ANDRÉ LUIZ DE SOUZA VICENZI A RELAÇÃO ENTRE

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ANDRÉ LUIZ DE SOUZA VICENZI
A RELAÇÃO ENTRE CRISES EPILÉTICAS E HISTERIA DE
CONVERSÃO
Monografia
apresentada para a
realização de Conclusão de Curso no
curso de Psicologia da Universidade do
Vale do Itajaí.
Orientador: Profº Henry Dario Cunha
Ramirez
BIGUAÇU
2007
Dedico essa Monografia ao meu pai e minha mãe
que esforçam-se por arcar financeiramente com
meus estudos.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.......................................................................................04
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA................................................................07
2.1 HISTERIA................................................................................................................ .. 07
2.2 Epilepsia......................................................................................................................13
2.3 Eventos Não Epilépticos...............................................................................................16
3. METODOLOGIA....................................................................................17
4. DISCUSSÃO.............................................................................................18
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................27
6. CRONOGROMA....................................................................................28
3
1. INTRODUÇÃO
O estudo da histeria marcou o início da Psicanálise no fim do século XIX. A
descoberta dos mecanismos da histeria por Freud e Breuer em seus estudos clínicos
constituíram-se a base para compreender-se os mecanismos das neuroses em geral, e de outras
estruturas clínicas como as psicoses e perversões. Com o estudo da histeria Freud introduzia a
Psicanálise, desenvolvendo sua estrutura teórica; a separação entre consciente e inconsciente,
os mecanismos de defesa, e além disso o conceito de associação livre como meio de se
acessar o inconsciente. Esses conceitos estão na base para o desenvolvimento teórico posterior
da Psicanálise e se relacionam intimamente com o interesse de Freud, várias vezes em
colaboração com Breuer, pela histeria.
A histeria, portanto, é um conceito que encontra-se nos manuais e obras
psicanalíticas, não fazendo parte de outras correntes psicológicas, da psiquiatria, e das
ciências médicas em geral. A histeria constitui-se num fenômeno de causas e mecanismos
psicológicos, entretanto o título desse trabalho é a relação entre crises epilépticas e histeria de
conversão. Como se sabe a epilepsia é um fenômeno médico, mais especificamente de causas
e mecanismos neurológicos, então como esse fenômeno se relaciona à histeria?
A histeria é uma patologia que apresenta um amplo leque de sintomas. Freud e
Breuer em sua Comunicação Preliminar (1893, v.2) enumeraram vários, nevralgias e
anestesias, contraturas e paralisias, etc. A epilepsia integrou mais um exemplo desses autores,
entretanto a epilepsia de origem histérica não constitui uma epilepsia genuína ou
organicamente determinada, ela integra o amplo conjunto do que diversos autores costumam
chamar pseudoepilepsias, cujas manifestações sintomáticas aparentam ser ataques epilépticos,
podem até ser diagnosticados falsamente como epilepsia mas registros eletroencefalográficos
não demonstram sinais elétricos típicos de atividade epileptiforme (TOJEK et al, 2000, v. 41,
n. 3).
Então a resposta àquela pergunta, qual é a relação entre epilepsia e histeria, é que a
histeria pode gerar ataques que simulam a epilepsia; a investigação da possível relação e seus
mecanismos será o tema do trabalho. Com esse intento centrar-se-á nos casos de
pseudoepilepsias somente de origem conversiva, pois se associam ao conceito de histeria em
Freud.
4
A relevância científica do trabalho indica a importância do estudo do tema pela
Psicologia ou outras ciências da saúde para o diagnóstico e tratamento das pseudoepilepsias,
já que essas corresponde a uma parte significativa do total de epilepsias. No artigo Stress and
other psycosocial characteristics of patients with psychogenic nonepilepileptic seizures1 os
autores Tina M. Tojek et al afirmaram que em certos estudos a quantidade de pacientes não
epilépticos diminuía depois de ser dado um diagnóstico apropriado e um tratamento
psicotêrapeutico válido (2000, v.4, n.3). Entretanto para administrar um tratamento
psicotêrapeutico válido é necessário mais pesquisas nessa área, o que foi ressaltado por todos
os autores pesquisados.
A relevância social desse trabalho constitui-se em exatamente incentivar a pesquisa
nessa área. Já que se afirmou que vários autores estudados ressaltaram a importância da
pesquisa sobre o tema, então a publicação do trabalho atual, seja em meio acadêmico ou até
em artigos para o público geral, pode incentivar posteriores pesquisadores a se conscientizar e
se interessar para o tema tratado. O trabalho atual é uma revisão bibliográfica; outros
trabalhos adiante poderão ser propostos como pesquisa de campo, com direção a aprofundar
mais o objeto de estudo.
Gates e Paola em seu artigo Eventos Não Epilépticos (1998, v.1), citando o DSM-IV,
subdividem em quatro os transtornos conversivos: a) fenômenos motores, b) fenômenos
sensitivos, c) mistos e, d) crises ou convulsões. Os mesmos autores afirmam:
O DSM-IV infere que 25% a 50% dos pacientes recebendo o diagnóstico de
transtorno conversivo foram anteriormente classificados como portadores de
sintomas legítimos; e ainda: um terço dos pacientes apresenta (ou apresentou)
afecção neurológica legítima. (1998, v.1, p.456).
Infere-se desses dados que se uma porcentagem alta de pacientes que receberam
diagnóstico de transtorno conversivo foram anteriormente diagnosticado como portador de
uma condição médica geral, é possível haver a relação entre epilepsia e histeria de conversão.
Além do mais o autor informou que um terço dos pacientes apresentou afecção neurológica
legítima, deixando margem a dúvida sobre até que ponto muitos sintomas apresentados são
orgânicos ou conversivos.
Portanto se existe uma porcentagem alta de pacientes que recebem o diagnóstico de
transtorno conversivo poderia se atribuir em alguns casos de crises epilépticas causas
vinculadas à histeria de conversão?
1
Estresse e outras características psicossociais de pacientes com ataques não-epilépticos de origem psicogênica
(tradução do autor).
5
Com essa questão, tem-se como objetivo geral pesquisar a relação entre crises
epilépticas e histeria de conversão. Essa relação ramifica-se em duas vias, a relação da histeria
com as pseudoepilepsias de forma geral, e a relação com as crises epilépticas genuínas no
sentido de se elas poderem vir num quadro em conjunto, ou seja, histeria de conversão e
epilepsia genuína, o que constitui os objetivos específicos desse trabalho. Com o sentido de
reforçar os objetivos específicos, exemplificar-se-á um caso real, encontrado na literatura;
esse caso real será analisada detalhadamente e poderá confirmar a possível relação entre os
fenômenos.
Far-se-á uma pesquisa bibliográfica no referencial teórico pesquisado, do qual se
extrairá a questão acima e buscar-se-á os objetivos mencionados. Portanto, a pesquisa vai ser
uma revisão bibliográfica, com a inclusão de um exemplo de um caso real para enriquecer o
trabalho.
O referencial teórico serão as obras freudianas, os seus diversos artigos reunidos na
coleção Imago, da qual extrair-se-á a teoria das neuroses de forma geral, e a histeria
particularmente; a primeira e segunda teoria de Freud sobre histeria. Outros autores
psicanalíticos que poderão ajudar a entender Freud serão usados também. Em conjunto com a
teoria de Freud pesquisar-se-á os inúmeros artigos médicos sobre pseudoepilepsias,
principalmente os que estarão mais estreitamente relacionados aos temas de transtornos
conversivos.
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2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
2.1 HISTERIA
A histeria é uma patologia conhecida desde a Idade Antiga. Hipócrates (460-377
a.C.), célebre médico grego, esforçando-se para separar a histeria de práticas místicas
(encantamentos, sacrifícios, expiações), e buscando estudá-la mais racionalmente associou a
convulsão histérica a uma “doença comum” como a epilepsia (MANNONI, 1989).
