Integraç˜ao Numérica

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Capı́tulo 9
Integração Numérica
9.1
Introdução
A integração numérica é o processo computacional capaz de produzir um valor numérico para a
integral de uma função sobre um determinado conjunto. Ela difere do processo de antidiferenciação,
aprendido em Cálculo, na medida em que não se procura uma função F tal que F = f ; aqui,
vamos procurar substituir f por uma outra função, g – tal que f ≈ g – mais amena à integração
(por exemplo, g é um polinômio). Nesse caso, a solução numérica de
b
f (x) dx
(9.1)
a
será obtida calculando-se
b
g(x) dx,
g≈f
a
Veremos, a seguir, o processo de integração numérica via interpolação polinomial e os diferentes
métodos daı́ derivados.
9.2
Integração numérica via interpolação polinomial
Suponha a integral (9.1); podemos selecionar um conjunto de nós x0 , x1 , . . ., xn no intervalo [a, b]
e interpolar a função f (x) através dos polinômios de Lagrange, os quais são expressos como
p(x) =
n
f (xi )li (x)
(9.2)
i=0
onde
li (x) =
n
x − xj
,
x
i − xj
j=0
i = 0, 1, . . . , n
(9.3)
j=i
Agora, substituı́mos f (x) por p(x), de tal forma que
b
f (x) dx ≈
a
b
p(x) dx =
a
n
i=0
b
f (xi )
li (x) dx
(9.4)
a
a qual pode ser usada para calcular a integral de qualquer função. A equação acima pode ser
reescrita na forma
b
n
f (x) dx ≈
Ai f (xi )
(9.5)
a
i=0
161
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Figura 9.1: A regra do trapézio.
onde
Ai =
b
li (x) dx
a
a qual é conhecida como a forma de Newton-Cotes, se os pontos xi forem igualmente espaçados.
A partir da equação (9.5), pode-se derivar várias regras de integração, dependendo do grau do
polinômio de Lagrange.
9.2.1
Regra do Trapézio
Se tomarmos n = 1, e usarmos como nós os pontos extremos do intervalo, i.e. x0 = a, x1 = b,
obtemos a chamada regra do trapézio. Nesse caso, os polinômios interpoladores são
l0 (x) =
de onde
b
b−x
,
b−a
l1 (x) =
1
l0 (x) dx = (b − a) =
2
A0 =
a
x−a
b−a
b
l1 (x) dx = A1
a
Assim, escrevendo a equação (9.5) para esse caso particular, temos
b
a
f (x) dx ≈
b−a
(f (a) + f (b))
2
(9.6)
a qual define a regra do trapézio. Essa fórmula é exata para qualquer polinômio de grau igual a
1, no máximo; o erro associado a essa aproximação é dado por
−
1
(b − a)3 f (ξ),
12
a<ξ<b
(9.7)
Ao usarmos a regra do trapézio, estamos substituindo a função f por uma reta, no intervalo
[a, b], conforme a figura 9.1. É claro que essa aproximação pode ser bastante crua, se | b − a | é
grande (o contrário também é verdade).
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
162
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Exemplo 9.1 Calcule a integral
2
A=
x2 + 3x dx
1
usando a regra do trapézio.
Solução: Usando a fórmula (9.6), temos
A=
Como a antiderivada F (x) =
definida, temos
x3
3
2−1
14
(4 + 10) =
=7
2
2
2
+ 3x2 é conhecida, podemos avaliar o erro. Calculando a integral
2
3x2 x3
+
x + 3x dx =
= 6, 8333
3
2 1
2
2
1
de onde podemos calcular o erro como sendo igual a 6, 8333 − 7 = −0, 1667. Usando a fórmula
(9.7), com f = 2, obtemos o valor
−
1
1
(2 − 1)3 2 = − = −0, 1667
12
6
o qual é igual ao calculado anteriormente.
Podemos, evidentemente, obter uma melhor aproximação se subdividirmos o intervalo [a, b],
calculando nós x0 , x1 , . . ., xn satisfazendo
a = x0 < x1 < . . . < xn = b
e aplicando a regra do trapézio a cada subintervalo (não necessariamente de mesmo tamanho).
