Nota técnica MINISTÉRIO DA SAÚDE SECRETARIA DE VIGILÂNCIA EM SAÚDE DEPARTAMENTO DE VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA Esplanada dos Ministérios, Edifício Sede, 1º andar, Ala Sul sala 155 70.058-900 Brasília-DF - Tel. 3315-2750/3315-3646 NOTA TÉCNICA Nº 02 /DEVEP/SVS/MS Assunto: Ocorrência de surto de infecções por Mycobacterium não tuberculosis póscirúgicas no Rio de Janeiro/RJ. 1. No dia 07 de março, a Secretaria de Vigilância em Saúde, por meio do CIEVS, foi informada da ocorrência de um surto de infecções pós-cirúgicas por Mycobacterium abscessus e M. fortuitum na cidade do Rio de Janeiro/RJ. No momento 156 casos foram notificados, com relato de aparecimento de abscessos cutâneos, abscessos em cavidade abdominal e em articulações que tinham sido diretamente submetidas a processos cirúrgicos ou cirúrgicos-endoscópicos, ou ainda, que se infectaram a partir da disseminação do patógeno originário de um sítio cirúrgico a distância (para mais informação sobre as Micobactérias, ver anexo I). 2. Manifestações clínicas Na pele, normalmente a infecção se manifesta por lesões nodulares próximas ao portal cirúrgico ou pelo simples aparecimento de secreção serosa, na deiscência ou na cicatriz cirúrgica. Geralmente não há febre, sendo a queixa mais comum o aparecimento da secreção no local da incisão. A lesão poderá estar restrita à epiderme e à derme, ou mais freqüentemente estar presente em todo o trajeto cirúrgico, inclusive com implantação em parede abdominal, articulações ou em outras cavidades. A infecção evolui com aspecto inflamatório crônico e granulomatoso, podendo formar abscessos, freqüentemente com crescimento lento, com manifestação até um ano após o ato cirúrgico. 3. Período de Incubação: duas semanas a doze meses 4. Definição de caso suspeito: Paciente submetido a cirurgia vídeo-endoscópica ou plástica ou a outros procedimentos transcutâneos que acessaram cavidades e ou tecidos estéreis, com apresentação após o processo invasivo de uma das manifestações abaixo, com ou sem febre, e sem resposta ao tratamento antimicrobiano para agentes infecciosos habituais de sítios cirúrgicos: Infecções de pele e subcutâneas que se apresentam como abscessos frios e ou piogênicos, com reação inflamatória aguda e supuração, ou evolução crônica ou com nódulos; Ulcerações nos portais de entrada de cânulas ou laparoscópios; Fistulizações após procedimentos invasivos; Abscessos em cavidades pós procedimento cirúrgico. 5. Definição de caso confirmado: Paciente exposto aos procedimentos descritos acima, que apresentaram os sinais e sintomas citados e que, no mínimo, se identificou no estudo anatomopatológico da peça ressecada, granuloma com ou sem necrose caseosa. 6. Diagnóstico laboratorial: Baciloscopia: pesquisa de BAAR em secreção - habitualmente o agente é identificado como um BAAR fortemente positivo. Cultura: é de fundamental importância para a confirmação de que é uma micobacteria e que trata-se de uma espécie de crescimento rápido, o que diferencia da M. tuberculosis (MNTB). Anátomo-patológico: em caso de peça cirúrgica pós-ressecção, observam-se as alterações histopatológicas típicas de infecções por micobactérias. OBSERVAÇÃO: todos os espécimes clínicos colhidos durante a ressecção cirúrgica devem ser preservados, parte em solução salina para realização da cultura, parte em formaldeído para o exame anátomopatológico. Ultrassonografia e/ou Ressonância Magnética são indicados para diagnóstico, identificação e localização de coleções líquido-caseosas a serem ressecadas. 