Na Idade Média, houve uma regressão para práticas místico-religiosas quando
acreditava-se que as convulsões eram manifestações demoníacas e os “doentes” condenados à
fogueira da Inquisição(MANNONI, 1989).
Na Idade Moderna a medicina principia novamente a ganhar espaço nas explicações
dos ataques histéricos. Edward Jorden (1569-1632) foi nomeado perito junto a um Tribunal
para defender Elizabeth Jackson, uma velha senhora acusada de enfeitiçar Mary Glover, uma
menina de quatorze anos. As duas haviam então brigado, e a menina foi tomada de ataques
convulsivos (mutismo, cegueira, paralisia), que reapareciam toda vez que a jovem encontravase com Elizabeth Jackson. Jorden usou esse último fato para propor que um elemento afetivo
entrava em ação, e ofereceu outros exemplos ao juiz. Denominou então as convulsões de
“paixões histéricas” (MANNONI, 1989).
Edward Jorden foi o primeiro a lançar uma obra em que oferecia explicações
médicas à histeria, posteriormente à Idade Média. O interesse de sua obra constitui-se em
enfatizar que o indivíduo pode utilizar outras linguagens que não a fala para exprimir o seu
sofrimento psíquico. Os sintomas histéricos são o exemplo desse fato.
A autoridade judiciária manteve-se insensível aos apelos de Jorden, e condenou a
velha senhora à morte. O autor com suas explicações psicológicas não ofereceu uma cura, isto
é, um medicamento que devolvesse a saúde à Elizabeth Jackson. Havia então uma concepção
médica da doença, que as reduzia à condições orgânicas, e se não eram adequadamente
explicada, taxava-se de bruxaria. Atualmente, muitas doenças psicogênicas são rotuladas de
orgânicas porque torna-se dificultoso a classificação e a determinação das causas e assim ela
permanece obscura, obstaculizando a psicoterapia. Hoje , no século XXI, como à época de
Edward Jorden, há uma atitude reducionista, e a preferência pela explicação mais fácil
(MANNONI, 1989).
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Thomas Sydenhan viveu no século XVII, e estudou as queixas hipocondríacas nos
homens caracterizando-as de forma equivalente à histeria feminina. Ele denomina histeria
“[...]a toda pertubação somática de origem psíquica[...]” (MANNONI, 1989, p.9). Outro autor
importante é Ferriar, no século XVIII, cunhando o termo conversão para as crise histéricas.
Contemporaneamente, concepções místico-religiosas perderam o espaço em relação
ao progresso das ciências médicas e psicológicas. Já na segunda metade do século XIX
Charcot (MANNONI, 1989), um anátomo-patologista, submete pacientes histéricos que
morreram de anorexia ou espasmos a autópsia, com o objetivo de encontrar lesões nervosas
que pudessem explicar o quadro histérico. Porém Charcot não as encontrou, e hipnotizando
pacientes no hospital de Salpêtrière na França descobre outras leis que explicam os
fenômenos histéricos; leis mentais.
No entanto, conforme
Mannoni, Charcot não se interessava em aprofundar os
estudos psicológicos da histeria. Essa problema ficou mais para Freud. Charcot era um
médico, muito voltado a explorar a anatomia e a fisiologia do corpo humano. O que lhe
interessava era classificar e distinguir certos sintomas histéricos similares a alguns estados
patológicos orgânicos. Em poucas palavras, Charcot se interessava pelo diagnóstico
diferencial, de forma que buscou separar a histeria da epilepsia. Esta organicamente
determinada, e aquela psiquicamente determinada, entretanto mais tarde avança o conceito de
histero-epilepsia (1989).
Charcot preocupava-se em descrever os sintomas histéricos. Eles deixaram de ter a
sua natureza maleável, como com Freud e Lacan constituiriam-se mais adiante, em troca
passaram a ser quadros fixos descritíveis. Com o objetivo de aguçar o diagnóstico diferencial
“[...]se monta uma cena do teatro da histeria, na qual o paciente é chamado a repetir as crises
para fins didáticos.” (MANNONI, 1989). Nesse contexto a linguagem da histeria perde sua
importância para o ideal descritível do médico.
Freud dedicou-se a estudar os mecanismos psíquicos da histeria. No início dos seus
estudos clínicos, entre 1893 e 1895, a noção de que a histeria derivava de traumas era básica
ao autor. Os traumas poderiam ser conseqüência de abalos físicos, mas que produzem
emoções intensas, como a queda de uma tora sobre um membro do corpo, que faz o indivíduo
pensar em morte, por exemplo; abalos emocionais, como por exemplo uma ofensa moral não
assimilada adequadamente pelo indivíduo e que pode ser associada a vômitos histéricos
(FREUD, 1893, v.2); ou mini-traumas que somados na estrutura psíquica davam como
produtos um grande trauma. Em todos eles encontram-se representações carregadas de afetos
que não foram adequadamente ab-reagidas; sejam representações pré-conscientes, ou
8
representações completamente separadas da consciência, mas todas elas buscam uma válvula
de escape no corpo, na inervação motora.
A expressão do psíquico no somático caracteriza o termo conversão. A histeria é uma
neurose conversiva, ao contrário das outras neuroses (obsessão, fobia) que não são
conversivas. A conversão é a transformação da soma de excitação de representações mentais
em alterações somáticas corporais. A soma de excitação relaciona-se a representações mentais
não aceitas na consciência do indivíduo, que carregadas de afetos pressionam constantemente
por uma forma de expressão. O corpo pode ser uma saída para essa pressão constante, e dessa
forma o fenômeno é denominado histeria, podendo desencadear sintomas tais como
contraturas, paralisias, cegueira, e o sintoma estudado a epilepsia (falsa epilepsia). Entretanto,
as outras neuroses não são fenômenos conversivos. A soma de excitação na obsessão instalase no pensamento, originando os sintomas obsessivos-compulsivos. Na fobia, o temor que o
indivíduo sente das representações internas projeta-se num objeto exterior.
Como foi mencionado anteriormente, os traumas em um certo período da visão
teórica freudiana desencadeavam a histeria. Entretanto não se pode afirmar que todos os
indivíduos têm a mesma predisposição para ser afetado por uma cena traumática. A força
traumática capaz de originar um trauma varia qualitativamente e quantitativamente de pessoa
para pessoa segundo sua suscetibilidade psicológica, o momento da ocorrência do trauma e o
estado de consciência em que o indivíduo se encontra (agitado, tranqüilo, nível de maturidade
biológica, etc). Um evento que poderia ser considerado com força traumática grande, não foi
capaz de produzir nenhum sintoma histérico em uma pessoa; um outro, de força traumática
pequena, desencadeou a histeria. Da mesma maneira, a quantidade de traumas varia de
indivíduo para indivíduo; para alguns uma quantidade de experiências traumáticas grandes
são necessárias, e às vezes dependendo da pessoa, nem isso conduz a sintomas histéricos. Em
outros, um número pequeno de experiências traumáticas já é capaz de culminar em histeria.
Para uma cena traumática atuar nas causas dos sintomas histéricos, ela precisa
preencher dois requisitos: a adequação como determinante, e precisa da necessária força
traumática (FREUD, 1896, v.3). A adequação como determinante ocorre quando existe uma
relação de similaridade entre os sintomas e o evento que os desencadearam. Segundo o
exemplo de Freud, a visão de um cadáver em decomposição por uma menina
compreensivelmente poderá produzir vômitos histéricos, pela alta dose de repugnância
embutida na experiência (v.3, 1896); os vômitos histéricos tornam-se de difícil compreensão,
porém, se a análise revelar cenas em que ela presenciou discussões severas entre seus pais. Do
mesmo modo, visualizar um cadáver em decomposição é distinto de comer, por exemplo, uma
9
fruta estragada. Se a análise revelar que este último evento desencadeou a histeria , parece não
preencher o requisito da necessária força traumática (FREUD, 1896, v.3).
