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Paulino CA, Rizzo MS, Souza MIA
Risco de Reações Alérgicas a Excipientes de Medicamentos Utilizados por Idosos com
Vestibulopatias
Risk of Allergic Reactions to Excipients in Medicines Used by Elderly with Vestibular Diseases
Célia Aparecida Paulinoa*; Márcia dos Santos Rizzob; Maria Isabel de Araújo Sousac
Universidade Anhanguera de São Paulo, Programa de Mestrado Profissional em Reabilitação do Equilíbrio Corporal e Inclusão Social. São Paulo.
b
Universidade Federal do Piauí, Programa de Pós-Graduação em Odontologia e em Ciências e Saúde. Teresina.
c
Universidade Anhanguera de São Paulo, Curso de Biomedicina. São Paulo.
*E-mail: [email protected]
a
Resumo
As doenças vestibulares são comuns na população idosa e, associadas a várias comorbidades, aumentam o uso de medicamentos e o risco de
reações adversas. O objetivo foi investigar os excipientes farmacêuticos contidos em medicamentos utilizados por idosos com vestibulopatias,
para identificar aqueles com maior risco de causar reações alérgicas. Foram utilizadas informações de 104 idosos da comunidade, com queixas
vestibulares e em uso de medicamentos; os excipientes farmacêuticos de todos os medicamentos foram identificados e separados os mais
frequentes, dentre os quais, foram destacados aqueles com potencial para induzir reações alérgicas. Os resultados obtidos mostraram que as
mulheres foram o gênero predominante (85%) e maior número de idosos está na faixa etária de 66 a 70 anos (30%). Os sintomas vestibulares
mais relatados pelos idosos foram tontura, zumbido e perda auditiva, e 91% da amostra fazia uso de polifarmacoterapia. Os excipientes mais
frequentemente encontrados nos medicamentos, incluindo os antivertiginosos mais usuais, foram a lactose (35%), os corantes (26%) e os
conservantes (21%), entre os quais, os que causam maior risco de reações alérgicas: lactose, parabenos, amarelo crepúsculo, eritrosina, amarelo
de tartrazina, benzoato de sódio e cloreto de benzalcônio. O cuidado nas prescrições e no uso de medicamentos pode contribuir para reduzir
o risco de reações adversas a certos excipientes farmacêuticos, especialmente em grupos etários mais vulneráveis e polimedicados, como os
idosos com vestibulopatias e naqueles mais predispostos às reações alérgicas e intolerâncias.
Palavras-chave: Excipientes Farmacêuticos. Hipersensibilidade. Doenças Vestibulares. Saúde do Idoso.
Abstract
Vestibular disorders are common in the elderly people and, associated with multiple comorbidities, increase the use of medicines and the risk
of adverse reactions. The aim was investigate the pharmaceutical excipients contained in medicines used by elderly patients with vestibular
disorders to identify those with greater risk for developing allergic reactions. It were used information of 104 elderly patients with vestibular
complaints and using medications. The pharmaceutical excipients of all medicines were identified and the most frequents were separated,
between them those with potential to cause allergic reactions. The results obtained showed that women were the predominant gender (85%)
and a greater number of elderly people aged 66-70 years (30%). Vestibular symptoms most frequently reported by the elderly were dizziness,
tinnitus and hearing loss, and 91% of the sample were using polypharmacy. The most frequently excipients found in the medicines were lactose
(35%), dyes (26%) and preservatives (21%), among which, those causing greater risk of allergic reactions were lactose, parabens, sunset
yellow, erythrosine, yellow tartrazine, sodium benzoate and benzalkonium chloride. The care in prescriptions and use of medicines can help
reducing the risk of adverse reactions to certain pharmaceutical excipients, especially to the most vulnerable and polymedicated age groups,
such as the elderly with vestibular disorders and those more susceptible to allergic reactions and intolerances.
Keywords: Pharmaceutical Excipients. Hypersensitivity. Vestibular Diseases. Health of the Elderly.
1 Introdução
O envelhecimento acarreta uma série de transformações
fisiopatológicas, produzindo alterações funcionais e
estruturais que reduzem a vitalidade do organismo e
favorecem o surgimento de variadas doenças, entre as quais,
aquelas doenças crônico-degenerativas relacionadas aos
sistemas cardiovascular, metabólico, nervoso, vestibular,
osteomuscular, entre outros1,2.
