Artigo Original Avaliação da satisfação e sobrecarga em um serviço de saúde mental Satisfaction and burden evaluation in a mental health service Cleucimara Aparecida Camilo1, Marina Bandeira2, Rosangela Maria de Almeida Camarano Leal3, João Domingos Scalon4 Resumo O objetivo desse estudo foi avaliar a qualidade de um serviço de saúde mental a partir da perspectiva dos pacientes, familiares e profissionais. Trata-se de um estudo descritivo, de corte transversal, com amostras aleatórias de 35 pacientes e 35 familiares, e participação de 8 profissionais de um serviço de saúde mental do interior de Minas Gerais. Aplicaram-se escalas de avaliação da satisfação com o serviço (SATIS-BR), de sobrecarga dos profissionais (IMPACTO-BR) e sobrecarga dos familiares (FBIS-BR). Foram obtidos níveis elevados de satisfação dos três atores com relação à maioria dos aspectos avaliados no serviço. Pacientes e profissionais se sentiram menos satisfeitos com a estrutura física, aparência e conforto do serviço. Foram observados escores baixos de sobrecarga dos profissionais, exceto no medo de ser agredido, cansaço físico, sobrecarga por trabalhar com pacientes psiquiátricos e desejo de mudar de trabalho. Uma avaliação qualitativa apontou aspectos específicos do serviço que interferem no trabalho dos profissionais. Para os familiares, a sobrecarga subjetiva foi mais elevada na supervisão dos comportamentos problemáticos, modificações permanentes em suas vidas e nas preocupações com os pacientes. A sobrecarga objetiva foi mais elevada na assistência aos pacientes na vida cotidiana. Os resultados apontam a qualidade do serviço, com pontos específicos a serem melhorados. Palavras-chave: avaliação; saúde mental; satisfação no emprego; satisfação dos consumidores; cuidadores. Abstract This study aimed to access the quality of a mental health service from the perspectives of patients, family members and professionals. A descriptive, cross-sectional study, was conducted with two random samples of 35 patients and 35 family members, and the participation of 8 professionals from a mental health service in Minas Gerais. Scales were applied to evaluate satisfaction with the service (SATIS-BR), professional burden (IMPACTO-BR) and family burden (FBIS-BR). High levels of satisfaction were observed among the three agents, relating to most of the service evaluated aspects. Patients and professionals were less satisfied with the service physical structure, appearance and comfort. Professionals’ burden scores were low for most items, except for the fear of being attacked, feelings of physical exhaustion and burden for working with psychiatric patients and desire to have another job. A qualitative evaluation analysis pointed to specific aspects of service which interfere with the professionals’ work. Family subjective burden was higher regarding the supervision of patient’ disturbing behaviors, permanent changes in their lives and concerns about the patients. The family objective burden was higher in relation to the assistance in everyday life. The results point to the quality of the service, with specific aspects to be improved. Keywords: evaluation; mental health; job satisfaction; consumers satisfaction; caregivers. Trabalho realizado no Laboratório de Saúde Mental (LAPSAM) da Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ) – São João del-Rei (MG), Brasil. 1 Mestre em Saúde Mental pela UFSJ – São João del-Rei (MG), Brasil; Psicóloga do Ambulatório de Saúde Mental do Município de Nepomuceno (MG), Brasil. 2 Professora Associada II da UFSJ – São João del-Rei (MG), Brasil; Pesquisadora-bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); Doutora Ph.D. pela Université de Montreal – Montreal, Canadá ; Pós-doutorada pela McGill University e Université de Montréal – Montreal, Canadá. 3 Professora Adjunta e chefe do Departamento de Psicologia da (UFSJ) – São João del-Rei (MG), Brasil. 4 Professor Associado III da Universidade Federal de Lavras (UFLA) – Lavras (MG), Brasil. Endereço para correspondência: Cleucimara Aparecida Camilo – Rua Coronel Alvim de Menezes, 54 – Jardim Floresta – CEP: 37200-000 – Lavras (MG), Brasil – E-mail: [email protected] Fonte de financiamento: nenhuma. Conflito de interesse: nada a declarar. 82 Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 Avaliação de satisfação e sobrecarga INTRODUÇÃO A avaliação dos serviços de saúde mental tem sido uma importante temática de pesquisa, recebendo um significativo interesse metodológico e empírico1. A Organização Mundial de Saúde (OMS) tem recomendado avaliações de resultados do atendimento que contemplem a perspectiva dos três atores envolvidos nesses serviços: pacientes, familiares e profissionais. A percepção desses atores tem sido avaliada em função de duas dimensões principais: a sua satisfação com os serviços e a sobrecarga sentida por familiares e profissionais nos cuidados prestados aos pacientes psiquiátricos. Para essa avaliação, a OMS desenvolveu o projeto WHO-SATIS2, em 19 países, visando à criação de cinco escalas de medida, que avaliam a qualidade dos serviços de saúde mental. Embora estudos tenham investigado uma dessas dimensões por parte de um dos três atores separadamente, não foi encontrada nenhuma pesquisa publicada nas bases indexadas Scielo e Lilacs que tenha avaliado simultaneamente as três perspectivas em termos da satisfação e sobrecarga. No Brasil, foram encontradas 13 pesquisas que avaliaram isoladamente a satisfação e/ou a sobrecarga de um ou dois atores em serviços de saúde mental, utilizando instrumentos de medida validados. Dentre esses estudos, cinco avaliaram a sobrecarga e a satisfação dos profissionais3-7. Um estudo avaliou somente a satisfação dos profissionais8 e três outros avaliaram apenas a satisfação dos pacientes9-11. Quatro estudos enfocaram a perspectiva dos familiares, um deles avaliando a sua satisfação com os serviços12 