Freud relatou que em sua experiência clínica, ocasionalmente esses dois requisitos
são preenchidos; porém com freqüência muito maior ou não coincide a adequação como
determinante, ou a força traumática, ou nenhum dos dois casos (1896, v.3). Então como tornase possível compreender os eventos histéricos? A afirmação que experiências não adequadas
relacionam-se à patologia confirmaria a tese de muitos autores da sua época que enfatizavam
a origem hereditária da mesma.
Porém a experiência clínica de Freud o fez constatar que as experiências de vida
poderiam ter tanta importância ou mais que a hereditariedade na determinação da etiologia da
histeria. Mas não uma ou duas experiências seriam determinantes, o que atua na etiologia da
histeria compõe-se de uma cadeia de lembranças, algumas facilmente recordáveis; outras
extramamente difíceis, como aquelas da infância precoce anterior aos cinco anos. O próprio
autor afirma: “Aprendemos que nenhum sintoma histérico pode emergir de uma única
experiência real, mas que, em todos os casos, a lembrança de experiências mais antigas
despertadas em associação com ela atua na causação do sintoma.” (FREUD, 1896, v.3,
p.194).
Se uma experiência não preencher o requisito da adequação em relação ao sintoma,
por exemplo, e se a lembrança desse evento não for suficiente para erradicar os sintomas,
então o terapeuta deve ter paciência e persistir, de acordo com Freud. Ele deve partir dessa
lembrança para outras mais antigas em ordem cronológica. De acordo com Freud, o terapeuta
encontrará uma cadeia de lembranças que em conjunto preenchem os requisitos de adequação
e necessária força traumática. O sintoma se liga a diferentes detalhes da experiência (FREUD,
1896, v.3).
Quando remove-se o afeto excessivo das lembranças pertubadoras provocando a abreação pela catarse no tratamento terapêutico, então a patologia é erradicada ou grandemente
atenuada.
Freud investigando essas cadeias de lembranças, observou que todas elas convergiam
para um pequeno número de experiências que possuíam a mesma natureza, a saber:
procediam do campo sexual. Aquele autor acreditava que a força traumática das experiências
e os recalques envolvidos nelas teriam a condição de explicar a origem de uma patologia
como a da histeria.
Se submeterem ao mais rigoroso exame minha afirmação de que a etiologia da
histeria repousa na vida sexual, os senhores verificarão que ela é confirmada pelo
fato de que, em dezoito casos de histeria, pude descobrir essa conexão em cada
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sintoma isolado e, onde o permitiram as circunstâncias, pude confirmá-lo pelo
sucesso terapêutico. (1896, v.3, p.197).
Já em 1896, o que se pode inferir da revisão da literatura das obras freudianas (v.3) a
primeira teoria deste autor para a histeria estava bem firmada. O trauma que originava a
histeria deixou de ser qualquer trauma. Ele passou a ser uma sedução sexual de um adulto ou
uma vivência precoce da criança dessa natureza. Mas entretanto era menos o vestígio psíquico
do trauma que desencadeava a histeria do que a natureza do conflito envolvida entre
inconsciente e consciente. “ O impulso essencial da histeria, portanto, consiste no conflito
entre uma representação portadora de um excesso de afeto, por um lado, e uma defesa infelizo recalcamento- que torna a representação ainda mais virulenta.” (NASIO, 1991, p. 28).
A sexualidade ao ocupar um lugar de destaque na etiologia das neuroses, e sendo a
histeria um tipo de neurose, levou Freud a propor a tese de causas específicas, que são
fundamentais na produção do distúrbio. As outras duas constituem-se nas precondições e nas
causas concorrentes.
As causas específicas da histeria fundamentam-se em experiências sexuais infantis
“[...]com excitação real dos órgãos genitais, resultante de abuso sexual cometido por outra
pessoa[...]” (FREUD, 1896, v.3, p.151). As experiências sexuais têm a característica de ser
passiva e ocorrer anterior à idade de dez ou oito anos. À época da experiência, os órgãos
genitais não se encontram desenvolvidos, e a experiência surte pouco efeito. Na puberdade,
porém, o desenvolvimento dos órgãos genitais e o lançamento de hormônios na corrente
sanguínea, avivam o traço mnêmico, ao mesmo tempo que o desenvolvimento moral do
indivíduo o recalca.
Freud relatou fatos que confirmassem essa tese. O autor relata: “Pude efetuar uma
psicanálise completa em treze casos de histeria, três dos quais eram combinações efetivas de
histeria e neurose obsessiva.” (1896, v.3, p.151), a seguir ele afirma que em nenhum dos casos
faltou a causa específica mencionada; seja um ataque brutal praticado por um adulto, uma
sedução mais tênue, ou mais freqüentemente o sexo entre duas crianças, na maioria das vezes
irmãos, que repetiam o ato até atingir a puberdade (1896, v.3). No ato dos irmãos havia um
que era o componente ativo, o menino, e um que era o passivo, a menina, esta última
desenvolvia os ataques histéricos.
A precondição da histeria é a hereditariedade: “[...]a ação da hereditariedade é
comparável à de um multiplicador num circuito elétrico, multiplicador este que exagera o
desvio visível da agulha, mas não pode determinar sua direção.” (1896, v.3, p.147), as causas
concorrentes das neuroses de forma geral e da histeria de forma particular podem ser
11
enumeradas: pertubação emocional, esgotamento físico, doenças graves, intoxicações,
acidentes traumáticos, sobrecarga intelectual, etc. (FREUD, 1896, v.3, p.147).
A precondição atua como uma suscetibilidade especial, as causas concorrentes como
fatores estressores.; nenhuma das duas podem substituir qualitativamente as causas
específicas na causação dos sintomas da histeria. Entretanto quantitativamente a precondição
e as causas específicas podem se compensarem; já as “[...]causas concorrentes banais podem
também substituir a etiologia específica com respeito à quantidade, mas nunca tomar o seu
lugar inteiramente.”(FREUD, 1896, v.3, p.148).
Freud introduziu uma modificação em sua teoria em 1900 (NASIO, 1991), que será
designada nesse trabalho como segunda teoria para a histeria. Nessa teoria a histeria se
associa essencialmente ao desenvolvimento do corpo pulsional infantil. Pulsão se diferencia
de estímulo, aquela é uma excitação (pressão constante) de uma fonte endossomática, o
estímulo é produzido por excitações vindo de fora. As fontes das pulsões sexuais são
denominadas zonas erógenas. Há duas zonas erógenas pré-genitais muito importante na
atividade sexual infantil, e a zona genital, que predomina a partir da adolescência.
Entretanto várias órgãos do corpo podem funcionarem como zonas erógenas, as
principais anteriormente às zonas genitais assumirem o comando são as organizações sexuais
da fase oral ou canibalesca, e sádico-anal (FREUD, 1905, v.7). As outras fontes (pele, olhos,
músculos, etc) são fontes acessórias e se caracterizam por ser não sexuais, mas são muito
importantes na sexualidade ao se associarem a ela.
A atividade sexual da criança (anterior aos cinco anos) é essencialmente auto-erótica
e sem inibições. Com o desenvolvimento da constituição moral do indivíduo essas atividades
e desejos tendem a ser recalcados nos psiconeuróticos. Mas o recalcamento não diminui a
intensidade do desejo, ao contrário, intensifica-o por não permitir sua expressão somática
apropriada, conduzindo a gerar fantasias inconsciente. Nasio definiu muito bem fantasia: “[...]
um acontecimento psíquico carregado de afeto, um verdadeiro micro-taruma local, centrado
numa região erógena do corpo e consistindo na ficção de uma cena traumática [...]” (1991, p.
38).