7. Tratamento: -1º Etapa: Ressecção cirúrgica das lesões, com prévia exploração por propedêutica armada da parede da cavidade, se esta foi acessada durante o procedimento prévio; - 2º Etapa: Poliquimioterapia por seis meses, como a seguir: Primeira escolha: Claritromicina 500 mg 12/12 hs Etambutol 1,2 g por dia 6meses Terizidona 500 mg ao dia < 60 Kg e 750 mg >60 Kg Segunda escolha: Claritromicina 500 mg 12/12 hs 6 meses Etambutol 1,2 g por dia Amicacina 1,0 g Im ou EV 3 vezes por semana 3 meses *Em caso de mais de um sítio de infecção, o tratamento após ressecção das lesões, deverá ser prolongado por 9 meses. OBSERVAÇÃO - Pacientes com HIV/AIDS em uso de Efavirenz ou inibidores de protease (especialmente Ritonavir/Atazanavir) devem ser acompanhados conjuntamente com o infectologista, em função de possíveis interações medicamentosas (ver documento técnico anexo). 8. Acesso a diagnóstico e tratamento Todos os pacientes de hospitais públicos ou privados poderão ter acesso aos medicamentos, porém os espécimes clínicos devem ser enviados ao LACEN do Rio de Janeiro/RJ, com cópia da ficha de notificação do caso suspeito. Já estão definidas as referências hospitalares que realizarão o tratamento, além do Centro de Referência Nacional para Tuberculose Profº Hélio Fraga - Hospital Raphael de Paula Souza, bem como a Ficha de Notificação a ser utilizada ([email protected] - link: ações de saúde - controle de infecção hospitalar). Todos os casos encaminhados por serviços particulares e públicos devem ser notificados para as Vigilâncias Epidemiológica (VE) do município e do Estado do Rio de Janeiro, com dados completos do paciente. 9. Recomendações para controle do surto A hipótese de causa mais provável para o surto é a de contaminação dos materiais e instrumentos, decorrente de falhas em uma das etapas do reprocessamento. Os procedimentos envolvidos incluíram videocirurgias realizadas por acesso transtrocateriano, por artroscopia ou procedimento de lipoaspiração. Assim, deverão ser adotadas as seguintes medidas, em caráter imediato: a) Substituir todos os processos de desinfecção de alto nível, aplicáveis aos artigos utilizados nos procedimentos acima referidos, por esterilização, conforme os conceitos descritos na RE/ANVISA nº 2606, de 11/8/2006; b) os serviços de saúde e as empresas que reprocessam artigos relacionados aos procedimentos de videocirurgias realizadas por acesso transtrocateriano, por artroscopia ou procedimento de lipoaspiração, deverão apresentar à Vigilância Sanitária do Estado do Rio de Janeiro os protocolos de reprocessamento para cada tipo de artigo, no prazo máximo de 30 dias, a partir da data de publicação desta Nota Técnica. Deverá constar dos protocolos a relação de quantidade, marcas e modelos e número de série, quando aplicável, dos equipamentos e instrumentos utilizados nestes procedimentos; c) os procedimentos de videocirurgias realizadas por acesso transtrocateriano, por artroscopia ou procedimento de lipoaspiração, ficarão suspensos nos serviços de saúde onde houve ou seja constatada a ocorrência de infecção por mycobacterium abscessus ou mycobacterium fortuitum relacionada com o procedimento, até que as informações referidas no item anterior (protocolo de reprocessamento) sejam avaliadas e aprovadas pela Coordenação de Vigilância Sanitária do Estado do Rio de Janeiro; d) os artigos de videocirurgias por acesso transtrocateriano, de artroscopia ou de lipoaspiração, deverão ser avaliados quanto à possibilidade de reprocessamento, e os processos devem estar descritos em protocolos conforme definido na RE/Anvisa nº2.606/06; (http://e.legis.anvisa.gov.br/leisref/public/showAct.php?id=23598&word=) e) os serviços de saúde são responsáveis pela efetividade do reprocessamento dos artigos utilizados em suas dependências, inclusive aqueles reprocessados fora de seu estabelecimento; f) todo serviço de saúde que admitir o uso de artigos não reprocessados no seu estabelecimento deverá auditar a empresa/estabelecimento responsável pelo reprocessamento destes