Espondilite Anquilosante Síndrome de Reiter Artrite Reativa Artrite Psoriásica RODRIGO WILLENS FERNANDES Espondiloartropatias Soronegativas (Espondilite Anquilosante/Síndrome de Reiter/Artrite Reativa/Artrite Psoriásica) As espondiloartropatias soronegativas (EASN) são entidades clínicas heterogêneas, que têm manifestações comuns e podem envolver também a pele, os intestinos, os olhos e a uretra sendo freqüentemente associadas ao comprometimento das articulações sacroilíacas e da coluna vertebral. Acompanhadas de um mesmo marcador genético, o HLA-B27. Denominam-se soronegativas, pois a pesquisa de fator reumatóide é negativa. Fazem parte: Espondilite Anquilosante Síndrome de Reiter e outras artrites reativas Artrite Psoriásica Artrites enteropáticas (doença de Crohn, retocolite ulcerativa, doença de Whipple) Artroosteíte pustulosa (SAPHO) Todas elas, possuem as seguintes características em comum: 1 - tendência ao acometimento das articulações sacroilíacas 2 - artrite periférica 3 - pesquisa negativa FR 4 - entesopatia 5 - superposição de manifestações entre as doenças do grupo 6 - agregação familiar Critérios de classificação para as EASN como um todo Classificação de EASN Dor vertebral tipo inflamatória ou Sinovite (assimétrica, predominantemente em membros inferiores) e qualquer um dos elementos seguintes: História familiar positiva Psoríase Enterocolopatia inflamatória Dor alternada na região glútea Entesopatia Espondilite Anquilosante Conceito A espondilite anquilosante (EA) é uma doença inflamatória, de etiologia desconhecida, caracterizando-se pelo acometimento da coluna vertebral e sacroilíacas. Ascendentes, podendo atingir todos os segmentos vertebrais, causando limitação dos movimentos e invalidez. Ocorre lesão das articulações sinoviais e os ligamentos adjacentes às vértebras, especialmente nos pontos de inserção. Epidemiologia Incidência maior em homens (4H:1M) É caracteristicamente doença de jovem, tendo seu início na adolescência, podendo surgir até os 30 anos de idade. O HLA-B27 esta presente em até 80% dos casos. Etiopatogenia O fato de ser uma doença inflamatória, por vezes febril, induz à suposição de uma causa infecciosa. Argumentos favoráveis a suspeita: a) Presença de Klebsiella pneumoniae em fezes de pacientes com EA b) Sorologia positiva para Klebsiella, Salmonella e Shiguella em soro de paciente com EA c) Presença de sacroileíte e espondilite pós-infecções intestinais d) Seqüência de aminoácidos de enterobactéias idênticas a seqüência do HLA-BR27 e) Descoberta de ratos transgênicos B27 que não tem artrite, quando vivem em meio estéril. Possui relação com HLA-B27 e a prevalência destacada em jovens do sexo masculino, leva a inclusão dos hormônios sexuais como participantes da etiopatogênese. Aumento de interleucinas (IL-6, IL-beta), fator de necrose tumoral (TNF-alfa), fator transformador de crescimento beta (TGF-beta) e fator produtor de angiogênese da célula endotelial (EPAF). Anatomia Patológica Ocorre infiltrado mononuclear nas margens das sacroilíacas, nas sinoviais das interapofisárias e nas inserções ligamentares; em torno destas e nos ângulos vertebrais, junto aos discos intervertebrais. Ocorre também, as mesmas alterações inflamatórias em inserções ligamentosas e tendinosas especialmente dos pés (calcanhar) e em torno das coxofemurais. O processo inflamatório leva à calcificação, que se traduz na coluna por anquilose e nos segmentos axiais por esporões. Pode atingir a raiz da aorta e o septo ventricular, causando regurgitação aórtica e BAV ou bloqueio de ramo. Pode ocorrer amiloidose renal e nefropatia por deposição de IgA. Quadro Clínico As manifestações da EA são: dor lombar, artrite periférica, talalgia, dorsalgia, cervicalgia, costalgia, uveíte, insuficiência aórtica, BAV ou bloqueio de ramo, pneumopatia apical, nefropatia. Dor lombar predominantemente noturna. Didaticamente, estabelece-se distintas fases da doença, de acordo com a evolução: a) Fase prodrômica: Surge precocemente. Dor lombar ou dor na região glútea, ora à direita ora à esquerda, com irradiação para a face posterior da coxa. Talalgia isolada, às vezes. Rx de sacroilíacas podem ser normais. b) Fase inicial: Manifestações clinicas mais proeminentes, acompanhadas de rigidez de repouso. Provas de atividade inflamatória se alteram e há as primeiras alterações radiológicas das articulações sacroilíacas. c) Fase de estado: Limitação vertebral maior, dor pode estar