O sistema vestibular é um dos principais responsáveis
pela manutenção do equilíbrio corporal, e o sistema nervoso
central é o responsável por integrar as informações recebidas
dos sistemas proprioceptivo, visual e vestibular1. Com o passar
da idade, podem ocorrer alterações neste sistema provocando
Rev. Equilíbrio Corporal Saúde, v.7, n.2, p.41-1, 2015
sintomas vestibulares, tais como, tonturas e outros3.
Neste sentido, os idosos exigem cuidados especiais em
termos de diagnóstico e tratamento, já que as doenças crônicas
podem causar limitações importantes na sua capacidade
física4. Isso exige um diagnóstico precoce e tratamento
adequado para essas doenças, para se evitar o aparecimento
de complicações para a saúde5.
Por isso, o envelhecimento aumenta a necessidade de
utilização de medicamentos6-8 e, em razão das múltiplas
doenças, não é raro o uso da polifarmacoterapia, que pode
resultar em efeitos colaterais importantes, ocasionado pelos
próprios fármacos ou pelas interações medicamentosas9. De
fato, o uso concomitante de medicamentos é bastante comum
em idosos para tratar suas diversas morbidades10,11.
41
Risco de Reações Alérgicas a Excipientes de Medicamentos Utilizados por Idosos com Vestibulopatias
Como o uso de medicamentos é a forma terapêutica mais
utilizada, a população geriátrica exige maior atenção quando
da realização dos múltiplos tratamentos farmacológicos12,
já que, por fazer uso de vários medicamentos, aumenta a
quantidade de reações adversas13.
Os medicamentos são apresentados em formulações
comerciais contendo o(s) fármaco(s) e outros componentes
(excipientes farmacêuticos), que permitem conservar,
assegurar estabilidade, evitar crescimento microbiano,
melhorar o sabor das substâncias químicas, tornar solúvel,
misturar substâncias imiscíveis, entre outras finalidades14.
Nas formulações medicamentosas para uso interno, podem
conter diferentes excipientes, ou seja, conservantes, corantes,
aromatizantes (flavorizantes), adoçantes (edulcorantes),
espessantes, emulsificantes, estabilizantes ou antioxidantes15,16.
Por muito tempo os excipientes farmacêuticos presentes
em formulações medicamentosas foram considerados inócuos
por não causarem ação farmacológica ou toxicológica
nos pacientes17,18. Mas, reações adversas a excipientes de
medicamentos representam grave problema de saúde pública,
sendo relatado que de 10 a 20% das internações hospitalares
são decorrentes de reações adversas a medicamentos,
incluindo os efeitos dos excipientes14.
As reações adversas a medicamentos (RAM) têm
importância epidemiológica pela alta frequência de morbidade
e mortalidade notificadas na clínica médica19,20. Todavia, as
RAMs associadas a excipientes não têm sido devidamente
reconhecidas, não só pela falta de conhecimento sobre suas
ações no indivíduo, mas também pelo conceito preconcebido
de que excipientes farmacêuticos são inofensivos17.
Entre as diferentes RAMs, as reações de hipersensibilidade
são desencadeadas por fármacos ou excipientes e constituem
uma importante questão na clínica médica, compreendendo
cerca de 6 a 10% de todos os casos notificados. Essas reações
imunologicamente mediadas são denominadas de alérgicas
(ou alergias) quando um mecanismo imunológico envolve
anticorpos específicos ou uma resposta imune celular
mediada por linfócitos T e esta associação entre as reações
imunomediadas e os excipientes vem sendo documentada19-21.
As reações imunologicamente mediadas compreendem
cerca de 6 a 10% de todos os casos clínicos e a relação entre
elas e os excipientes vem sendo documentada desde a metade
da década de 198019,20.
De forma geral, as RAMs são classificadas segundo o
modelo de Gell e Coombs, em reações imunologicamente
mediadas, compostas por reações de hipersensibilidade
imediata e mediadas por anticorpos IgE específicos (tipo I),
as reações citotóxicas mediadas por anticorpos IgG ou IgM
(tipo II), reações por imunocomplexos (tipo III), e reações de
hipersensibilidade retardada (tipo IV)19,22.
