Eugen Bleuler Fausto Amaro Paul Eugen Bleuler nasceu a 30 de

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Eugen Bleuler
Fausto Amaro
Paul Eugen Bleuler nasceu a 30 de Abril de 1857, em Zollikon, uma pequena cidade
perto de Zurique, atualmente um dos seus subúrbios com cerca de 12 mil habitantes.
A sua família, de religião protestante, era de origem camponesa e segundo Ellenberger
(cit. por Roudinesco e Plon: 94) tinha tomado parte nas lutas políticas que levaram à
igualdade de direitos dos camponeses e à criação da Universidade de Zurique em 1833.
Filho de Hans Rudolph, um fazendeiro e comerciante de Zollikon, fez o ensino primário
na sua cidade natal. Frequentou depois em Zurique o ensino médio e o ensino superior
tendo-se licenciado em Medicina em 1881. É provável que o seu interesse pela
psiquiatria tenha resultado do facto de ter uma irmã que sofria de catatonia e que chegou
a estar internada no Hospital Burghölzlki em 1874, tinha Bleuler 17 anos de idade. A
experiência familiar do internamento da irmã parece ter sido também desafiante para o
jovem Bleuler, já que a irmã se queixava de o então diretor do hospital, Hitizg, um
berlinense que não falava o alemão de Zurique, não entender o que ela dizia (Makari,
2010:182).
Entre 1881 e 1883 foi médico assistente no hospital psiquiátrico de Waldau, perto de
Berna em cuja universidade se doutorou em 1883. No ano seguinte, em 1884, com 27
anos, fez viagens de estudo a Paris e Londres, tendo contatado em Paris com o famoso
Jean Martin Carcot. No final de 1884 e início de 1885 trabalha em Munique no
laboratório de Bernhard von Gudden, voltando em 1885 a Zurique como médico
assistente no hospital psiquiátrico de Burghölzli, na altura sob a direção de Augusto
Forel (1848-1931).
Em 1886, com apenas 29 anos, foi nomeado diretor da clínica psiquiátrica do asilo de
Rheinau, localizado numa ilha do Reno, no Cantão de Zurique, onde esteve até 1898.
Rheinau era uma instituição de retaguarda do hospital Burghölzli, para onde eram
transferidos os doentes considerados incuráveis, tendo chagado a ter uma população de
cerca de 800 internados.
Os doze anos passados em Rheinau permitiram-lhe fazer uma observação cuidadosa de
muitos doentes o que contribuiu para reforçar os seus pontos de vista sobre a
importância dos aspetos psicológicos na evolução das psicoses (Makari, 2010:183).
Em 1898 Forel deixou o lugar de diretor do Burghölzli, tendo sido substituído por
Eugen Bleuler que ocupou também o lugar de professor de Psiquiatria na Universidade
de Zurique.
A identificação com as ideias de Sigmund Freud e o seu interesse pela componente
psicológica na origem das psicoses levou-o a adotar, com grande entusiasmo, a terapia
psicanalítica no tratamento dos doentes no hospital de Zurique.
O método terapêutico de Freud pode assim ser testado pela primeira vez em contexto
institucional e o hospital Burghölzli tornou-se um centro de pesquisa psicanalítica de
renome internacional entre 1904 e 1913. Contudo, a partir de 1913 a clínica Burghölzli
perdeu importância neste campo devido a discordância científica entre Bleuler e Freud.
Juntamente com o Carl Jung (1875-1961) que foi seu interno na Clínica Burghölzli, e
Freud (1856-1939), Bleuler foi um dos primeiros membros da Associação Psicanalítica
de Viena. Foi também membro da Associação Psicanalítica Suíça, da Associação
Psicanalítica Internacional e editor do Jahrbuch für psychoanalytische Forschung,
sendo
pioneiro na divulgar na Europa as ideias de Freud.
Eugen Bleuler, porém, ficaria na história da psiquiatria principalmente pela sua
conceção de esquizofrenia, termo que ele próprio introduziu na literatura científica em
1908 e que vinha substituir o termo demência precoce adotado por Kraepelin no seu
manual de Psiquiatria (Kraepelin, 1899). A perturbação deixava, assim, de ser
considerada uma demência que surgia numa idade jovem e que era definida
principalmente em relação ao seu prognóstico. No conceito de Bleuler o termo
“demência precoce” ou “esquizofrenia” (literalmente cisão da mente), designava um
“um grupo de psicoses cujo desenvolvimento é por vezes crónico, por vezes marcado
por surtos intermitentes, e que param ou regridem para qualquer estágio, mas que não
permitem um completo restitutio ad intregrum. A doença é caracterizada por um
particular tipo de pensamento, afectividade e relação com o mundo externo o qual não
aparece em mais nenhuma parte nesta forma particular” (Bleuler, 1911, cit. por Forrest,
1975:2).
Para além do novo conceito de esquizofrenia, Bleuler é também credor da introdução do
termo ambivalência e autismo na literatura científica.
Eugene Bleuler permaneceu à frente do Burghölzli até se reformar em 1927, tendo-lhe
sucedido o seu filho Manfred Bleuler (1903-1994), um reputado psiquiatra que deixou
igualmente um notável legado nos estudos sobre a esquizofrenia.
