a responsabilidade tributária eventual dos gestores

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A RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
EVENTUAL DOS GESTORES
É sabido que a administração fiscal pode por vezes exigir aos gestores o
pagamento de impostos devidos pelas empresas (responsabilidade tributária subsidiária).
Mas esta responsabilidade não é uma inevitabilidade.
Os gestores das empresas (administradores e/ou
pagamento desses impostos e a culpa dos gestores
gerentes) podem, verificados determinados pressu-
por essa falta de bens.
postos, ser responsabilizados pelo pagamento dos
impostos das empresas que gerem. Entre esses pres-
Não pode existir responsabilidade dos gestores se
supostos encontramos a culpa pelo não pagamento
não se verificar o requisito da culpa. O facto de os
dos impostos devidos dentro do prazo para o efeito,
gestores assumirem a responsabilidade dos desti-
a inexistência de bens da empresa suficientes para o
nos das empresas não os habilita por si só e sem
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DANIEL ALVES DA CUNHA
Managing Partner AdC Advogados
mais com esta culpa, por muito que a administração fiscal
rá verificar por qual das vias a administração fiscal optou para
assim o queira as mais das vezes fazer vingar. É sabido que
reverter contra si a dívida da empresa. O exercício do direito
a administração fiscal pode por vezes exigir aos gestores o
de audição por parte dos gestores, quando notificado do pro-
pagamento de impostos devidos pelas empresas (responsa-
jeto de reversão, é essencial, assumindo o posicionamento da
bilidade tributária subsidiária). Mas esta responsabilidade não
defesa deste no processo que seguirá. Caso a administração
é uma inevitabilidade.
fiscal não faculte ao gestor a possibilidade de se pronunciar
previamente, verifica-se uma nulidade suscetível de ser invoca-
A responsabilização dos gestores pelas dívidas das suas em-
da junto do tribunal tributário.
presas tem pressupostos muito específicos a observar, sem
os quais qualquer tentativa da administração fiscal nesse
Se a reversão se fundar na primeira hipótese (i), o gestor de-
sentido será ilegal e, por isso, inevitavelmente condenada à
verá estar munido de elementos que contrariem a prova even-
anulação pelos tribunais tributários. Infelizmente, sucede as
tualmente produzida. Aqui, o gestor ver-se-á confrontado com
mais das vezes. Porém, é necessário, antes de mais, ter esta
a imputação sem mais de culpa pela falta ou insuficiência de
consciência, e depois, defender-se convenientemente. A me-
património social, cabendo-lhe então demonstrar, designada-
lhor defesa passa por um correto planeamento da gestão, a
mente, que agiu em termos informados, livre de qualquer inte-
par de uma reação cabal atempada.
resse pessoal e segundo critérios de racionalidade empresarial
que levem à exclusão da sua responsabilidade. Mas devemos
Não há por isso responsabilidade tributária sem culpa do ges-
ter em atenção que os gestores não devem apenas cuidar dos
tor. E então, ou a administração fiscal prova que (i) o gestor,
seus negócios com diligência, não devendo servir-se do incum-
agindo com culpa, colocou a empresa em situação de não
primento das obrigações tributárias como meio preferencial de
poder pagar as suas dívidas fiscais, ou (ii) o gestor prova que
financiamento. Pretende-se evitar que o gestor em dificuldades
não lhe é imputável a falta de pagamento do imposto. Para
opte por sacrificar os interesses da fazenda pública aos interes-
se poder defender no momento da reversão, o gestor deve-
ses dos credores privados (e.g. fornecedores).
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em rede.
Por outro lado, se a reversão se fundar na segunda hipótese
so de execução fiscal, a reversão não é possível.
(ii), o gestor deverá dispor de elementos que provem não lhe
ser imputável a falta de pagamento do imposto. Neste caso,
Importa ainda assinalar que o nosso ordenamento jurídico atri-
a defesa exige uma abordagem diferente, pois o ónus de de-
bui dignidade criminal a alguns casos de não cumprimento
monstrar a não culpa pela falta de pagamento do imposto re-
de obrigações tributárias, como é o caso do crime de fraude
cai sobre o gestor em funções durante a fase do pagamento
fiscal e do crime de abuso de confiança fiscal.
voluntário, pelo que nesta hipótese a defesa passa por uma
de duas vias: ou se demonstra que a falta de pagamento do
Por fim, referir que esta responsabilidade pode ser também
imposto não resultou da sua vontade, mas da inexistência de
extensiva aos membros dos órgãos de fiscalização, revisores
bens sociais e que esta é resultante da atividade, ou que a
oficiais de contas e técnicos oficiais de contas. A responsabi-
falta de pagamento do imposto é imputável a terceiros.
lidade subsidiária dos revisores oficiais de contas e restantes
membros dos órgãos de fiscalização, em caso de incumpri-
Importa ainda referir que a reversão da execução fiscal contra
mento dos seus deveres de fiscalização, também é solidária,
os gestores depende sempre da excussão prévia dos bens da
mas a culpa não se presume, cabendo à administração fis-
empresa, ou seja, só após se verificar a efetiva inexistência de
cal demonstrá-la aquando da reversão. A responsabilidade
bens desta pode a administração fiscal avançar contra os ges-
subsidiária dos técnicos oficiais de contas ocorre em caso
tores. Este é um pressuposto essencial, dado estar em causa
de violação (pode ser dolosa ou negligente) dos deveres de
uma responsabilidade subsidiária e não uma responsabilida-
assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas
de solidária. Enquanto houver bens da empresa, e enquanto
áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações
todos os bens existentes não estiverem liquidados no proces-
fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos.
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O Cobrador de Impostos
Pieter Brueghel II, o Jovem
Flandres, 1616
Óleo sobre madeira de carvalho
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