e os outros três avaliando a sua sobrecarga com o papel de cuidadores de pacientes psiquiátricos13-15. Nenhum dos estudos avaliou simultaneamente as percepções dos pacientes, familiares e profissionais. O objetivo do presente estudo foi fazer uma avaliação de um serviço de saúde mental, investigando as perspectivas desses três atores. MÉTODO Delineamento Trata-se de uma pesquisa avaliativa de um serviço de saúde mental, do tipo somativa, definida por Selltiz16, como aquela em que se estudam os resultados e as repercussões de um programa ou serviço. Contandriopoulos et al.17 descrevem cinco tipos de pesquisa avaliativa somativa, dentre elas a avaliação dos resultados. O presente estudo enfoca a avaliação de resultados, por meio de medidas padronizadas e validadas da satisfação dos pacientes, profissionais e familiares com o serviço, bem como da sobrecarga apresentada pelos profissionais e pelos familiares cuidadores dos pacientes psiquiátricos. Este estudo caracteriza-se, ainda, como uma pesquisa de corte transversal, na qual as medidas são coletadas em um mesmo momento no tempo17. No presente estudo, as medidas de satisfação e sobrecarga foram coletadas em uma única entrevista. Inclui-se, adicionalmente, neste trabalho uma investigação de natureza qualitativa, que consiste na análise da organização do trabalho e das condições de trabalho dos profissionais, por meio de entrevistas, análises de documentos e observação dos profissionais, na situação concreta de trabalho. Participantes Participaram deste estudo 35 pacientes, 35 familiares e 8 profissionais da equipe de trabalho de um Centro de Referência em Saúde Mental (CERSAM) de um município do interior de Minas Gerais. O tamanho da amostra dos pacientes foi determinado segundo critérios de Barbetta18. Os pacientes da amostra foram selecionados aleatoriamente a partir de uma lista numerada de todos os pacientes do CERSAM que preenchiam os seguintes critérios de inclusão: idade igual ou superior a 18 anos; diagnósticos de esquizofrenia; transtornos esquizoafetivos, delirantes ou depressivos, de acordo com a Classificação Internacional de Doenças – CID-1019; e estar em tratamento há, pelo menos, um ano no CERSAM. Para cada paciente selecionado aleatoriamente, era identificado o seu familiar cuidador para compor a amostra dos familiares, totalizando 35 familiares. Os critérios de exclusão para os pacientes foram: estar em crise ou apresentar dificuldade em compreender as questões da escala. Incluíram-se os familiares de ambos os sexos, com idade superior a 18 anos e que residiam com o paciente. Foram excluídos os familiares que apresentavam transtorno psiquiátrico diagnosticado e dificuldade de compreensão das questões dos instrumentos utilizados no estudo. Nenhum dos pacientes e familiares selecionados se recusou a participar do estudo. No que se refere aos profissionais, por se tratar de um número menor de pessoas, foram realizadas entrevistas com todos os que aceitaram responder às escalas e que estavam há mais de um ano trabalhando no serviço. Dentre os 12 profissionais do serviço, apenas 4 se recusaram a participar do estudo, alegando falta de tempo para o preenchimento dos instrumentos utilizados no estudo. Instrumentos de medidas Foram utilizadas cinco escalas de medida. Para avaliar a satisfação dos pacientes, familiares e profissionais do serviço, foram usadas as três escalas de satisfação denominadas SATIS-BR. A escala IMPACTO-BR foi usada para avaliar a sobrecarga dos profissionais. Esses quatro instrumentos foram elaborados pela divisão de Saúde Mental da Organização Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 83 Cleucimara Aparecida Camilo, Marina Bandeira, Rosangela Maria de Almeida Camarano Leal, João Domingos Scalon Mundial de Saúde2. A adaptação e validação desses instrumentos foram realizadas por Bandeira et al.12,20-22. A quinta escala utilizada no presente trabalho foi a Escala de Avaliação da Sobrecarga dos Familiares (FBIS-BR), que visa avaliar o grau de sobrecarga dos familiares com o papel de cuidador de um paciente psiquiátrico. Esta foi adaptada e validada para o Brasil, a partir da versão original Family Burden Interview Schedule (FBIS), elaborada por Tessler e Gamache23, pelo Laboratório de Pesquisa em Saúde Mental (LAPSAM) da Universidade Federal de São João del-Rei24. A escala SATIS-BR dos pacientes possui 13 itens, distribuídos em duas subescalas: (1) satisfação com a equipe e (2) satisfação com o serviço, além de quatro questões adicionais, que fazem parte da escala global12,20. A escala SATIS-BR dos familiares possui oito itens distribuídos em três subescalas: (1) satisfação com o resultado do tratamento no serviço, (2) satisfação com a acolhida e competência da equipe e (3) satisfação com a privacidade e confidencialidade da equipe12. A escala SATIS-BR dos profissionais possui 30 itens agrupados em quatro subescalas: (1) satisfação com a qualidade dos serviços oferecidos, (2) satisfação com a participação da equipe no serviço, (3) satisfação com as condições de trabalho e (4) satisfação com o relacionamento no serviço22. Possui ainda duas questões adicionais, relacionadas ao trabalho em saúde mental e frequência de contato entre pacientes e profissionais, que fazem parte do escore global. As alternativas de resposta aos itens, de todas as três escalas de satisfação, estão dispostas em uma escala do tipo Likert com cinco pontos, em que 1 representa muito insatisfeito e 5, muito satisfeito. A escala IMPACTO-BR, que avalia a sobrecarga dos profissionais, possui 18 itens agrupados em três subescalas: (1) efeitos sobre a saúde física e mental, (2) efeitos no funcionamento da equipe e (3) sentimento de estar sobrecarregado. As alternativas de resposta estão dispostas em uma escala do tipo Likert de cinco pontos, em que 1 representa que de forma alguma o profissional se sente sobrecarregado e 5, que ele se