Em 1932 Eugen Bleuler foi nomeado membro da Academia Leopoldina, atualmente a
Academia Nacional Alemã.
Bleuler faleceu a 15 de julho de 1939 em Zollikon, sua terra natal, cerca de dois meses
antes de Freud falecer em Londres onde se tinha refugiado após a ocupação da Áustria
pela Alemanha nazi.
Zurique e o Hospital Burghölzli
No último quartel do século XIX a Suíça gozava notável estabilidade política e social e
tinha entrado num período de desenvolvimento económico e efervescência cultural,
sobretudo depois da aprovação da constituição de 1874.
O facto de a Suíça ter acomodado, de forma autónoma, diversas comunidades
linguísticas permitiu ainda maior cruzamento de ideias na dinâmica área da psicologia e
psiquiatria daquele tempo.
Zurique era um dos 32 cantões suíços, de língua alemã e de religião predominantemente
protestante onde a universidade gozava de crescente prestígio e desde 1870 dispunha do
novo hospital psiquiátrico Burghölzli que ficou ligado à história da esquizofrenia e da
Psicanálise devido à obra de Bleuler e alguns cultores da psicanálise como Carl Gustav
Jung que foi interno deste hospital no início do século XX.
Após a sua construção, o hospital Burghölzli passou inclusive a ser uma referência
turística. Num guia da época pode ler-se: “Subindo um pouco mais, alcançamos o novo
hospital psiquiátrico Burghölzli construído entre 1864 e 1870 e bem merecedor da nossa
atenção. Ele dispõe de notáveis instalações e de um esplêndido parque oferecendo
imenso espaço para os seus 300 pacientes.” (Harfin, 1887).
Segundo Ernest Jones que visitou Zurique em 1907 havia ali um grupo chamado
“Grupo de Freud” o qual era liderado por Carl Jung e de que fazia parte entre outros o
seu chefe Eugen Bleuler (Jones, 1964: 331).
Burghölzli foi desde a sua fundação um centro de pesquisa importante na área da
psiquiatria. Os seus primeiros diretores eram de origem alemã. Em 1878 foi nomeado
diretor o suíço Auguste Forel que contava na altura apenas 31 anos. É com Forel que
Eugen Bleuler inicia a sua experiência no Burghölzli de que vem a ser diretor em 1898.
Como curiosidade refira-se que foi neste hospital, sob a direção de Bleuler, que Herman
Rorschach testou o seu famoso teste.
Com quase 150 anos de existência a Clínica Burghölzli continua como centro de
cuidados psiquiátricos e centro de pesquisa e ensino, não já nos arredores bucólicos de
Zurique, mas fazendo parte da própria cidade que o englobou no seu crescimento.
Referências
Bleuler, Eugen (1908). Die Prognose der Dementia Praecox (Schizophreniegruppe). Allgemein Zeitschrift
für Psychiatrie und Physisch-gerichtliche Medizin, 65: 436-464
Bleuler, Eugen (1911). Dementia praecox oder Gruppe der Schizophrenien. Leipzig/Wien: F. Deuticke.
(Edição inglesa: 1950 - Dementia Precox: or the Group of Schizophrenias. New York: International
Universities Press; edição portuguesa: 2005 - Dementia Praecox: Ou Grupo das Esquizofrenias. Lisboa:
Climepsi).
Ernst, Cécile; Angst, Jules (1994). Images in Psychiatry: Eugen Bleuler's "Schizophrenias". The
American Journal of Psychiatry; Jun 1994; 151, 6; pg. 914.
Ernst, Cécile; Angst, Jules (1996). The Burgholzli Clinic. The American Journal of Psychiatry, 153. 6 :
816.
Forrest, A. D. (1975). “Concepts of Schizophrenia: Historical Review”. In: Forrest. Alister D. e James
Affleck (Eds.). (1975). New Perspectives in Schizophrenia. London: Churchill Livingstone.
Fusar-Poli, Paolo;Politi, Pierluigi (2008).Images in Psychiatry: Paul Eugen Bleuler and the Birth of
Schizophrenia (1908). The American Journal of Psychiatry; Nov 2008; 165, pg. 1407.
Harfin, J. (1887). Zurich and its environs. Zurich: Orell & Co.
Jones, Ernst (1964 [1953]. The Life and Work of Sigmund Freud. Abridged edition, Harmondswor,
Kraepelin, Emil (1899). Psychiatrie. Ein Kurzes Lehrbuch für Studirende und Aerzte. 6.ª ed., Leipzig:
Verlag von Johann Ambrosius Barth (trad. inglesa:Psychiatry. A textbook for Students and Physicians. 2
vols. edited by Jacques M. Quen, Watson Publishing international, 1990).
Makari, George (2010). Revolution in Mind – The Creation of Psychoanalysis. London: Duckworth
Overlook.
Middlesex, England: Penguin Books.
Roudinesco, Elisabeth; Plon, Michel (2000). Dicionário de Psicanálise. Lisboa: Editorial Inquérito.
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