artigos, solicitar a licença sanitária de funcionamento e a apresentação dos protocolos de reprocessamento para cada tipo de artigo. No caso de discordância dos métodos de validação apresentados, o serviço de saúde deverá executar o reprocessamento destes artigos em seu estabelecimento ou empresa por ele contratada; g) até que sejam concluídas as investigações e havendo recomendação pelo fabricante, de método específico de esterilização para os artigos utilizados em videocirurgias por acesso transtrocateriano, em artroscopia ou em lipoaspiração, este deverá ser adotado. Todos os pacientes que se submeteram a procedimentos invasívos realizados por videoscopia nos últimos três meses em qualquer dos serviços relacionados no anexo XX deverão ser convocados para exame clínico e submetidos a realização de exames ultrassonográficos e/ou de ressonância magnética, caso seja necessário, para elucidação diagnóstica. Casos de infecção relacionados aos procedimentos descritos acima ou com isolamento de M abscessus ou identificação de BAAR em sítio cirúrgico diagnosticados em outros estados devem ser notificados como eventos inusitados para a Vigilância Municipal local e para o CIEVS. Brasília, 05 de Abril de 2007. Dr. José Ricardo Pio Marins Diretor Substituto do Departamento de Vigilância Epidemiológica De acordo. Em____/____/_______ Gerson Penna Secretário de Vigilância em Saúde Claudio Maierovitch Pessanha Henriques Diretor- ANVISA ANEXO I MICOBACTERIOSES NÃO TUBERCULOSAS (MBNT) EM PACIENTES SUBMETIDOS A PROCEDIMENTOS CIRÚRGICOS Profa. Dra. Margareth Pretti Dalcolmo Centro de Refrência Helio Fraga - MS Sociedade Brasileira de Doenças Respiratórias Diagnóstico Deverá ser estabelecido a partir de: Componente epidemiológico: haver sido submetido (a) a procedimentos laparoscópicos, artroscópicos, implantes de próteses ou órteses, ou lipoaspiração nos últimos 12 meses, implantes de marcapasso, cirurgia oftalmológica ou cardíaca. Observação clínica do aspecto das lesões, i.e., se no orifício de entrada de cânulas e/ou trajeto "tunelizado", (quando se tratar de lipoaspiração) tipo de abscesso, se frio ou quente (micobactérias produzem via de regra abscessos frios), ausência de antecedentes ou de comorbidades, características de disseminação para outros sítios; Uso de propedêutica como ultra-sonografia e RNM de parede abdominal auxiliam na determinação das lesões com coleções líquido-caseosas que deverão ser debridadas e ressecadas. Confirmação: baciloscopia fortemente positiva; cultura com detecção de MNTB de crescimento rápido e posteriormente espécie identificada no laboratório do CRPHF (os casos até o momento confirmados foram causados por M.abscessus ou M. fortuitum), presença de granuloma em tecido retirado pelo debridamento (material de inclusão em parafina (cell block) em descrição microscópica na histopatologia). Fazer recomendação para todos os espécimes colhidos serem conservados em solução salina e não formol. Recomenda-se não fazer swabs, pelo pouco rendimento; ou punções repetidas, para evitar contaminações outras e infecções cruzadas. Uma vez detectada lesão, esta deve ser debridada adequadamente, com margem. Terapêutica A diferenciação entre Lesão superficial e Lesão profunda, como se faz nas feridas cirúrgicas, para escolha dos antibióticos a serem usados, não se aplica para definição de regimes terapêuticos eventualmente diferentes nas micobacterioses patogênicas. Uma vez diagnosticada a doença, esta deverá ser tratada com poliquimioterapia pelo período de seis meses. Rationale Considerando: - não haver estudos controlados que nos permitam estabelecer recomendações baseadas estritamente em evidências, porém conhecendo o comportamento microbiológico dos patógenos envolvidos na presente situação (crescimento intermitente, capacidade