisão. Entretanto, uma decisão do Superior
Tribunal de Justiça, suspendeu por prazo indeterminado, o julgamento. Para o
conselho regional de saúde o caso esta arquivado há dez anos, quando o
médico foi julgado e absolvido das acusações.
7.4 Estados Unidos
Nos Estrados Unidos a eutanásia não é permitida por lei. A justiça americana
possibilitou algumas outras situações que envolvem o final de vida como a
interrupção de tratamento que apenas prolongue o processo de morrer de
pacientes e o suicídio assistido.
Em 1990, no caso Nancy Cruzan a justiça do estado de Missouri assegurou o
direito dos familiares solicitarem a interrupção de tratamentos que apenas
prolonguem a morte de uma paciente em estado vegetativo persistente.
Em 11 de janeiro de 1983, Nancy Cruzan, de 25 anos, casada, perdeu o
controle de seu carro quando viajava no interior do estado de Missouri; EUA. O
carro capotou e ela foi encontrada voltada com rosto para baixo em um
córrego, sem respiração ou batimento cardíaco detectável. Os profissionais de
emergência que a atenderam foram capazes de recuperar as funções
respiratória e cardíaca, sendo a paciente transportada inconsciente para o
hospital. Um neurocirurgião diagnosticou a possibilidade de dano cerebral
permanente devido a falta de oxigênio. O período de tempo de anóxia foi
estimado em 10 a 12 minutos. Em média se estima que ocorram danos
cerebrais permanentes com anóxia de 6 minutos ou mais.
A paciente ficou em coma por três semanas. O quadro evoluiu para um
estado de inconsciência onde a paciente podia se alimentar parcialmente por
via oral. Com a finalidade de facilitar a sua alimentação, foi introduzida uma
sonda de alimentação. O seu marido autorizou este procedimento. Em outubro
de 1983, ou seja, dez meses após o acidente, ela foi internada em um hospital
público.
Todas
as
tentativas
de
reabilitação
foram
mal
sucedidas,
demonstrando que ela não teria possibilidade de recuperar a vida de relação.
Os seus pais, que também eram considerados como seus representantes
26
legais, em conjunto com o esposo, solicitaram ao hospital que retirassem os
procedimentos de nutrição e hidratação assistida, ou seja, a sonda que havia
sido colocada. Os médicos e a instituição se negaram a atender esta demanda
sem autorização judicial.
Os pais entraram na justiça do estado do Missouri solicitando esta
autorização em junho de 1989. Um representante legal foi indicado para atuar
durante o julgamento. O tribunal, em junho de 1990, após realizar audiências,
ordenou à instituição que atendesse a demanda da família. Esta decisão se
baseou em três argumentos básicos: no diagnóstico, na previsão legal desta
demanda e na manifestação prévia da vontade pessoal da paciente. O
diagnóstico de dano cerebral permanente e irreversível, em consequência do
longo período de anóxia, foi confirmado e não questionado. A lei do estado do
Missouri e da Constituição norte-americana permitem que uma pessoa no
estado da paciente pode recusar ou solicitar a retirada de "procedimentos que
prolonguem a morte". considerando que ela, aos vinte anos, tinha manifestado
em uma conversa séria com uma colega de quarto, que se estivesse doente ou
ferida, ela não gostaria de ser mantida viva, salvo que pudesse ter pelo menos
metade de suas capacidades normais. Esta posição sugeriu que ela não
estaria de acordo com a manutenção da hidratação e da nutrição nas suas
condições atuais.
No túmulo de Nancy Cruzan consta a seguinte indicação:
―Nascida em 20 de julho de 1957
Partiu em 11 de janeiro de 1983
Em paz em 26 de dezembro de 1990 ―
Em janeiro de 1998, o médico Maurice Genereux foi o primeiro americano a
ser condenado por morte assistida e ficou preso por quase dois anos. Ele havia
prescrito remédios em excesso para um jovem gay que tinha AIDS e acabou
sendo delatado por amigos.
Theresa Marie (Terri) Schindler-Schiavo, de 41 anos,
teve uma parada
cardíaca, em 1990, talvez devido a perda significativa de potássio associada a
Bulimia, que é um distúrbio alimentar. Ela permaneceu, pelo menos, cinco
27
minutos sem fluxo sanguíneo cerebral. Desde então, devido a grande lesão
cerebral, ficou em estado vegetativo, de acordo com as diferentes equipes
médicas que a tem tratado. Após longa disputa familiar, judicial e política, teve
retirada a sonda que a alimentava e hidratava, vindo a falecer em 31 de março
de 2005.
Figura 6 - Terri Schiavo - http://morristrust.com/wpcontent/uploads/2013/01/terri_schiavo3x311.jpg
O Caso Terri Schiavo vem tendo grandes repercussões nos Estados Unidos,
assim como em outros países, devido a discordância entre seus familiares na
condução do caso. O esposo, Michael Schiavo, desejava que a sonda de
alimentação fosse retirada, enquanto que os pais da paciente, Mary e Bob
Schindler, assim como seus irmãos, lutaram para que a alimentação e
hidratação fossem mantidas. Por três vezes o marido ganhou na justiça o
direito de retirar a sonda. Nas duas primeiras vezes a autorização foi
revertida. Em 19 de março de 2005 a sonda foi retirada pela terceira vez,
assim permanecendo assim até a sua morte. Apesar de todo o envolvimento
político, que permitiu reabrir o caso em nível da justiça federal norte-americana,
o primeiro juiz federal que foi chamado a se pronunciar no caso, não autorizou
a recolocação da sonda.
28
Figura 7 - Terri http://www.folsomvillage.com/WorldArchives/images/TerriSchiavo/TSchiavoInPVS1-b.jpg
Inúmeros componentes de litígio dos familiares, entre si, com a sociedade,
com a classe médica, com o sistema judiciário, com a Câmara dos Deputados
dos Estados Unidos e com o governo do estado da Flórida, atestam a
complexidade que este caso assumiu.
Figura 8 – Schiavo jovem - http://www.jesus-issavior.com/Disturbing%20Truths/shiavo_murdered.jpg
29
Uma das circunstâncias agravantes deste caso foi a divergência de opinião
entre os familiares da paciente. As posições antagônicas da família iniciaram
em 1993, com questões que incluem diferentes versões sobre os interesses em
manter ou terminar o uso da alimentação e hidratação por sonda. O marido
alegou várias vezes que a sua esposa havia manifestado verbalmente, quando
ainda estava consciente, que não desejaria permanecer em um estado como o
que se encontra agora. Caso esta manifestação estivesse documentada por
escrito se constituiria uma Vontade Antecipada (Living Will), com respaldo legal
pela justiça norte-americana. A disputa familiar perdurará mesmo após a morte.
O marido já conseguiu autorização judicial para a cremação do cadáver da
esposa, enquanto que a família desejava que o corpo dela seja sepultado.
Outra disputa familiar envolve o local onde as suas cinzas serão depositadas,
se na Flórida ou na Pensilvânia.
A sociedade tem se manifestado nestes 15 anos tanto a favor quanto contra a
retirada da sonda de alimentação através de manifestações públicas e ações
continuadas. Alguns questionam o direito de uma outra pessoa poder tomar
esta decisão, por representação, tão importante em nome de outra. Outros
discutem a questão de recursos já gastos na manutenção de uma paciente
sem possibilidade de alterar o seu quadro neurológico. Os custos de seu
tratamento, na ordem de US80,000.00/ano, foram cobertos pelo Woodside
Hospice, que é uma instituição sem fins lucrativos, e pelo fundo público de
saúde MEDICAID da Flórida. Normalmente o MEDICAID cobre seis meses de
auxílio, mas o estado da Flórida aportou recursos à paciente por mais de dois
anos. Vale lembrar que o advogado do marido era um dos membros da
diretoria do Hospice e atuava em movimentos a favor da legalização da
eutanásia. A sociedade também tentou interferir de outras formas. Em 2005,
um milionário norte-americano ofereceu um milhão de dólares para que o
marido passasse a guarda legal para os pais, encerrando a questão do
desligamento. O marido considerou a oferta ofensiva. As ações judiciais
movidas pela família da paciente foram parcialmente financiadas por
instituições vinculadas à luta contra a legalização do aborto nos Estados
Unidos. A família Schindler é católica. Muitas denominações religiosas,
principalmente cristãs fundamentalistas, também realizaram manifestações
30
públicas e pressão política sobre o parlamento norte-americano. Algumas
pessoas ligadas a estes movimentos consideravam que retirar a sonda da
paciente configuraria uma situação de homicídio. A mídia mundial tem dado
destaque a esta situação, além dos noticiários, em programas de debates,
pesquisas de opinião, apresentando uma perspectiva meramente dicotômica
ou maniqueísta. As pessoas são forçadas a se posicionarem apenas de forma
contra ou a favor.
O litígio com a classe médica foi devido a questões de diagnóstico e
tratamento. Em três ações judiciais ocorridas em 1992 geraram um ganho de
cerca de dois milhões de dólares para a paciente e seu marido, que deveriam
ser utilizados para custear o seu tratamento. O valor recebido em nome da
paciente foi gerido por um juiz que era o responsável pela autorização de todas
as despesas. Estes recursos acirraram a disputa familiar. Os pais alegavam
que um dos motivos pelo qual o marido queria a retirada da sonda se devia a
questão dele ser o seu herdeiro. Ele alegava, por outro lado, que a família
havia entrado em litígio com ele após ter solicitado ficar com parte dos recursos
arrecadados nas ações judiciais. O marido já fez uma proposta de deixar todo o
patrimônio auferido com estas ações legais para entidades filantrópicas. Outro
importante aspecto envolvendo a classe médica diz respeito ao próprio
diagnóstico da paciente. Os médicos que a assistem afirmam categoricamente
que ela está em Estado Vegetativo Permanente, contudo vários peritos
indicados pelos pais, deram laudos onde este diagnóstico é substituído por
outros quadros neurológicos menos graves. O mais recente questionamento foi
feito por um neurologista da Mayo Clinic, que não examinou a paciente, mas
apenas a observou em uma visita e assistiu aos vídeos gravados pela família.
Ele é vinculado a movimentos pró-vida. Para demonstrar que a paciente tem
alguma forma de vida de relação foram apresentados vídeos, gravados pelos
pais, onde a paciente abre os olhos, sorri e acompanha alguns movimentos.
Estas imagens têm sido constantemente divulgadas pelas emissoras de TV,
jornais e revistas. Alguns especialistas afirmaram que estas manifestações são
condizentes com o quadro de Estado Vegetativo Persistente, pois podem ser
apenas reflexos involuntários. Em fevereiro de 2004, uma paciente que estava
em coma, durante 20 anos, recuperou-se, tendo sido utilizado este caso pela
31
família Schindler para alertar da possibilidade de que sua filha possa ter ainda
alguma esperança. A falta de uniformidade no diagnóstico tem gerado muita
controvérsia, apesar do juiz responsável pelo caso ter aceito o diagnóstico de
Estado Vegetativo Persistente para permitir a retirada da sonda. O marido
autorizou a realização de necropsia da paciente. Logo após a sua morte, a
polícia da Flórida levou o corpo para um departamento médico legal. Em 15 de
junho de 2005 foi revelado o conteúdo do relatório da necropsia realizada em
Terri Schiavo informando que a causa da morte foi uma complicação de
encefalopatia por anóxia. Os resultados comprovam a existência de uma grave
lesão cerebral, com atrofia de cerca de 50% da massa encefálica. Não foram
verificados outros sinais de lesões provocadas,
especialmente sobre o
estrangulamento que a família havia alegado. Ficou constatado também que a
paciente era cega, contrariando o que a família de origem defendia ao
apresentar os vídeos. Após a liberação do relatório os pais alegaram que
sabiam da grave lesão, mas que ainda assim tinham o direito de levá-la para
casa e cuidá-la, pois, segundo eles, ela ainda mantinha alguma forma de
comunicação.
As dificuldades de relacionamento também envolvem o sistema judiciário ao
colocar sob suspeita a isenção de alguns dos juízes envolvidos nos diferentes
julgamentos e instâncias. Durante todo o processo mais de 40 juízes se
pronunciaram sobre o caso. A Suprema Corte da Flórida e dos próprios
Estados Unidos se negaram a reconhecer que este caso merecesse a sua
consideração, mantendo-o no nível da justiça comum estadual. Nesta última
solicitação
de
retirada
a
Suprema
Corte
da
Flórida
se
manifestou
favoravelmente a demanda do marido autorizando a retirada da sonda. A
Suprema Corte dos Estados Unidos reiterou em março de 2005 a sua posição
anterior de não se envolver na discussão deste caso. No dia 29 de março
o tribunal federal de Atlanta aceitou avaliar novamente a solicitação dos pais
para reabrir a discussão do caso. Esta nova posição pode acabar autorizando a
recolocação da sonda de alimentação.
32
Na área governamental tanto o legislativo quanto o executivo estadual da
Flórida quanto o Senado, a Câmara e a Presidência dos Estados Unidos
tiveram alguma atuação sobre o caso.
Em 2003, o governador da Flórida, Jeb Bush fez passar uma lei estadual para
poder interferir no caso, recolocando a sonda que já havia sido retirada com
autorização da justiça. O marido da paciente processou o governador na
justiça da Flórida por interferir em uma ordem judicial. Em 2004, a Suprema
Corte da Flórida julgou a lei inconstitucional. No estágio final da vida de Terri a
comunidade pressionou o governador Bush a tomar medidas em favor da
retirada da sonda. Desta vez, em 2005, ele se declarou impedido de fazer
qualquer ação neste sentido. Após a divulgação do relatório de necropsia,
o governador Bush quer esclarecer por que o marido demorou tanto tempo
para chamar o serviço de emergência (911) quando ela teve o primeiro
episódio de parada cardíaca, em 1990. Vale relembrar que esta é uma questão
nova sobre um episódio ocorrido fazem 15 anos.
