ESPONDILOARTROPATIAS Dr. Célio Roberto Gonçalves As espondiloartropatias são um grupo de doenças interlacionadas que guardam entre si, certos aspectos em comum, como epidemiológicos, patogenéticos, clínicos e patológicos. As entidades que compõem este grupo incluem a espondilite anquilosante, síndrome de Reiter, artrite psoriasica, enteroartropatias e as artrites reativas pós infecciosas. Elas são caracterizadas pelo envolvimento das articulações sacroiliacas, artropatias inflamatórias periféricas e ausência de fator reumatóide. São incluídos outros achados como: tendência de agregação familiar, acometimento ocular, pele, anexos e mucosas podem ocorrer e o envolvimento valvar e pulmonar é extremamente raro. A interelação deste grupo de condições que formam as espondiloartropatias tem origem numa variedade de sinais e sintomas provienentes de vários sistemas do organismo. Mesmo nas artropatias reativas, onde o agente infeccioso desencadeante é reconhecido, a patogenese destas condições e pouco conhecida, assumindo-se que vários genes interagem para definir a expressão fenotipica específica. As artropatias reativas podem ser definidas como, uma artrite inflamat+oria esteril, num espaço de tempo e local distinto do processo infeccioso desencadeante primário. Estas artropatias podem ser consideradas doenças tipicamente relacionadas ao alelo HLA-B27, entretanto, isto não se aplica a febre reumatica, que deve ser encarada como um fenomeno reativo devido a reação cruzada entre o streptococcus e o tecido cardíaco. Dependendo das diferentes manifestações articulares, periarticulares e ou as diversas manifestações clínicas, como, conjuntivite, uretrite, envolvimento cutâneo e evolução clínica, as diversas espondiloartropatias são classificadas. Estes destaques clínicos, epidemiológicos, imunogenéticos, radiológicos nos ajudam a separar, as espondilartropatias da doença reumatóide soronegativa do adulto. ESPONDILITE ANQUILOSANTE Esta entidade nosológica acomete as articulações da coluna vertebral, principalmente as sacroilíacas e num grau variável o restante da coluna, assim como, com menor frequencia, artrite periférica e manifestações extrarticulares ocorrem precedendo ou acompanhando o quadro articular. Durante muitos anos recebeu sinonimia variada como, Doença de Bechterew, Espondilite deformante, Espondilite Rhizomélica, Doença de Marie - Strumpell, Espondilite Reumatóide, etc... Sua distribuição quanto ao sexo, raça e idade, ainda não é uniforme, porém sabese ser mais frequente entre os caucasianos, sendo três vezes maior no sexo masculino e ocorre principalmente entre os 20 anos de idade, podendo se iniciar na quinta ou sexta década, naqueles individuos que na adolescência manifestaram tipo de poliartrite soronegativa. Há muito tempo se reconhece a baixa incidência de espondilite anquilosante em pacientes não caucasianos. A possível razão é hoje aparentemente conhecida, devido a menor frequencia do HLA-B27 nas populações de raça amarela e negra e a sua interação neste espectro de doenças. E frequente o envolvimento familiar, sendo dez vezes maior a susceptibilidade de desenvolver a patologia na população HLA-B27 positivo. Quadro Clínico Apesar dos clínicos reconhecerem que a espondilite Anquilosante é uma doença comum, o indice de suspeita mantem-se baixo e seu diagnóstico esquecido. A dor lombar é sintomatologia frequente, em algum período da vida, em torno de 30% da nossa sociedade, porém a sua persistência é menos frequente. Esta persistência nos faz suspeitar de patologia inflamatória da coluna vertical. Numa análise de pacientes com dor lombar mecanica e os de causa inflamatória, Calin destaca cinco achados característicos na sua diferenciação. (Quadro 1) Alguns pacientes relatam inicialmente dor toracica do tipo pleural, causando desconforto no leito e distúrbio do sono. Esta dor, piora na inspiração devido a tendinite das inserções musculares das várias articulações costoesternais e costovertebrais. A dor lombar não é bem localizada pelo paciente e pode ser central, na transição dorso lombar