sente extremamente sobrecarregado22. A Escala FBIS-BR possui 52 itens, que avaliam tanto a sobrecarga objetiva quanto a subjetiva dos familiares, distribuídos em cinco subescalas: (A) assistência na vida cotidiana (sobrecargas objetiva e subjetiva); (B) supervisão dos comportamentos problemáticos (sobrecargas objetivas e subjetivas); (C) gastos financeiros (sobrecarga subjetiva avaliada em um item); (D) impacto nas rotinas diárias (sobrecarga objetiva); (E) preocupações com o paciente (sobrecarga subjetiva). As alternativas de resposta para as questões que avaliam a sobrecarga objetiva (a frequência com que o familiar executou tarefas para cuidar do paciente, lidou com 84 Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 seus comportamentos problemáticos e sofreu alterações diárias na vida) são distribuídas em uma escala tipo Likert de cinco pontos, sendo 1 = nenhuma vez e 5 = todos os dias. As alternativas de resposta para as questões de sobrecarga subjetiva (grau de incômodo sentido pelo familiar) das subescalas A e B estão dispostas em uma escala tipo Likert de quatro pontos, sendo 1 = nem um pouco e 4 = muito. As questões de sobrecarga subjetiva da subescala E e de um item da subescala C (frequência de preocupações e de sentimento de peso financeiro) estão dispostas em uma escala tipo Likert de cinco pontos, sendo 1= nunca e 5 = sempre ou quase sempre24. Para a avaliação qualitativa dos profissionais, adotou-se o método da autoconfrontação e da análise observacional de suas atividades no serviço, que fazem parte da abordagem da ergonomia da atividade. Os princípios de autoconfrontação e da análise da atividade têm se mostrado eficazes na elucidação das dificuldades práticas encontradas pelos sujeitos nos contextos de trabalho25. Coleta de dados As aplicações das escalas foram feitas individualmente, pela pesquisadora, por meio de entrevistas estruturadas, realizadas no serviço de saúde mental, com os pacientes e profissionais. Em relação às entrevistas com os familiares, todas foram realizadas em suas residências, em horários previamente agendados. Verificou-se a compreensão dos pacientes e familiares acerca das questões das escalas, a partir da Técnica de Sondagem, denominada como Probe Technique26. Essa técnica consiste em solicitar aos sujeitos que justifiquem suas respostas a cada um dos itens das escalas. No caso dos profissionais, as escalas foram autoadministradas, porém na presença da pesquisadora para esclarecimentos que se fizessem necessários. A coleta de dados qualitativos foi feita, por meio de entrevistas e observação das atividades dos profissionais, em situação concreta de trabalho no serviço. Esta pesquisa foi aprovada pela Comissão de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), processo número 016-a/2010/CEPES, e pela direção da instituição participante. Assegurou-se aos participantes a confidencialidade das informações, sendo a participação voluntária. Os sujeitos assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e receberam uma cópia dele. Análise dos dados A análise quantitativa dos dados foi feita a partir do software Statistical Package for Social Scences (SPSS), versão 13.0. Foram realizadas análises estatísticas descritivas, com cálculos Avaliação de satisfação e sobrecarga das médias, desvios-padrão e porcentagens para descrição das amostras dos pacientes, familiares, profissionais e para avaliação dos escores de satisfação e sobrecarga global e por subescalas. Foram utilizados testes paramétricos para as análises estatísticas, após ter sido constatada a normalidade dos dados para as cinco escalas, por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov (SATIS-BR/ pacientes: K-S=0,65, p=0,78; SATIS-BR/familiares: K-S=0,83, p=0,49; SATIS-BR/profissionais: K-S=0,61, p=0,84; IMPACTOBR: K-S=0,61, p=0,85; FBIS-BR (sobrecarga objetiva): K-S=0,52, p=0,81; FBIS-BR (sobrecarga subjetiva): K-S=0,82, p=0,63). Foram feitas análises intragrupos, para comparar as subescalas de satisfação e de sobrecarga, visando identificar quais dimensões apresentavam escores mais elevados para cada grupo. Para isso, foram utilizados os testes: t de Student para amostras independentes, para comparação de duas subescalas e análise de variância ANOVA, e teste post hoc de Tukey, para comparação de três ou mais subescalas. RESULTADOS Descrição das amostras A maioria dos pacientes era do sexo feminino (54,30%), com idade média de 45,11 anos, sendo a mínima de 26 anos e a máxima de 73 anos. Em sua maioria, eram solteiros (54,30%) e alfabetizados, com escolaridade predominante de ensino fundamental incompleto (65,70%). A maioria dos pacientes (65,70%) tinha recebido diagnósticos da categoria de esquizofrenia, transtornos esquizotípicos e transtornos delirantes. A idade média dos pacientes, no início da doença mental, era de 26,60 anos. A duração média da doença era de 18,83 anos e a duração média do tratamento era de 14,71 anos. A maioria dos pacientes não apresentou crises agudas no último ano (65,70%), enquanto 22,90% deles tiveram de quatro a sete crises. Em relação à internação em hospitais psiquiátricos, 45,70% dos pacientes nunca tinham sido internados. Dentre os que haviam sido internados, 40,00% sofreram de uma a cinco internações, 11,40% sofreram de seis a dez internações e 2,90%, mais de dez internações. A duração média das internações foi de 36,06 dias. Em relação aos familiares, a idade média era de 55,60 anos, sendo a mínima de 21 e a máxima de 78 anos. Verificou-se que a maioria dos familiares era do sexo feminino (80,00%), casada (54,40%), com Ensino Fundamental incompleto (51,30%). Quanto ao grau de parentesco do cuidador com o paciente, a maioria era representada pelos pais (48,60%), sendo mães (42,88%) e pais (5,72%), seguidos por irmãos ou irmãs (17,10%), cônjuges (14,30%), filhos ou filhas (11,40%) e outros (8,60%). Com relação aos profissionais, a idade média