A Câmara de Deputados dos Estados Unidos envolveu-se neste caso ao
arrolar a paciente, que já estava em Estado Vegetativo Persistente, como
testemunha. Esta convocação a incluiria no sistema de proteção a
testemunhas, impedindo que fossem tomadas quaisquer medidas que
pudessem alterar a sua situação. Esta convocação foi tornada sem efeito na
justiça. Outra proposta dos representantes do partido Republicano foi feita no
sentido de estabelecer uma lei nacional que permita trazer estes casos para o
âmbito da justiça federal. O próprio presidente George Bush retornou à
Washington, antes do término do final de semana, depois da terceira retirada
da sonda, com a finalidade de poder acompanhar melhor as repercussões do
caso junto ao Congresso. Vários grupos de pressão mandaram cartas, e-mails
e telefonemas ao presidente Bush no sentido de que ele assinasse a lei, caso
ela fosse aprovada. O Congresso aprovou a lei, em caráter emergencial, pela
primeira vez na história do país, e o presidente a sancionou. Os críticos desta
interferência dos poderes executivo e legislativo no judiciário afirmaram que
esta proposta violou o direito de privacidade pessoal e familiar, além de romper
com uma tradição de independência entre os poderes. A população, através
33
de pesquisas de opinião, se manifestou contrariamente a participação do
Congresso e do Presidente em um caso como este.
Este caso permite múltiplas abordagens . A questão central pode ser a da
tomada de uma decisão desta magnitude por um representante legal que tem
questionada a sua intenção de realmente defender os melhores interesses da
paciente. Outras questões como má prática profissional, conflitos de interesse
de profissionais, familiares, políticos, advogados e juízes, privacidade,
autodeterminação,
veracidade,
justiça,
beneficência,
eutanásia
versus
homicídio, eutanásia versus retirada de tratamento, entre outras, podem ser
levantadas.
O viúvo de Terri, Michael Schiavo, foi convidado como palestrante em um
encontro de Bioética. Esta participação tem gerado polêmica sobre a sua
adequação.
Este caso é um exemplo da transformação de uma decisão privada, que
deveria ter sido tomada no âmbito familiar, para a esfera pública, de uma
questão de atender ao melhor interesse da paciente, para transformar-se em
um espetáculo.
7.5 França
Chantal Sébire. Desfigurada por um tumor incurável, alojado na região do
céu da boca e no seio nasal, Chantal Sébire, uma cidadã francesa mãe de três
filhos menores e com 52 anos de idade, solicitou à justiça do seu país o direito
de praticar eutanásia.
34
Figura 9 - Chantal - http://ensaiosobreamorte.pbworks.com/f/antes.jpg
Numa carta ao Presidente Nicolas Sarkozy,Madame Sébire solicita que lhe
seja autorizada o consumo de uma droga letal que acabe definitivamente com
o seu sofrimento, conduzindo-a à morte, enquanto se encontra consciente do
seu ato.
Alega a requerente, que a doença de que sofre encontra-se num estado
progressivamente
incurável,
produzindo
dores
insuportáveis,
e
uma desfiguração facial monstruosa, além do fato do seu organismo ser
intolerante a analgésicos, em particular a morfina.
35
Figura 10 - Sebire -http://www.bbc.co.uk/blogs/legacy/ni/_44498754_sebire_203.jpg
Depois de seu pedido ser negado na Justiça, Chantal foi encontrada morta
em sua residência.
7.6 Italia
Eluana Englaro foi uma mulher italiana que entrou em um estado
vegetativo persistente em 18 de janeiro de 1992, na sequência de um acidente
de carro e, posteriormente, se tornou o foco de uma batalha judicial entre
apoiadores e opositores da eutanásia. Pouco depois de Eluana tinha sido
mantida em suporte artificial de vida, seu pai pediu para ter seu tubo de
alimentação e removido para permitir que ela morra naturalmente. As
autoridades inicialmente recusaram o seu pedido, mas a decisão foi alterada.
36
Figura 11 - Eluana - http://cdn.tempi.it/wp-content/uploads/old_post/eluana_englaro-jpegcrop_display.jpg
Em carta aberta ao presidente italiano, Giorgio Napolitano, enviada em
setembro, o paciente Piergiorgio Welby explicava sua vontade de morrer, pois
estava tetraplégico devido a uma distrofia muscular progressiva, desde 1997.
Na carta ele afirmava:
―Eu amo a vida. Não sou maníaco-depressivo. Acho a ideia de morrer
horrível. Mas o que me resta não é mais uma vida".
Esta carta e sua divulgação causou um grande debate na Itália.
O paciente já havia solicitado uma autorização judicial para que seus
equipamentos fossem desligados, mas a sua demanda não foi considerada
válida pela ausência de lei na Itália que tipifique esta situação.
37
Figura 12 - Welby - http://www.ilsussidiario.net/img/ANSA3/welby.jpg
Welby morreu em dezembro de 2006. O médico anestesista Mario Riccio
após sedá-lo, para evitar a sensação de falta de ar, desligou o
respirador. Então, Welby morreu da forma como havia desejado e descrito em
seu livro "Deixem-me morrer". No livro o paciente escreveu:
"Morrer teria que ser como dormir depois do amor, cansado, tranquilo e com
esse sentido de estupor que invade tudo".
Sua mulher admitiu que recebeu uma educação católica muito rígida e que,
por isso, considerava a eutanásia um assassinato.Mas ao passar 27 anos ao
lado de Piergiorgio, que tinha distrofia muscular progressiva desde os 18 anos,
sua posição foi se modificando.
O paciente teve apenas um enterro laico, pois a Igreja Católica negou a
possibilidade de um enterro religioso. O argumento utilizado pela Igreja foi o de
que o paciente se afastou da doutrina católica ao solicitar a realização da
eutanásia.
O médico foi denunciado e processado por homicídio. Na sua defesa, o Mario
Riccio sustentou a argumentação de que esta intervenção não é um caso de
eutanásia, mas sim de retirada de um tratamento rejeitado pelo paciente.
Segundo a interpretação da juíza Zaira Secchi, do Tribunal de Roma, o
médico Mario Riccio não cometeu crime ao desligar o respirador que mantinha
38
vivo paciente, porque rejeitar tratamento médico não desejado é um direito
reconhecido na Constituição italiana. Segundo a juíza, ―não foi homicídio,
porque Welby estava lúcido, consciente, informado e suas vontades eram
legítimas‖. De acordo com a sua interpretação, o médico ―atuou atendo-se ao
direito da vítima de se privar de um tratamento não desejado, um direito
reconhecido pela Constituição em relação ao qual o médico assumiu o dever
jurídico de consentir‖. De acordo com a juíza, o médico cumpriu a sua
obrigação profissional.
9. Curiosidade
Jack Kevorkian foi um médico estadunidense.
Kevorkian é mundialmente conhecido por sua luta para fazer do suicídio
assistido um direito de todos. Médico patologista aposentado que inventou
a “máquina do suicídio”, ele deu apoio a mais de 130 doentes terminais
dos Estados Unidos para pôr um fim nas suas vidas com a eutanásia,
ganhando o epíteto de Dr. Morte.
39
10. A eutanásia, o direito à vida e sua tutela penal
A eutanásia pode ser conceituada como a eliminação da vida alheia,
praticada devido valores morais, com o intuito de livrar um doente, sem
esperança de cura, dos inúmeros sofrimentos que vem passando. O
ordenamento brasileiro, não exclui a ilicitude dessa conduta, com ou sem o
consentimento do ofendido, enquadrando-a no crime do artigo 121 do Código
Penal, mas permite o reconhecimento do privilégio, configurando uma redução
da pena de um sexto a um terço.
Art. 121. Matar alguém:
Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
Caso de diminuição de pena
§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de
relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de
violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação
da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um
terço.
O anteprojeto da Parte Especial do Código Penal de 1984 previu, pela
primeira vez, a isenção de pena para o médico que praticasse a eutanásia que,
com o consentimento da vítima, ou na sua falta, de ascendente, descendente,
cônjuge ou irmão, antecipasse a morte iminente e inevitável do doente, desde
que atestada por outro médico.
No entanto, o projeto foi abandonado, por diversos motivos, principalmente,
por fortes influências de ordem religiosa.
11. O Direito à vida
No Brasil, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948 em seu
artigo 1° estabelece que: ―Todos os homens nascem livres e iguais em
40
dignidade. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns
aos outros com espírito de fraternidade‖, trazendo ainda em seu artigo 3° que:
―Todo homem tem direito à vida, à liberdade e a segurança pessoal‖.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 trata, em seu
artigo 5º, dos direitos e deveres individuais e coletivos onde a inviolabilidade do
direito à vida é tutelada.
O direito a vida se tornou um direito fundamentalmente reconhecido pelo
Direito Internacional.
41
12. Eutanásia no Brasil
O Brasil, nos seus primitivos tempos, também conheceu a eutanásia. Essa
prática foi detectada entre os silvícolas.
Algumas tribos deixavam à morte seus idosos, principalmente aqueles que
já não mais participavam das festas e caças. Acreditavam esses indígenas que
viver era poder participar de festas, caças e pescas; logo, aqueles privados de
tais ações não teriam mais nenhum estímulo para a vida. Assim, a morte viria
como benção, uma vez que a vida sem aquelas atividades perdera todo seu
significado.
Além da prática entre indígenas, a eutanásia no Brasil apresentou-se na
época colonial como consequência da tuberculose, doença que na época era
tida como sem cura e que conduzia a um definhamento crescente até a morte.
Nos dias atuais, ainda há práticas eutanásias, só que não são divulgadas,
pois a nossa lei penal considera-a como crime.
12.1 Lei Mario Covas
Mario Covas faleceu em 6 de março de 2001 em um quarto de hospital pois
recusava-se a ir para uma UTI para ficar com os familiares. Ele tinha o
diagnostico de Adenocarcinoma de bexiga (doença relaciona ao tabagismo) e
estava numa condição clinica bastante deteriorada e sob efeitos de
medicações para dor que alteram a capacidade de raciocinar, mas antes disso,
em 1999, já sabendo de seu diagnostico e também do prognostico hominizo,
Covas sancionou a Lei dos Direitos dos Usuários dos Serviços de Saúde do
Estado de São Paulo ( Lei n° 10.241/99) que ficou conhecida como Lei Mario
Covas. Assim, assegurando para que a Ortotanásia
(ou Eutanásia passiva)
seja legal. Em seu texto :
Art 2 º - São direitos dos usuários dos serviços de saúde
no Estado de São Paulo:
XXIII - recusar tratamentos dolorosos ou extraordinários
para tentar prolongar a vida
XXIV - optar pelo local de morte.
42
Figura 13 - Mario Covas http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/3/34/M%C3%A1rio_Covas.jpg
12.2 O que a doutrina diz
Sendo a morte o que vem após o último suspiro de vida, espera-se que esta
seja de forma indolor, súbita, sem que traga sofrimento. Quando se considera a
situação do indivíduo nascer, crescer e vir a morrer não se imagina que
qualquer um possa passar por uma enfermidade incurável que o traga grande
sofrimento. Nesse prisma que se baseia este estudo, sabe-se que a prática da
eutanásia, apesar de não legalizada, é feita em muitos hospitais como exemplo
tem-se na denúncia feita pelo médico Roosevelt de Sá Kalume, então diretor
da Faculdade de Medicina de Taubaté São Paulo o qual ofereceu denúncia
contra os seus colegas de profissão, que formaram uma quadrilha para
acelerar a morte de pacientes com intuito de retirada e venda dos seus órgãos.
Perícia realizada pelo Conselho Regional de Medicina (CRM) constatou que as
vítimas não estavam em estado de morte cerebral ou encefálica.
Segundo
entendimento
do
jurista
Bruno
(1974),
considerando
o
consentimento do ofendido, este afirma: "realmente se a lei incrimina o auxílio
ao suicídio, com melhor razão punirá o matador, mesmo quando atua com o
consentimento da vítima‖.
43
Manifestando-se contra a eutanásia, Hungria (1955), prefaciando o livro ―O
direito de matar‖ de Evandro Correia de Menezes, afirma que o problema não
suscita discussões jurídicas, devendo ser tratado, exclusivamente, como tema
próprio dos estudos relativos à morbidez ou inferiorização do psiquismo, ou
seja, na órbita da psicologia anormal (HUNGRIA, 1955 apud MENEZES, 1977).
O jurista brasileiro Noronha (1994, p.143) manifestando-se contrário à
eutanásia, entende que não existe direito de matar, nem o de morrer, pois a
vida tem função social. A missão da ciência, segundo o doutor penalista, não é
exterminar, mas lutar contra o extermínio.
Favorável à eutanásia, Menezes (1977, p. 132) defende a isenção de pena
daquele que mata devido à piedade ou com consentimento afirmando: "não
nos basta o perdão judicial; queremos que a lei declare expressamente a
admissão da eutanásia, que não seria um crime, mas, pelo contrário, um dever
de humanidade‖.
Sergio Abdalla Semião, juiz e professor de Biodireito declara:
―Sou a favor da Eutanásia, em todas as suas modalidades. Porque eu acredito
que o Estado não tem direito algum de se meter na vida privada das pessoas.
A eutanásia é a coisa mais intima que o ser humano deve ter, é a sua vontade
de morrer com dignidade. Então o Estado não pode interferir. E quem não
quiser a Eutanásia, que não faça, que mora com a aparelhagem como na
Distanagem. Eu não gostaria de morrer na Distanásia, eu já operei e senti um
pouco da situação de um paciente em tal estado, é uma coisa horrível. Por isso
preferiria uma morte tranquila‖
Conforme Gonçalves (2007) em artigo publicado na revista âmbito jurídico, a
análise científica sobre o tema da eutanásia é de suma importância, não só
pela atualidade e polemicidade da questão, mas, para alertar as pessoas sobre
a necessidade de conhecerem seus verdadeiros contornos, a fim de que
possam aceitá-la ou não, ou mesmo para aceitá-la sob determinadas
condições. Sua pesquisa forneceu alguns contornos definitórios e abordou a
interação da eutanásia com os direitos da personalidade, com o direito à vida e
44
à dignidade, enfocou ainda, a questão da bioética e do biodireito, fornecendo
soluções para se conciliar os aspectos que geralmente são apontados como
obstáculos para a aceitação de sua prática. O estudo desenvolvido caminhou
pela aceitação da eutanásia, mediante determinadas condições. Todavia, teve
como objetivo demonstrar que, na verdade, o cerne da questão consiste em se
desvendar qual a interpretação dada ao valor da santidade ou da
inviolabilidade da vida humana para que, a partir daí, cada um possa refletir e
concluir pela sua admissibilidade ou não. A contribuição que a pesquisa
pretendeu fornecer foi o delineamento de alguns parâmetros sobre a eutanásia
e a chamada de consciência e de reflexão sobre este tema.