Essa estratégia nos leva à regra composta do trapézio,
b
f (x) dx
=
a
n xi
f (x) dx
xi−1
i=1
1
(xi − xi−1 ) (f (xi−1 ) + f (xi ))
2 i=1
n
≈
(9.8)
A regra composta do trapézio nos leva à aproximação da função f (x) por um conjunto de retas
unindo cada um dos nós xi , dois a dois, conforme a figura 9.2-a.
Se o espaçamento entre os nós é igual, i.e. xi = a+ih, h = b−a
n , então obtemos a regra composta
uniforme do trapézio,
n−1
b
h
f (a) + 2
f (x) dx ≈
f (a + ih) + f (b)
(9.9)
T (f, h) =
2
a
i=1
conforme a figura 9.2-b. O erro de truncamento E(f, h) associado a essa aproximação é estimado
por
h2
(b − a) max | f (x) |.
(9.10)
E(f, h) ≤
12
x∈[a,b]
Exemplo 9.2 Calcule a integral
A=
2
x2 + 3x dx
1
usando as regras composta e composta uniforme do trapézio.
Solução:
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
163
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
1. Usando a fórmula (9.8), para n = 2 e usando x0 = 1, x1 = 1, 1 e x2 = 2, temos
A=
1
[(1, 1 − 1)(4 + 4, 51) + (2 − 1, 1)(4, 51 + 10)] = 6, 9550
2
e o erro, comparado com o valor da integral definida (= 6, 8333), é de −0, 1217.
2. Usando a fórmula (9.9), para n = 2 e usando x0 = 1, x1 = 1, 5 e x2 = 2, temos
A=
1
[(1, 5 − 1)(4 + 6, 75) + (2 − 1, 5)(6, 75 + 10)] = 6, 8750
2
e o erro, comparado com o valor da integral definida (= 6, 8333), é de −0, 0417.
Note que, em ambos os casos, a aproximação com a regra composta é melhor do que usando a
regra simples do trapézio.
Exemplo 9.3 Considere a tabela abaixo, que fornece a velocidade (km/h) de um certo objeto em
função do tempo e determine qual é a distância percorrida pelo objeto ao final de 2 h.
t
v(t)
0, 00
6, 0
0, 25
7, 5
0, 50
8, 0
0, 75
9, 0
1, 00
8, 5
1, 25
10, 5
1, 50
9, 5
1, 75
7, 0
2, 00
6, 0
Como a distância percorrida (d) é calculada como
2
d=
v(t) dt,
0
pode-se empregar a regra dos trapézios com n = 8, h = 0, 25, de forma que
A=
0, 25
[6 + 2 (7, 5 + 8, 0 + 9, 0 + 8, 5 + 10, 5 + 9, 5 + 7, 0)) + 6] .
2
Portanto, uma aproximação para a distância total percorrida no intervalo de tempo [0, 2] é
d ≈ A = 16, 5km.
Exemplo 9.4 Considere as integrais definidas
3
x
dx
e
2
1 1+x
3
1
dx
7−2x
As tabelas 9.1 e 9.2 mostram as aproximações obtidas usando a regra dos trapézios com n =
1, 2, 4, 8, 16, 32 subintervalos e o erro na aproximação. Note que, à medida que n cresce, h é
sucessivamente dividido por 2 e cada erro é aproximadamente 14 do erro anterior.
n
1
2
4
8
16
32
h
2, 0
1, 0
0, 5
0, 25
0, 125
0, 0625
A
0, 800000
0, 800000
0, 803183
0, 804311
0, 804615
0, 804693
E(f, h)
0, 004719
0, 004719
0, 001536
0, 000408
0, 000104
0, 000026
Tabela 9.1: Aproximação para
3
x
1 1+x2
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
dx.
164
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
n
1
2
4
8
16
32
h
2, 0
1, 0
0, 5
0, 25
0, 125
0, 0625
A
1, 200000
0, 933333
0, 841667
0, 814484
0, 807203
0, 805343
E(f, h)
−0, 395281
−0, 128614
−0, 036948
−0, 009765
−0, 002484
−0, 000624
3
dx
1 7−2 x .
Tabela 9.2: Aproximação para
9.2.2
Método dos Coeficientes a Determinar
A equação (9.5) (fórmula de Newton-Cotes) é um caso particular do método dos coeficientes a
determinar.