era de 38 anos, sendo a mínima de 27 e a máxima de 51 anos. A maioria era do sexo feminino (87,50%) e 50,00% eram solteiros. No que se refere à escolaridade, 62,50% dos profissionais possuíam pós-graduação. Considerando o tipo de profissão, 50,00% da amostra era constituída por psicólogos. Em relação ao tempo de trabalho em serviços de saúde mental, 37,50% dos profissionais tinham trabalhado entre um e cinco anos, 37,50% entre 6 e 10 anos, e 25,00% dos profissionais mais de 10 anos. Satisfação dos pacientes com o serviço A Tabela 1 apresenta os dados referentes à análise descritiva da satisfação dos pacientes, global e pós-subescala. A média global de satisfação dos pacientes foi de 4,52 em uma escala que varia de 1 a 5 pontos. Esse resultado indica que a avaliação dos pacientes sobre esse serviço se situa entre satisfação (escore 4) e muita satisfação (escore 5). A análise das subescalas pelo teste t de Student indicou que os pacientes apresentaram um grau significativamente mais elevado (p<0,001) de satisfação com relação ao atendimento dos profissionais do serviço (subescala 1), comparativamente aos demais aspectos. Essa dimensão avalia a satisfação dos pacientes com os seguintes itens: obtenção de informações da equipe, qualidade da discussão sobre o tratamento, a equipe estar ajudando, a equipe ser amigável e a equipe ser competente. Os resultados das porcentagens referentes aos itens da escala (Tabela 2) indicaram que a maioria das respostas se situou entre satisfeito e muito satisfeito (escores 4 e 5). Todos os pacientes (100%) relataram estar entre satisfeitos (escore 4) e muito satisfeitos (escore 5) em relação a cinco itens da escala: sentir-se respeitado e tratado com dignidade, ter sido ouvido com atenção, ter sido admitido no serviço por uma pessoa que compreendeu o problema, ter recebido o tipo de ajuda de que precisava e a competência do profissional. Na categoria intermediária (escore 3), verificou-se que 20,00 e 11,40% dos pacientes, respectivamente, consideraram regulares as condições gerais das instalações e a competência da equipe. Na categoria de insatisfação (escores 1 e 2), observou-se que 8,60 e 2,90% dos pacientes estavam insatisfeitos em relação ao conforto e aparência do serviço e às condições gerais das instalações do serviço. Tabela 1. Médias e desvios-padrão do escore global e das subescalas e valor p referentes às subescalas da SATIS-BR para pacientes, obtidos pelo teste t de Student Subescalas e escala global 1. Satisfação com a equipe 2. Satisfação com o serviço Escala global Média 4,61 4,32 4,52 DP 0,37 0,46 0,33 Valor p <0,01* *teste t de Student; DP: desvios-padrão. Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 85 Cleucimara Aparecida Camilo, Marina Bandeira, Rosangela Maria de Almeida Camarano Leal, João Domingos Scalon Tabela 2. Porcentagens de respostas para cada item da escala SATIS-BR para pacientes Itens da escala 1. Ter sido tratado com respeito e dignidade 2. Ter sido ouvido com atenção pela pessoa que o admitiu 3. Pessoa que o admitiu compreendeu o seu problema 4. Equipe compreendeu o tipo de ajuda de que paciente necessitava 5. Tipo de ajuda dada pelo serviço 6. Obtenção de informações pela equipe 7. Discussão feita sobre seu tratamento 8. Ajuda dada pela equipe do serviço 9. Considera equipe amistosa 10. Competência da equipe 11. Competência do profissional 12. Conforto e aparência do serviço 13. Condições gerais das instalações do serviço Insatisfeito % resposta 1 e 2 3 (8,60) 1 (2,90) Mais ou menos % resposta 3 1 (2,90) 2 (5,70) 2 (5,70) 2 (5,70) 1 (2,90) 4 (11,40) 7 (20,00) Satisfeito % resposta 4 e 5 35 (100,00) 35 (100,00) 35 (100,00) 35 (100,00) 34 (97,10) 33 (94,30) 33 (94,30) 33 (94,30) 34 (97,10) 31 (88,50) 35 (100,00) 32 (91,40) 27 (77,20) Tabela 3. Médias, desvios-padrão do escore global e das subescalas e valor p referentes às subescalas da SATIS-BR para familiares, obtidos pela análise de variância Subescalas e escala global 1. Satisfação com o resultado do tratamento no serviço 2. Satisfação com a acolhida e competência da equipe 3. Satisfação com a privacidade confidencial do serviço Escala global Média 4,53 4,35 4,31 4,41 DP 0,61 0,47 0,66 0,51 Valor p Insatisfeito % resposta 1 e 2 - Mais ou menos % resposta 3 2 (5,70) 3 (8,60) 1 (2,90) Satisfeito % resposta 4 e 5 33 (94,30) 32 (91,40) 34 (97,10) 1 (2,90) 1 (2,90) 1 (2,90) 1 (2,90) 1 (2,90) 1 (2,90) 1 (2,90) 2 (5,70) 2 (5,70) 33 (94,30) 33 (94,30) 33 (94,30) 33 (94,30) 32 (91,40) 0,20 F=1,67; p>0,05; DP: desvios-padrão. Tabela 4. Porcentagens de resposta para cada item da escala SATIS-BR para familiares Itens da escala 1. Compreensão do familiar pelo profissional que o admitiu 2. Equipe compreendeu tipo de ajuda que o familiar necessitava 3. Serviços recebidos ajudaram paciente a lidar mais eficientemente com seus problemas 4. Obtenção do tipo de ajuda de que o paciente necessitava 5. Medidas tomadas para assegurar privacidade no tratamento 6. Confidencialidade das informações 7. Competência do profissional 8. Beneficiou com tratamento Satisfação dos familiares com o serviço Na Tabela 3, são apresentados os resultados da análise descritiva da satisfação dos familiares com o serviço global e por subescalas. A média global de satisfação dos familiares foi de 4,41 em uma escala que varia de 1 a 5 pontos, indicando que a avaliação dos familiares sobre esse serviço se situa entre satisfação (escore 4) e muita satisfação (escore 5). Os dados das subescalas foram submetidos a uma análise comparativa por meio da análise de variância (ANOVA). Os resultados indicaram que a satisfação dos familiares não diferiu entre as dimensões avaliadas pelas subescalas (F=1,67, p=0,20). A Tabela 4 apresenta os dados de porcentagens para cada um dos itens da escala de satisfação dos familiares. Verificou-se 86 Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 que 97,10% dos familiares se sentiram