A histeria surge do fracasso do recalcamento e a conseqüente substituição de uma
zona erógena essencial por uma acessória (qualquer parte do corpo) por meio do desvio da
tensão sexual excessiva. Eventos reais traumatizantes, principalmente abusos sexuais na
infância ainda continuam sendo muito importantes por perturbar o desenvolvimento do corpo
pulsional e se associarem às fantasias mnêmicas do indivíduo mas não são a condição
essencial na segunda teoria de Freud.
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2.2. Epilepsia
Antes de iniciar o tema mais específico desse trabalho, o estudo das pseudoepilepsias
que podem ter origem histérica, é necessário anteriormente conceituar, caracteriza e
classificar as epilepsias. A epilepsia é um distúrbio orgânico que pode ser hereditário ou
sintomático a uma patologia ou lesão A epilepsia pode ser definida como:
[...]um tipo de disfunção cerebral caracterizada clinicamente por alterações
subjetivas ou comportamentais súbitas (“crises epilépticas”), com tendência a se
repetirem ao longo da vida do paciente. Essas crises refletem uma atividade elétrica
anormal, de início súbito, acometendo uma ou várias áreas o córtex cerebral. Essa
alteração da atividade elétrica cortical, por sua vez, pode ser causada por um semnúmeros de patologias estruturais ou neuroquímicas. (PALMINI; COSTA, 1998,
v.1, p.149).
O diagnóstico da epilepsia abrange duas características que devem ser levadas em
consideração na sua classificação: os tipos de crises e a existência de etiologia definida
(PALMINI; COSTA, 1998, v.1).
Quanto aos tipos de crise elas são subdivididas em crises parciais, generalizadas ou
indeterminadas. Em relação à etiologia classifica-se as epilepsias em idiopáticas, sintomáticas
ou criptogênicas
As crises parciais, por sua vez, subdividem-se em crises parciais simples (CPS) e
crises parciais complexas (CPC). Nas crises parciais simples a responsividade do paciente é
preservada, ou seja, ele mantém-se com a consciência preservada durante a alteração da
atividade elétrica do cérebro (crises epilépticas). Nas crises parciais complexas a
responsividade não é preservada.
Existem vários tipos de CPS; as do tipo motoras, sensitivo/sensorial, vegetativo(por
exemplo, sensações súbitas na região epigástrica) ou psíquicas(a mais comum é uma súbita
sensação de medo imotivado). Comumente as CPS duram apenas alguns segundos, e o mais
comum é elas evoluírem para um comprometimento da responsividade do paciente. A
alteração da responsividade é explicada pela natural propagação da atividade elétrica através
das conexões sinápticas.
Quando o paciente principia a ficar ausente, por exemplo, não responder a chamados
verbais, uma crise do tipo CPC já está dominando-o. Nas CPC são comuns automatismos
motores: movimentos do tipo mastigar, engolir, lamber-se, etc; automatismos mais complexos
são comuns também: abrir e fechar uma gaveta repetidamente, masturbar-se, e outros. A
pessoa não se recorda desses eventos e constantemente apresenta-se confusa durante alguns
13
minutos ou horas após a crise. Quando uma pessoa relata uma crise epiléptica, ela está
descrevendo as CPS inicias, não as CPC (PALMINI; COSTA, 1998, v.1).
As crises generalizadas(CGEN) distinguem-se das crises parciais pela característica
que nas CGEN grande parte das estruturas dos dois hemisférios, ou a totalidade das estruturas
apresentam a atividade elétrica alterada (PALMINI; COSTA, 1998, v.1), com ondas agudas
detectadas pelo eletroencefalograma; enquanto que as crises parciais exibem alteração da
atividade elétrica focal, seja ela lateral ou bilateral.
As CGEN classificam-se em crises primariamente generalizadas ou secundariamente
generalizadas. Nas crises primariamente generalizadas a atividade elétrica generalizada está
presente desde o início, enquanto que nas secundariamente generalizadas as crises iniciam-se
parcial e generalizam-se por todo os dois hemisférios. (PALMINI; COSTA, 1998, v.1).
Segundo Palmini e Costa (1998, v.1) quatro são os tipos de CGEN:
1)
crises generalizadas tônico-clônicas (CGTC): tipo mais comum,
caracteriza-se por contração inicial tanto da musculatura axial quanto das
extremidades , por alguns segundos; em seguida advém os denominados
movimentos clônicos, estado hipertônico com interrupções intermitentes,
envolvendo a musculatura extra-ocular, os aparelhos fonatórios,
ventilatório e a musculatura masseteriana, que determinam o “célebre
revirar os olhos”, a produção de sons guturais, por exemplo;
2)
crises de ausências: segundo tipo mais comum. As ausências clássicas
duram menos de dez segundos, iniciam e terminam de forma abrupta,
com a pessoa seguindo suas atividades como se nada tivesse acontecido.
Durante as ausências o paciente pode apresentar movimentos sutis tais
como, piscamento, tremor ao redor da boca ou um leve desvio do olhar
para cima;
3)
crises mioclônicas: caracterizam-se por breves abalos muscalares,
geralmente envolvendo as extremidades dos membros superiores;
envolvimento bilateral e simétrico dos músculos. As mioclonias ocorrem,
em sua maior parte, pela manhã ao acordar, e são ativadas por privação
de sono, uso de álcool, tensão emocional e estímulos luminosos. Os
pacientes descrevem como “sustos” ou “choques elétricos”;
4)
“drop attacks”: quedas abruptas súbitas ao solo, como primeira
manifestação da crise. Caracterizam-se por constituírem a forma mais
14
severa de epilepsia, sendo acompanhadas por retardo mental e outras
manifestações neurológicas.
Quando há uma difícil caracterização entre crises parciais ou generalizadas, então
define-se como indeterminadas.
Em relação à etiologia, como mencionado, elas dividem-se em idiopáticas,
sintomáticas ou criptogênicas.
As epilepsias idiopáticas subdividem-se em epilepsias parciais idiopáticas e
epilepsias generalizadas idiopáticas. As epilepsias parciais idiopáticas “[...]se comportam
evolutivamente como benignas, ou seja, com tendência à cura e sem sinais de deterioração
neuropsíquica.” (FEJERMAN; CARABALLO; TENEMBAUM, 1998, v.1, p.203). As
características básicas constituem-se em: origem genética e tendência a apresentar as crises na
infância. 15 a 25% de epilepsias em crianças menores de quinze anos são de origem parcial
idiopática (FEJERMAN; CARABALLO; TENEMBAUM, 1998, v.1, p.203).
As epilepsias generalizadas idiopáticas ou primárias caracterizam-se por: ser de
origem genética, ocorrência durante a vigília e envolvimento de ambos os hemisférios desde o
início,e sendo que no período entre duas crises não há alteração da atividade elétrica cortical.
Três tipos de crises compõe o quadro das epilepsias generalizadas idiopáticas, as crises
tônico-clônicas generalizadas, ausências e mioclonias, que podem ocorrer separadamente ou
combinadas.
As epilepsias generalizadas idiopáticas são classificadas em ordem de idade, segundo
o início das crises: 1)convulsões neonatais familiares benignas; 2) convulsões neonatais
benignas; 3) epilepsia mioclônica benigna da infância; 4) epilepsia ausência da infância; 5)
epilepsia ausência juvenil; 6) epilepsia mioclônica juvenile e; 7) epilepsias com crises tônicoclônicas generalizadas do despertar (YACUBIAN, 1998, v.1).
Quando as epilepsias são o sintoma de uma doença ou lesão, elas são classificadas
em sintomáticas ou criptogênicas. A existência de etiologia bem determinada as define como
sintomáticas. Quando os meios disponíveis não conseguem determinar as causas, porém
pressupõe-se que elas sejam sintomáticas a uma doença, então classifica-se como
criptogênicas (LIMA, 1998, v.1).