Junqueira (2007) questiona o fato dos próprios profissionais regularem uma
prática em sua profissão que nem está prevista na legislação brasileira.
Considerando o disposto no artigo 1°, III (dignidade da pessoa humana) e Art.
5°, III (não submeter ninguém a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante) da Constituição Federal, a resolução 1.805/2006 do Conselho
Federal de Medicina justifica o ato ilegal de deixar o paciente morrer. Considera
relevantes as garantias elencadas no parágrafo anterior, mas entende que
mesmo compreendendo a importância destas não se pode supervalorá estas
em detrimento da vida humana.
Em análise ao aborto sentimental, aquele que ocorre em uma gravidez
resultante de estupro, o CP prevê o direito da mãe em executá-lo, ceifando a
vida do feto, uma vez que entende que a dignidade da mãe prevalece sobre a
vida do feto.
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ação de gestante que desejava
interromper a gravidez de feto sem cérebro, tendo recebido o aval através de
liminar, porém, essa liminar recebeu uma arguição de descumprimento de
preceito fundamental (ADPF). Nesse impasse jurídico estavam apresentados
valores consagrados na Constituição Brasileira (1988) como a dignidade da
pessoa humana, da saúde, da liberdade, da autonomia da manifestação da
vontade e da legalidade. Após longa discussão e votação dos ministros do
45
STF, a decisão foi de revogar a liminar deferida, em sua segunda parte, que
reconhecia o direito da gestante submeter-se à operação terapêutica de parto
de fetos anencéfalos.
O artigo 1° caput da resolução 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina
a qual prevê que ―É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e
tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de
enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu
representante legal‖. No entendimento do autor do artigo quando a resolução
fala: ―respeitada à vontade da pessoa ou de seu representante legal‖ este quer
dizer que quando faltar autorização, e no caso do paciente não puder
expressar sua vontade e, na falta de representante legal, o médico poderá
decidir. O autor conclui o artigo considerando que a resolução em questão tem
eficácia quanto à responsabilidade ética do paciente, respaldando os
profissionais que efetivarem a prática de não sofrerem nenhuma penalidade
por parte do organismo profissional, porém, do ponto de vista cível e penal, o
autor entende que o médico responde pela prática da eutanásia. Entende ainda
que a resolução 1.805/2006 consiste no tipo penal do artigo 286 CP: ―Incitação
ao crime‖ (Brasil, 2007, p. 462).
Verifica-se que a doutrina divide-se entre aqueles que defendem a eutanásia
e os que abominam a mesma. Alguns autores justificam razões pessoais,
outras religiosas, e em sua grande maioria apelam para questões éticas,
sociais, morais e de dignidade da pessoa humana, porém o entendimento
majoritário tanto por parte da doutrina quanto da jurisdição é contrario a
eutanásia.
46
13. As consequências jurídicas da eutanásia
A eutanásia é enquadrada dentro do direito brasileiro como homicídio
privilegiado no artigo 121, parágrafo 1º, do Código Penal Brasileiro, isto é, um
tipo de homicídio em que a lei prevê uma redução da pena de um sexto a um
terço. Assim dispõe a lei "se o agente comete o crime impelido por motivo de
relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em
seguida a injusta provocação da vítima".
Logo se entende que a eutanásia na forma ativa no Brasil se caracteriza
crime enquanto que a passiva, o deixar morrer, não é enquadrada na
legislação brasileira.
Já as espécies de eutanásia selecionadora,aquela citada como projeto
nazista, é definida no Código Penal como homicídio qualificado, sem qualquer
piedade.
47
14. Projeto de Lei 125/96
De acordo com o art. 2°, eutanásia é permitida nos casos de morte cerebral,
desde que haja manifestação de vontade do paciente para tanto; seu § 1°,
dispõe que a manifestação de vontade deve ser expressa e feita como se fosse
uma manifestação de última vontade e o § 2° dispõe sobre a forma de
constatação da morte cerebral.
O art. 3° do projeto de lei aborda a eutanásia nos casos de morte cerebral
quando a autorização é dada expressamente pela família. O § 1° define quem
é considerado familiar para efeito da lei e o 2° levanta a hipótese do paciente
não ter familiares. Neste caso, a autorização será pedida ao juiz pelo médico
ou pessoa que mantenha alguma relação de afetividade com o paciente. O art.
4°, por sua vez, dispõe que nos casos do art. 3°, §2°, o juiz deverá ouvir o
Ministério Público e mandará publicar citação por edital para que dê ciência aos
possíveis familiares. O § único deste art. determina que a petição inicial venha
obrigatoriamente
acompanhada
das
conclusões
da
Junta
Médica.
Já o art. 7° permite a eutanásia por omissão. O § 1° dispõe sobre a avaliação
do estado do paciente por uma Junta Médica e exige o consentimento
expresso do paciente. Já § 2° aborda a forma pela qual deverá ser dado o
consentimento do paciente, que é a mesma prevista no § 1° do art. 2°. O art. 3°
permite que a família ou pessoa que mantém laços de afetividade com o
paciente requeira autorização judicial para a prática da eutanásia, mas só nos
casos de não haver consentimento prévio do paciente e este estar
impossibilitado de se manifestar.
Ainda há os artigos de 8 a 12 que seguem transcritos abaixo, como no
projeto de lei: art. 8° dispõe que, nos casos do art. 7°, §3°, se não houver
concordância de todos os familiares, deverá ser instaurado um processo
judicial por iniciativa de qualquer familiar. Art. 9° aborda a providência de
citação pessoal de todos os familiares do paciente no caso de ocorrer a
hipótese do art. 8. O § único do art. 9 ° dispõe que a petição inicial deve ser
instruída das conclusões da Junta Médica. Art. 10 e seus §s dispõem sobre a
48
oitiva do Ministério público e a formação da Junta Médica. Art. 11 expõe que
após todas as diligências o juiz deve proferir sentença, decidindo sobre a
manutenção da vida ou pela consecução da morte sem dor. Art. 12 dispõe que
da sentença cabe apelação e da decisão pela consecução da morte sem dor o
recurso
é
ex
officio
para
o
Tribunal
de
Justiça.
15. A eutanásia no Direito Comparado
Na legislação da Bolívia está introduzido em seu ordenamento jurídico no
artigo 257,o homicídio por meio da eutanásia impõe ao autor a reclusão de um
a três anos, sendo que nos casos de homicídios chamados com consentimento
do interessado, poderá ser concedido o perdão judicial, dispondo ainda de
atenuantes especiais.
Já a Colômbia regula o homicídio piedoso no artigo 326 de seu Código
Penal, onde quem matar outrem objetivando por fim a sofrimento intenso
proveniente de lesão corporal ou enfermidade grave ou incurável, incorrerá em
pena de prisão de seis meses a três anos de prisão, se diferenciando do código
penal boliviano quanto a não necessidade de manifestação do voluntário.
Em El Salvador, a eutanásia está compreendida no artigo 130, como forma
de homicídio piedoso, sendo por sua vez estabelecida à sanção de um a cinco
anos de prisão sempre que ocorra:
- Que a vítima se encontre em estado de desespero mediante sofrimento
conhecido publicamente e observado pelos médicos que assistam o paciente;
- Que o sujeito ativo esteja ligado por um vinculo familiar, ou seja, que a
pessoa que for praticar a eutanásia seja da família do paciente;
- Amizade íntima ou de amor com o enfermo e que o sujeito passivo
demonstre seu desejo de morrer por meio de manifestação externa de pedidos
reiterados e expressos.
49
O Código Penal do Paraguai, também regula expressamente a eutanásia.
O artigo 106 traz expresso: ―No caso do homicídio motivado por súplica da
vítima, o autor que cometeu o delito contra outrem que se encontre gravemente
enfermo, obedecendo a súplicas verdadeiras, reiteradas e insistentes da vítima,
será penalizado com pena privativa de liberdade de até três anos‖.
A legislação do Peru estabelece em seu artigo 212 que o homicídio
piedoso, onde por motivo de piedade mata-se um enfermo incurável que
solicita de maneira expressa e consciente como forma de por fim a uma dor
intolerável, receberá o autor do delito, pena privativa de liberdade não maior
que três anos (Peru, 1996).
Em 2002, a Bélgica se tornou o segundo país europeu depois dos Países
Baixos a promulgar uma lei sobre a eutanásia. Esta lei permite a eutanásia sob
condições estritas e a ser realizada apenas por médicos onde taxas de
mortalidade na Bélgica e na Holanda são baixas, variando de 0,30 a 1,20%,
para a Bélgica e de 1,70 para 2,59% para os Países Baixos.
50
16. Sobre o Código de Ética Médica
O atual Código de Ética Médica afirma em seu primeiro capítulo que o
guardará absoluto respeito pelo ser humano e atuará sempre em seu benefício.
Jamais utilizará seus conhecimentos para gerar sofrimento físico ou moral,
para o extermínio do ser humano, ou para permitir e acobertar tentativa contra
sua dignidade e integridade.
O documento ainda ressalta que é vedado ao médico no art. 56
desrespeitar o direito do paciente de decidir livremente sobre a execução de
práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso de iminente perigo de
vida; deixar de utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a
seu alcance em favor do paciente (art. 57) e abreviar a vida do paciente, ainda
que a pedido deste ou de seu representante legal (art.41), isto é praticar a
eutanásia, mesmo nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico
oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis, de acordo com o parágrafo
único.
No capítulo que trata sobre os Direitos Humanos é vedado ao médico pelo
art. 22 deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante
legal após esclarecê-lo, sob o procedimento a ser realizado, salvo em risco
iminente de morte.
51
17. Análise do Filme “Mar Adentro”
Mar Adentro é um filme dirigido por Alejandro Amenábar que conta a
historia verídica de Ramón Sampedro, um marinheiro que aos 20 anos já dava
volta ao mundo, e que aos 26 anos acabou ficando tetraplégico quando foi
mergulhar em águas rasas. Assim se condenando a uma vida numa cama
entre quatro paredes de seu quarto, onde a única vista é o mar, o mesmo mar
em que tanto viajou e que agora roubou o resto da sua vida.
O que mais lhe incomoda não é o fato de ter perdido sua vida antiga, é ter
que viver contra sua vontade paralisado em uma cama, mas o fato de
depender de sua família para todas suas necessidades. Quando lhe perguntam
por que quer morrer, Ramón diz:
―Bom, deixe-me ver, eu quero morrer porque a vida nesse estado, a vida
assim não é digna. Eu entendo que alguns tetraplégicos possam se sentir
ofendidos quando eu digo que viver assim não é digno, mas eu não estou
julgado ninguém, quem sou eu para julgar quem quer viver? É por isso peço
que ninguém me julgue, nem a pessoa que me prestar a ajuda necessária para
morrer. (...) Mas não é pra tanto, a morte sempre esteve conosco e sempre
estará pois é o fim de todos nos, e ela faz parte da vida, então por que ficar tão
escandalizado quando digo que quero morrer como se fosse algo contagioso?
(...) Aceitar a cadeira de rodas, seria aceitar migalhas da liberdade que já
tive...‖
Na metade do filme, Ramon recebe a visita de um padre tetraplégico que
questiona sua vontade de morrer, e assim se inicia um debate entre os dois por
meio de um ajudante do padre:
―Nossa vida pertence a Deus. É preciso pensar (...). E como nós estamos
dentro da eternidade à vida não nos pertence, então é claro, nos levamos ao
extremo ridículo a nossa noção burguesa de propriedade privada‖
52
E Ramon rebate dizendo que a igreja foi a primeira a sacramentar a
propriedade privada, e manda um recado para o padre ―Liberdade para
escolher minhas crenças, não as suas crenças, e decidir sobre sua vida‖. O
padre responde que seria um retrocesso e um desrespeito tremendo contra a
vida. Ramon se questiona o por que a Igreja mantém com tanta paixão essa
postura de terror pela morte, pois sabe que perderia grande parte de seus fiéis
se estes perdessem o medo. A partir dai, Ramon e o padre começam a falar
diretamente entre si, sem o ajudante.
―Não lhe parece muito demagogia a expressão ―morte com dignidade‖, por
que não deixa de eufemismo e diz e alto e bom som com toda a crueza, que
vai se matar?‖ diz o padre, e Ramon se defende ―Não deixa de surpreender
que mostre tanta sensibilidade perante minha vida, levando em conta que a
instituição que o senhor representa aceita hoje em dia nada menos que a pena
de morte, e durante anos condenou a forca
aqueles que não pensavam
corretamente‖
E a discussão se encera quando o Padre diz ―Uma liberdade que elimina a
vida, não é liberdade‖, mas Ramon rebate dizendo que ―E uma vida que elimina
a liberdade também não é‖.
Ramon depois de anos na espera na justiça resolve ir pessoalmente ao
tribunal, e lá seu advogado diz aos juízes ―Em um Estado que se declara Laico
e que reconhece o direito a propriedade privada, e cuja constituição protege
também o direito de não ser torturado, ou de não sofrer mal tratos, cabe
deduzir que alguém que se sinta em situação degradante como Ramon
Sampedro, possa dispor da sua vida. De fato, alguém que tente o suicídio e
sobreviva, nunca é processado depois, entretanto, se é preciso ajuda de outra
pessoa para morrer com dignidade, então o Estado interfere no direito das
pessoas, e diz que suas vidas não lhes pertence e que não podem dispor dela.