entre satisfeitos (escore 4) e muito satisfeitos (escore 5) em relação à percepção de que os serviços ajudaram o paciente a lidar mais eficientemente com os seus problemas. Para a categoria de resposta intermediária “mais ou menos” (escore 3), que se situa entre insatisfação e satisfação, 8,60% dos familiares classificaram dessa maneira o item que avaliava se a equipe tinha compreendido o tipo de ajuda de que o paciente necessitava. Considerando os dados da categoria de resposta de insatisfação, que inclui os escores de muita insatisfação (escore 1) e insatisfação (escore 2), apenas 2,90% dos entrevistados classificaram dessa maneira os seguintes itens: tipo de ajuda esperada, privacidade no tratamento, confidencialidade das informações e benefício recebido com o tratamento. Avaliação de satisfação e sobrecarga Satisfação dos profissionais com o serviço Na Tabela 5, são apresentados os resultados da análise descritiva da satisfação dos profissionais, avaliada pelas médias, desvios-padrão do escore global e das subescalas e valor p referentes à análise das subescalas. A média global de satisfação dos profissionais foi de 4,05 em uma escala que varia de 1 a 5 pontos. Esse resultado indica que a avaliação dos profissionais sobre esse serviço se situa entre satisfação (escore 4) e muita satisfação (escore 5). As médias encontradas para cada subescala foram submetidas a uma análise comparativa por meio da análise de variância (ANOVA). Os resultados indicaram que a satisfação dos profissionais não diferiu entre as dimensões do serviço avaliadas pelas subescalas (F=2,23 e p=0,10). A Tabela 6 apresenta os dados de porcentagens para cada item específico da escala de satisfação dos profissionais. Pode-se observar que todos os profissionais (100,00%) se consideraram Tabela 5. Médias, desvios-padrão do escore global e das subescalas e valor p referentes às subescalas da SATIS-BR profissionais, obtidos pela análise de variância Subescalas e escala global 1. Satisfação com a qualidade dos serviços oferecidos 2. Satisfação com a participação da equipe no serviço 3. Satisfação com as condições de trabalho 4. Satisfação com o relacionamento no serviço Escala global Média 4,27 3,91 3,86 4,29 4,05 DP 0,31 0,51 0,47 0,41 0,41 Valor p Insatisfeito % resposta 1 e 2 2 (25,00) 1 (12,50) 1 (12,50) - Mais ou menos % resposta 3 5 (62,50) 1 (12,50) 1 (12,50) 2 (25,00) Satisfeito % resposta 4 e 5 8 (100) 1 (12,50) 8 (100) 7 (87,50) 8 (100) 7 (87,50) 7 (87,50) 7 (87,50) 6 (75,00) 1 (12,50) 5 (62,50) 1 (12,50) - 1 (12,50) 1 (12,50) 2 (25,00) 2 (25,00) 1 (12,50) - 8 (100) 7 (87,500 7 (87,50) 7 (87,50) 8 (100) 1 (12,50) 5 (62,50) 8 (100) 7 (87,50) 8 (100) - 1 (12,50) - 7 (87,50) 8 (100) 8 (100) 2 (25,00) 1 (12,50) - 1 (12,50) 1 (12,50) 4 (50,00) - 8 (100) 8 (100) 7 (87,50) 8 (100) 8 (100) 8 (100) 6 (75,00) 7 (87,50) 3 (37,50) 8 (100) 0,10 ANOVA: F=2,23; p>0,05; DP: desvios-padrão. Tabela 6. Porcentagem de resposta para cada item da Escala SATIS-BR para profissionais Itens da escala 1. Satisfeito com este serviço 2. Expectativa de ser promovido 3. Grau de responsabilidade de seu serviço 4. Relacionamento com os colegas 5. Controle de seus supervisores de seu trabalho 6. Grau de autonomia com seu serviço 7. Discussões profissionais entre colegas 8. Grau de participações nas decisões no serviço 9. Grau de participações na implementação de programas e/ou atividades novas no serviço 10. Participações na avaliação do programa e/ou atividades 11. Atenção às suas opiniões 12. Perceber o bom clima no trabalho 13. Satisfeito com o clima no trabalho 14. Clima de amizade no trabalho 15. Satisfação do o salário 16. Benefício que recebem deste trabalho 17. Satisfação com a atenção e os cuidados dados aos pacientes 18. Profissionais do serviço compreendem os problemas dos pacientes 19. Profissionais de saúde mental do serviço compreendeu o tipo de ajuda de que pacientes precisam 20. Serviço apropriado para as necessidades globais dos pacientes 21. Satisfação com informações dadas aos pacientes sobre suas doenças 22. Satisfação com as informações dadas aos pacientes sobre seu tratamento 23. Satisfação com a forma como os pacientes são tratados 24. Quantidade de ajuda que é dada aos pacientes 25. Medidas para assegurar a privacidade durante o tratamento 26. Medidas para assegurar a confidencialidade 27. Satisfação com a frequência de contato entra a equipe e o paciente 28. Satisfação com o grau de competência profissional 29. Satisfação em relação às medidas de segurança no CERSAM 30. Satisfação com o conforto e aparência do CERSAM 31. Como classificaria as instalações do serviço 32. Recomendaria o serviço para um amigo ou familiar Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 87 Cleucimara Aparecida Camilo, Marina Bandeira, Rosangela Maria de Almeida Camarano Leal, João Domingos Scalon satisfeitos (escore 4) a muito satisfeitos (escore 5) em relação aos 15 itens destacados na Tabela 6. Em relação à categoria de resposta intermediária “mais ou menos” (escore 3), que se situa entre insatisfação e satisfação, pode-se observar que uma porcentagem expressiva de profissionais (62,50%) considerou essa categoria intermediária de satisfação para o item referente à expectativa de ser promovido. Ao considerarmos a categoria de escores de insatisfação, que incluem muita insatisfação (escore 1) e insatisfação (escore 2), observa-se que 62,50%, 25,00% e 25,00% dos profissionais se consideraram insatisfeitos em relação aos seguintes itens: salário recebido, expectativa de promoção e medidas de segurança tomadas. Sobrecarga dos profissionais no trabalho Na Tabela 7, são apresentados os resultados dos escores globais e das subescalas da IMPACTO-BR para a análise descritiva da sobrecarga no trabalho dos profissionais, avaliada pelas médias, desvios-padrão e valor p. A média global de sobrecarga dos profissionais foi de 1,65 em uma escala que varia de 