Suponha, por exemplo, que n = 2 e [a, b] = [0, 1]. Nesse caso, os polinômios de Lagrange,
escritos para os nós 0, 12 e 1, são
1
l0 (x) = 2(x − )(x − 1),
2
l1 (x) = −4x(x − 1),
1
l2 (x) = 2x(x − )
2
de onde podemos escrever
A0
0
A1
0
=
0
l0 dx =
1
6
l1 dx =
2
3
l2 dx =
1
6
1
=
A2
1
=
1
Os mesmos coeficientes Ai podem ser obtidos usando o método aqui descrito. Suponha que
1
1
f (x) dx ≈ A0 f (0) + A1 f
+ A2 f (1)
2
0
a qual deve ser exata para qualquer polinômio de grau igual ou inferior a 2. Para determinar os
coeficientes, usamos as funções base 1, x e x2 – i.e., p(x) = c0 + c1 x + c2 x2 – e escrevemos
0
0
1
1
dx
=
1 = A0 + A1 + A2
x dx
=
1
1
= A1 + A2
2
2
x2 dx
=
1
1
= A1 + A2
3
4
0
1
o que nos leva ao sistema de equações lineares

 A0 + A1 + A2
1
2 A1 + A2

1
4 A1 + A2
=
=
=
1
1
2
1
3
o qual tem a seguinte solução: A0 = 16 , A1 = 23 , A2 = 16 .
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
165
Introdução ao Cálculo Numérico
9.2.3
Integração Numérica
Regra de Simpson
A regra de Simpson é obtida a partir do método dos coeficientes a determinar, generalizada para
um intervalo de integração [a, b] qualquer. Ela é obtida a partir da integral de um polinômio
interpolador de segundo grau p2 (x) que passa por três pontos igualmente espaçados, (a, f (a)),
(m, f (m)), e (b, f (b)), onde m = (a + b)/2. Assim, tomando h = b−a
2 , tem-se
b
b
∆2 f (a)
∆f (a)
+ (x − a)(x − m)
p2 (x) dx =
f (a) + (x − a)
dx
(9.11)
h
2 h2
a
a
Para facilitar o cálculo, faz-se a mudança de variável x(α) = a + α h. Assim, enquanto x
percorre o intervalo [a, b], α percorre o intervalo [0, 2] e dx = h dα. Desta maneira,
2
b
∆2 f (a)
p2 (x) dx =
f (a) + α ∆f (a) + α (α − 1)
hdα
2
a
0
h
[f (a) + 4 f (m) + f (b)]
(9.12)
=
3
de onde a fórmula de Simpson pode ser escrita como
b
b−a
a+b
h
f (x) dx ≈ [f (a) + 4 f (m) + f (b)] =
f (a) + 4f
+ f (b)
3
6
2
a
(9.13)
a qual é exata para polinômios de grau n ≤ 2 (conforme visto na seção anterior) e, inesperadamente,
também para n ≤ 3. O erro associado à regra de Simpson é
−
1
(b − a)5 f (4) (ξ),
90
a<ξ<b
(9.14)
Usando a mesma estratégia da regra composta uniforme do trapézio, podemos obter a regra
composta uniforme de Simpson, para um número n par 1 de subintervalos. Nesse caso, temos
x2
x4
xn
b
f (x) dx =
f (x) dx +
f (x) dx + . . . +
f (x) dx
a
x0
=
x2
n
2
x2i
i=1
x2i−2
xn−2
f (x) dx
de onde, aplicando a regra de Simpson a cada um dos subintervalos, obtemos


n
n
b
2
2
h
f (x) dx ≈ f (x0 ) + 2
f (x2i−2 ) + 4
f (x2i−1 ) + f (xn )
S(f, h) =
3
a
i=2
i=1
O erro associado é
−
1
(b − a)h4 f (4) (ξ),
180
Exemplo 9.5 Calcule a integral
A=
2
a<ξ<b
(9.15)
(9.16)
x2 + 3x dx
1
usando a regra de Simpson.
Solução: Usando a fórmula (9.13), temos
A=
2−1
[4 + 4 · 6, 75 + 10] = 6, 8333
6
e o erro é nulo, comparado com o valor da integral definida (= 6, 8333). Note que, para a função
em questão, f (4) = 0 e, portanto, a aproximação da integral pela regra de Simpson deve ser exata.
1 É
necessária essa restrição devido à forma como a regra de Simpson foi definida.