Isso só se poderia fazer, se baseando em crenças metafísicas, ou seja,
religiosas, em um Estado, repito, que se declara Laico‖ assim, o advogado
pede uma decisão jurídica, mas sobretudo racional e humana, e pede para seu
cliente poder falar diretamente com os juízes, mas esse pedido é negado. Ele
53
então critica a atitude do juiz de não dedicar 3 minutos para alguém que esta
esperando há 28 anos.
Quando seu pedido de Eutanásia foi novamente negado, Ramon não viu
outra escolha a não ser praticar o ato ilegalmente. Sozinho com uma câmera e
um copo contendo cianeto de potássio ao alcance se sua cabeça, Ramon disse
suas ultimas palavras:
―Caros Juízes, autoridades políticas e religiosas, o que a dignidade significa
para vocês? Seja qual for a resposta de suas consciências, saibam que para
mim isto não é viver dignamente. Eu queria amemos ter podido morrer
dignamente. Hoje cansado da inércia das instituições, me vejo obrigado a
fazer isso as escondidas, como um criminoso. Os senhores irão gostar de
saber que o processo que me conduzira a morte, foi escrupulosamente dividido
em pequenas ações, que não constituem crime por si mesmas, levadas a cabo
por diferentes mãos amigas. Se mesmo assim o Estado insistir em punir meus
colaboradores, eu sugiro que cortem suas mãos, pois essa foi toda sua
contribuição. A cabeça, quero dizer, a consciência, foi minha. Como podem ver,
ao meu lado tem um copo de água, contendo uma dose de cianeto de potássio.
Quando eu a beber, deixarei de existir, renunciando ao meu bem mais preciso,
ao meu corpo. Considero que , viver é um direito e não uma obrigação, como
tem sido no meu caso, obrigado a suportar esta terrível situação durante 28
anos, 4 meses e alguns dias. Passado esse tempo, avalio o caminho percorrido
e ele não foi lá muito feliz. Só o tempo que passou contra minha vontade,
durante quase toda a minha vida, a partir de agora será meu aliado, só o tempo
e a evolução das consciências decidirão algum dia se minha petição era
razoável ou não.‖
Há importância de se falar sobre esse filme, pois ele retrata um caso real.
Ramon além de ter uma longa espera por uma resposta no Judiciário, foi
forçado a ser eutanasiado de forma indevida pois escolheu morrer nem que
fosse de forma dolorosa.
54
Mar adentro não é o único filme que retrata a Eutanásia, os mais conhecidos
além de Mar Adentro são:
1- Uma Prova de Amor;
2- As Invasões Bárbaras;
3- Menina de Ouro;
4- Longe Dela;
5- Guzaarish.
Alem do tema ter discutido em filmes, eutanásia já foi abordado em novelas,
seriados e até mesmo em desenhos como Os Simpsons, Futurama e South
Park.
55
18. Holanda
Na Holanda a eutanásia é legalizada. Até a aprovação final da nova lei de
Eutanásia, os artigos do Código Penal continuaram tendo validade. A nova lei,
já aprovada na Câmara Baixa e no Senado holandês, torna a morte assistida
(eutanásia ou suicídio assistido) um procedimento legalizado nos Países
Baixos, alterando os artigos 293 e 294 da lei criminal holandesa. A legalização
foi aprovada em 10 de abril de 2001, entrando em vigor em abril de 2002.
Em 1990, foram feitas 9000 solicitações de Eutanásia Ativa, mas apenas
2300 foram atendidas. Consequentemente, esses 6700 pacientes que não
tiveram sua solicitação atendida tiveram que se submeter a outros
procedimentos, igual a Ramon Sampedro.
A Eutanásia vem sendo debatida na Holanda desde a década de 1970.
Inúmeras situações ocorridas com pacientes e seus médicos geraram
questionamentos quanto aos seus aspectos morais e legais. Elas começaram
em 1973, com o caso Postma.
Desde 1990 o Ministério da Justiça e a Real Associação Médica Holandesa
(RDMA) concordaram em um procedimento de notificação de eutanásia. Desta
forma, o médico fica imune de ser acusado, apesar de ter realizado um ato
ilegal.
A Lei Funeral (Burial Act) de 1993 incorporou os 5 critérios para eutanásia e os
3 elementos de notificação do procedimento. Isto tornou a eutanásia um
procedimento aceito, porém não legal. Estas condições eximem o médico da
acusação de homicídio.
Os cinco critérios, propostos em 1973, durante o julgamento do caso Postma, e
estabelecidos pela Corte de Rotterdam, em 1981, para a ajuda à morte não
penalizável, por um médico, são os seguintes:
56
1) A solicitação para morrer deve ser uma decisão voluntária feita por um
paciente informado;
2) A solicitação deve ser bem considerada por uma pessoa que tenha uma
compreensão clara e correta de sua condição e de outras possibilidades. A
pessoa deve ser capaz de ponderar estas opções, e deve ter feito tal
ponderação;
3) O desejo de morrer deve ter alguma duração;
4) Deve haver sofrimento físico ou mental que seja inaceitável ou insuportável;
5) A consultoria com um colega é obrigatória.
O acordo entre o Ministério da Justiça e a Real Associação Médica da Holanda,
estabelece 3 elementos para notificação:
1) O médico que realizar a eutanásia ou suicídio assistido não deve dar um
atestado de óbito por morte natural. Ele deve informar a autoridade médica
local utilizando um extenso questionário ;
2) A autoridade médica local relatará a morte ao promotor do distrito;
3) O promotor do distrito decidirá se haverá ou não acusação contra o médico.
Se o médico seguir as 5 recomendações o promotor não fará a acusação.
Em um estudo publicado em fevereiro de 2000, foi apresentado um
levantamento 649 casos de eutanásia e de suicídio assistido. Muitas
solicitações de suicídio assistido acabaram tornando-se eutanásia pela
necessidade do médico intervir diretamente na administração da droga em
dose letal, devido a inabilidade dos pacientes em executar o procedimento ou
intervalo de tempo muito longo entre a administração do medicamento e a
morte. Em 3% dos casos de eutanásia e em 6% dos casos de suicídio assistido
ocorreram complicações com os pacientes antes de sua morte.
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A nova lei, aprovada com 104 votos favoráveis e 40 contrários, em 28 de
novembro de 2000, incorpora algumas novas questões, tais como a
possibilidade de realizar este tipo de procedimento em menores de idade, a
partir dos 12 anos. Dos 12 aos 16 anos a solicitação do paciente deve ser
acompanhada pela autorização dos pais. Além dos critérios, já previamente em
vigor, mais um foi incluído, o que estabelece que o término da vida deva ser
feito de uma maneira medicamente apropriada. Em 11 de abril de 2001 o
senado aprovou esta mesma lei. Houve protestos populares contra esta
medida, apesar de haver uma maioria expressiva da população ter se
manifestado favoravelmente a este respeito em pesquisas de opinião pública.
Os novos critérios legais estabelecem que a eutanásia só pode ser realizada:
1. Quando o paciente tiver uma doença incurável e estiver com
dores insuportáveis.
2. O paciente deve ter pedido, voluntariamente, para morrer.
3. Depois que um segundo médico tiver emitido sua opinião sobre
o caso.
58
19. Dignidade
Para se chegar ao paradigma da dignidade da vida, acredita-se necessário
proceder uma breve abordagem histórica sobre o direito do indivíduo ao próprio
corpo. E é nas disposição inseridas na Lei das XII Tábuas – de importância
histórica indiscutível – que se pode encontrar as disposições mais antigas
acerca do tratamento dispensado ao ser humano.
Àquela época, aproximadamente em 462 a.C., o valor do indivíduo era
reconhecido pelos créditos que possuía, além do poder de que dispunha, e a
comprovação de tal assertiva está em algumas disposições da lei
supramencionada que, a par de outros dispositivos, permitia a morte e o
acorrentamento de seres humanos, ao claro objetivo de que fosse feita justiça,
nas situações em que devedores não cumprissem o compromisso de saldar
suas dívidas.
Ultrapassadas essas fases, manifestou-se a prevalência do indivíduo,
entrevista desde a Revolução Francesa, com o interregno socialista, de
submissão ao interesse comum e agora se volta à origem individualista, com
enfoque de solidariedade. No Brasil, somente a Constituição Federal de 1988
expressa, através do
artigo 5º e incisos, no sentido de garantir o direito á vida a qualquer pessoa
individual, tratando da questão em capítulo próprio (Dos Direitos e Garantias
Fundamentais)
Vida, no nosso texto constitucional, ―não será considerada apenas no seu
sentido biológico de incessante auto-atividade funcional, peculiar à matéria
orgânica, mas na sua acepção biográfica mais compreensiva. Sua riqueza
significativa é de difícil apreensão porque é algo dinâmico, que se transforma
incessantemente sem perder sua própria identidade. É mais um processo
(processo vital), que se instaura com a concepção (ou germinação vegetal),
transforma-se, progride, mantendo sua identidade, até que muda de qualidade,
deixando, então, de ser vida para ser morte‖.
As novas questões suscitadas nesse limiar de século XXI referentes aos
seres humanos são, entre outras: Independentemente de sua qualidade, a vida
59
humana deve ser sempre preservada? Há de serem empregados todos os
recursos biotecnológicos para prolongar um pouco mais a vida de um paciente
terminal? Há de serem utilizados processos terapêuticos cujos efeitos são mais
nocivos do que os efeitos do mal a curar? É lícito sedar a dor se de tal ato a
consequência será o encurtamento da vida? O que fazer com os nascituros
portadores de doenças congênitas do sistema nervoso central, cujas vidas, se
mantidas
obstinadamente,
significarão
a
condenação
ao
sofrimento
permanente ou a estado vegetativo de vida?
Tem-se que não se pode privilegiar apenas a dimensão biológica da vida
humana, negligenciando a qualidade de vida do indivíduo. A obstinação em
prolongar o mais possível o funcionamento do organismo de pacientes
terminais não deve mais encontrar guarida no Estado Democrático de Direito,
simplesmente porque o preço dessa obstinação é uma gama indizível de
sofrimentos gratuitos, seja para o enfermo, seja para os familiares deste. O ser
humano tem outras dimensões que não somente a biológica, de forma a aceitar
o critério da qualidade de vida significa estar a serviço não só da vida, mas
também da pessoa. O prolongamento da vida somente pode ser justificado se
oferecer às pessoas algum benefício, ainda assim, se esse benefício não ferir a
dignidade do viver e do morrer.
A liberdade e a dignidade são valores intrínsecos à vida, de modo que essa
última não deve ser considerada bem supremo e absoluto, acima dos dois
primeiros valores, sob pena de o amor natural pela vida se transformar em
idolatria. E a consequência do culto idólatra à vida é a luta, a todo custo, contra
a morte.
Entende-se que a vida deva ser encarada no seu ocaso, para que seja
devolvida a dignidade perdida. São muitos os doentes que se encontram
jogados em hospitais, a um sofrimento em perspectiva, muitos em terapias
intensivas e em emergências. O desdobramento disso? Uma parafernália
tecnológica que os prolonga e os acrescenta. Inutilmente.
60
20. Conclusão
Em último caso, é importante ressaltar duas informações, sendo essas:
Quanto custa não ter a Eutanásia legalizada, a Eutanásia Voluntária:
―Se a Eutanásia fosse legalizada no Brasil, teríamos uma economia de por
volta de Bilhão de reais. Com esse dinheiro seria possível abrir uma nova rede
Sarah de Hospitais e ainda sobram mais de 250 milhões de reais. A não
legalização implica no investimento de mais ou menos 1 Bilhão de reais em
questão de SUS em pessoas que optariam em não estar nessas condições,
numa estimativa de 30 mil pessoas são mantidas em sofrimento extremo junto
com seus familiares que padecem prestando assistência para esses pacientes
em sofrimento extremo e terminal.
Há medicamentos para o tratamento de câncer que são extremamente caros
cuja ampola custa cerca de 1500 reais.Outros, cuja cartela, com 20
comprimidos, custa 20 mil reais, sendo que o sujeito tem que tomar um
comprimido por dia. Alguns médicos de UTI, afirmam que o custo diário de uma
variam muito, podendo chegar ate 10 mil reais. De modo geral, os
medicamentos mais caros são os utilizados no tratamento do câncer.
No site do Ministério do planejamento vemos no orçamento federal para 2013
que R$ 87,7 Bilhões foram para a área da saúde e R$ 743 milhões para Rede
Sarah de Hospitais de Reabilitação.
― Em 2011 o governo com o tratamento de câncer no SUS despendeu cerca
de R$2,2 bilhões de reais‖ Paulo Moreira Leite- Revista Época
O tratamento mais baixo de câncer custa 30 mil, visto que muitas pessoas
que solicitam eutanásia são devido à câncer, isso é muito importante.
Levando em conta que há uma grande defasagem de órgãos no Brasil, ou
seja, há muitas pessoas precisando e poucas doando, a eutanásia seria uma
solução, pois as pessoas que optarem pela eutanásia poderia logo em seguida
doar seus órgãos para quem gostaria de viver seria morrer com dignidade e dar
61
a mesma para que outra pessoa tivesse a chance de viver, ambos os lados
ganhariam.
Tendo em vista as informações acima, nota-se que a eutanásia seria um
benefício para o sistema de saúde brasileiro, pois ajudaria a aumentar o
número de doadores de órgão e diminuíram gastos desnecessários, pois os
custos com pessoas que não tem possuem mais o desejo de viver são
demasiado altos.
Podemos levar em conta também, a decisão do Supremo Tribunal Federal
sobre o aborto de anencéfalo, considerando que o aborto de um feto sem
cérebro não constitui crime.
"Um bebê anencéfalo é geralmente cego, surdo, inconsciente e incapaz de sentir
dor. Apesar de que alguns indivíduos com anencefalia possam viver por minutos, a
falta de um cérebro descarta complementa mente qualquer possibilidade de haver
consciência. [...] Impedir a interrupção da gravidez sob ameaça penal equivale à
tortura‖ - Luiz Fux.