presente em todos os níveis da coluna. Paciente tem aspecto de “esquiador” pela retificação da lordose lombar, cifose dorsal pronunciada, flexão da coluna cervical e dos joelhos. Estudo radiológico mostra lesões mais avançadas das sacroilíacas e calcificações de ligamentos para vertebrais. d) Fase final: Anquilose total da coluna, devido a vários anos de evolução, em cerca de 25% dos casos. Deambulação realizada a pequenos passos, pelo comprometimento das coxofemorais. Atitude de “esquiador”, não pode olhar para cima, campo visual restrito, realização de manobras é restrito. O próprio asseio é realizado com auxílio de terceiros. Uveíte anterior em 25%, em qualquer época, geralmente unilateral e de início agudo. Comprometimento cardiovascular é raro (aortite ascendente, insuficiência valvular aórtica, defeitos de condução, cardiomegalia e pericardite) e pode ser assintomático. Pneumopatias também são raras e de aparecimento tardio (fibrose apical, bilateral, podendo tornar-se cística) pode ocorrer infecção por aspergillus. Acometimento neurológico ocorre por fraturas ou instabilidade vertebral, compressão ou inflamação. Luxação ou sub-luxação atlanto-axial, atlanto-occiptal e subluxação cranial do odontóide. Exames Complementares a) Laboratório: hemograma costuma ser mais importante para monitorizar o tratamento com AINH. VHS tem aumento moderado. Elevação sérica leve de IgA. Análise do líquido sinovial revela as alterações inespecíficas de um processo articular, com contagem de leucócitos variando de 2000 a 60.000/mm3 com predomínio inconstante de linfomononucleares. Estudo Radiológico Variam de lesões articulares destrutivas, esclerosantes, com calcificações ligamentares e ossificação a reabsorção óssea e nas inserções de ligamentos e tendões. Ocorrem mais freqüentemente nas articulações sacroilíacas, de modo simétrico. Estadiamento radiológico: Grau 0 = Normal Grau 1 = Duvidoso Grau 2 = Sacroileíte mínima Grau 3 = Sacroileíte moderada Grau 4 = Anquilose Outros dados radiológicos: coluna em bambu, calcificações ligamentosas, sindesmófitos, esporões calcâneos, erosões na sínfise pubiana e em inserções ligamentares. Diagnóstico Critérios para diagnóstico de EA Dor lombar persistindo por >3 meses, que melhora com exercício e não melhora com repouso Rigidez lombar de repouso Diminuição da expansibilidade torácica Sacroileíte unilateral grau 3 a 4 Sacroileíte bilateral grau 2 a 4 Diagnóstico definido = um critério clínico + evidência de sacroileíte Diagnóstico Diferencial Outras doenças do grupo (síndrome Reiter, artrite psoriásica, artrite reumatóide, e outras afecções inflamatórias periféricas). Osteíte condensante do ilíaco. Dor por problemas mecânicos e posturais. Hiperostose anquilosante. Doença inflamatória pélvica, espondilodiscite bacteriana. Tratamento Esquemas posológicos dos fármacos usados em EA Indometacina Meloxicam Naproxeno Fenilbutazona Sulfassalazina Metotrexato Pulso terapia de metilprednisolona 50 mg VO, 3x/dia crianças: 1 – 2 mg/kg/dia 15 mg VO, 1x/dia 500 mg VO, 2x/dia crianças: 10 – 20 mg/kg/dia 200 mg VO, 3 – 4x/dia 500 mg VO, 3 – 4x/dia crianças: 40 – 50 mg/kg/dia 10 – 2- mg VO/semana crianças: 10 mg/m2/semana 1g EV, em 100 ml de SF 0,9% em aprox. 2h crianças: 30 – 40 mg/kg, em aprox. 2h Tratamento cirúrgico necessário para as complicações extraarticulares ou função do aparelho locomotor. Reabilitação Orientação doméstica quanto a postura, para se evitar vícios, exercícios respiratórios e localizados para membros, e de extensão para a coluna. Prognóstico Altamente incapacitante. Quadro de evolução varia muito de acordo com a evolução e diagnóstico precoce. Apenas 25% evoluem para anquilose total da coluna, qualidade de vida e a sexualidade podem ser comprometidas. Pode ocorrer morte súbita devido a lesões em C1 – C2. Síndrome de Reiter Introdução A síndrome de Reiter (SR) é uma tríade composta de: 1 - Artrite 2 - Uretrite 3 - Conjuntivite Etiologia desconhecida. Predominância no sexo masculino e com vida sexual ativa. Tem vinculações em 1/3 dos casos com artrite reativa. Os patógenos mais freqüentes associados são os entéricos (Shigella, Salmonella, Yersinia, Campylobacter) e geniturinários (Clamydia trachomatis e Ureaplasma urealyticum). A SR tem caráter reicidivante, podendo se tornar crônica na sua evolução. Diagnóstico Manifestações articulares variam desde artralgias ater artrites, oligoarticular ou poliarticular. Acomete mais