de permanecer em estado de latência por longo tempo, velocidades de crescimento e multiplicação diversa, dependendo do hospedeiro e do sítio); - a experiência relatada na literatura a partir de surtos localizados em instituições, internacionais e nacionais, com pequena casuística, em comparação com a situação atual; - que o princípio básico de tratamento destas micobacterioses obedece à mesma lógica da tuberculose, ou seja, usar no mínimo dois fármacos aos quais o germe seja comprovadamente sensível, preferencialmente associando a um terceiro, objetivando prevenir o surgimento de resistência, e por tempo de tratamento nunca inferior a 6 meses. - a atuação de cada fármaco ou grupo farmacológico, para compor uma associação medicamentosa eficaz; - que há um consenso universal sobre o papel dos macrolídeos (em especial a claritromicina, pelo melhor nível sérico alcançado nesses patógenos), como componente do núcleo terapêutico; - que a claritromicina e a azitromicina (ambas na dose de 500mg duas vezes ao dia) mostraram-se eficazes como monoterapia no tratamento de doença por M avium, para doença por MAC na década passada, porém, o surgimento precoce de resistência limita a duração de eventual benefício; - a necessidade de se ter um (ou mais de um) regime poliquimioterápico padronizado e factível de utilização por grande número de pessoas, e o mais eficaz possível; - que a maior parte das pessoas acometidas são previamente hígidas e mantê-las sob hospitalização para uso de medicamentos endovenosos, por longo tempo, seria inviável; - a recomendação de que se assuma os tratamentos governamentalmente, independentemente da origem do caso, se oriundo da rede privada ou pública, reconhecendo assim o problema como de saúde pública; e portanto provendo os regimes recomendados; Recomendamos a seguintes associações, a serem adotadas para casos confirmados, e notificados. Regime 1: Claritromicina 1g/ dia EMB 1,2 g / dia Todos por seis meses. Terizidona 500 a 750mg / dia (cut off de peso 60K) Regime 2: Claritromicina 1 g/ dia (500mg de 12 em 12 hs) - 6 meses EMB 1,2 g / dia - por 6 meses Amicacina 1g IM ou EV 3 vezes por semana - por 3 meses Considerações especiais: Critérios de doença disseminada = Comprometimento de mais de um sítio: Exemplos: subcutâneo abdominal + mama; mama + pulmões, gânglios de diferentes cadeias + abdomen. >>>>> O tratamento poderá ser prolongado para 9 meses de tratamento, de acordo com a evolução clínica. Pacientes em uso de antivirais, como Efavirenz e inibidores da protease, poderão ter seus regimes antivirais modificados para permitir a utilização da Claritromicina. No entanto a larga experiência de serviços de referência com aids no Brasil, com frequente utilização concomitante desses fármacos, permite seu uso. Os IP em geral aumentam a concentração de claritomicina e portanto um monitoramento da função hepática é fundamental durante todo o tratamento. Os menos afetados são Indinavir, nelfinavir e kaletra e saquinavir. Evitar Atazanavir, Ritonavir (cujas elevações de niveis séricos são mais acentuadas Sabe-se que o EFV reduz a concentração de claritromicina em 40% portanto uma suplementação da dose pode ser necessária apesar de não haver uma recomendação formal nos guidelines (Consenso nacional AIDS 2006). INTRODUÇÃO- Micobactérias Microrganismos conhecidos desde a década seguinte à descoberta do M. tuberculosis por Robert Koch, no final do século passado, e com sua morfologia e patogenicidade descritas desde a metade deste século, após a classificação proposta por Ernest Runyon, as micobactérias não tuberculosas (MNTB) tiveram sua magnitude reconhecida e assumiram grande importância clínica somente após a epidemia do vírus da imunodeficiência humana (HIV). Contribuíram para isso os surtos de transmissão nosocomial