Além das reações de hipersensibilidade imediata ou
tardia (alergias), os excipientes também podem causar
reações anafilactoides, desencadeadas por mecanismos não
42
imunológicos18,19,22.
Diante dos questionamentos acerca das possíveis reações
causadas por excipientes nas notificações de casos de RAM,
é importante identificar esses excipientes nas formulações
medicamentosas para informar e prevenir os pacientes
usuários de medicamentos, sobretudo os mais propensos a
desenvolverem reações alérgicas a tais substâncias e, também,
aqueles mais vulneráveis do ponto de vista de saúde.
Portanto, o objetivo deste estudo foi identificar nas
formulações medicamentosas utilizadas por idosos com
vestibulopatias os excipientes farmacêuticos relacionados
como risco de reação alérgica.
2 Material e Métodos
O estudo foi descritivo e retrospectivo, realizado com dados
secundários de uma amostra de idosos com vestibulopatias
provenientes da comunidade, no ano de 2011.
A pesquisa foi previamente aprovada pela Comissão de
Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Protocolo nº 146/10).
Os dados foram coletados no Laboratório de Estudos
e Pesquisas do Programa de Mestrado em Reabilitação do
Equilíbrio Corporal e Inclusão Social, da Universidade
Anhanguera de São Paulo (Unian-SP), em São Paulo.
A amostra total do estudo foi representada por 104
idosos com vestibulopatias, dos quais 95 faziam uso de
medicamentos. Desses idosos, foram obtidos os seguintes
dados secundários: informações sociodemográficas (idade e
gênero), queixas vestibulares principais e medicamentos em
uso.
Todos os medicamentos em uso pelos idosos foram
levantados, e seus fármacos foram identificados e classificados
com auxílio de material bibliográfico de referência em
farmacologia e terapêutica, sobretudo o Dicionário de
Especialidades Farmacêuticas (DEF) (2012/2013), a Relação
Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) (2014), a
Lista de Medicamentos de Referência da Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa) (2012) e o Bulário Eletrônico
da Anvisa (2015).
Somente os medicamentos de uso oral tiveram seus
excipientes farmacêuticos identificados por meio do Bulário
Eletrônico da Anvisa.
Os dados obtidos foram agrupados e tabulados, e
posteriormente submetidos à análise descritiva, com
apresentação dos resultados em frequências absolutas e
relativas.
3 Resultados e Discussão
Em relação aos dados sociodemográficos, a amostra total
avaliada de 104 idosos com queixas vestibulares revelou
predominância de mulheres (85%) e um maior número de
idosos na faixa etária de 66 a 70 anos (30%). Os Gráficos 1 e
2 ilustram a distribuição percentual desses idosos, segundo o
gênero e a faixa etária, respectivamente.
Rev. Equilíbrio Corporal Saúde, v.7, n.2, p.41-6, 2015
Paulino CA, Rizzo MS, Souza MIA
Gráfico 1: Distribuição percentual de idosos com vestibulopatias,
segundo o gênero
Fonte: Dados da pesquisa.
Gráfico 2: Distribuição percentual dos idosos com vestibulopatias,
segundo a faixa etária
Fonte: Dados da pesquisa.
No que se refere aos sintomas vestibulares, o Quadro 1
apresenta a frequência dos três sintomas mais relatados pelos
idosos: tontura, zumbido e perda auditiva.
Quadro 1: Sintomas mais relatados pelos idosos
segundo o gênero
Sintomas
Mulheres
Homens
Vestibulares*
(n = 89)
(n = 15)
nº
%
nº
%
Tontura
84 94,38 10 66,66
Zumbido
63 70,78
7
46,66
Perda auditiva
49 55,05 11 73,33
vestibulopatas
*Cada idoso relatou um ou mais sintomas concomitantes.
Fonte: Dados da pesquisa.
Total
(n = 104)
nº
%
94
90,38
70
67,30
60
57,69
Sobre o uso de medicamentos, do total de idosos da
pesquisa, 95 deles relataram o uso (91,3%). Vale ressaltar
que cada medicamento continha um ou mais fármacos na
formulação e o Quadro 2 apresenta a quantidade de fármacos
utilizada pelos idosos.