1 a 5 pontos, indicando valores baixos de sobrecarga. As médias dos escores das subescalas foram submetidas a uma análise de variância (ANOVA). Os resultados indicaram que o grau de sobrecarga dos profissionais não diferiu em relação às dimensões avaliadas pelas subescalas (F=3,21; p=0,06). Na Tabela 8, são apresentados os resultados da análise dos itens específicos da escala IMPACTO-BR, em termos das porcentagens de respostas 1 e 2 (sobrecarga baixa) e 4 e 5 (sobrecarga alta). Em relação à categoria de sobrecarga baixa, verificou-se que todos os profissionais (100%) relataram-na em relação aos itens que estão destacados na Tabela 8, indicando que se sentiam de forma alguma (escore 1) a não muito (escore 2) sobrecarregados em relação aos seguintes itens: tomar mais medicação após esse Tabela 7. Médias, desvios-padrão do escore global e das subescalas e valor p referentes às subescalas da IMPACTO-BR, obtidos pela análise de variância Subescalas e escala global 1. Efeitos sobre a saúde física e mental 2. Efeitos no funcionamento da equipe 3. Sentimento de estar sobrecarregado Escala Global Média 1,32 1,81 2,05 1,65 DP 0,47 0,58 0,67 0,47 Valor p Mais ou menos % resposta 3 2 (25,00) 3 (37,50) Sobrecar-regado % respostas 4 e 5 2 (25,00) 3 (37,50) 1 (12,50) 1 (12,50) 2 (25,00) - 1 (12,50) 3 (37,50) - 2 (25,00) - 1 12,50 1 12,50 2 25,00 - - 1 12,50 2 25,00 - 2 (25,00) 1 (12,50) - - - 0,06 ANOVA: F=3,21; p>0,05; DP: desvios-padrão. Tabela 8. Porcentagens de resposta para cada item da escala IMPACTO-BR Não sobrecar-regado % resposta 1 e 2 1. Sentimento de frustração com resultado do trabalho 6 (75,00) 2. Sentimento de sobrecarga ao lidar com portadores de transtorno 3 (37,50) mental 3. Receio de ser agredido pelos pacientes 3 (37,50) 4. Trabalho afetando estado geral de saúde física 7 (87,50) 5. Aumento de problema ou queixas físicas após trabalhar em 7 (87,50) saúde mental 6. Aumento da necessidade de procurar médicos 7 (87,50) 7. Toma mais medicação após este serviço 8 (100,00) 8. Sentimento de cansaço físico após dia de trabalho 3 (37,50) 9. Afastamento por doença relacionada com período de estresse no 8 (100,00) trabalho 10. Contato com paciente tem afetado sua estabilidade emocional 7 (87,50) 11. Presença de distúrbio de sono relacionado com o trabalho 7 (87,50) 12. Sentimento de depressão por trabalhar com doentes mentais 8 (100,00) 13. Sentimento de estresse por causa do trabalho 6 (75,00) 14. Precisou de ajuda de um profissional de saúde mental devido a 8 (100,00) seu trabalho 15. Desejo de outro emprego para sentir mais emocionalmente saudável 5 (62,50) 16. Pensa em mudar de campo de trabalho 5 (62,50) 17. Sente que trabalhar com os pacientes interfere em seu 8 (100,00) relacionamento familiar 18. Contato com os pacientes afeta sua vida pessoal e social 8 (100,00) Itens da escala 88 Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 Avaliação de satisfação e sobrecarga serviço, afastamento por doença relacionado com o período de estresse no trabalho, sentimento de depressão por trabalhar com doentes mentais, necessidade de pedir ajuda de um profissional de saúde mental devido ao trabalho, sentimento de que trabalhar com os pacientes interfere em seu relacionamento familiar e de que o contato com os pacientes afeta sua vida pessoal e social. Em relação à categoria de resposta intermediária “mais ou menos” (escore 3), pode-se observar que 37,50% dos profissionais indicaram essa categoria com relação aos seguintes itens: sentimento de sobrecarga ao lidar com portadores de transtorno mental, receio de ser agredido fisicamente pelos pacientes e sentimento de cansaço físico após o dia de trabalho. Observou-se também que 25,00% dos profissionais indicaram essa categoria de sobrecarga em relação aos seguintes itens: sentimento de frustração com o resultado do trabalho, sentimento de estresse por causa do trabalho e desejo de mudança de campo de trabalho. Na categoria de sobrecarga alta (escore 4 e 5), pode-se observar que esta foi indicada pelos profissionais em relação aos seguintes itens: sentimento de sobrecarga ao lidar com portadores de transtorno mental, receio de ser agredido fisicamente pelos pacientes, sentimento de cansaço físico após o dia de trabalho e desejo de trabalhar em outro emprego. Para esses itens, 25,00% dos profissionais consideraram sentirem-se de muito (escore 4) a extremamente sobrecarregados (escore 5). Tabela 9. Médias e desvios-padrão referentes à comparação das subescalas, obtidos pelo test t de Student, análise de variância ANOVA e teste post hoc de Tukey Comparação das subescalas Subescala A Subescala B Subescala A Objetivas Subescala D Subescala B Subescala D Subescala A Subjetivas Subescala B Média (DP) 2,51 (1,05) 1,47 (0,70) 2,51 (1,05) 1,48 (0,97) 1,47 (0,70) 1,48 (0,97) 1,55 (0,73) 3,16 (0,66) Valor p 0,00**a 0,00**a 1,00a 0,00**b **p<0,01; aPost hoc de Tukey; bTeste t de Student ; DP: desvios-padrão. Os resultados da análise qualitativa, referente ao trabalho dos profissionais no serviço, mostraram alguns entraves que interferiram na atividade de atendimento dos profissionais. Verificaram-se constantes interrupções no trabalho, que interferiam no desempenho dos profissionais. Os profissionais relataram também que sentiam dificuldades em realizar simultaneamente tarefas de natureza distintas. O impacto provocado pelo envolvimento afetivo com os pacientes foi outro fator destacado pelos profissionais como fonte de sobrecarga. Outros aspectos de dificuldade, encontrados no serviço, se referiram à imprevisibilidade, à falta de instrumentos básicos para realização do trabalho, ao número reduzido de profissionais e às precárias condições de trabalho. Sobrecarga dos familiares com o papel de cuidador Na Tabela 9, são apresentados os resultados globais e por subescalas dos escores médios de sobrecarga objetiva e subjetiva. Os resultados indicaram que os familiares