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
166
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Exemplo 9.6 Use a fórmula de Simpson para encontrar a área sob a curva y = f (x) que passa
sob os três pontos (0, 2), (1, 3) e (2, 2).
Como n = 1 e h = 1, calcula-se
área ≈ S(f, h) =
1
16
h
[f (0) + 4 f (1) + f (2) ] = [2 + 12 + 2] =
.
3
3
3
Exemplo 9.7 O volume de um sólido de revolução é dado por
b
volume = π
[R(x)]2 dx,
a
onde o sólido é obtido pela rotação da região sob a curva y = R(x), a ≤ x ≤ b, em torno do eixo
x. Use a fórmula de Simpson para aproximar o volume do sólido de revolução, onde o raio R(x)
da posição ao longo do eixo x é dado na tabela
x
R(x)
0
6, 2
1
5, 8
2
4, 0
3
4, 6
4
5, 0
5
7, 6
6
8, 2
Usando a regra de Simpson com n = 3 e h = 1, o valor aproximado da integral é calculado por
volume
9.2.4
π
2
2
2
2
2
2
2
[f (x0 ) + 4 (f (x1 ) + f (x3 ) + f (x5 ) ) + 2 (f (x2 ) + f (x4 ) ) + f (x6 ) ]
3
π
[(6, 2)2 + 4 ((5, 8)2 + (4, 6)2 + (7, 6)2 ) + 2 ((4, 0)2 + (5, 0)2 ) + (8, 2)2 ]
≈
3
π
[38, 44 + 4 (33, 64 + 21, 16 + 57, 76) + 2 (16, 00 + 25, 00) + 67, 24]
≈
3
≈ 668, 03
≈
Regra de Simpson com exatidão crescente
Esta regra calcula uma aproximação por Simpson com uma combinação linear de fórmulas dos
trapézios, {T (J)}. Para J ≥ 1, divide-se o intervalo [a, b] em 2 n = 2J subintervalos de igual
e usa-se os pontos a = x0 < x1 < . . . < x2 n = b, xk = a + h k para k =
espaçamento h = b−a
2J
0, 1, . . . , 2 n. A regra dos trapézios T (f, h) e T (f, 2 h) para espaçamentos h e 2 h, respectivamente,
obedece a relação
n
T (f, 2 h)
+h
f (x2 k−1 ).
(9.17)
T (f, h) =
2
k=1
h
2 (f (a)
+ f (b)), então para qualquer inteiro positivo J define-se T (J) = T (f, h)
Definindo T (0) =
e T (J − 1) = T (f, 2 h), o que permite escrever a fórmula acima como
n
T (J − 1)
+h
T (J) =
f (x2 k−1 )
2
para
J = 1, 2, . . .
(9.18)
k=1
Assim, a regra de Simpson S(J) = S(f, h) para 2J subintervalos é obtida de T (J) e de T (J − 1)
pela fórmula
4 T (J) − T (J − 1)
para
J ≥1
(9.19)
S(J) =
3
Exemplo 9.8 Use a regra de Simpson com exatidão crescente para calcular aproximações S(1),
S(2) e S(3) para
1
5
dx
x
Solução: Neste caso, a = 1, b = 5 e f (x) = x1 .
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
167
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
1. Cálculo de S(1): Para calcular a primeira aproximação, S(1), é preciso conhecer T (0) e
T (1):
(a) Cálculo de T (0): se J = 0, conseqüentemente h = b − a = 4. Logo,
T (0) = 4
1
1
+
2
1
5
= 2, 4
(b) Cálculo de T (1): se J = 1, conseqüentemente n = 1 e h =
x1 = a + h = 3,
b−a
21
= 2. Logo, com
2, 4
T (0)
1
+ h f (x1 ) =
+ 2 = 1, 866666
2
2
3
T (1) =
Assim,
S(1) =
4 T (1) − T (0)
= 1, 688888
3
2. Cálculo de S(2): como T (1) já é conhecido, calcula-se apenas T (2) com n = 2, h =
x1 = a + h = 2 e x3 = a + 3 h = 4:
b−a
22
= 1,
2
T (2) =
=
=
de forma que
S(2) =
T (1) +
[f (x1 ) + f (x3 )]
2
k=1
1 1
1, 866666
+
+
2
2 4
1, 683333
4 T (2) − T (1)
= 1, 622222
3
3. Cálculo de S(3): como T (2) já é conhecido, calcula-se T (3) com n = 4, h =
x1 = a + h = 1, 5, x3 = a + 3 h = 2, 5, x5 = a + 5 h = 3, 5 e x7 = a + 7 h = 4, 5:
b−a
23
= 0, 5,
4
T (3) =
=
=
T (2) +
[f (x1 ) + f (x3 ) + f (x5 ) + f (x7 )]
2
k=1
1
1
1
1
1, 683333
+ 0, 5
+
+
+
2
1, 5 2, 5 3, 5 4, 5
1, 628968
ou seja,
S(3) =
9.2.5
4 T (3) − T (2)
= 1, 610846
3
Mudança do intervalo de integração
Algumas regras de integração são definidas em termos de um intervalo de integração fixo – por
exemplo, [−1, 1]. Caso se deseje utilizar uma dessas regras para se resolver a integral (9.1), pode-se
proceder a uma mudança linear de variáveis.