ou nas nádegas com mínima irradiação, traduzindo um quadro clínico de acometimento das articulações Sacroilíacas (figura1). O envolvimento da coluna cervical ocorre nesta entidade atingindo tanto as articulações interapofisiárias, como os ligamentos, levando a fusão total (figura2). Sua aparição é insidiosa, sendo mais frequente observada no período noturno, acompanhada ou não de febre baixa, perda de peso e fadiga. (fig.01) Sacroleíte Bilateral (fig.02) Anquilose do Seguimento Cervical com Retificação da Lordose Fisiológica, Calcificação Ligamentar e Fusão das Articulações Interapofisiárias Ao exame físico observa-se perda da lordose lombar e intenso espasmo muscular. Ao contrário das patologias mecânicas da coluna lombar, a mobilidade esta diminúida, em todas as manobras de flexão e lateralidade, simetricamente. O grau de restrição desta mobilidade é mensurado pela manobra de Schober. Esta, consiste na medição da distenção da coluna lombar, em posição ereta e em flexão máxima, observando-se dois pontos previamente marcados, o primeiro na transição lombosacra e o seguinte 10 cm acima. Pode-se ao paciente para flexionar a coluna e faz-se nova medição, se ocorrer variação de cinco ou mais centimetros considera-se dentro da normalidade. Artrite periférica surge em 20 a 30% dos pacientes, principalmente de membros inferiores, em qualquer período da doença. Esta frequencia aumenta conforme a garvidade da patologia. A evolução do quadro inflamatório axial leva o apciente adotar uma posição de flexão da coluna (cifose dorso lombar), obrigando-o a deambulação, a flexionar os joelhos, para manter a visão na posição de marcha. A esta posição deu-se o nome de "posição do esquiador". Neste estadio a anquilose das articulações interapofisarias se faz presente. Manifestações oculares podem ser observadas em torno de 20% dos casos, seja iridociclite (uveite anterior) ou epiesclerite. Mais raramente ocorre envolvimento cardíaco (3 a 10%), observando mais frequentemente por insuficiência aórtica, alterações de condução e cardiomegalia. As manifestações pulmonares, seja a pneumonite intersticial e ou a fibrose apical pulmonar, são achados raros. As alterações radiológicas são precocemente reconhecidas pela quadratura dos corpos vertebrais lombares, sendo que este é devido ao processo inflamatório no lugar de inserção das fibras externas do anulo fibroso. Os achados tardios compreendem a formação de pontes sindesmofitárias dando o aspecto de espinha em "linha de trem" ou "bambu". A fusão das articulações sacroilíacas é achado patognomónico. "COLUNA em BAMBU" - Coluna em Bambu ou Linha de Trem, onde observamos Calcificação dos ligamentos Lombares (incidência em AP e PERFIL) Os parametros laboratoriais de atividade inflamatória como, a velocidade de hemosedimentação e dosagem da proteina C reativa estão geralmente elevados. A tipagem do HLAB27 é positiva em torno de 90% dos casos, porém não existe prova laboratorial patognomônica. A abordagem terapêutica abrange cuidados para evitar posições viciosas, exercícios respiratórios e o uso de antiflamatórios não hormonais como a indometacina e a fenilbutazona, o uso de drogas de "base" como a sulfazalasina tem sido preconizado nos casos com envolvimento periférico. SÍNDROME DE REITER Descrita por Reiter em 1916, consiste de uma triade clínica caracterizada por artrite, uretrite e conjuntivite. O envolvimento de agente infeccioso como estimulo desencadeante é reconhecido, dentre os quais, Shigella, Salmonella, Campylobacter, Yersinia enterocolitica, Chlamydia trachomatis, foram implicados. Esta síndrome é tradicionalmente considerada completa quando da presença da tríade e incompleta quando duas manifestações estão presentes, apesar de estar estabelecido pela Associação Reumatologica Americana desde 1981, ser necessário para o diagnóstico infeccioso e a artrite. Atualmente define-se Síndrome de Reiter como uma artrite soronegativa acompanhada de uretrite, cevicite e ou disenteria. Outras manifestações associadas incluem, lesões inflamatórias oculares, balanite, úlceras orais (aftas), lesões psoriasiformes, queratodermia. A incidência de Reiter ainda não está bem definida, porém nos surtos epidemicos de bactérias relacionadas a artrite 2 a 3% dos pacientes irão desenvolver artrite reativa. Com relação a sua incidência no sexo masculino é cinco vezes maior. Quadro Clínico A artrite ocorre geralmente duas a seis semanas após o estimulo infeccioso. Ela manifesta-se por ínicio abrupto de oligoartrite ou poliartrite assimétrica, predominantemente de membros inferiores joelhos e tornozelos. O achado dessas tres manifestações articulares é considerado típico: "dedos em salsicha" (dactilite), inchaço ou hipersensibilidade dolorosa da região da inserção do tendão de Aquiles ou da fascia plantar e dor lombar caracterizada por sacroileíte. A uretrite dentre as manifestações genitourinárias e a mais frequente seguida da balanite, cistite, prostatite e cervicite, sendo a cistite mais frequente nas mulheres. Conjuntivite não infecciosa unilateral ou bilateral é a manifestação mais comumente observada (40%), sendo precose e transitória, podendo surgir outras manifestações como, uveite, epiesclerite e ulceração de córnea. A balanite circinada é a mais frequente das manifestações mucocutâneas aparecendo em 25 a 50% dos pacientes, seguidas das lesões psoriasiformes e da queratodermia podendo acometer pele e unhas. Acometimento sistemico pode ocorrer, seja do coração com alterações do sistema de condução ou aortite levando a insuficiência aórtica ou envolvimento neurológico central e periférico. Febre, perda de peso e linfoadenopatia acompanham a síndrome. O achado laboratorial mais significativo na Síndrome de Reiter é a presença do antígeno HLAB27 em 80% dos paciente, sendo que os individuos que possuem este antígeno, apresenta 20% de chance de desenvolver a síndrome após estímulo infeccioso. Os outros paramêtros laboratoriais estão presentes, porém são inespacíficos. No estudo radiológico a presença de imagens de sugestivas de periostite comum as entesopatias e ou sacroileíte e sindemósfitos geralmente unilaterais são frequentes. Imagem Tomográfica de Sacroilíacas mostrando Acometimento Bilateral e Assimétrico (Esclerose Marginal Ilíaca e Sacral, presença de Erosões Ósseas) Esporão Hipertrófico Plantar O curso clínico pode ser um surto isolado ou apresentar vários episódios e ter um quadro permanente. O tratamento vai ser orientado conforme a evolução clínica e dependerá do tipo de envolvimento. Os antiinflamatórios não hormonais são a indicação de escolha no tartamento do quadro articular, nas manifestações mucocutâneas e oculares podemos optar pelos corticoesteroides tópicos, sendo reservado o uso da sulfasalazina, methotrexate ou azathiprina nos casos de surtos contínuos. O uso de tetraciclina é utilizado por nós, nos casos de uretrite. ACOMETIMENTO ARTICULAR NAS POLIARTRITES CRÔNICAS ARTRITE PSORIÁSICA Estudos epidemiologicos confirmam um aumento não uniforme da prevalencia de artrite inflamatória associada a psoriasis e o conceito de artrite psoriasica como entidade isolada esta aceito atualmente. Aproximadamente 7% dos pacientes com psoriasis apresenta a forma articular, sendo que a distribuição com relação ao sexo e uniforme. Envolvimento familial e a presença de antígenos HLA favorecem a expressão da doença articular. Cor relacionou-se os antígenos HLA B38 com a forma periferica e o B27 com forma axial assim como, HLA-DR4 com a forma erosiva articular. O modelo de acometimento articular e muito variável, aproximadamente 95% dos pacientes com artrite psoriasica apresentam forma pariferica, sendo que a maioria apresenta a forma pauciarticular assimetrica. Cerca de 25% dos pacientes apresentam poliartrite de dificil distinção Doença Reumatóide e naqueles com fator reumatóide positivo observa-se diagnóstico das duas entidades. O quadro poliarticular distal mutilante ocorre em 5 a 10% dos casos, sendo a forma axial em outros 5%. Além dos achados cutâneos e ungueais necessários para o diagnóstico o envolvimento ocular com uveite e conjuntivite, insuficiência aórtica são relatados.