O STF entendeu que esse feto não teria uma vida, pois logo iria morrer, e essa
condição pode ser comparada em muitos casos de pacientes que querem a
eutanásia. Como por exemplo os pacientes em estado vegetativo, mas que são
mantidos vivos artificialmente.
De acordo com Janaina Penalva, especialista em Bioética:
―Numa sociedade Democrática, é preciso respeitar as decisões individuais
quando elas não trazem prejuízos nem violam direito alheios, pois trata-se de
uma decisão unicamente individual com impacto individual que os sujeitos
capazes decidem.‖
Logo, entende-se que a eutanásia tanto socialmente quanto financeiramente
e politicamente falando seria apenas um benefício, tanto para o paciente
quanto para com a sociedade, e não há sentido em jogar todas essas
oportunidades fora por argumentos de cunho religioso visto que está claro que
estamos em um estado laico e quem comanda nossas vidas somos nós
62
mesmos, não importa sua religião. Se nós não somos donos de nossos
próprios corpos e de nossas próprias vidas, do que seríamos donos?
Concluindo, estendemos que a espécie de eutanásia mais adequada é a
eutanásia ativa, ou o suicídio assistido. Mas temos os casos de pacientes que
não podem expressar sua vontade, nesses casos teria que ser adotado o
Testamento Vital, onde o paciente por meio desse documento deixa expressas
suas vontades.
Entendemos que apesar da Constituição Federal proteger a Vida, nada vale a
vida se ela não for vivida da melhor forma para o individuo, portanto, há a
necessidade de ser regulamentado o assunto no Brasil, apesar de já ter havido
muitas tentativas, todas foram mal sucedidas ou interrompidas por conta das
questões polemicas que o assunto envolve.
63
21. Bibliografia
<http://os4elementos.no.comunidades.net/index.php?pagina=1641186785_01 >
<http://os4elementos.no.comunidades.net/index.php?pagina=1641186785_02 >
<http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u82109.shtml >
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Eluana_Englaro>
<http://www.jusbrasil.com.br/topicos/297813/eutanasia>
<http://www.conjur.com.br/2009-dez-21/eutanasia-direito-vida-tutela-penal-luz-
constituicao>
<http://joseauache.jusbrasil.com.br/politica/111843232/premio-nobel-da-
medicina-morre-apos-eutanasia-aos-95-anos?ref=home>
<http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/04/supremo-decide-por-8-2-que-abortode-feto-sem-cerebro-nao-e-crime.html>
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Jack_Kevorkian>
<http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/artigos/53894/eutanasia+aspectos+j
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<http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/dh/volume%20i/sa
udelei10241.htm>
<http://scienceblogs.com.br/eccemedicus/2009/07/os_10_anos_da_lei_mario_c
ovas/>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/eugenia.htm>
<http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/42016/quais-as-diferencas-entre-eutanasia-
morte-assistida-ortotanasia-e-sedacao-paliativa-patricia-donati-de-almeida>
<http://www.brasilescola.com/sociologia/eutanasia.htm>
64
<http://www.bioetica.ufrgs.br/euthist.htm>
<http://www.ambito-
juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8765>
<http://eutanasia11a.wordpress.com/argumentos-a-favorcontra/>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/casoeubr.htm>
<http://eutanasiaedistanasia.blogspot.com.br/2006/02/argumentos-contra-
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<http://www.bioetica.ufrgs.br/casoeurj.htm>
<http://anoticia.clicrbs.com.br/sc/noticia/2009/02/confira-alguns-argumentos-
contra-e-a-favor-da-eutanasia-2392119.html>
<http://proecclesiacatholica.files.wordpress.com/2014/02/52.jpg>
<http://www.publico.pt/mundo/noticia/belgica-vota-para-alargar-direito-a-
eutanasia-aos-menores-de-idade-1623439>
<http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfa
ith_doc_19800505_euthanasia_po.html>
<http://arquidiocesedecampogrande.org.br/arq/images/stories/news_brasil_ms/
eutanasia.jpg>
<http://noticias.terra.com.br/mundo/europa/eutanasia-entidade-ajudou-459pessoas-a-morrer-em2013,2713cc1628115410VgnCLD2000000ec6eb0aRCRD.html>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/textos.htm#eutanasia>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/morte.htm>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/modo.htm>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/welby.htm>
<http://www.portugues.rfi.fr/geral/20110819-polemica-sobre-eutanasia-voltafranca>
65
<http://www.bioetica.ufrgs.br/nancy.htm>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/eutmorho.htm>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/eutanhol.htm#crit%C3%A9rios>
<https://www.youtube.com/watch?v=n5QU5J3fnU8>
<http://vimeo.com/92665643>
<http://conceito.de/dignidade>
<http://www.dicio.com.br/dignidade/>
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Princ%C3%ADpio_da_dignidade_da_pessoa_huma
na>
<https://www.youtube.com/watch?v=n5QU5J3fnU8>
<http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Arquivos/sof/orcamento_1
3/OFAT_2013.pdf>
<http://portaldocoracao.uol.com.br/pare-de-fumar/pesquisa-estima-os-custoscom-o-tratamento-do-cancer-em-fumantes>
<http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI2680509-EI8142,00Eutanasia+me+recuso+a+aceitar+meu+estado+diz+mulher.html>
<http://www.bioetica.ufrgs.br/eutanasi.htm>
<http://veja.abril.com.br/300305/p_096.html>
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=5225>
66
Anexo 1.
Bélgica vota para alargar direito à
eutanásia aos menores de idade
RITA SIZA (HTTP://WWW.PUBLICO.PT/AUTOR/RITA-SIZA) 12/02/2014 - 18:07 - Uma larga maioria
de 75% dos belgas apoia a emenda à lei.
A Câmara de Representantes da Bélgica prepara-se
para aprovar uma proposta de emenda legislativa
para levantar as restrições etárias à prática da
eutanásia, e assim estender aos menores de idade
com doenças terminais e em “sofrimento físico
insuportável” o direito a solicitar o fim da vida.
A iniciativa legislativa provocou um intenso debate no
país, com os partidos, a Igreja Católica, profissionais
da saúde, organizações e associações de pais, juristas e
editorialistas a intervir. As sondagens demonstram
que a larga maioria dos belgas aprova a legalização da
eutanásia para as crianças e adolescentes, mediante
certas salvaguardas: 75% manifestaram-se a favor da
aprovação do projecto de lei, que já foi votado em
Dezembro no Senado e aprovado com 50 votos a
(http://imagens3.publico.pt/imagens.aspx/825073?tp=UH&db=IMAGE
NS)
Manifestação contra o alargamento da eutanásia a menores de idade
LAURENT DUBRULE
/REUTERS
favor, 17 contra e quatro abstenções. Mesmo assim,
uma forte oposição organizou-se no país para tentar
evitar que a lei fosse alterada.
“Estaremos a abrir uma porta que depois ninguém
poderá voltar a fechar”, alertou o arcebispo de
Bruxelas e presidente da Conferência Episcopal da
Bélgica, André-Joseph Léonard, em declarações à
Associated Press. “Os riscos são demasiado graves em
termos das consequências para a sociedade a longo
prazo. Temos de reflectir sobre o significado que
atribuímos à vida, à morte e à liberdade dos seres
humanos”, considerou, uma posição que mereceu o
eco dos dirigentes religiosos muçulmanos e judeus do
país.
Uma lei contra o sofrimento
O autor da proposta de emenda legislativa, o senador
socialista Philippe Mahoux, reconhece que existe um
aspecto “chocante” na matéria em análise, mas
argumenta que “é a doença e a morte de crianças que
é escandalosa, não a lei da eutanásia”. Para o senador,
a distinção entre o “sofrimento insuportável” de
crianças e adultos é injusta: “O conceito fundamental
[da lei] é o sofrimento, e o que a legislação propõe e
oferece é uma resposta humanista para os casos
extremos em que a dor é insuportável”.
A lei da eutanásia da Bélgica, que remonta a 2002,
restringe essa prática aos maiores de idade,
precisando que, no caso dos doentes com menos de 18
anos, a única opção é “deixar a natureza seguir o seu
caminho”. A emenda proposta acaba com as
limitações etárias, e reforça alguns dos
condicionalismos para que o pedido para o fim da vida
possa ser considerado. Concretamente, a lei
estabelece que só é possível nos casos de doença
terminal, depois de terem sido tentados todos os
tratamentos médicos disponíveis, quando o paciente
se encontra na fase final da doença, em sofrimento
físico insuportável e para o qual já não exista uma
terapêutica capaz de aliviar a dor.
No caso dos menores de idade, além do consentimento
parental e do acordo da equipa médica responsável
pelo tratamento, será exigido um atestado que
comprove que o doente está consciente, tem
capacidade de discernimento e é capaz de formular
autonomamente a sua decisão. Também será
obrigatória uma sessão de aconselhamento com um
68
médico antes do início do processo.
Uma carta aberta, assinada por 160 pediatras, foi
posta a circular na véspera do debate na câmara baixa
do Parlamento – onde decorreram vigílias e outras
manifestações contra a autorização da eutanásia de
crianças – com um pedido para que a votação fosse
adiada. Os médicos dizem que a evolução da ciência
moderna já permite responder de forma compassiva
ao sofrimento de crianças com doenças terminais,
disponibilizando várias soluções para “atenuar a dor”,
nomeadamente a sedação paliativa. E sublinham que
não existe consenso quanto à objectividade dos
diagnósticos relativos à capacidade de discernimento
das crianças e à sua compreensão do conceito da
eutanásia, pelo que a possibilidade de que sejam
influenciadas não pode ser excluída.
Derradeira possibilidade
Em Dezembro, um outro colectivo de médicos
pediatras tinha subscrito uma petição entregue aos
legisladores, apelando à aprovação da lei (que tinha já
sido avaliada pelo Comité de Justiça e Assuntos
Sociais do Parlamento). “Porquê privar os menores
desta derradeira possibilidade? A experiência
demonstra que, nos casos de doenças terminais e
morte iminente, os menores desenvolvem
rapidamente uma grande maturidade, a ponto de
serem capazes de reflectir e expressar as suas
escolhas e decisões de forma mais capaz do que
adultos saudáveis”, dizia o documento.
69
Anexo 2.
DECLARAÇÃO SOBRE A EUTANÁSIA
INTRODUÇÃO
Os direitos e valores inerentes à pessoa humana têm um lugar importante na
problemática contemporânea. A este propósito, o II Concílio Ecuménico do
Vaticano reafirmou solenemente a eminente dignidade da pessoa humana e
muito particularmente o seu direito à vida. Por isso, denunciou os crimes contra
a vida, como são « toda a espécie de homicídio, o genocídio, o aborto, a
eutanásia e o próprio suicídio voluntário » (Const. Past. Gaudium et Spes, n.
27).
Recentemente a Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé chamou a
atenção para a doutrina católica sobre o aborto provocado. Agora, a mesma
Sagrada Congregação julga oportuno apresentar a doutrina da Igreja sobre o
problema da eutanásia.
Com efeito, embora neste campo continuem sempre válidos os princípios
afirmados pelos últimos Sumos Pontífices, os progressos da medicina fizeram
aparecer nestes anos mais recentes novos aspectos do problema da eutanásia
que reclamam ulteriores esclarecimentos precisos no plano ético.
Na sociedade hodierna, onde mesmo os valores fundamentais da vida humana
frequentemente são postos em causa, a modificação da cultura influi no modo
de considerar o sofrimento e a morte; a medicina aumentou a sua capacidade
de curar e de prolongar a vida em condições que, por vezes, levantam
problemas de carácter moral. Assim, os homens que vivem num tal clima
interrogam-se com angústia sobre o significado da velhice extrema e da morte.
E chegam mesmo a perguntar a si mesmos se não terão o direito de procurar,
70
para si e os seus semelhantes, uma « morte suave » que lhes abrevie os
sofrimentos e seja, a seus olhos, mais conforme com a dignidade humana.
Diversas Conferências Episcopais puseram a esta Sagrada Congregação para
a Doutrina da Fé quesitos a este respeito. Depois de consultar peritos sobre os
diversos aspectos da eutanásia, a Congregação intenta com a presente
Declaração responder aos Bispos, para os ajudar a orientar rectamente os fiéis
e oferecer-lhes elementos de reflexão que possam apresentar às autoridades
civis a propósito deste gravíssimo problema.
A matéria proposta neste documento diz respeito, antes de mais, àqueles que
põem a sua fé e a sua esperança em Cristo que, pela sua vida, morte e
ressurreição, deu um sentido novo à existência e especialmente à morte dos
cristãos, segundo as palavras de S. Paulo: « Se vivemos, vivemos para o
Senhor e, se morremos, morremos para o Senhor. Portanto, na vida e na
morte, pertencemos ao Senhor » (Rm 14, 8; cf. Flp. 1, 20).
Quanto aos que professam outras religiões, são muitos os que admitirão como
nós que a crença — se na verdade a compartilham — num Deus Criador,
Providente e Senhor da vida, dá uma dignidade eminente a toda a pessoa
humana e lhe garante o respeito.
E espera-se também que a presente Declaração possa encontrar o consenso
de tantos homens de boa vontade que, para além das diferenças filosóficas e
ideológicas, possuem uma viva consciência dos direitos da pessoa humana.
Estes direitos foram, aliás, muitas vezes proclamados, no decurso dos últimos
anos, em declarações de Entidades Internacionais; [3] e porque se trata aqui
de direitos fundamentais de toda a pessoa humana, é evidente que não se
pode recorrer a argumentos tirados do pluralismo político ou da liberdade
religiosa, para lhes negar o valor universal.