Suponha uma regra de integração numérica dada por
c
d
f (t) dt ≈
n
Ai f (ti )
(9.20)
i=0
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
168
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
a qual é exata para polinômios de grau igual ou inferior a m. Considere, agora, que o intervalo de
integração desejado é [a, b]; para usarmos a fórmula (9.20), devemos definir uma função λ(t) que
associe c a a e d a b. Essa função pode ser dada por
λ(t) =
ad − bc
b−a
t+
,
d−c
d−c
c≤t≤d
(9.21)
Escrevendo, agora, x = λ(t), temos dx = λ (t) dt = (b − a)(d − c)−1 dt, de onde escrevemos a
integral (9.1) como
b−a
d−c
b
f (x) dx
=
a
b−a
d−c
≈
de onde
a
b
λ−1 (b)=d
f (λ(t)) dt
λ−1 (a)=c
n
Ai f (λ(ti ))
i=0
b−a f (x) dx ≈
Ai f
d−c
n
i=0
b−a
ad − bc
ti +
d−c
d−c
(9.22)
A função de transformação λ(t) deve ser linear de forma que f (λ(t)) seja polinomial e de mesmo
grau que f .
9.2.6
Quadratura Gaussiana
As regras de integração vistas nas seções anteriores são todas baseadas na determinação de
coeficientes Ai tal que a aproximação da função integranda f é exata para polinômios de grau
igual ou inferior a n.
No entanto, é possı́vel escolher outros nós que levem a uma redução no volume de cálculo
necessário. Por exemplo, se Ai = c, ∀ 0 ≤ i ≤ n, então a forma de Newton-Cotes (9.5) pode ser
escrita como
b
n
f (x) dx ≈ c
f (xi)
(9.23)
a
i=0
o que elimina n multiplicações no processo de integração numérica.
As formas de quadratura de Chebyshev são um exemplo da equação (9.23); elas existem apenas
para n = 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 8. Outras formas de quadratura existem, como, por exemplo, as de
Hermite e as de Gauss.
A regra de integração de Gauss é expressa para o caso geral como
b
f (x)w(x) dx ≈
a
n
Ai f (xi )
(9.24)
i=0
onde w é uma função positiva de ponderação. Assumindo que (9.24) é exata para qualquer função
polinomial de grau menor ou igual a n, isso nos leva a determinar os coeficientes Ai como
Ai =
b
w(x)
a
n
x − xj
dx
x
i − xj
j=0
j=i
Carl Friedrich Gauss (1777-1855) mostrou que é possı́vel determinar-se esses coeficientes de tal
forma que a aproximação para f seja exata para polinômios de grau igual ou inferior a 2n + 1,
mas com apenas n avaliações.
As fórmulas de Gauss para a integração de f são exatas para polinômios de grau menor
ou igual a 2 n + 1, de forma que a determinação dos pontos x0 , x1 , . . . , xn em que é necessário
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169
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
conhecer o valor de f (x) será função do grau do polinômio interpolador e da fórmula especı́fica a
ser considerada. Estas formulas são do tipo
b
f (x) dx = w0 f (x0 ) + w1 f (x1 ) + . . . + wn f (xn )
(9.25)
a
Para construir a fórmula da quadratura gaussiana para n = 1 é necessário determinar w0 , w1 ,
x0 e x1 tais que
b
f (x) dx = w0 f (x0 ) + w1 f (x1 )
(9.26)
a
seja exata para polinômios de grau menor ou igual a 3.