As epilepsias sintomática e criptogênicas também subdividem-se em parciais e
generalizadas. As epilepsias sintomáticas e criptogênicas parciais são as que mais
freqüentemente se iniciam na idade adulta, e compreendem síndromes de grande variabilidade
individual segundo a localização anatômica e dados clínicos. As epilepsias generalizadas
sintomáticas e criptogênicas são síndromes raras (LIMA, 1998, v.1).
15
Em relação à etiologia das síndromes sintomáticas elas são variadas; podendo ser
uma patologia congênita ou infecciosa, muito comum em países em desenvolvimento;
traumatismos cranioencefálicos, com lesões perfurantes ou que conduzem à inconsciência;
doenças cerobrovasculares, que vêm aumentando devido a crescente importância da
população idosa; alcoolismo e; neurocisticercose (LIMA, 1998, v.1).
2.3. Eventos Não Epilépticos
Paola e Gates (1998, v.1, p.455) citando Luther et al, e Gumnit e Gates propuseram
uma subdivisão para o que eles denominaram de “eventos não epilépticos” de origem
psicogênica. Cinco são as subdivisões:
1)
grupo de pacientes com dificuldade em adaptação que objetivam um
ganho secundário com as “falsas crises”;
2)
grupo que interpreta erroneamente sensações que julgam ser epilépticas,
muitos recebendo erroneamente medicações em conseqüência do erro;
3)
pacientes psicóticos que apresentam quadros confusionais similares a
crises epilépticas;
4)
reações do tipo conversivas, desencadeadas por conflitos emocionais;
caracteriza-se por pacientes com histórias de desajustes familiares,
abusos sexuais e traumas emocionais múltiplos. Os autores enfatizaram
que esse é o maior de todos os subgrupos;
5)
Grupo de pacientes com crises parciais simples legítimas, mas que
tendem a supervalorizar esses eventos e como conseqüência segue-se
eventos não epilépticos.
Bhatia
apresenta
algumas
formas
de
crises
de
pseudoepilepsia:
pseudoepilepsias do tipo convulsiva, perda de tônus muscular, não responsividade
com posterior confusão e mioclonias (2004, v. 41, n. 7). Observa-se que esses
sintomas se parecem com as alterações comportamentais em crises epilépticas
genuínas.
16
3. METODOLOGIA
Com o plano de se atingir os objetivos propostos, utilizar-se-á a pesquisa
bibliográfica. O pesquisador ao efetuar uma pesquisa bibliográfica busca investigar toda a
documentação referente ao tema delimitado. “Os documentos são estocados em centro de
documentação, bibliotecas, museus, banco de dados, arquivos etc., que se especializam na sua
conservação e classificação.” (CHIZZOTTI, 2005, v.16, p.109). Define-se pesquisa
bibliográfica como uma forma de “[...]explicar um problema a partir de referências teóricas
publicadas em documentos.” (CERVO, BERVIAN, 1996, p.48).
Bibliotecas e banco de dados como a internet constituirão o centro de documentação
privilegiado na pesquisa bibliográfica em curso. Convém ressaltar que a pesquisa
bibliográfica pode ser original ou um resumo de assunto. “Como trabalho científico original,
constitui a pesquisa propriamente dita na área das Ciências Humanas. Como resumo de
assunto, constitui geralmente o primeiro passo de qualquer pesquisa científica. (CERVO;
BERVIAN, 1996, p.48). Como nas obras psicanalíticas pode-se encontrar muito material a
respeito de histeria, mas pouco que associa a histeria e epilepsia, o trabalho se reveste de uma
certa originalidade; pelo menos no Brasil As obras freudianas consultadas, as mais
pesquisadas até o momento, não trouxeram nenhum caso específico do tema delimitado.
Pretende-se que nessa pesquisa bibliográfica organize-se a coleta e análise do
material segunda a recomendação de Luiz de Paiva Neto, a partir do nível geral do tema a ser
tratado ao nível específico ( 2005). Nesse sentido pesquisar-se-á histeria, epilepsia, eventos
não epilépticos para a posterior discussão na Monografia.
17
4. DISCUSSÃO
O levantamento de dados sobre o tema do trabalho começou com a busca de
respostas sobre a definição, causas e mecanismos da neurose histérica. Já se conhecia
anteriormente ao Projeto para a Monografia a primeira teoria de Freud sobre a histeria, de que
era derivada de representações carregadas de afetos, recalcadas pela consciência e que
buscavam uma forma de expressão através de distúrbios somáticos. Conhecia-se também o
conceito de precondições, causas concorrentes e causa específica, esta última, estando na
origem da histeria, correspondia a força traumática adquirida por meio de experiência sexual
prematura na infância, em que a criança foi o objeto passivo de algum familiar ou adulto.
Entretanto a investigação do tema teve início ao especificar-se a epilepsia como uma
possibilidade de conversão histérica. Neste ponto os objetivos ainda não estavam claros, mas
pretendia-se fazer a relação entre epilepsia e histeria de conversão. Começou-se a revisão
bibliográfica, pretendendo conhecer-se mais sobre histeria estudando as obras freudianas.
Definição, causas, mecanismos e inúmeros casos relatados da experiência clínica de Freud e
Breuer estão presentes no v.2 e v.3 da coleção Imago. Nenhum caso relatado por esses autores
de um paciente que apresentava o sintoma de “simulação de epilepsia” como uma crise
histérica foi encontrado, mas atingiu-se o objetivo de ter-se uma visão geral sobre histeria de
conversão, mais especificamente a primeira teoria de Freud.
Estudou-se um relatório de uma estagiária, apresentado no Projeto para a Monografia
e discutido mais adiante em que um paciente atendido por ela apresentava crises epilépticas
de origem conversiva em associação com crises epilépticas genuínas. Esse relatório
constituiu-se no primeiro material em que associou-se epilepsia a uma possível histeria de
conversão.
Pesquisou-se em artigos reunidos por Jaderson Costa e outros autores no v.1 de seus
Fundamentos Neurobiológicos da Epilepsia definição de epilepsia, classificação e aspectos
clínicos dessa condição médica. Estudou-se um artigo sobre eventos não epilépticos na
mesma obra e as cinco subdivisões propostas no tópico Eventos Não Epilépticos da Revisão
Bibliográfica desenvolvida neste trabalho.
A esse ponto a definição dos objetivos tornou-se mais nítida. Escolheu-se
obviamente o extenso subgrupo dos conversivos, ou seja, de epilepsia de origem conversiva, e
com isso buscar estatísticas de significância e fazer análises da relação dinâmica entre
epilepsias e histeria de conversão. Pesquisar como os autores explicam as epilepsias de
18
origem psicogênica para poder responder a pergunta proposta no trabalho, a saber: se é
possível atribuir em alguns casos de crises epilépticas causas vinculadas a histeria de
conversão?
Dessa forma chegou-se a pesquisar artigos médicos de pseudoepilepsias numa
tradução livre do inglês pseudoseizures já que artigos em português não foram encontrados, o
que se infere que a pesquisa no Brasil sobre esses tema é muito pobre. Pseudoseizures “[...]
are events that resemble epileptic seizures behaviorally but demonstrate no coincidence
epileptiform activity during electroencephalographic recording.”2 (TOJEK et al, 2000, v. 41,
n.3, p. 221). Bhatia enumera uma lista de sinônimos de pseudoseizures, dentre os quais
nonepileptic seizures, nonepileptic psychogenic seizures, hysterical seizures, psychogenic
seizure, hystereoepilepsy3 e muitos outros (2004, v.41, n.7).