observados nos Estados Unidos, no início dos anos 90. Esses surtos, ainda que ocasionados pela tuberculose, despertaram o interesse pela investigação científica no domínio das micobacterioses em geral e, em particular, na sua relação oportunista com a imunodepressão causada pela aids. As micobactérias não tuberculosas têm a denominação original ligada à sua origem, a saber: bovina, aviária, reptiliana, saprofítica, ambiental, e outras. Não foram consideradas, a princípio, patogêncicas para o homem, apesar de relatos esporádicos de doenças nas quais se isolou micobactérias distintas do bacilo da tuberculose, em 1885, a partir da descrição do bacilo smegmatis. Esses relatos se multiplicaram ao longo da primeira metade deste século, até a descrição do Mycobacterium ulcerans por Mac Callum, em 1948, quando se reconheceu sua potencial patogenicidade. Runyon, que criou a classificação até hoje aceita, se baseou nas características morfotintoriais e no tempo de crescimento em cultura para separar as micobactérias em grupos. Demonstrou que o maior grupo no gênero mycobacterium é o de crescimento rápido, porém, as mais patogênicas para o homem estão entre as micobactérias de crescimento lento ou patógenas estritas, como o M. tuberculosis, M. bovis, M. africanum,, M. leprae. e, entre os pacientes imunodeprimidos o M. avium intracellulare (MAC). São germes encontrados no solo, na água, e em aerossóis, sendo esta última a fonte de infecção mais freqüente para o homem. Por esta razão, sendo o aparelho respiratório a porta de entrada mais comum, as manifestações pulmonares são as mais prevalentes entre as causadas por micobactérias patogêncicas, especialmente a M. avium e, assim, a via inalatória é potencialmente a exposição de maior risco para esses microrganismos. Com o avanço das técnicas diagnósticas e a identificação etiológica mais acurada, a prevenção e o tratamento das doenças causadas por estes agentes, particularmente entre os grupos de pacientes imunodeprimidos, passou a representar um dos grandes desafios da investigação científica. Outras formas clínicas, com comprometimento de tecidos moles e doença causada por micobactérias de crescimento rápido, predominantemente M.abscessus e M. fortuitum, têm sido descritas na literatura, em surtos institucionais, a partir de procedimentos cirúrgicos gerais, estéticos e oftalmológicos. TAXONOMIA Robert Koch, além do Mycobacterium tuberculosis, descobriu e descreveu outras micobactérias ao final do século passado. Porém, apenas na metade deste século foram reconhecidas as doenças causadas por essas micobactérias, basicamente através do trabalho de classificação proposto por Ernest Runyon em 1954, baseado nas características laboratoriais das culturas de micobactérias (quadro 1). Deve-a a Runyon a designação "micobactérias atípicas", que, apesar de prevalecer até os nossos dias, se acompanhou de vários outras como: a sigla inglesa "MOTT" (mycobacteria other than tuberculosis) -, hoje adotada em toda a literatura de língua inglesa -, micobactérias ambientais, oportunistas, ou, ainda, não tuberculosas. Esta última denominação é a mais utilizada e aceita, sobretudo pelos clínicos, embora ainda permaneça o debate a respeito da melhor definição. A definição taxonômica do gênero Mycobacterium se baseia em marcadores quimiotaxonômicos sob tres critérios, a saber: a álcool-ácido resistência, a sequência G-C (guanina-citosina) do seu ADN, presente em 61 a 71% das cepas, e, a síntese de ácidos micólicos de peso molecular de 60 a 90 C, liberando ésteres de pirólise de 22 a 26 C. Estes ácidos graxos constituem o suporte molecular da álcool-ácido resistência e a análise de sua composição é um elemento essencial para a caracterização das espécies de micobactérias. Outros lipídios complexos, como