apresentaram, em média, sobrecarga global objetiva baixa (subescalas A, B e D), com o valor de 1,91, indicando que a frequência dos cuidados concretos prestados aos pacientes ocorreu entre nenhuma vez por semana (escore 1) e menos de uma vez por semana (escore 2). Em relação ao grau de sobrecarga global subjetiva, obteve-se média global (subescalas A e B) de sobrecarga de 2,58, indicando que os familiares, em média, sentiram-se entre muito pouco (escore 2) e um pouco (escore 3) sobrecarregados por auxiliar os pacientes nas tarefas diárias. Os escores médios obtidos nas subescalas objetivas foram comparados a partir de uma análise da variância (ANOVA) e teste post hoc de Tukey. Os dados da Tabela 10 mostram que o grau de sobrecarga objetiva diferiu nas subescalas A e B (p=0,00), A e D (p=0,00) e não diferiu nas subescalas B e D (p=1,00). Esses resultados indicam que os familiares cuidadores apresentaram sobrecarga objetiva (frequência de cuidados prestados) significativamente mais elevada na assistência prestada ao paciente na vida cotidiana (subescala A=2,51), comparativamente às demais subescalas. Os familiares Tabela 10. Porcentagens de respostas dos familiares para cada item da subescala E e dos itens C5 e D2 das subescalas subjetivas da FBIS-BR Não sobrecar-regado Mais ou menos Sobrecar-regado % respostas 1 e 2 % respostas 3 % respostas 4 e 5 C: Gastos C5: Peso dos gastos com o paciente 71,40 20,00 D: Impacto na rotina diária do cuidador D2: Impacto permanente na vida do cuidador 60,00 40,00 E1. Segurança física 8,60 14,30 77,10 E2. Qualidade do tratamento 80,00 17,10 2,90 E3. Vida social 42,80 2,90 54,30 E: Preocupação com o paciente E4. Saúde 2,90 17,10 80,00 E5. Moradia 85,70 5,70 8,60 E6. Finanças 37,10 11,40 51,50 E7. Futuro 5,80 11,40 82,80 Subescalas Itens Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 89 Cleucimara Aparecida Camilo, Marina Bandeira, Rosangela Maria de Almeida Camarano Leal, João Domingos Scalon precisaram supervisionar os comportamentos problemáticos dos pacientes entre nenhuma vez e menos de uma vez por semana (subescala B=1,47) e tiveram suas rotinas alteradas também entre nenhuma vez e menos de uma vez por semana (subescala D=1,48). Em relação aos dados de sobrecarga subjetiva, os escores médios obtidos para as subescalas foram submetidos ao teste t de Student. Os resultados mostraram que houve diferença estatisticamente significativa entre as subescalas A e B (p=0,00). Esse resultado indicou que o grau de incômodo sentido pelos familiares foi significativamente maior em relação à supervisão dos comportamentos problemáticos do que em relação aos cuidados cotidianos prestados aos pacientes. Os familiares se sentiram entre um pouco (escore 3) e muito incomodados (escore 4) por supervisionar os comportamentos problemáticos dos pacientes (subescala B=3,16) e entre nem um pouco (escore 1) e muito pouco (escore 2) incomodados por auxiliar os pacientes em suas tarefas cotidianas (subescala A=1,55). Não foi possível comparar essas duas subescalas subjetivas com a escala subjetiva E, que avalia as preocupações dos familiares com os pacientes, tendo em vista as diferenças em suas pontuações. Na Tabela 10, são apresentados os dados de cada item das subescalas, referentes à sobrecarga subjetiva dos familiares, avaliada a partir das porcentagens de respostas 1 e 2 (sobrecarga baixa) e de respostas 3 e 4 (sobrecarga elevada), obtidas para a subescalas E (preocupação com o paciente), ao item C5 da subescala C (gastos) e ao item D2 da subescala D (impacto na rotina diária do familiar cuidador). Essas subescalas avaliam o grau de incômodo (sobrecarga subjetiva) do familiar cuidador. Em relação à frequência com que o familiar considerou sentir o peso financeiro do papel do cuidador no último ano (subescala C – item C5), os resultados da Tabela 10 indicam que uma porcentagem considerável dos familiares cuidadores (71,40%) se sentiu entre nunca e raramente incomodada, indicando uma sobrecarga subjetiva baixa (escores 1 e 2). No entanto, outra parte dos familiares cuidadores (20,00%) relatou sentir que seus gastos com os pacientes eram pesados frequentemente (escore 4) a sempre ou quase sempre (escore 5). No que se refere ao impacto permanente do papel de cuidador na vida dos familiares (item D2), verificou-se que 60,00% dos familiares apresentaram sobrecarga baixa (escores 1 e 2) e que 40,00% consideraram que a doença do paciente provocou mudanças permanentes em sua rotina diária, no trabalho ou na vida social, acarretando uma sobrecarga subjetiva elevada. Quanto às preocupações com os pacientes (subescala E), uma porcentagem considerável dos familiares (82,80%) considerou que se sentiam frequentemente (escore 4) a sempre ou quase sempre (escore 5) preocupados com o futuro dos pacientes. Esse resultado demonstrou que, em relação a esse 90 Cad. Saúde Colet., 2012, Rio de Janeiro, 20 (1): 82-92 item, os familiares apresentaram sobrecarga subjetiva alta (escores 4 e 5). Ao considerarmos a sobrecarga subjetiva baixa (escores 1 e 2), os dados demonstram que 80,00% dos familiares nunca ou raramente se sentiam preocupados com a qualidade do tratamento que os pacientes recebiam. DISCUSSÃO Os resultados deste estudo apresentaram algumas convergências das avaliações da satisfação com o serviço nas perspectivas dos pacientes, familiares e profissionais. De modo geral, em consonância com a literatura nacional, os resultados indicaram níveis elevados de satisfação dos três atores, com a maioria dos aspectos avaliados no serviço5,9-12. Esse resultado, sobretudo em relação aos pacientes e familiares, pode indicar a presença de aceitabilidade social, sendo um fator importante para a qualidade do serviço, servindo para influenciar e potencializar os efeitos do tratamento27. A compreensão da equipe sobre as necessidades do paciente e a qualidade dos cuidados dispensados aos pacientes foram dois