A lista de sinônimos mencionadas se referem a uma ampla gama de fatores
psicogênicos associados a esses eventos: incluídos abusos sexuais, físicos e psicológicos na
história de pacientes que apresentam essa sintomatologia; ocorrência de pseudoataques
epilépticos em resposta a eventos estressantes (discórdias parentais, morte de amigo, doença
crônica, problemas financeiros, pressão por performance, etc) na infância e adultez, ou em
resposta a dilemas incomunicáveis, adiante conceituado. Comorbidade de ansiedade e
depressão costumam ser relacionadas a pseudoepilepsias. Outro ponto importante é que
muitas vezes esses pseudoataques não são associados a conversão ou uma forma inconsciente
de descarregar afetos, mas uma simulação em vista a buscar ganhos secundários, em inglês
essa forma específica de ataque não epiléptico denomina-se malingering. Já outras vezes as
pseudoepilepsias são confundidas com certas desordens somatoformes como ataques de
pânico, por exemplo.
É interessante ressaltar que esses fatores psicogênicos podem se aproximar ou
distanciar das causas vinculadas a etiologia específica da histeria de conversão. É interessante
também notar que esses mesmos fatores podem estar presentes tanto em pseudoepilepsias
como em epilepsias dificultando um diagnóstico adequado.
Paralela a revisão bibliográfica de artigos psiquiátricos, o estudo da segunda teoria de
Freud sobre a histeria ajudará na interpretação dos dados colhidos para esse trabalho. Na
teoria desenvolvida pelo autor, que na verdade é uma continuação da primeira, a noção de
2
Pseudoepilepsias são eventos que lembram ataques epilépticos comportamentalmente sem demonstrar
coincidência com atividade epileptiforme durante registro eletroencefalográfico (tradução do autor).
3
Ataques não epiléptiticos, ataques psicogênicos não epilépticos, ataques histéricos, ataques psicogênicos,
histereoepilepsia (tradução do autor).
19
trauma só adquirirá importância na medida em se inscreve na vida de fantasia do indivíduo
(NASIO, 1991).
Tina M. Tojek et al informam que pacientes não epilépticos representam 5 a 20% do
total de pacientes epilépticos, com 75% dos casos ocorrendo em mulheres. A média de idade
do diagnóstico é de 30 a 40 anos (2000, v.41, n.3). Já Peter Salmon et al fornecem os dados de
que pacientes não epilépticos respondem por 5 a 37% dos pacientes que procuram
neurologistas por sofrerem ataques epilépticos (2003, v.65, n.4). Os mesmos autores
informam que muitos destes são falsamente diagnosticados como epilépticos e recebem
tratamentos iatrogênicos com drogas antiepilépticas. Na continuação do texto eles revelam
que existe uma longa tradição de fornecer explicações de aflições psicológicas em atribuição
às crises não epilépticas. Já problemas físicos associados a essa forma de crise são menos
encontrados na literatura do que problemas psicológicos.
James L. Griffith, Alexis Polles e Melissa E. Griffith informam uma estatística
próxima ao dos outros autores relacionados. As pseudoepilepsias ocorrem de 5 a 30% entre
pacientes de diferentes populações epilépticas, algumas vezes sozinha, outras vezes em
comorbidade com epilepsias genuínas (1998, v.39, n.2).
As estatísticas arroladas demonstram a significância da população de não epilépticos
entre a população de epilépticos. Entretanto não encontrou-se uma estatística específica que
informara a porcentagem de histéricos conversivos entre a população de pseudoepilépticos, ou
seja, que os sintomas são uma expressão de conteúdos inconscientes reprimidos, em vez de
ser “sintomas” simulados objetivando ganhos secundários (malingering), ou uma
supervalorização de crises parciais simples, ou certos sintomas em pacientes psicóticos com
quadros confusionais que se assemelham a crises epilépticas etc,
mas sabe-se que os
transtornos conversivos desse tipo são o mais extenso do subgrupo de não epilépticos
(GATES; PAOLA, 1998, v.1).
M. S. Bhatia fornece uma estatística muito importante para os objetivos desse
trabalho, que as pseudoepilepsias constituem em torno de 25% de pacientes histéricos (2004,
v.41, n.7), o que responde positivamente a questão de se é possível vincular causas histéricas
a quadros epilépticos. Também é possível que em alguns desses casos exista a comorbidade
de epilepsia.
A indagação da causa e possíveis fatores relacionados desse misterioso fenômeno
trouxe algumas respostas de interesse para esse trabalho. Salmon et al aludem uma numerosa
literatura associando as pseudoepilepsias a abusos sexuais. Os autores relatam que um terço a
um quinto de indivíduos com essa sintomatologia lembram-se de ter sofrido assalto sexual
20
durante a sua infância ou existência, ao revisarem a literatura. Entretanto os mesmos autores
criticam as conclusões dos estudos pelo fato de ser estudos não controlados (obter
informações clinicamente antes que por exames padronizados), usarem amostras pequenas ou
exclusivamente femininas, não compararem por idade ou gênero, e por haver também outros
estudos demonstrando uma alta prevalência de abusos físicos em pacientes não epilépticos
(2003, v.65, n.4). Conforme os autores mencionado vários outros também referem uma alta
prevalência de abusos de forma geral (abuso sexual, físico e psicológico) na história de
pacientes com essa psicopatologia (TOJEK et al, 2000, v. 41, n. 3; GRIFFITH, J.; POLLES,
A; GRIFFITH, M., 1998, v.39, n. 2).
Salmon e colaboradores comparando grupos epilépticos e não epilépticos, sem haver
a comorbidade entre as duas patologias, usando amostras amplas e controladas, tanto de
homens quanto de mulheres, questionaram-se o que estaria unicamente associado a quadros
pseudoepilépticos. Eles realmente acharam uma alta incidência de abuso sexual de pacientes
não epilépticos em relação aos pacientes epilépticos. Entretanto acharam uma maior ainda
incidência de abusos físicos e psicológicos, e os mesmos indivíduos que relataram sofrer
abusos sexuais também relatavam sofrer as outras formas de abuso. Ao mesmo tempo os
indivíduos que relataram sofrer abusos na infância tendiam a relatar sofrer abusos na adultez,
de forma que abusos nessa última faixa etária somente não estava unicamente relacionada a
pseudoepilepsia (SALMON et al, 2003, v.65, n.4).
Os autores analisando outras variáveis de disfunção familiar e associando a
diferentes formas de abuso encontraram que : “[...] NES patients recalled more control by the
family end less emotional expression, and control was the critical variable in linking abuse to
NES.”4 (SALMON et al, 2003, v. 65, n.4, p. 699). Dessa forma, baseando-se em seus estudos,
eles concluíram que um quadro de disfunção familiar onde existia diversas formas de abusos e
controles rígidos devem estar na causa das pseudoepilepsias.
Os achados de que diferentes formas de abusos com origem principalmente na
infância, num contexto familiar disfuncional e repressor, devem estar na causa de sintomas
falsos de epilepsia, se aproximam mais estreitamente do que Freud estipulou como etiologia
da histeria de conversão. Um ambiente como esse que impede a expressão do indivíduo e o
submete a agressões de toda ordem satisfaz duas condições essenciais para predispor uma
neurose histérica: o impedimento da expressão emocional propicia o recalcamento verbal e
motor do indivíduo; e as agressões originam representações carregadas de afetos que em
4
[...] pacientes pseudoepilépticos lembram-se de ser mais controlados pela família e de ter menos expressão
emocional, e o controle foi a variável crítica em ligar abuso a pseudoepilepsia (tradução do autor).
21
contrapartida pressionam por uma forma de expressão. Em conseqüência não é de se duvidar
que em tais ambientes as pseudoepilepsias pertençam ao quadro mais amplo da histeria de
conversão.
Os achados se tornam ainda mais estreitamente associados ao modelo causal
psicanalítco para histeria quando encontrou-se na revisão da literatura uma alta taxa de abuso
sexual na infância entre indivíduos com pseudoepilepsia. Esses resultados preenchem
exatamente o requisito de causas específicas para a histeria, na primeira teoria de Freud.
Entretanto relatou-se também que os abusos sexuais não estariam unicamente e
necessariamente associados às pseudoepilepsias, mas os abusos de forma geral, em que o
abuso psicológico ocupou um papel importante, através do elemento controle.