I. VALOR DA VIDA HUMANA
A vida humana é o fundamento de todos os bens, a fonte e a condição
necessária de toda a actividade humana e de toda a convivência social. Se a
71
maior parte dos homens considera que a vida tem um carácter sagrado e
admite que ninguém pode dispor dela a seu bel-prazer os crentes vêem nela
também um dom do amor de Deus, que eles têm a responsabilidade de
conservar e fazer frutificar. Desta última consideração se derivam as seguintes
consequências:
1. ninguém pode atentar contra a vida de um homem inocente, sem com isso
se opor ao amor de Deus para com ele, sem violar um direito fundamental que
não se pode perder nem alienar, sem cometer um crime de extrema
gravidade.[4]
2. todos os homens têm o dever de conformar a sua vida com a vontade do
Criador. A vida é-lhes confiada como um bem que devem fazer frutificar já
neste mundo, mas só encontrará perfeição plena na vida eterna.
3. a morte voluntária ou suicídio, portanto, é tão inaceitável como o homicídio:
porque tal acto da parte do homem constitui uma recusa da soberania de Deus
e do seu desígnio de amor. Além disto, o suicídio é, muitas vezes, rejeição do
amor para consigo mesmo, negação da aspiração natural à vida, abdicação
frente às obrigações de justiça e caridade para com o próximo, para com as
várias comunidades e para com todo o corpo social — se bem que por vezes,
como se sabe, intervenham condições psicológicas que podem atenuar ou
mesmo suprimir por completo a responsabilidade.
É preciso no entanto distinguir bem entre suicídio e aquele sacrifício pelo qual,
por uma causa superior — como, a honra de Deus, a salvação das almas ou o
serviço dos irmãos — alguém dá ou expõe a própria vida (cf. Jo. 15, 14).
II.
A EUTANÁSIA
Para tratar de modo adequado o problema da eutanásia, convém antes de
mais, precisar o vocabulário.
72
Etimologicamente, a palavra eutanásia significava, na antiguidade, uma morte
suave sem sofrimentos atrozes. Hoje já não se pensa tanto no significado
originário do termo; mas pensa-se sobretudo na intervenção da medicina para
atenuar as dores da doença ou da agonia, por vezes, mesmo com risco de
suprimir a vida prematuramente. Acontece ainda que, o termo está a ser
utilizado num sentido mais particular, com o significado de « dar a morte por
compaixão », para eliminar radicalmente os sofrimentos extremos, ou evitar às
crianças anormais, aos incuráveis ou doentes mentais, o prolongamento de
uma vida penosa, talvez por muitos anos, que poderia vir a trazer encargos
demasiado pesados para as famílias ou para a sociedade.
É necessário, portanto, dizer claramente em que sentido se usa este termo no
presente documento.
Por eutanásia, entendemos uma acção ou omissão que, por sua natureza ou
nas intenções, provoca a morte a fim de eliminar toda a dor. A eutanásia situase, portanto, ao nível das intenções e ao nível dos métodos empregados
Ora, é necessário declarar uma vez mais, com toda a firmeza, que nada ou
ninguém pode autorizar a que se dê a morte a um ser humano inocente seja
ele feto ou embrião, criança ou adulto, velho, doente incurável ou agonizante. E
também a ninguém é permitido requerer este gesto homicida para si ou para
um outro confiado à sua responsabilidade, nem sequer consenti-lo explícita ou
implicitamente. Não há autoridade alguma que o possa legitimamente impor ou
permitir. Trata-se, com efeito, de uma violação da lei divina, de uma ofensa à
dignidade da pessoa humana, de um crime contra a vida e de um atentado
contra a humanidade.
Pode acontecer que dores prolongadas e insuportáveis, razões de ordem
afectiva ou vários outros motivos, levem alguém a julgar que pode
legitimamente pedir a morte para si ou dá-la a outros. Embora em tais casos a
responsabilidade possa ficar atenuada ou até não existir, o erro de juízo da
consciência — mesmo de boa fé — não modifica a natureza deste gesto
homicida que, em si, permanece sempre inaceitável. As súplicas dos doentes
73
muito graves que, por vezes, pedem a morte, não devem ser compreendidas
como expressão duma verdadeira vontade de eutanásia; nestes casos são
quase sempre pedidos angustiados de ajuda e de afecto. Para além dos
cuidados médicos, aquilo de que o doente tem necessidade é de amor, de
calor humano e sobrenatural, que podem e devem dar-lhe todos os que o
rodeiam, pais e filhos, médicos e enfermeiros.
III.
O
CRISTÃO
PERANTE
O
SOFRIMENTO
E O USO DOS MEDICAMENTOS ANALGÉSICOS
A morte não se dá sempre em condições dramáticas e depois de sofrimentos
insuportáveis. Nem se deve pensar unicamente nos casos extremos. Existem
numerosos e concordes testemunhos que permitem pensar que a própria
natureza está ordenada de tal modo que facilita, no momento da morte,
separações que seriam terrivelmente dolorosas para um homem em plena
saúde. Assim uma doença prolongada, uma velhice avançada, uma situação
de solidão e abandono, podem criar condições psicológicas que tornam mais
fácil a aceitação da morte.
No entanto, deve reconhecer-se que a morte, muitas vezes precedida ou
acompanhada de sofrimentos atrozes e de duração desgastante, será sempre
um acontecimento natural angustiante para o coração do homem.
A dor física é certamente um elemento inevitável da condição humana; no
plano biológico, é como que uma advertência de utilidade incontestável; mas
repercutindo-se também na vida psicológica do homem, muitas vezes torna-se
desproporcionada à sua utilidade biológica, e pode assumir dimensões tais que
gerem o desejo de eliminar a mesma dor, custe o que custar.
Segundo a doutrina cristã, a dor, sobretudo nos últimos momentos da vida,
assume um significado particular no plano salvífico de Deus; é, com efeito, uma
participação na Paixão de Cristo e união com o sacrifício redentor que Ele
ofereceu em obediência à vontade do Pai. Por isso, não deve surpreender que
alguns cristãos desejem moderar o uso dos medicamentos analgésicos, para
74
aceitar voluntariamente, ao menos uma parte dos seus sofrimentos e se
associar assim com plena consciência aos sofrimentos de Cristo crucificado
(cf. Mt. 27, 34). Não seria conforme à prudência, porém, impor como norma
geral uma atitude heróica. Pelo contrário, a prudência humana e cristã
aconselhará para a maior parte dos doentes o uso dos medicamentos capazes
de suavizar ou suprimir a dor, mesmo que surjam efeitos secundários, como
torpor ou menor lucidez. Quanto àqueles que não podem exprimir-se, poder-seá razoavelmente presumir que desejem receber estes calmantes e administrarlhos de acordo com o conselho do médico.
Entretanto o uso intensivo de medicamentos analgésicos não está isento de
dificuldades, porque o fenómeno da habituação obriga geralmente a aumentar
a dose para lhes assegurar a eficácia. Convém recordar aqui uma declaração
de Pio XII que conserva ainda todo o seu valor. A um grupo de médicos que lhe
tinha feito a pergunta se « a supressão da dor e da consciência por meio de
narcóticos (...) é permitida pela religião e pela moral ao médico e ao paciente
(mesmo ao aproximar-se a morte e se se prevê que o uso dos narcóticos lhes
abreviará a vida », o Papa respondeu: « se não existem outros meios e se,
naquelas circunstâncias, isso em nada impede o cumprimento de outros
deveres religiosos e morais, sim ».[5] Neste caso, é claro que a morte não é de
nenhum modo querida ou procurada, embora, por um motivo razoável, se corra
o risco de morrer; a intenção é simplesmente acalmar eficazmente a dor,
usando para isso os medicamentos analgésicos de que a medicina dispõe.
Contudo, os medicamentos analgésicos que produzem nos doentes a perda da
consciência, merecem uma particular atenção. Com efeito, é muito importante
que os homens possam satisfazer não só os seus deveres morais e as suas
obrigações familiares, mas também e, acima de tudo, preparar-se com plena
consciência para o encontro com Cristo. Por isso, Pio XII adverte que « não é
lícito privar o moribundo da consciência, se não há um motivo grave ».[6]
IV.
O
USO
PROPORCIONADO
DOS MEIOS TERAPÊUTICOS
75
Hoje é muito importante proteger, no momento da morte, a dignidade da
pessoa humana e a concepção cristã da vida contra um « tecnicismo » que
corre o perigo de se tornar abusivo. De facto, há quem fale de « direito à morte
», expressão que não designa o direito de se dar ou mandar provocar a morte
como se quiser, mas o direito de morrer com toda a serenidade, na dignidade
humana e cristã. Sob este ponto de vista, o uso dos meios terapêuticos pode,
às vezes, levantar alguns problemas.
Em muitos casos a complexidade das situações pode ser tal que faça surgir
dúvidas sobre o modo de aplicar os princípios da moral. As decisões
pertencerão, em última análise, à consciência do doente ou das pessoas
qualificadas para falar em nome dele, como também aos médicos, à luz das
obrigações morais e dos diferentes aspectos do caso.
É dever de cada um cuidar da sua saúde ou fazer-se curar. Aqueles que têm o
cuidado dos doentes devem fazê-lo conscienciosamente e administrar-lhes os
remédios que se julgarem necessários ou úteis.
Ma será preciso, em todas as circunstâncias, recorrer a todos os meios
possíveis? Até agora, os moralistas respondiam que nunca se era obrigado a
usar meios « extraordinários ». Esta resposta, que continua a ser válida em
princípio, pode talvez parecer hoje menos clara, já pela imprecisão do termo, já
pela rápida evolução da terapêutica. Por isso, há quem prefira falar de meios «
proporcionados » e « não proporcionados ». De qualquer forma, poder-se-á
ponderar bem os meios pondo o tipo de terapêutica a usar, o grau de
dificuldade e de risco, o custo e as possibilidades de aplicação, em confronto
com o resultado que se pode esperar, atendendo ao estado do doente e às
suas forças físicas e morais.
Para facilitar a aplicação destes princípios gerais podemos dar os seguintes
esclarecimentos precisos:
— Se não há outros remédios, é lícito com o acordo do doente, recorrer aos
meios de que dispõe a medicina mais avançada, mesmo que eles estejam
ainda em fase experimental e não seja isenta de alguns riscos a sua aplicação.
76
Aceitando-os, o doente poderá dar também provas de generosidade ao serviço
da humanidade.
É também permitido interromper a aplicação de tais meios, quando os
resultados não correspondem às esperanças neles depositadas. Mas, para
uma tal decisão, ter-se-á em conta o justo desejo do doente e da família, como
também o parecer de médicos verdadeiramente competentes;
são estes, na realidade, que estão em melhores condições do que ninguém,
para poderem julgar se o investimento de instrumentos e de pessoal é
desproporcionado com os resultados previsíveis, e se as técnicas postas em
acção impõem ao paciente sofrimentos ou contrariedades sem proporção com
os benefícios que delas pode receber.
— É sempre lícito contentar-se com os meios normais que a medicina pode
proporcionar. Não se pode, portanto, impor a ninguém a obrigação de recorrer
a uma técnica que, embora já em uso, ainda não está isenta de perigos ou é
demasiado onerosa. Recusá-la não equivale a um suicídio; significa, antes,
aceitação da condição humana, preocupação de evitar pôr em acção um
dispositivo médico desproporcionado com os resultados que se podem esperar,
enfim, vontade de não impor obrigações demasiado pesadas à família ou à
colectividade.
— Na iminência de uma morte inevitável, apesar dos meios usados, é lícito em
consciência tomar a decisão de renunciar a tratamentos que dariam somente
um prolongamento precário e penoso da vida, sem contudo, interromper os
cuidados normais devidos ao doente em casos semelhantes. Por isso, o
médico não tem motivos para se angustiar, como se não tivesse prestado
assistência a uma pessoa em perigo.
CONCLUSÃO
As normas contidas na presente Declaração estão inspiradas por um profundo
desejo de servir o homem segundo o desígnio do Criador. Se, por um lado, a
vida é um dom de Deus, pelo outro, a morte é inelutável; é necessário,
77
portanto, que, sem antecipar de algum modo a hora da morte, se saiba aceitála com plena responsabilidade e com toda a dignidade. É verdade que a morte
marca o termo da nossa existência terrena mas, ao mesmo tempo, abre
também a via para a vida imortal. Por isso, todos os homens devem prepararse cuidadosamente para este acontecimento, à luz dos valores humanos, e os
cristãos mais ainda à luz da sua fé.
Aqueles que exercem profissões destinadas a cuidar da saúde pública, nada
hão-de negligenciar para colocar ao serviço dos doentes e dos moribundos
toda a sua competência; mas lembrem-se de lhes prestar também o conforto
muito mais necessário de uma bondade imensa e de uma ardente caridade.
Um tal serviço aos homens é também um serviço prestado a Cristo Senhor que
disse: « O que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim o
fizestes » (Mt. 25, 40).
O Sumo Pontífice João Paulo II, no decorrer da Audiência concedida ao abaixo
assinado Cardeal Prefeito, aprovou esta Declaração, decidida em reunião
ordinária da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, e ordenou a sua
publicação. Roma, da Sede da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, 5
de Maio de 1980.
78
Anexo 3
Eutanásia: entidade ajudou 459
pessoas a morrer em 2013
A organização de assistência ao suicídio Exit recebeu mais de 2 mil
solicitações de pessoas pedindo ajuda para morrer, um aumento de 18% em
relação a 2012
A máxima
instância judicial da Suíça estabeleceu, em 2006, que toda pessoa com capacidade de
discernimento tem o direito de decidir como morrerFoto: Getty Images
A organização suíça de assistência ao suicídio Exit ajudou 459 pessoas a
morrerem em 2013, uma centena a mais do que no ano anterior, segundo seu
relatório anual publicado nesta segunda-feira.
A entidade privada recebeu no ano passado mais de 2 mil solicitações de
pessoas pedindo ajuda para morrer, o que significou um aumento anual de
18%.
79
Também aumentou o número de filiados à Exit, que, com 8 mil novos sócios,
passou a somar 70 mil membros, residentes na ampla maioria nas regiões de
fala italiana e alemã da Suíça, principalmente nas cidades de Zurique, Basileia
e Berna.