Quadro 2: Quantidade de fármacos utilizada pelos idosos
vestibulopatas segundo a faixa etária e gênero. Os valores
foram calculados de acordo com o total de idosos em uso de
medicamentos
Faixa Etária
Mulheres
Homens
Total
(anos)
nº %
nº %
nº %
60 65
28
29,47
5
5,26
33
34,73
66 70
22
23,16
1
1,05
23
24,21
71 75
15
15,78
2
2,11
17
17,90
76 80
9
9,47
2
2,11
11
11,58
81 85
5
5,26
3
3,16
8
8,42
≥ 86
3
3,15
3
3,16
Total
82
86,31
13
13,69 95 100,00
Fonte: Dados da pesquisa.
Foram identificados todos os excipientes farmacêuticos
contidos nas formulações medicamentosas em uso e
tabulados os mais frequentes entre os idosos que utilizavam
Rev. Equilíbrio Corporal Saúde, v.7, n.2, p.41-1, 2015
medicamentos (N = 95), como demonstrado no Quadro 3.
Quadro 3: Excipientes farmacêuticos mais frequentemente
identificados em diferentes formulações medicamentosas em uso
pelos idosos com vestibulopatias
Total de
Excipientes
Formulações
Farmacêuticos
Função Principal Medicamentosas
Mais Frequentes
nº
%
Lactose
Edulcorante
88
34,91
Parabenos (metil e
Conservantes
42
16,66
propilparabenos)
Amarelo crepúsculo
Corante
25
9,92
Eritrosina
Corante
23
9,13
Sacarina
Edulcorante
21
8,34
Sorbitol
Edulcorante
21
8,34
Amarelo de
Corante
17
6,76
tartrazina
Benzoato de sódio
Conservante
8
3,17
Aspartame
Edulcorante
3
1,19
Cloreto de
Conservante
2
0,79
benzalcônio
Álcool benzílico
Conservante
2
0,79
Total
252
100,00
Fonte: Dados da pesquisa.
Dos excipientes identificados, os que representam maior
risco de alergias são: a lactose (edulcorante), os parabenos
(conservantes), os corantes (amarelo crepúsculo, eritrosina
e amarelo de tartrazina) e os conservantes (benzoato de
sódio e cloreto de benzalcônio), os quais estão presentes
em diferentes formulações medicamentosas, aumentando a
exposição dos idosos que fazem uso de polifarmacoterapia. O
Gráfico 3 ilustra a distribuição percentual destes excipientes
na pesquisa.
Esses medicamentos utilizados pelos idosos com
vestibulopatias pertenciam a diferentes classes terapêuticas,
mas, é importante ressaltar que todos os antivertiginosos
mais usuais: cinarizina, flunarizina, betaistina, meclizina,
dimenidrinato e Ginkgobiloba levantados na pesquisa
apresentam na formulação algum desses excipientes que
podem causar reações alérgicas, entre outros medicamentos
utilizados no tratamento dos sintomas vestibulares.
Gráfico 3: Distribuição percentual dos excipientes mais
frequentes nos medicamentos utilizados pelos idosos com
vestibulopatias e que representam risco de reações alérgicas
Fonte: Dados da pesquisa.
O estudo mostrou que a maior parte dos idosos tinha idade
entre 60 e 92 anos, relatou queixas relacionadas ao equilíbrio
corporal e utilizava algum tipo de medicamento, corroborando
43
Risco de Reações Alérgicas a Excipientes de Medicamentos Utilizados por Idosos com Vestibulopatias
outros estudos que apontam a relação entre o envelhecimento
e a maior frequência de distúrbios vestibulares23,25.
A predominância de mulheres idosas com vestibulopatias
(85%) também foi observada, como já descrito em outro
estudo25. A prevalência de mulheres idosas vestibulopatas, entre
65 e 89 anos, também foi observada em outra investigação23.
Ainda, outros autores que avaliaram idosos vestibulopatas
provenientes da comunidade, com características semelhantes
a este, igualmente apontaram maior prevalência de
mulheres26-28.
Estudos com idosos não vestibulopatas atendidos em
um serviço de reabilitação público também revelaram o
predomínio feminino29, assim como investigações sobre o uso
de medicamentos em idosos atendidos em ambulatórios de um
hospital público30. De igual modo, estudo sobre a influência
da polimedicação em fraturas por quedas em idosos mostrou
maior quantidade de mulheres participantes31.