Para simplificar os cálculos, determina-se esta fórmula considerando [a, b] = [−1, 1]. No caso
de um intervalo [a, b] genérico efetua-se a mudança de variáveis: para t ∈ [−1, 1] corresponde
x ∈ [a, b] onde
b−a
1
e
dx =
dt
x = [a + b + t (b − a)]
2
2
de forma que
b
b−a 1
f (x) dx =
F (t) dt
(9.27)
2
a
−1
onde F (t) = f (x(t)).
Dizer que a fórmula é exata para polinômios de grau menor ou igual a 3 equivale a dizer que
a fórmula é exata para
g(t) ≡ 1,
g(t) ≡ t2 e
g(t) ≡ t,
g(t) ≡ t3
ou seja
1
1 dt
= w0 g(t0 ) + w1 g(t1 ) = w0 + w1 = 2
t dt
= w0 g(t0 ) + w1 g(t1 ) = w0 t0 + w1 t1 = 0
−1
1
−1
1
−1
1
t2 dt
= w0 g(t0 ) + w1 g(t1 ) = w0 t20 + w1 t21 = 2/3
t3 dt
= w0 g(t0 ) + w1 g(t1 ) = w0 t30 + w1 t31 = 0
−1
Desta forma, obtém-se o seguinte sistema não linear:

=
w0 + w1



w0 t0 + w1 t1 =
w0 t20 + w1 t21 =



w0 t30 + w1 t31 =
2
0
2/3
0
(9.28)
cuja solução fornece
t0 = −
√
3
3
t1 =
√
3
3
w0 = w1 = 1,
Assim, a fórmula gaussiana para n = 1 é
√ √ 3
3
+F
F (t) dt = F −
3
3
−1
1
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(9.29)
170
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
O mesmo procedimento pode ser usado para determinar a fórmula geral (9.25). Supondo que
F (t) represente os polinômios especiais tk para k = 0, 1, . . . , 2n + 1, observa-se que
1
k
t dt =
−1
0
2
k+1
se k é ı́mpar
(9.30)
se k é par
e a solução do sistema não linear que se origina destas equações é bastante complicada. Usando
então a teoria dos polinômios ortogonais, pode ser visto que os tk são as raı́zes de polinômios de
Legendre2 e os coeficientes wk devem ser obtidos pela solução do sistema de equações. Alguns
dos valores de tk e wk são mostrados na tabela 9.3; para quadraturas de maior ordem, pode-se
recorrer aos valores tabelados em vários livros de referência.
n
1
tk
−0, 57735027
0, 57735027
−0, 77459667
0, 00000000
0, 77459667
−0, 86113631
−0, 33998104
0, 86113631
0, 33998104
−0, 90617985
−0, 53846931
0, 00000000
0, 90617985
0, 53846931
2
3
4
wk
1, 00000000
1, 00000000
0, 55555555
0, 88888888
0, 55555555
0, 34785485
0, 65214515
0, 34785485
0, 65214515
0, 23692689
0, 47862867
0, 56888889
0, 23692689
0, 47862867
k
0
1
0
1
2
0
1
2
3
0
1
2
3
4
Tabela 9.3: Pesos e nós da quadratura Gaussiana, para n = 1, 2, 3, 4.
O erro associado à quadratura Gaussiana é dado pela fórmula
f (2n) (ξ)
(2n)!
b
2
q (x)w(x) dx,
a
q(x) =
n−1
(x − xi ), a < ξ < b
(9.31)
i=0
O algoritmo 9.2.1 faz uso da técnica de troca de intervalos e da simetria entre os nós e
coeficientes, a fim de se calcular a integral (9.1) através da quadratura Gaussiana para n = 4.
Na prática, a execução do algoritmo que calcule a integral (9.1) por quadratura Gaussiana sempre
incorrerá em erros de ponto-flutuante, principalmente se os valores dos nós e coeficientes não forem
utilizados com uma precisão adequada, como pode ser visto no exemplo a seguir.
2 Os
polinômios de Legendre são definidos pela seguinte fórmula de recorrência:
p0 (x)
=
1
p1 (x)
=
x
pm+1 (x)
=
1
{(2 m + 1) x pm (x) − m pm−1 (x)} ,
m+1
m = 1, 2, . . .