aspectos do serviço que geraram satisfação dos três atores. Constatou-se também que pacientes e profissionais sentiam-se satisfeitos ou muito satisfeitos em relação ao tipo de tratamento oferecido, ao tipo de informações dadas e à competência da equipe. Considerando a competência do profissional com quem os pacientes e familiares trabalharam mais de perto, observou-se também a satisfação desses dois atores. A coerência dessas avaliações, na perspectiva dos três atores, aponta para a qualidade de um serviço. Considerando a satisfação dos pacientes, verificou-se que eles se sentiam mais satisfeitos em relação ao atendimento dos profissionais do que em relação às características do serviço, em consonância com os resultados dos estudos brasileiros de Jaegger et al.10 e Kantorski et al.11. Os únicos itens que apresentaram porcentagens de insatisfação dos pacientes estiveram relacionados ao conforto e aparência do serviço, e condições gerais das instalações. No estudo de Kantorski et al.11, os resultados evidenciaram também que a fragilidade dos serviços está relacionada às condições de infraestrutura. O presente trabalho encontrou poucos efeitos da sobrecarga do trabalho na equipe, quando avaliada pelos escores da escala de sobrecarga. Esse resultado está em consonância com os estudos brasileiros de Marco et al.4 e Pelisoli et al.5. A satisfação apresentada pelos profissionais, com a maioria dos aspectos do serviço, talvez tenha sido um fator que contribuiu para um baixo sentimento de sobrecarga no trabalho. Entretanto, a análise dos itens isolados da escala mostrou sentimento de sobrecarga dos profissionais, pelo fato de trabalharem com portadores de transtornos psiquiátricos, cansaço Avaliação de satisfação e sobrecarga físico após o serviço, medo de ser agredido e desejo de mudar de emprego A análise qualitativa apontou alguns entraves que ocorreram na atividade de atendimento dos profissionais. Por exemplo, verificaram-se constantes interrupções no trabalho. Segundo Normand28, interrupções constantes na atividade de trabalho provocam um esforço consciente de atenção sobre a tarefa. Essas interrupções podem gerar erros, diante da impossibilidade de não manutenção da memória ativa, para a execução da tarefa. Foram observadas também as dificuldades dos profissionais em realizar tarefas de natureza distintas, o impacto provocado pelo envolvimento afetivo com os pacientes, a imprevisibilidade, a falta de equipamentos básicos para a realização do trabalho, o número reduzido de profissionais e as precárias condições de trabalho. Considerando a sobrecarga dos familiares cuidadores, foi verificada alta frequência das tarefas cotidianas de assistência aos pacientes, acarretando elevada sobrecarga objetiva para a maioria dos familiares cuidadores. No Brasil, esse aspecto havia sido apontado, até então, apenas por Barroso et al.13 e Albuquerque29. Em estudos internacionais, já se havia observado que as tarefas cotidianas de assistência aos pacientes acarretavam maior sobrecarga objetiva aos familiares30,31. Com relação à sobrecarga subjetiva dos familiares, o presente estudo observou maior grau de incomodo na supervisão aos comportamentos problemáticos dos pacientes, às modificações permanentes ocorridas na vida social e profissional dos familiares, como resultado do papel de cuidador e as preocupações com os pacientes. Esses resultados corroboram os dados do estudo de Barroso et al.13. O presente estudo apresenta algumas limitações. Como se trata da avaliação de um único serviço, que apresenta suas peculiaridades, os resultados têm reduzido potencial de generalização. Por ser um estudo descritivo, apresenta ainda a limitação de não ter incluído a análise dos fatores associados à satisfação e sobrecarga. CONCLUSÃO O presente trabalho possibilitou a realização de uma avaliação integrativa de um serviço de saúde mental a partir da perspectiva dos três atores envolvidos no serviço: pacientes, familiares e profissionais. Foram observados níveis elevados de satisfação, com os principais aspectos do serviço, o que pode indicar que, em geral, houve uma boa aceitabilidade desses três atores ao sistema de atendimento em saúde mental. Esse nível de satisfação pode ser um indicativo ou preditor de adesão ao tratamento tanto pelos pacientes quanto pelos familiares. Da mesma forma, o nível elevado de satisfação dos profissionais pode ser um indicativo da qualidade do atendimento oferecido aos pacientes e familiares. Os aspectos levantados como menos satisfatórios poderão fornecer subsídios para a implementação de melhorias no serviço que possam aumentar a qualidade do atendimento, como a melhoria das condições físicas e infraestrutura do serviço, a melhoria das condições de trabalho da equipe e a necessidade de apoio aos familiares, aspectos estes destacados nos dados coletados no presente estudo. Observou-se um baixo sentimento de sobrecarga no trabalho em geral, apesar da sobrecarga apontada por eles com relação a pontos específicos, como o medo de ser agredido e sobrecarga por lidar com portadores de transtornos mentais. As avaliações qualitativas no contexto real de trabalho apontaram igualmente aspectos que necessitam ser melhorados para a realização mais efetiva do trabalho destes profissionais no serviço. Observou-se elevada sobrecarga objetiva dos familiares na assistência aos pacientes na vida cotidiana e alta sobrecarga subjetiva ou incômodo com relação à atividade de supervisionar os comportamentos problemáticos dos pacientes, às preocupações com os pacientes e às mudanças permanentes em suas vidas, em função do papel de cuidador. Esses resultados apontam para a necessidade de serem desenvolvidas intervenções com os familiares, visando fornecer informações, apoio e ajuda, a fim de que possam desenvolver estratégias para lidar com os pacientes. Referências 1. 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