A tontura foi o sintoma mais frequente na pesquisa,
concordando com outra que destacou a alta prevalência de
tontura entre idosos, possivelmente associada a várias causas
e de origem no sistema vestibular32. Também em um estudo
com mulheres idosas vestibulopatas, de 60 a 84 anos, a tontura
foi uma das queixas vestibulares mais frequentes, associadas
a outros relatos24,27,28.
O envelhecimento compromete a funcionalidade do
sistema nervoso central e prejudica o processamento dos
sinais vestibulares, visuais e proprioceptivos, responsáveis
pela manutenção do equilíbrio corporal, levando a sintomas
vestibulares, como, tontura, vertigem, desequilíbrio e outros3.
A tontura é a sensação de alteração do equilíbrio corporal
de caráter não-rotatório, enquanto a vertigem é a tontura de
caráter rotatório33. Entre as queixas vestibulares, a tontura
é considerada o segundo sintoma de maior prevalência,
perdendo apenas para a cefaleia3.
O uso concomitante de múltiplos medicamentos
(polifarmacoterapia) foi uma realidade entre os idosos com
vestibulopatias avaliados, assim como já demonstrado em
outros estudos com população semelhante24,26-28 ou mesmo
com idosos não vestibulopatas34.
A farmacoterapia em idosos deve ser encarada com cuidado,
pois os déficits funcionais de certos órgãos e sistemas podem
alterar a farmacocinética e a farmacodinâmica, favorecendo
o aparecimento de efeitos indesejáveis6,7. Quando comparado
aos de uma pessoa mais jovem, os sistemas hepático e renal
dos idosos apresentam deficiências que alteram, sobretudo,
a farmacocinética35. Especificamente, nos idosos com
vestibulopatias, os medicamentos podem também favorecer o
aparecimento de sintomas otoneurológicos e até a ocorrência
de quedas36.
Contudo, o tratamento farmacológico é procedimento
terapêutico usual, e para manter a qualidade do medicamento
e para que o fármaco alcance seu alvo farmacológico no
organismo, são necessários excipientes farmacêuticos nas
44
formulações14. De fato, os excipientes são substâncias que
compõem o medicamento e que, apesar de terem pouco ou
nenhum valor terapêutico, garantem certas propriedades
químicas e farmacológicas37.
Apesar de serem considerados sem atividade terapêutica,
os excipientes são capazes de influenciar no resultado da ação
do fármaco ou até interagir com outros excipientes38. Além
disso, a segurança dos excipientes está relacionada com suas
interações físicas e químicas e com sua toxicidade, mas essas
substâncias estão quase sempre associadas a algum tipo de
reação indesejável39.
A pesquisa mostrou a presença de vários excipientes nos
medicamentos utilizados pelos idosos com vestibulopatias
(Quadro 3), entre os quais, aqueles com maior risco de causar
reações alérgicas: lactose, metil e propilparabeno, amarelo
crepúsculo, eritrosina, amarelo de tartrazina, benzoato
de sódio e cloreto de benzalcônio. Esses medicamentos
pertenciam a diferentes classes terapêuticas, incluindo todos
os antivertiginosos mais usualmente utilizados no tratamento
das vestibulopatias.
A despeito de sua finalidade farmacotécnica, é descrita
a relação entre excipientes e reações adversas, sobretudo
com certos excipientes considerados de risco, tais como:
lactose, metil e propilparabeno, amarelo de tartarazina,
benzoato de sódio, cloreto de benzalcônio, álcool benzílico,
sulfitos e sorbitol. Esse risco é muito preocupante, já que a
maior parte dos medicamentos que contém tais substâncias é
comercializada de forma livre no Brasil14.
De fato, como qualquer substância química, os excipientes
são responsáveis por inúmeras RAMs, as quais, na prática
clínica, são erroneamente atribuídas apenas ao(s) fármaco(s)
contido(s) no medicamento. Exemplos de toxicidade induzida
por excipientes incluem as reações de hipersensibilidade
deflagradas em indivíduos susceptíveis a certos excipientes,
como parabenos, lanolina, propilenoglicol e polietileno40,41.
Em geral, as RAMs podem ser previsíveis e imprevisíveis.