Deve-se ter em conta, entretanto, que com o desenvolvimento da teoria de Freud para
a histeria, na sua segunda teoria, a idéia de um evento externo, o trauma, como um ato que
precocemente despertava a sexualidade infantil, não se torna mais necessário. Mas o requisito
da causa específica, o elemento de natureza sexual, continua ser fundamental na teoria
freudiana. Entretanto sexual em Freud não é sinônimo de genital. A sexualidade na infância é
essencialmente não genital. Ela liga-se na criança à descoberta de seu corpo como fonte de
prazer, associando-se ao desenvolvimento do corpo pulsional ao nível das zonas erógenasboca, ânus, pele, músculo, olhos. O simples pensar do adulto nos detalhes de seu
desenvolvimento sexual tem um valor de um “trauma” ao se converter numa angústia
fantasística. (NASIO, 1991).
Assim sendo, outras formas de abuso, que não especificamente o sexual, podem ser
potenciais fontes de psicopatologia, como a da histeria de conversão, porque todos eles
instalam-se na organização pulsional infantil, e pertubam o desenvolvimento normal destas. O
abuso sexual desperta abruptamente a sexualidade infantil ao apresentar “[...] prematuramente
à criança um objeto sexual de que, a princípio, a pulsão sexual infantil não mostra nenhuma
necessidade.” (FREUD, 1905, v.7, p.180), o abuso físico e psicológico submetem a criança a
viver suas primeiras experiências infantis sexuais por meio da dor e do sofrimento. Em Freud,
as excitações mecânicas, os processos afetivos, a atividade muscular e até a atividade
intelectual poderiam propagar-se para a sexualidade:
O elemento decisivo nessas fontes de excitação sexual é, sem dúvida, a qualidade do
estímulo, embora o fator da intensidade (no caso da dor) não seja de todo
indiferente. Além disso, porém, existem no organismo dispositivos cuja
conseqüência é fazer com que a excitação sexual surja como um efeito concomitante
num grande número de processos internos, tão logo a intensidade desses processos
ultrapasse certos limites quantitativos. [...] É possível que nada de maior importância
ocorra no organismo sem fornecer seus componentes para a excitação da pulsão
sexual. (FREUD, 1905, v.7, p.193).
22
O termo abuso pressupõe eventos reais e concretos, entretanto reafirma-se que para a
psicanálise, o importante é como a criança e o adulto vivenciam fantasísticamente esses
eventos com toda sua carga de medo, angústia, culpa e vergonha. Se o abuso é real, exagerado
pelo indivíduo ou não é real, certamente é algo que deve ser considerado, mas o importante é
que os indivíduos com pseudoepilepsia relataram sofrer abusos na sua infância e adultez.
Portanto o indivíduo apresenta epilepsia a nível de sintoma, ou uma falsa epilepsia, porque
subjacente a esse sintoma o mecanismo pode ser de histeria de conversão em tais casos com
essa história de vida específica. E dessa forma atingiu-se um dos objetivos que é responder se
existe a possibilidade de relação entre alguns quadros epilépticos e histeria de conversão.
Um outro objetivo desse trabalho é verificar a ocorrência em conjunto de crises
epilépticas genuínas e possibilidade de histeria de conversão associada àquela patologia. Já se
viu pelas relações estatísticas que muitas vezes ocorre a comorbidade entre epilepsia e
pseudoepilepsia. Um suscinto estudo de caso poderá auxiliar o entendimento de como ocorre
esse fato baseado num relatório de uma estagiária, Felícia Preto, que tratou um neurótico que
apresentava crises epilépticas de origem conversiva, associada a crises de origem orgânica.
Neste relatório de estágio foram documentadas observações acerca de um paciente
que apresentava crises epilépticas desde seus quatorze anos. As crises eram constantes, e nos
primeiros anos ocorriam em um intervelo de três a quatro meses. Já com vinte e três anos, a
freqüência intensificou-se ocorrendo de três em três meses, e nesse período ele sentia fortes
dores de cabeça. Em todo esse tempo ele tomou medicamentos anti-epilépticos. No ano de
1996 I.C.O veio morar em Florianópolis, procurou médicos e um eletroencefalograma
diagnosticou Má Formação Vascular Extensa do Hemisfério Direito, sendo esta alteração
considerada a causa das crises epilépticas. Em 2001 I.C.O. voltou a ter fortes dores de cabeça,
que desta vez levaram-no ao hospital, onde ficou internado por vinte e quatro dias. Voltou
para a casa mas as dores de cabeça retornaram, então ficou internado mais doze dias. As dores
de cabeça foram conseqüência de uma hemorragia intravascular cerebral e o médico o proibiu
de praticar atividades físicas pesadas (PRETO, 2003).
I.C.O. se viu impossibilitado de trabalhar, porque trabalhava em serviços pesados
(construção civil, depósito de uma loja de móveis), e seus pais que moravam no Rio Grande
do Sul vieram à Florianópolis para garantir os cuidados do mesmo. Segundo a autora do
relatório por essa época, quando seus pais se mudaram, I.C.O. começou a apresentar sintomas
como insônia (um zumbido no ouvido o impedia de dormir), crises diárias de ansiedade (com
típicas sensações de medo súbito absolutamente imotivado), sensação de despersonalização
(desorientação temporo-espacial), desafetivação (distanciamento em relação aos outros) e
23
falta de motivação, associado à intensificação das crises epilépticas para um período diário
(PRETO, 2003). O médico encaminhou I.C.O para a estagiária porque acreditou que muito de
suas crises epilépticas eram de origem psicológica.
A autora do relatório ao atendê-lo diagnosticou-o como um obsessivo. Uma das
características do obsessivo refere-se ao fato de ele ser especialmente investido como um
objeto amoroso por sua mãe. Em um desenvolvimento normal o Complexo de Castração põe
fim ao Complexo de Édipo e a criança do sexo masculino se identifica ao pai; porém o desejo
do obsessivo mantém-no tenazmente ligado à mãe. Na fantasia da criança, o investimento
privilegiado da mãe o induz a querer ocupar o lugar do pai, primariamente excitando os seus
desejos incestuosos. Toda criança quer ocupar o lugar do pai, no entanto o Complexo de
Castração permite a libido ser investida no pai e em outros objetos substitutos. O obsessivo
tem dificuldade de fazer esse movimento porque o vínculo com a mãe é intenso. Ao mesmo
tempo gera fortes resistências das fantasias pela proximidade com a mãe. Por conseqüência a
libido no obsessivo não circula com a mesma liberdade que num “indivíduo normal”. A libido
presa busca fugir à resistência, podendo desencadear fenômenos patológicos.
A anamnese de I.C.O., dirigida pela estagiária, revelou que aquele sempre foi o filho
preferido da mãe. Os outros filhos a abandonaram e seguiram suas vidas, aquele permaneceu
próximo por mais tempo. Ao se mudar do Rio Grande do Sul para cuidar de I.C.O. a mãe do
mesmo passou a controlar demasiadamente a sua vida; cuidava dos horários dos remédios,
não o deixava caminhar muito, por exemplo (PRETO, 2003). Infere-se desses fatos que
também na infância precoce I.C.O. devia ser muito controlado pela mãe, e até preferido. Os
sintomas pioraram com a chegada dos pais e o controle exacerbado da mãe. Provavelmente a
proximidade desta mobilizava as fantasias daquele.