Suas raı́zes são todas reais e distintas e situam-se no intervalo [−1, 1]. Estas raı́zes estão simetricamente situadas
com respeito à origem e se m é ı́mpar, uma raiz de pm (x) é sempre x = 0.
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171
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Algoritmo 9.2.1 Quadratura Gaussiana de 4 pontos
proc quadratura gaussiana 4(input: a, b, f ; output: S)
x0 ← 0
x1 ← 0, 5384 6931 0105 683
x2 ← 0, 9061 7984 5938 664
w0 ← 0, 5688 8888 8888 889
w1 ← 0, 4786 2867 0499 366
w2 ← 0, 2369 2688 5056 189
u ← ((b − a)x0 + a + b)/2
S ← w0 f (u)
for i = 1, 2 do
u ← ((b − a)xi + a + b)/2
v ← (−(b − a)xi + a + b)/2
S ← S + wi (f (u) + f (v))
endfor
S ← (b − a)S/2
endproc
Exemplo 9.9 Calcule a integral
2
A=
x2 + 3x dx
1
usando a quadratura de Gauss, com n = 4.
Solução: Usando o algoritmo 9.2.1, temos
A = 6, 833333335
e o erro é igual a −2 × 10−9 , comparado com o valor da integral definida (= 6, 8333).
Exemplo 9.10 Integre f (t) = t4 +1 no intervalo (−1, 1) usando quadratura gaussiana para n = 2.
1
I=
−1
(t4 + 1) dt = w0 f (t0 ) + w1 f (t1 ) + w2 f (t2 )
Da tabela 9.3, sabe-se que
t0 = −0, 77459667
w0 = 0, 55555555
t1 = 0, 00000000
t2 = 0, 77459667
w1 = 0, 88888888
w2 = 0, 55555555
Logo,
I
= 0, 55555556 (−0, 77459667)4 + 1
+ 0, 88888889 (0, 00000000)4 + 1
+ 0, 55555556 (0, 77459667)4 + 1
= 2, 4
Sugestão: Calcule esta integral com o método de Simpson e compare os resultados.
Exemplo 9.11 Use quadratura gaussiana com três pontos para aproximar a integral
1
5
dx
x
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172
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Como o intervalo é I = [1, 5], é preciso fazer mudança de variável. Por isto, calcula-se a
integral desejada como
5
dx
b−a 1
=
F (t) dt
x
2
1
−1
com a mudança de variável
5−1
b−a
a+b
5+1
=t
= 2t+3
x=t
+
+
2
2
2
2
1
5
dx
x
5−1
[w0 F (t0 ) + w1 F (t1 ) + w2 F (t2 )]
2
5−1
1
1
1
≈
0, 55555556
+ 0, 88888889
+ 0, 55555556
2
2 t0 + 3
2 t1 + 3
2 t2 + 3
≈ 1, 602694
≈
onde t0 = −0, 77459667, t1 = 0, 00000000 e t2 = 0, 77459667.
9.3
Integração de funções mal comportadas
Funções mal comportadas (ou mal condicionadas) são aquelas que possuem algum tipo de caracterı́stica especial e que, portanto, requerem cuidados especiais quando se quer integrá-las.
Exemplo 9.12 Calcule a integral de
1
0
ex
√ d x.
x
Solução:Como esta função tem uma singularidade, é preciso fazer uma mudança de variável que
a elimine. Neste caso, pode-se fazer
x = u2
e
dx = 2u du
de forma que
0
1
ex
√ dx
x
1
= 2
0
= 2
1
2
eu
udu
u
2
eu d u
0
Como o integrando agora é uma função bem comportada, pode-se escolher um dos métodos
estudados para calcular esta última integral.
Exemplo 9.13 Calcule
1
√
sen x dx
0
Solução:Como o integrando possui uma tangente vertical, a velocidade de integração fica muito
lenta. Se o método escolhido fosse trapézios, por exemplo, seriam necessárias mais de 500 subdivisões
do intervalo de integração [0, 1] para que se obtivesse quatro casas decimais repetidas.
Neste caso, também é possı́vel fazer a mudança de variável,
sen x = u2
e
2u du
dx = √
,
1 − u4
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173
Introdução ao Cálculo Numérico
de maneira que
1
Integração Numérica
√
sen x dx = 2
0
√
sen 1
0
√
u2
du.