ácidos graxos de cadeias curtas, fenolglicolipídios, peptidoglicolipídeos) também são bons marcadores para a identificação de numerosas espécies. Classicamente a inclusão no gênero Mycobacterium repousa sobre propriedades morfológicas e tintoriais. As micobactérias são descritas como bacilos ligeiramente curvos, de 1 a 10 mm de comprimento e 0,2 a 0,6mm de largura, imóveis e incapazes de formar esporos, conídeos e cápsulas. Seu crescimento se dá, em geral, sob forma de micélios ou filamentosa, dando origem a elementos bacilares ou cocóides. A composição de sua parede não permite a coloração pelo método de Gram, e lhe confere uma álcool-ácido resistência evidenciada pela técnica de coloração adaptada do método de Ziehl-Neelsen. Quadro 1: MICOBACTÉRIAS NÃO TUBERCULOSAS OU ATÍPICAS (MBNT) PATOGÊNICAS PARA O HOMEM, DE ACORDO COM A CLASSIFICAÇÃO DE RUNYON ESPÉCIES Grupo I : Fotocromogênicas M. kansasii M. marinum M. simiae lento M. asiaticum Grupo II: Escotocromogênicas M. scrofulaceum M. xenopi M. szulgai M. gordonae M. flavencens Grupo III: Não cromogênicas Complexo M. avium (inclui M.intracellulare) M. malmoense M. hemophilum M. terrae M. ulcerans 1. noncromogenicum APRESENTAÇÃO CLÍNICA MAIS COMUM TEMPO DE CRESCIMENTO Pulmonar e ganglionar Lesões cutâneas Pulmonar lento rápido Pulmonar lento Ganglionar e pulmonar Pulmonar Pulmonar lento * Não patogênica * Não patogênica Pulmonar, ganglionar, ou disseminada Pulmonar Cutânea e de tecidos moles * Não patogênica Úlceras cutâneas Úlceras cutâneas Grupo IV: De Crescimento Rápido Complexo M. fortuitum (inclui M.chelonae), M.abscessus M. thermoresistible M. neoaurum Pulmonar, tecidos moles, óssea * Não patogênica * Não patogênica lento lento lento lento lento lento lento lento rápido rápido rápido * Usualmente saprófitas, porém há registros de doenças provocadas por elas. Fonte: adaptado de Runyon (1), ATS Statement 1997, 2007. Variáveis para Definição Diagnóstica de Patogenicidade das Micobacterioses Não tuberculosas Definitivas Isolamento de micobactéria em espécime dito estéril, como líquor, sangue, medula óssea, linfonodos. Para doença em tecidos moles e pele: Histologia em biópsia de tecido compatível com granulomatose associada a isolamento de MBNT em cultura. Fortes Síndrome clínica compatível com MBNT associada a vários isolamentos de MBNT em espécime não estéril (secreções pulmonares ou de tecidos moles) sem outro patógeno isolado. Quanto maior o número de culturas e o tempo de observação maior a probabilidade diagnóstica. Progressão da doença durante quimioterapia anti-TB, com baciloscopia + e cultura + para MBNT MBNT isolada de fezes em pacientes com aids associado à cultura positiva para MBNT. Intermediárias MBNT isolada apenas de uma cultura de escarro. MBNT persistentemente isolada de escarro em paciente com condições patológicas pulmonares subjacentes. Baciloscopia persistentemente positiva em paciente com aids com cultura negativa __________________________________________________________________ Modificado de Davidson PT: Diagnosis and Management of Disease due to M. avium Complex and M. kansasii. BIBLIOGRAFIA Runyon EH . Anonymous mycobacteria in pulmonary disease. Med Clin North Am 1959; 43: 273-90. MacCallun P, Tolhurst JC, Buckle G et al. A new mycobacterial infection in man. J Pathol and Bact 1948;60:93-96. Selkon JB. "Atypical" Mycobacteria: a review. Tubercle 1969;50 Suppl march:70-88. Vincent VLF, Portaels F. Proposed minimal standards for the genus Mycobacterium and for the description of new slowly growing Mycobacterium species. Int J Syst Bacteriol 1992;42:315-23. Inderlied CB, Nash KA. Microbiology and in vitro susceptibility testing. Capítulo in Korvick JA & Benson CA Mycobacterium avium Complex Infection. 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