Sabe-se que a obsessão é um distúrbio do pensamento, e não um distúrbio conversivo
como a neurose histérica. I.C.O. foi diagnosticado como um obsessivo, baseando-se nas suas
sessões clínicas conduzidas pela estagiária, e baseando-se num teste projetivo, o Rorschach,
porque provavelmente o seu quadro clínico geral era o de um obsessivo. Como a estagiária
Preto expôs: “...[a] maior evidência é a sua relação com a mãe, I.C.O. sente-se muito amado e
protegido por sua mãe.” (2003, p.64), um outro sintoma é o rigor moral, e a tendência ao
isolamento que a estagiária relatou que I.C.O. apresentava, ‘ “ se eu vejo alguém falar ou
fazer alguma coisa que eu considere errada, eu me afasto. [...] eu sempre fui assim, desde a
minha adolescência, eu não concordava com meus irmãos e por isso não ficava com eles
[...]”’, (PRETO, 2003, p.66) o que é interpretado como um mecanismo de defesa contra
desejos não aceitos: “[...] é através da posição legalista com que o obsessivo pactua que é
24
tomada a medida inversa do desejo inconsciente de transgredi-la.” (PRETO, 2003, p.66), além
disso I.C.O. nunca teve uma relação sexual por achar errado, “se eu for me relacionar com
alguém, tem que ser para sempre. Não me relacionaria com uma pessoa para depois não ter
nada com ela. Eu acho isso errado.” (PRETO, 2003, p.55), e mais ainda I.C.O. nunca teve
um grupo de amigos, só amigos de trabalho de acordo com a estagiária.
Apesar do quadro ser o de um obsessivo, a intensificação das crises epilépticas, que
não obstante tem uma origem orgânica em I.C.O., constitui-se em um quadro conversivo
histérico. Não é incomum ocorrer uma “neurose mista” em uma pessoa, esse termo foi usado
por Freud em seu artigo Sobre os Fundamentos para Destacar da Neurastenia uma Síndrome
Específica Denominada “Neurose de Angústia” (1895 |1894|, p.94, v.3). Assim sendo I.C.O.
poderia apresentar um quadro obsessivo com algumas crises de natureza histérica.
O tratamento psicoterapêutico administrado pela estagiária Preto teve uma evolução
positiva. Isso é confirmado pelo fato de as crises diminuírem, tanto as crises epilépticas como
as de ansiedade, associados a um estar mais tranqüilo pelo paciente. Um outro sintoma que
obteve alívio foi a diminuição das exigências morais.
Na busca de possíveis causas para as pseudoepilepsias, encontrou-se o resultado de
que elas poderiam também ser uma resposta a dilemas incomunicáveis. J. Griffith, A. Polles e
M. Griffith definem dilemas incomunicáveis:
In an unspeakable dilemma, a patient is distressed by family, social, religious, or
political circumstances that have imposed forced choices in the patient’s existence
and consequent suffering must remain hidden from important persons involved in
the situation.5 ( 1998, v. 39, n.2, p. 144).
Ao comparar as pseudoepilepsias como uma expressão simbólica de dilemas
incomunicáveis com a etiologia da histeria de conversão, os resultados não coincidem.
Entretanto indivíduos que apresentam essa forma sintomática podem ser diagnosticados como
tendo desordem conversiva, e os sintomas são o resultado de conflitos vivenciados pelos
mesmos, eles são uma resposta a eventos atuais, e não a um conflito de natureza inconsciente
com origem no passado remoto do indivíduo.
Os autores citados conduziram uma pesquisa, que eles próprios a definiram como
não controlada, em que entrevistaram e gravaram de 1990 a 1993 quatorze pacientes com
pseudoepilepsia de origem conversiva em conjunto com seus familiares, e amigos ( a questão
básica era: quais palavras ocorreriam se eles (pacientes, familiares, etc) não tivessem os
ataques). Desses quatorze, treze foram referidos como vivenciando um dilema incomunicável.
5
Em um dilema incomunicável, um paciente é angustiado por circunstâncias familiares, sociais, religiosas, ou
políticas que impõe escolhas forçadas na existência do paciente, e o conseqüente sofrimento deve permanecer
escondido de importantes pessoas envolvidas na situação (tradução do autor).
25
Alguns desses relataram sofrer abuso físico e sexual. Mas os autores ressaltaram que a
constante-chave dos casos estudados por eles era o dilema incomunicável, mesmos os que
sofriam abusos físicos e sexuais, eram abusos correntes que originavam um dilema. Extrairse-á sucintamente dois casos do artigo para exemplificar o que é dilema incomunicável: uma
paciente com 15 anos de idade sofreu abuso sexual de seu avô paterno, e era fisicamente
abusada pelo seu pai durante suas “bebedeiras”, ao mesmo tempo receava protestar a sua
situação com medo de sofrer represálias; uma outra paciente com 9 anos de idade não tinha
um bom desempenho escolar enquanto sua irmã mais velha tinha um desempenho excelente
ao avançar as séries, ela sentia-se muito embaraçada em deixar os pais e os professores
conhecerem o seu desempenho (GRIFFITH, J.; POLLES, A; GRIFFITH, M.; 1998, v.39,
n.2).
Há estudos que associam eventos não epilépticos a uma maior taxa de estresse em
indivíduos com esse sintoma. Esses estudos consideram que as pseudoepilepsias são uma
resposta a eventos estressantes de forma geral, incluídos abusos sexuais, muito sugerido na
literatura. Bhatia enumera uma lista de precipitantes de pseudoseizures: discórdia parental,
separação, morte, doença crônica em um parente, superproteção ou negligência, problemas
financeiros, pressão por performance, aproximação de exames, etc (2004, v.41, n.7).
Tina M. Tojek et al ao conduzirem um estudo controlado, comparando uma amostra
de pacientes adultos com pseudoepilepsias com outra amostra de pacientes epilépticos
encontraram que aqueles tendiam a relatar viver uma ampla variedade de eventos estressantes
em relação aos pacientes epilépticos, incluídos abuso físico durante a adultez, morte ou
doença de um amigo próximo (2000, v.41, n.3).
Esses resultados são muito valiosos por indicarem que as pseudoepilepsias são uma
resposta a eventos estressantes de forma geral. Apesar dos eventos estressantes ocorridos na
atualidade de um indivíduo jovem ou adulto funcionarem como causas concorrentes na
histeria de conversão, em um ângulo psicanalítico, e dessa forma precipitarem os sintomas, ao
se somarem somente às causas específicas latentes cronicamente, ainda não está claro se esta
é uma fórmula válida para explicar as pseudoepilepsias que parecem ser uma resposta a
dificuldade de adaptação do indivíduo a circunstâncias atuais.
26
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considera-se que a resposta ao problema do trabalho foi respondida e os objetivos
parcialmente cumpridos com a pesquisa teórica efetuada. Se não houve uma resposta
definitiva é porque as referências procuradas também são confusas, algumas apontam para
traumas sexuais, físicos e psicológicos crônicos, outras consideram que dilemas
incomunicáveis e fatores estressores atuais estão nas causas das pseudoepilepsias. Entretanto
uma pesquisa teórica mais avantajada é importante na compreensão das pseudoepilepsias de
forma geral.
O estudo de caso não foi satisfatório porque o caso se tratava de um obsessivo, pelo
menos assim foi diagnosticado, e não de um histérico. O ideal seria a pesquisa de um histérico
que apresentava as pseudoepilepsias mas não foi encontrado um caso abrangente o suficiente
para uma pesquisa mais minuciosa nas referências buscadas. Entretanto considera-se que as
relações estatísticas fornecidas e as interpretações destas foram adequadas na discussão e se
aproximaram dos objetivos propostos anteriormente.
De mais enfatiza-se que é importante um autor escolher um tema que lhe dê prazer,
afinal de contas uma pesquisa científica exige muito esforço e tempo de dedicação, o que foi
constatado nesse trabalho.
27
6. CRONOGRAMA
Ag.
Definição do
Tema
Revisão
Bibliográfica
Elaboração
do Projeto
Banca do
Projeto
Pesquisa
Bibliográfica
Articulação
do Estudo de
Set.
Out.
Nov.
Dez.
Fev.
Mar.
Abr.
Maio
Jun.
Jul.
X X
X X
X X
X
X X
X X
Caso
Discussão
Defesa
X X
28
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