membros inferiores e é assimétrica. Envolve mais enteses (tendão de Aquiles, e região plantar). A conjuntivite é geralmente transitória e autolimitada. Podendo evoluir com epiesclerite, ceratite e ulceração córnea. Envolvimento cutâneo é comum, com ulcerações da mucosa oral ceratodermias (regiões palmar, plantar e escrotal). A presença de artrite periférica tem que ter mais de um mês de duração, ocorrendo em associação com uretrite e/ou cervicite. Achados radiológicos podem ser semelhantes a EA, e os laboratoriais são inespecíficos. Artrite Reativa Introdução A artrite reativa caracteriza-se como uma sinovite asséptica que ocorre em média 2 a 4 semanas após uma infecção bacteriana não articular a distancia, geralmente no intestino ou trato genitourinário. É distinguida de outras artrites induzidas por infecção devido à sua associação com o Complexo Principal de Histocompatibilidade, via antígeno HLA-B27 e com padrão clínico do tipo oligoarticular dos membros inferiores, freqüentemente associado à sacroileíte e as aspectos sistêmicos (conjuntivite, balanite e lesões cutâneas). Tratamento Depende do curso clínico (agudo ou crônico), agente desencadeante, incapacidade funcional articular e envolvimento extra articular. Deve-se seguir os seguintes princípios básico: 1 - Controle da sinovite 2 - Preservação da função articular 3 - Prevenção de deformidades 4 - Erradicação do patógeno agressor e desencadeante A indicação principal é de AINH – 15 mg/dia, seu uso se restringe até a melhora, em média três a quatro semanas. Uso de corticóides é indicado após a persistência ao tratamento inicial. Utiliza-se hexacetonida – triancinolona – 20 a 40 mg. Pacientes que não respondem a este tratamento, entrando para a fase crônica, utilizase metotrexato, azatioprina, ciclosporina, e sulfassalazina. Orientação para repouso e terapia física com calor úmido e seco alternado com gelo e associado com cinesioterapia preservam a função articular e muscular. Episódio agudo, orienta-se natação e caminhada, sem exercícios de descarga. Em relação a coluna vertebral, instruir o paciente a dormir com travesseiro baixo, para evitar deformidades. Artrite Psoriásica Introdução A artrite psoriásica (APs) é uma artropatia inflamatória que ocorre em pacientes com psoríase. Ocorre em 5 – 7% dos portadores de psoríase. Diagnóstico O seu diagnóstico é muitas vezes fundamentado em dados clínicos característicos isolados ou associados, como oligoartrite assimétrica, poliartrite em IFDs, artrite mutilante, acometimento da coluna vertebral, do tipo inflamatório, e envolvimento cutâneo e ungueal. Ocorre um espaço de 20 anos entre o início da psoríase, com a evolução para APs. Pode ocorrer trauma articular precedendo o início da doença. Geralmente apresenta-se com oligoartrite de maior acometimento de IFDs, e tenossinovite dos flexores. Possuem as seguintes formas clínicas: 12- Acometimento das IFDs Artrite mutilante. Ocorre osteólise das falanges e metacarpianos. Maior associação com sacroileíte. Pode acometer os pés. 3 - Poliartrite simétrica. Assemelha-se a artrite reumatóide, porém, na fase crônica, devido a anquilose óssea das articulações interfalangeanas proximais e distais, poderá ser observada deformidade das mãos, “mãos em garra”. 4 - Oligoarticular. Mais comum, assimétrica, com maior acometimento da IFDs, IFPs, MCF, MTF. O acometimento simultâneo das MCF e IFP, e associado a tenossinovite dos flexores, dá aos dedos aspecto semelhante a salsichas. 5 - Espondiloartropatia. Maior tendência a sacroileíte assimétrica e com formação de sindesmófitos atípicos na coluna vertebral. As lesões cutâneas são características da psoríase. Avaliação laboratorial nada apresenta de característico. A hiperuricemia esta relacionada a severidade do envolvimento cutâneo. Aspectos radiológicos são erosões ósseas marginais, neoformação óssea, fusão articular, acroosteólise e periostite. Tratamento Formas clínicas leves e de início recente são tratadas com AINH. Pacientes com artrite psoriásica progressiva, não respondendo ao tratamento com AINH, utiliza-se metotrexato, quando não responde, utiliza-se ciclosporina A. As lesões cutâneas melhoram, com medicamentos sob forma de pomada, a base de carvão ativado, antralina ou corticóide. Bibliografia Cecil, Tratado de Medicina Interna, Vol.1, 20ª Ed. Espondiloartropatias Soronegativas, Série “Diagnóstico e Tratamento Atual de Doenças Reumáticas” – Fascículo 8 – Parte I e II.