1 − u4
Outra alternativa seria utilizar a função inversa para resolver o problema:
1
√
sen x dx =
0
9.4
1
0,3
√
sen x dx + 0, 3 sen 0, 3 −
√
sen 0,3
arcsin y 2 dy
0
Intervalos de integração infinitos
Quando um ou os dois limites de integração de uma função são ∞, é necessário combinar o
processo de integração numérica com uma manipulação algébrica adequada da função integranda,
ou, alternativamente, determinar um valor que aproxime a região abaixo da curva da função a
partir de um valor de x (ver [2]).
Considere a integral
∞
1
dx
(9.32)
−x
x + e + x2
b
onde pode-se observar que e−∞ ≈ 0. Uma alternativa para se calcular (9.32) é notar que a curva
da função
1
x + x2
aproxima relativamente bem a função integranda em (9.32), como pode-se ver na figura 9.3. Nesse
caso, pode-se escrever
∞
∞
1
1
dx
<
dx = − ln b + ln(1 + b).
(9.33)
−x
2
x+e +x
x + x2
b
b
Uma alternativa seria substituı́rmos e−x em (9.32) por e−b , já que esse valor poderia ser
considerado não tão desprezı́vel. Nesse caso, terı́amos
∞
1
2b+ 1
1
−b − 1)π − 2 arctan( √
)
dx
=
csgn(
4
e
(9.34)
−b
2
−b
x+e +x
4e −1
− (−4 + eb ) e−b
b
1
é bastante complicado, e, algumas vezes,
Note que, nesse caso, calcular a antiderivada de x+e−b
+x2
a aproximação obtida com (9.33) é suficiente, como mostra o exemplo abaixo.
Exemplo 9.14 Seja b = 10 em (9.32). Calculando a aproximação dessa integral através de
(9.33), obtemos o valor 0, 095310180; utilizando (9.34), o valor obtido é .09531016670. Note que
o erro relativo entre ambas aproximações é da ordem de 10−5 , o que pode não justificar o uso da
segunda aproximação.
9.5
Exercı́cios
√
Exercı́cio 9.1 Calcule a integral de f (x) = 6 x + 5 no intervalo [1, 9] com a fórmula dos
trapézios considerando h = 1 e depois delimite o erro de truncamento para este caso.
Exercı́cio 9.2 Determine h de tal forma que a regra dos trapézios forneça o valor de
1
2
e−x dx
0
com um erro de truncamento menor do que 10−4 .
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174
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Exercı́cio 9.3 Calcule
10
log x dx
6
utilizando a fórmula de Simpson para 8 subintervalos e delimite o erro de truncamento.
Exercı́cio 9.4 Encontre n e h tal que o erro para a fórmula de Simpson seja menor do que
5 × 10−9 quando se quer aproximar
7
dx
x
2
Depois, faça o mesmo para a fórmula dos trapézios e compare os resultados.
Exercı́cio 9.5 Calcular uma aproximação de
1
0
1
dx
1 + x2
pela regra de Simpson com exatidão crescente com no mı́nimo 5 DIGSE.
Exercı́cio 9.6 Usando quadratura de Gauss, calcule:
1
x2 dx
com 4 pontos
−1
Exercı́cio 9.7 Usando quadratura de Gauss, calcule:
10
e−x dx
com 2 pontos
0
Depois, calcule o “erro exato” (diferença entre o valor da integral calculada com as regras do
Cálculo e o valor obtido por quadratura) e use este valor para estimar o número mı́nimo de pontos
necessários para calcular esta integral com a regra dos trapézios.
Exercı́cio 9.8 Sugira uma mudança de variável adequada para o cálculo da integral:
1
sen x
√
dx.
1 − x2
0
Depois, encontre uma aproximação para o seu valor.
Exercı́cio 9.9 Utilize a regra de Simpson com exatidão crescente para calcular
1 √
x
dx
4
−
x2
0
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175
Introdução ao Cálculo Numérico
Integração Numérica
Figura 9.2: A regra do trapézio composta: (a) subintervalos de qualquer tamanho, (b) subintervalos
de tamanhos iguais.
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176
Introdução ao Cálculo Numérico
Figura 9.3: Gráfico de
Integração Numérica
1
x+e−x +x2
(–) e
∞
A.L. de Bortoli, C. Cardoso, M.P.G. Fachin, R.D. da Cunha
b
1
x+x2
(♦).
177
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