As reações previsíveis são geralmente relacionadas com as
ações farmacológicas conhecidas do fármaco. As reações
imprevisíveis, comumente não são relacionadas com as ações
do fármaco e ocorrem apenas em indivíduos susceptíveis, e
podem ser subdivididas em intolerância ao fármaco, respostas
idiossincrásicas, RAMs imunologicamente mediadas e reações
pseudo-alérgicas (chamadas de reações anafilactoides), devido
à liberação direta de mediadores inflamatórios provenientes
de mastócitos e basófilos não mediados por IgE18,20,22.
Assim, tem sido proposto que os excipientes induzam
reação de hipersensibilidade imediata ou tardia e reações
anafilactoides18. Como um alérgeno, os excipientes reagem
com proteínas teciduais e promovem sensibilização do
organismo por meio da síntese de IgE. Em um segundo
contato, o alérgeno promove reação sistêmica com liberação
de mediadores inflamatórios pré-formados, causando erupções
de pele, distúrbios respiratórios e colapso vascular, em casos
Rev. Equilíbrio Corporal Saúde, v.7, n.2, p.41-6, 2015
Paulino CA, Rizzo MS, Souza MIA
mais graves. Além da reação sistêmica podem ocorrer,
também, reações localizadas, dependendo da via de contato
do alérgeno, ou seja, pode haver vômito, cólicas, diarreia (se
a exposição for por via oral), rinite alérgica e asma (se houve
inalação) e reações urticariformes (em caso de injeção ou
inoculação)19,22.
De acordo com os resultados aqui mostrados, a lactose
foi o excipiente mais frequentemente encontrado e os relatos
na literatura sustentam que as reações adversas provocadas
por este edulcorante geralmente são classificadas como
intolerância à lactose ou reação de hipersensibilidade, e
seu grau de gravidade está relacionado à sensibilidade do
paciente. A lactose é utilizada como diluente nas formulações
farmacêuticas sólidas e normalmente está presente em
diferentes medicamentos14. Em caucasianos, de 5 a 15%
dos indivíduos têm vários graus de deficiência de lactase e
podem apresentar dor abdominal, distensão ou diarreia após a
ingestão de lactose40.
Neste contexto, as reações alérgicas a medicamentos
podem afetar qualquer órgão ou sistema, sendo a pele mais
frequentemente acometida, com mais de um tipo de reação
cutânea. Além dessas manifestações cutâneas, nas reações
de hipersensibilidade do tipo I ocorre comprometimento
cardiorrespiratório e/ou gastrintestinal, incluindo outras
formas de reações sistêmicas em quadros de maior gravidade20.
A pesquisa também mostrou a presença de parabenos e
corantes em grande parte das formulações medicamentosas
utilizadas pelos idosos. Está bem documentado na literatura
que os parabenos e o corante amarelo de tartrazina estão
relacionados a reações de hipersensibilidade, por serem
estruturalmente semelhantes ao ácido acetilsalicílico38. No
caso dos corantes, estudos constataram que seu uso deve ser
evitado em indivíduos susceptíveis, sobretudo o amarelo de
tartrazina18.
Desse modo, em função da ocorrência de efeitos adversos
associados a excipientes farmacêuticos, a Food and Drug
Administration (FDA) determina que seja discriminada
no rótulo do medicamento a lista completa das substâncias
presentes, facilitando o diagnóstico de possíveis reações
adversas e os prováveis fatores de risco envolvidos42.
Vale lembrar que as reações adversas causadas pelos
excipientes podem ocorrer na população em geral e sua
toxicidade está representada por imunotoxicidade, alergia
e intolerância. Já em grupos específicos da população, a
toxicidade pode ser devida a doenças crônicas preexistentes, à
predisposição genética ou à idade dos pacientes38.
Assim sendo, é importante a identificação dos excipientes
e as informações sobre seus efeitos, de modo a permitir aos
profissionais da área de saúde avaliar os potenciais riscos
e monitorar os pacientes que forem vulneráveis aos efeitos
adversos desses componentes dos medicamentos11.
Rev. Equilíbrio Corporal Saúde, v.7, n.2, p.41-1, 2015
4 Conclusão
As possíveis reações alérgicas e outras desencadeadas por
certos excipientes farmacêuticos contidos nas formulações
medicamentosas exigem maior cuidado nas prescrições,
sobretudo em grupos etários mais vulneráveis e polimedicados,
como é o caso dos idosos com vestibulopatias, em especial
aqueles com predisposição a alergias e intolerâncias.
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