Seis em cada dez membros são mulheres e a idade média é superior aos 60
anos, embora entre os novos membros baixa aos 50 anos.
A organização, que estudou as razões do significativo aumento de seus
membros e dos pedidos de assistência à morte em 2013, afirmou que os
principais motivos são um maior conhecimento de sua existência entre a
opinião pública e o envelhecimento da população.
As pessoas que mais optam pelo suicídio são os pacientes terminais de câncer
e que sofrem doenças degenerativas, especialmente nos casos em que o
enfermo tem idade avançada ou sofre dor crônica.
De acordo com o relatório da entidade, a média de idade das pessoas que
procuram a Exit subiu de 74 para 77 anos.
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Conforme os protocolos da organização, a morte é induzida através de dose
letais de barbitúricos prescritos por um médico por via oral ou intravenosa - o
que deve ser feito de forma consciente pela pessoa que decide morrer.
A máxima instância judicial da Suíça, a Corte Federal, estabeleceu, em 2006,
que toda pessoa com capacidade de discernimento - independentemente de
sofrer uma doença mental - tem direito a decidir como morrer.
80
Anexo 4
Físico Stephen Hawking conta por que apoia o suicídio assistido
O cosmólogo britânico Stephen Hawking revelou publicamente que apoia
a decisão de doentes terminais de se submeterem a um suicídio
assistido.
"Nós não deixamos os animais sofrerem. Por que deixaríamos os humanos?", questionou
o físico ao repórter Tim Muffett, da BBC, durante entrevista sobre um documentário de sua
vida, prestes a ser lançado no cinema.
Em entrevistas anteriores, Hawking havia sido menos assertivo ao comentar o assunto,
dizendo apenas que "onde há vida, há esperança".
Stephen Hawking é protagonista de documentário que estreia nos cinemas neste mês
O cientista, que sofre de uma doença degenerativa, defendeu que familiares que ajudam
um doente terminal a morrer não sejam processados pela Justiça.
Mas ressaltou que "devem haver garantias de que a pessoa (doente) deseja genuinamente
dar um fim a sua vida, e que eles (os doentes) não estejam sendo pressionados para isso
e não tenham suas vidas terminadas sem seu conhecimento ou consentimento".
Hawking, com 71 anos, é um dos mais conhecidos cientistas. Professor da Universidade
de Cambridge, na Grã-Bretanha, ele é autor de best-sellers nos quais tenta explicar a
física ao grande público.
O professor, que hoje só se movimenta auxiliado por meio de uma cadeira de rodas e só
consegue se comunicar com ajuda do computador, tem uma doença neurológica
degenerativa que gradualmente paralisa os músculos de seu corpo.
Ele foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica (ou doença de Lou Gehrig) em
1964, dois anos após se casar com sua primeira esposa, Jane. Hawking tinha 21 anos, e
os médicos diziam que ele não viveria mais do que dois ou três anos.
Apenas 5% dos que sofrem com a doença conseguem sobreviver por mais de uma
década.
81
Anexo 5
Eutanásia: me recuso a aceitar meu
estado, diz mulher
15 de março de 2008 • 09h59 • atualizado às 10h37
O debate sobre a autorização da eutanásia, recorrente na França, voltou
com força às manchetes dos jornais franceses nesta semana depois que
o presidente Nicolas Sarkozy enfim se pronunciou sobre o caso de
Chantal Sébire. "Me recuso a aceitar meu estado", diz a mulher que pede
na Justiça o direito de ter sua morte assistida.
» Veja fotos de Chantal após a doença
» França já teve outros casos de eutanásia
» Procurador nega eutanásia; decisão sai 2ª
» Fórum: opine sobre o tema da eutanásia
Chantal, 52 anos, é uma dona de casa que sofre de um câncer raríssimo e incurável na face, responsável
pela perda da visão, do olfato e da gustação dela, além de ter deformado o seu rosto e provocar fortes
dores permanentemente.
Há menos de um mês, Chantal abriu sua casa em Plombières-de-Dijon, no leste francês, para diversas
emissoras de televisão e jornais e expor seu desejo de pôr fim ao sofrimento causado pela
estesioneuroblastomia, doença da qual sofre desde 2002.
No último dia 6, ela enviou ao presidente Sarkozy uma carta, escrita pela filha em função da cegueira, e
uma fita cassete em que mostra seu sofrimento e solicita o direito de "morrer com dignidade, antes de me
transformar em um legume".
Diante do silêncio do chefe de Estado, na última quarta-feira ela entrou na Justiça pedindo a autorização
para realizar a eutanásia com o auxílio de seus médicos, que já teriam concordado em efetivar a morte
assistida. No mundo todo, foram identificados apenas 200 casos nos últimos 20 anos deste tipo raro de
tumor nas vias nasais.
"Não existe nem solução cirúrgica nem medicamentosa para estancar a minha doença, que evolui
sozinha. Hoje, eu simplesmente não agüento mais, a minha situação se agrava dia após dia e o
sofrimento é atroz. Eu me sinto literalmente engolida pela dor", disse Chantal.
O parecer da Justiça deve ser conhecido na próxima segunda-feira, mas juristas e promotores
consideram quase impossível o acordo para a eutanásia, proibida pela lei francesa. Nesta sexta, a
Procuradoria francesa pronunciou-se contra o pedido de Chantal.
Por meio de seu porta-voz, David Matinon, Sarkozy propôs a Chantal um encontro com o seu conselheiro
para as questões de saúde, Arnold Munnich, a fim de conhecer a opinião do médico sobre a certeza da
irreversibilidade do tumor que a dona de casa enfrenta.
"O presidente ficou muito tocado pela carta dela e pediu a Munnich que entre em contato com ela",
anunciou o porta-voz da presidência na quinta-feira. No mesmo dia, o primeiro-ministro François Fillon e a
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ministra da Justiça, Rachida Dati, se pronunciaram contrários à autorização da eutanásia. "Não é nosso
direito. O juiz não terá outra alternativa a não ser rejeitar essa proposta", afirmou Dati.
Para tentar vencer a batalha, o advogado da paciente, Gilles Antonowicz, aposta na brecha aberta pela
Lei dos Direitos dos Doentes, de 22 de maio de 2005. "Essa lei não autoriza nominalmente a eutanásia,
mas reconhece o direito aos doentes em fim da vida de recusar qualquer tratamento e o direito de alívio
aos seus sofrimentos", explicou o defensor.
Mãe de três filhos e ex-professora, no seu pedido judicial Chantal evoca também a Convenção Européia
dos Direitos Humanos, que protege a liberdade e o respeito à vida privada.
"Me recuso a aceitar a irreversível degradação do meu estado", diz Chantal por telefone, com a voz
sempre calma. Ela afirma estar decidida a morrer desde novembro do ano passado, quando ficou cega e
percebeu de uma vez por todas que sofreria cada vez mais, até o final da vida. Caso o seu pedido seja
recusado pela Justiça, ela se diz pronta para realizar o procedimento na Bélgica ou na Suíça, onde é
autorizado.
"A lei atual francesa não permite decidir o momento e as circunstâncias da minha partida. Ela abriu uma
brecha, ao permitir o 'deixar morrer', mas não foi até onde poderia ir. Eu reivindico que o paciente que
está como eu, em situação incurável mas ainda consciente, possa decidir pela sua morte, com o aval de
uma comissão médica. Sou eu quem sofre, sou eu quem deve decidir."
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Anexo 6
Prêmio Nobel da Medicina morre
após eutanásia aos 95 anos
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Publicado por Jose Auache - 8 meses atrás
07/05/2013 - 03h17
Prêmio Nobel da Medicina morre após eutanásia aos 95 anos
O bioquímico belga Christian de Duve, ganhador do Prêmio Nobel de
Medicina em 1974, morreu após eutanásia no último sábado (4), aos 95
anos.
De Duve é a segunda personalidade belga a escolher a indução à morte,
depois do escritor Hugo Claus, em 2008. Em 2002 a Bélgica adotou uma
lei que permite a eutanásia, sob certas condições.
"Seria demais dizer que a morte não me assusta, mas eu não tenho medo do
que virá depois, porque eu não acredito. Quando eu desaparecer será para
sempre, não sobrará nada", declarou De Duve, em sua última entrevista,
para o jornal belga Le Soir, no dia 8 de abril.
O cientista, que estava acamado, decidiu esperar que o filho voltasse dos
Estados Unidos para morrer. Durante o último mês de sua vida, De Duve
escreveu para amigos e colegas para dizer adeus.
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"Ele nos deixou com grande serenidade, se recusando a tomar calmantes
antes da injeção letal. Ele foi embora dizendo adeus e sorrindo", disse a
filha do cientista, Françoise.
De Duve ganhou o Prêmio Nobel em 1974 junto com o seu colega belga
Albert Claude e com o norte-americano George Palade por ter descoberto a
função do lisossomo.
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2013/05/1274367-premionobel-da-medicina-morre-apos-eu...
Opinião Pessoal (José Auache)
Morreu como grande homem que foi sua vida inteira, não deixou de ser
digno nem nos últimos momentos de vida. Se temos o Direito a Vida
garantido pela constituição oque e a morte se não a ultima etapa da vida de
qualquer espécie, não se pode obrigar ninguém a vida, por capricho afinal
a vida ainda e um direito e não um dever.
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Anexo 7
Um debate sobre a vida
Embate na Justiça americana sobre
paciente em coma resume dúvidas
fundamentais do ser humano
Diogo Schelp
Erik S. Lesser/The New York Times
Manifestantes com adesivo sobre a boca com a palavra "vida": como��o
nacional
O destino de uma mulher que há quinze anos está em coma na Flórida, nos Estados
Unidos, precipitou na semana passada mais do que uma batalha ética e política,
que envolveu até o presidente George W. Bush. A disputa judicial sobre se deveria
ou não ser retirada a sonda de alimentação que mantém viva Terri Schiavo, uma
paciente em coma irreversível, pôs na ordem do dia uma questão que desafia a
humanidade há milhares de anos: como se pode traçar o limite entre corpo e
mente? A medicina acredita já ter localizado o ponto exato em que o fenômeno da
consciência ocorre dentro do cérebro. A descoberta impressiona, mas é insuficiente
para encerrar o debate. Como escreveu Francis Crick, o cientista britânico que
descobriu o DNA, o código da vida, em seu livro A Busca Científica da Alma, é difícil
aceitar pura e simplesmente a hipótese de que tudo aquilo que determina a
essência do ser humano – suas alegrias e suas tristezas, suas memórias e suas
ambições – se resume ao comportamento de um amontoado de neurônios.
Terri Schiavo, hoje com 41 anos, sofreu dano irreversível no cérebro em 1990,
causado por uma parada cardíaca. Seu córtex cerebral ficou destruído, o que, até
onde a medicina contemporânea consegue afirmar, não lhe permite nenhum tipo de
consciência. Terri permaneceu em estado vegetativo persistente nos últimos quinze
anos. A expressão médica significa que ela é incapaz de pensar, de ter emoções ou
lembranças e de fazer qualquer movimento voluntário. Nessas condições, também
não consegue engolir alimentos, o que a torna dependente de uma sonda
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introduzida no abdômen, pela qual é alimentada e hidratada. Na sexta-feira 18, a
sonda que alimentava Terri foi retirada com autorização da Justiça. Sem esse
mecanismo, ela morrerá de fome e sede em uma ou duas semanas, segundo os
médicos que a acompanham.
Carlos Barria/Reuters
Religiosos em frente ao hospital de Terri:
contra a decis�o judicial
O ponto central do dilema que envolve Terri pode ser resumido numa pergunta
inicial, da qual decorrem todas as outras: uma vez perdida para sempre a
consciência, perde-se também aquilo que torna a vida humana um bem sagrado?
Essa é a questão moral que norteia todas as escolhas relacionadas ao
prolongamento da vida de pacientes inconscientes e sem chance de recuperação.
No passado, os equipamentos eram tão rudimentares que a questão nem sequer
existia. A tecnologia atual ampliou essa fronteira entre a vida e a morte a ponto de
o paciente em coma sobreviver de acordo com seu destino genético – como
qualquer pessoa. Retirar os aparelhos que mantêm as funções vitais de um
paciente nessas condições pode ser visto como um ato de misericórdia ou um
assassinato? O que deve pesar mais: o direito de viver a qualquer custo ou o direito
de morrer quando a linha que separa um ser humano de um vegetal – a
consciência – não existe mais? Como saber o que o paciente, que já não pode se
comunicar ou entender a própria condição, escolheria?
O marido de Terri, Michael Schiavo, tentou durante doze anos autorização da
Justiça para retirar a sonda da esposa, o que significa a morte certa e
supostamente sem sofrimento, já que ela está inconsciente. Ele diz que, antes da
doença, essa era a vontade que sua mulher manifestava em conversas particulares.
Os pais de Terri, por sua vez, passaram a última década lutando nos tribunais para
que a filha seja mantida viva, porque acreditam que ela conserva, sim, certo nível
de consciência. Os médicos dizem que essa é uma impressão equivocada. "É uma
situação de grande angústia para a família", diz José Maria Orlando, presidente da
Associação de Medicina Intensiva Brasileira. "Pacientes em situação semelhante à
de Terri parecem estar conscientes porque têm movimentos espontâneos e reações
a estímulos dolorosos. Na verdade, não são capazes de interpretar nada à sua
volta."
Para desespero dos pais, até agora prevaleceram na Justiça os argumentos de
Michael, o guardião legal da enferma. Nos Estados Unidos, diferentemente do
Brasil, a lei permite a retirada de recursos tecnológicos que mantêm artificialmente
a vida de um paciente em coma irrecuperável. Cabe à Justiça estadual tomar essa
decisão, com base no que o paciente deixou registrado por escrito ou no
testemunho dos parentes mais próximos O caso ganhou dimensão nacional porque
despertou o interesse de grupos religiosos que são contra o aborto e qualquer
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tentativa de abreviar a vida de doentes terminais. A pressão conseguiu que, numa
manobra rara, na segunda-feira passada, os parlamentares americanos aprovassem
uma lei feita sob medida para que os pais de Terri, Robert e Mary Schindler,
pudessem recorrer à Justiça Federal. Bush viajou de sua fazenda no Texas para
Washington no meio da noite só para assinar a lei. Na quinta-feira passada, os
Schindler perderam o recurso na Suprema Corte, praticamente encerrando o caso.
Há uma diferença ética entre a retirada da sonda que alimentava Terri e a
eutanásia. A suspensão de tratamentos e equipamentos que mantêm
artificialmente a vida de um paciente é considerada uma maneira de deixar a
natureza seguir seu curso, quando as possibilidades de cura já estão esgotadas. O
termo técnico para isso é ortotanásia, algo como "a morte correta". Já a eutanásia
exige uma postura mais ativa do paciente ou do médico e nada mais é que um
suicídio assistido, normalmente com a injeção de uma droga letal. Para os pais de
Terri, retirar a sonda de alimentação da filha e deixá-la definhando dias até morrer
equivale a uma eutanásia, ou até pior. "Suspender tratamentos que apenas
prolongam a vida de pacientes em estado vegetativo é algo aceito há muito tempo
nos Estados Unidos", disse a VEJA o jurista americano Marc Spindelman,
especialista em bioética da Faculdade de Direito da Universidade Estadual de Ohio.
"Já estávamos em um estágio mais avançado, discutindo a proibição ou não da
eutanásia, quando políticos encontraram em Schiavo uma causa para voltarmos
atrás", diz Spindelman.
Quando Terri sorri...
Os pais de Terri, que são contra a retirada da
sonda que a alimenta, divulgaram vídeos em
que a filha parece perceber o que se passa à
sua volta...
Cutucada na
boca com um
palito, ela afasta
o rosto
Terri sorri e
emite sons com
a boca ao ouvir
música
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Ela fixa o olhar
na m�e e parece
expressar
ternura
...mas os médicos que a analisaram dizem que
os gestos e as expressões faciais são reações
automáticas a estímulos físicos e que ela não
entende o que vê e ouve
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Anexo 8
Perguntas & Respostas
Fevereiro de 2009
Eutan�sia
A longa agonia da italiana Eluana Englaro, morta em 9 de fevereiro de 2009, aos 38
anos, 17 dos quais passados em estado vegetativo, reacendeu em todo o mundo o
debate sobre a eutan�sia e a ortotan�sia. A pr�tica de provocar a morte de um
paciente em estado grave cuja reabilita��o � descartada pelos m�dicos �
pol�mica, mesmo quando � o pr�prio paciente quem a solicita. Antes de
suspender a alimenta��o de Eluana, v�tima de um acidente de carro em 1992, a
fam�lia teve de atravessar uma longa e ruidosa batalha na Justi�a - e a oposi��o
do premi� Silvio Berlusconi. O caso chegou a gerar uma crise pol�tica na It�lia.
Al�m de se recusar a assinar o decreto-lei criado por Berlusconi para impedir a
eutan�sia de Eluana, aprovada em novembro pela m�xima corte de Justi�a
italiana, o presidente Giorgio Napolitano taxou a atitude do colega de
inconstitucional. Em seu pedido � Justi�a, a fam�lia afirmou que levar Eluana �
morte atenderia � vontade da paciente. A seguir, mais informa��es sobre a
pr�tica.
1. O que � exatamente a eutan�sia e por que � t�o pol�mica?
2. Como � realizado o procedimento que recebe o nome de eutan�sia?
3. A eutan�sia � considerada uma pr�tica legal no Brasil?
4. Eutan�sia pode ser tamb�m chamada de suic�dio assistido?
5. Qual � a posi��o da Igreja Cat�lica brasileira a respeito?
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6. H� institui��es que defendam a eutan�sia no Brasil?
7. No �mbito pol�tico, j� se tomou alguma medida para regulamentar a pr�tica?
8. H� pa�ses onde a eutan�sia � permitida por lei?
9. Quais argumentos s�o usados contra e a favor da eutan�sia?
10. A eutan�sia � uma pr�tica caracter�stica do mundo moderno?
1. O que � exatamente a eutan�sia e por que � t�o
pol�mica?
De acordo com o dicion�rio Houaiss, eutan�sia � o �ato de proporcionar morte sem
sofrimento a um doente atingido por afec��o incur�vel que produz dores
intoler�veis�. Da�, j� se pode diferenciar a pr�tica da distan�sia, express�o
relativa a uma morte lenta e sofrida, e da ortotan�sia, voc�bulo que representa a
morte natural. A eutan�sia suscita pol�mica pelas mesmas raz�es que fazem do
aborto um motor de calorosos debates: porque perpassa a bio�tica, e tamb�m a
moral de cada um. N�o h� consenso a respeito da validade da pr�tica nem mesmo
entre os m�dicos, porque n�o h� acordo a respeito do que sentem e pensam
doentes em coma ou em estado vegetativo. Exemplo dessa dissintonia de opini�es �
o caso Terri Schiavo, a americana morta por eutan�sia em 2005 a pedido do marido.
Ele se apoiava num diagn�stico m�dico segundo o qual Terri, que em 1990 sofrera
uma parada card�aca e ficara sem oxigena��o no c�rebro, j� n�o possu�a
consci�ncia. Os pais da paciente, no entanto, dispunham de outros laudos, que
afirmavam que Terri tinha uma consci�ncia m�nima, e se opunham � sua morte. A
Justi�a dos Estados Unidos acabou dando ganho de causa ao marido. Os aparelhos
foram desligados e ela morreu.
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2. Como � realizado o procedimento que recebe o
nome de eutan�sia?
Existem pelo menos quatro tipos de eutan�sia, divididos em duas categorias: a
volunt�ria e a involunt�ria, e a passiva e a ativa. Na eutan�sia ativa, tamb�m
chamada de positiva ou direta, o paciente recebe uma inje��o ou uma dose letal de
medicamentos. Conhecida ainda como negativa ou indireta, a eutan�sia passiva foi a
que matou Eluana Englaro, cuja alimenta��o foi suspensa. Aqui, o que conta � a
omiss�o: o paciente deixa de receber algo de que precisa para sobreviver. A
diferen�a entre eutan�sia volunt�ria e involunt�ria est� na participa��o do
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paciente. Numa, ele coopera, tomando parte da decis�o. Na outra, a a��o �
praticada sem o seu aval ou mesmo sem o seu conhecimento. Uma outra
classifica��o, que cruza fins e voluntariedade, divide a eutan�sia em libertadora
(aquela que abrevia a dor de um doente incur�vel), piedosa (aplicada a pacientes
terminais e em estado inconsciente) e eug�nica (do tipo que os nazistas praticavam
para eliminar indiv�duos aps�quicos e associais).
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3. A eutan�sia � considerada uma pr�tica legal no
Brasil?
N�o. As leis brasileiras sequer preveem a pr�tica. A eutan�sia n�o possui nenhuma
men��o nem no C�digo Penal Brasileiro, que data de 1940, nem na Constitui��o
Federal. Por isso, legalmente falando, o Brasil n�o tem nenhum caso de eutan�sia quando algo semelhante acontece, recebe o nome de homic�dio ou suic�dio. Mas,
de acordo com a interpreta��o que advogados e ju�zes venham a desenvolver, os
artigos 121 e 121 do C�digo Penal podem ser empregados para fundamentar
posi��es em rela��o � pr�tica. O artigo 121 trata do homic�dio qualificado,
conceito que inclui a morte provocada por motivo f�til, com emprego de meios de
tortura ou com recurso que �dificulte ou torne imposs�vel a defesa do ofendido�. Em
todos esses casos, a pena vai de 12 a 30 anos de reclus�o. O artigo 122 versa sobre
o suic�dio induzido, instigado ou auxiliado por terceiros.
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4. Eutan�sia pode ser tamb�m chamada de suic�dio
assistido?
Embora as leis brasileiras n�o prevejam a eutan�sia, ela pode ser definida como uma
pr�tica distinta do suic�dio assistido, que � quando um paciente pede ele mesmo - e
sempre de maneira consciente - ajuda para se matar. � este o caso abordado no filme
Mar Adentro, de Alejandro Amen�bar, em que o personagem vivido pelo ator Javier
Bardem luta para obter o direito ao suic�dio. O artigo do C�digo Penal Brasileiro que
disp�e sobre o suic�dio assistido, o de n�mero 122, descreve-o como a pr�tica de
�induzir ou instigar algu�m a suicidar-se ou prestar-lhe aux�lio para que o fa�a� e
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prev� de um a seis anos de reclus�o, de acordo com os resultados (se les�o ou se
morte) da a��o. O artigo tamb�m prev� a duplica��o da pena se o crime tiver
motivo ego�stico ou se a v�tima for menor de idade ou com baixa capacidade de
resist�ncia.
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5. Qual � a posi��o da Igreja Cat�lica brasileira a
respeito?
A Igreja � contra a eutan�sia. A campanha da fraternidade lan�ada pela
Confer�ncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em 2008, �Escolhe, pois a vida�,
se dirigia contra a eutan�sia, bem como contra o aborto e a pesquisa cient�fica com
embri�es humanos. Ao tomar parte do debate levantado pelo caso Eluana Englaro, o
papa Bento XVI afirmou que a eutan�sia seria uma �solu��o falsa para o
sofrimento�.
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6. H� institui��es que defendam a eutan�sia no
Brasil?
Sim. Uma delas � oriunda da pr�pria Igreja Cat�lica. � a organiza��o n�ogovernamental (ONG) Cat�licas pelo Direito de Decidir (CDD), formada por militantes
feministas crist�s, dissidentes das enc�clicas e de outros documentos elaborados
pela c�pula da igreja e ligada � Teologia da Liberta��o. Em 2008, ano em que a
campanha da fraternidade da Confer�ncia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
mirou a eutan�sia e o aborto, a CDD elaborou um manifesto, questionando: ��
poss�vel afirmar a defesa da vida e condenar as pessoas a sofrer indefinidamente
num leito de morte, condenando o acesso livre e consentido a uma morte digna, pelo
recurso � eutan�sia?�.
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7. No �mbito pol�tico, j� se tomou alguma medida
para regulamentar a pr�tica?
O Brasil chegou a ter uma iniciativa parlamentar a favor da eutan�sia. Foi o projeto de
lei 125/96, de autoria do senador Gilvam Borges (PMDB-AP), que pretendia liberar a
pr�tica em algumas situa��es. Submetida � avalia��o das comiss�es
parlamentares em 1996, a proposta n�o prosperou e acabou sendo arquivada tr�s
anos depois. J� o deputado Osm�mio Pereira (PTB-MG) prop�s em 2005 uma lei
que proibisse claramente e pr�tica no pa�s, definindo-a, assim como ao aborto, como
crime hediondo. O seu projeto de lei, de n�mero 5058, tamb�m se encontra
arquivado.
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8. H� pa�ses onde a eutan�sia � permitida por lei?
Sim. Na Europa, continente que mais avan�ou na discuss�o, a eutan�sia � hoje
considerada pr�tica legal na Holanda e na B�lgica. Em Luxemburgo, est� em vias de
legaliza��o. Holanda e B�lgica agiram em cadeia: a primeira legalizou a eutan�sia
em abril de 2002 e a segunda, em setembro do mesmo ano. Na Su�cia, � autorizada
a assist�ncia m�dica ao suic�dio. Na Su��a, pa�s que tolera a eutan�sia, um
m�dico pode administrar uma dose letal de um medicamento a um doente terminal
que queira morrer, mas � o pr�prio paciente quem deve tom�-la. J� na Alemanha e
na �ustria, a eutan�sia passiva (o ato de desligar os aparelhos que mant�m algu�m
vivo, por exemplo) n�o � ilegal, contanto que tenha o consentimento do paciente. A
Europa � o continente mais posicionado em rela��o � eutan�sia, mas � prov�vel
que o Uruguai tenha sido o primeiro pa�s a legislar sobre o assunto. O C�digo Penal
uruguaio, que remete � d�cada de 1930, livra de penaliza��o todo aquele que
praticar �homic�dio piedoso�, desde que conte com �antecedentes honr�veis� e
que pratique a a��o por piedade e mediante �reiteradas s�plicas� da v�tima.
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9. Quais argumentos s�o usados contra e a favor da
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eutan�sia?
N�o � � toa que a eutan�sia � uma pr�tica pol�mica, capaz de dividir opini�es:
ela re�ne muitos pr�s e contras. Na opini�o de seus defensores, o procedimento �
uma sa�da honrosa para os que se veem diante de uma longa e dolorosa agonia. �
essa a posi��o do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aur�lio Mello.
�N�o pode haver dignidade com uma vida vegetativa�, disse ele a VEJA. Reduzir
esse sofrimento seria ent�o um ato de solidariedade e compaix�o. Os casos em que
o paciente pudesse decidir por sua morte seriam ainda concretiza��es do princ�pio
da autodetermina��o da pessoa. Quest�es de sa�de p�blica tamb�m podem
entrar na discuss�o: pode-se falar do custo de manter vivo um paciente sem chance
de voltar � plena consci�ncia. Para os que se op�em � eutan�sia, isso n�o �
desculpa: o estado tem o dever de preservar a vida humana a todo custo, assim como
o m�dico, de cuja �tica n�o pode abrir m�o.
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10. A eutan�sia � uma pr�tica caracter�stica do
mundo moderno?
N�o, a eutan�sia � uma pr�tica que acompanha a humanidade h� milhares de
anos. N�o � poss�vel saber a data exata em que surgiu. Em artigo publicado no site
da sede da Ordem dos Advogados do Brasil em S�o Paulo (OAB-SP), o criminalista
Luiz Fl�vio Borges D�Urso, presidente da se��o paulista da entidade, afirma que a
eutan�sia era muito praticada na antiguidade, por povos considerados primitivos. Vale
lembrar que a palavra tem origem grega. � o resultado do casamento de �eu�, que
significa bem, e �thanatos�, que � morte, representando a boa morte ou morte sem
sofrimento.
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