1.1 A justiça como dever natural e virtude das instituições sociais A teoria de Rawls reconhece a justiça como a primeira virtude das instituições sociais (CLOTET, Joaquim. A justiça segundo John Rawls. In: CLOTET, Joaquim et al. A justiça: abordagens filosóficas. Porto Alegre: Acadêmica, 1988. p. 99: “O objetivo primeiro da justiça é a estrutura básica da sociedade e a idéia principal da justiça é a imparcialidade. A justiça é a primeira virtude das instituições sociais”), em que as leis e as próprias instituições quando não se justificarem à sociedade, mesmo com aparência de eficiência e organização, devem ser rejeitadas por serem injustas (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. Tradução: Almiro Pisetta e Lenita Maria Rímoli Esteves. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 4). Rawls encontra no dever de justiça as características de um dever natural fundamental, reconhecendo sua aplicação a todos os membros da sociedade, independentemente de atos voluntários e de regras definidas pelas instituições ou práticas sociais. Destacamos (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. p. 123 e 124): Do ponto de vista da eqüidade, um dever natural fundamental é o dever de justiça. Esse dever exige nosso apoio e obediência às instituições que existem e nos concernem. [...] Assim, se a estrutura básica da sociedade é justa, ou justa como é razoável esperar que seja dentro de determinadas circunstâncias, todos têm um dever natural de fazer a sua parte no esquema existente. Cada um está vinculado a essas instituições independentemente de seus atos voluntários, sejam eles de execução ou de outro tipo. Assim, embora os princípios do dever natural sejam derivados de um ponto de vista contratualista, eles não pressupõem nenhum ato de assentimento, tácito ou explícito, e nem mesmo nenhum ato voluntário, para que possam ser aplicados. Os princípios que valem para os indivíduos, exatamente como os princípios válidos para as instituições, são aqueles que seriam reconhecidos na posição original. Esses princípios são entendidos como o resultado de um acordo hipotético. Se a sua formulação mostra que a sua aplicação não pressupõe nenhuma ação obrigatória, seja ela consensual ou não, então eles se aplicam incondicionalmente. [...] De fato, uma vez que temos em mãos o conjunto completo de princípios, uma concepção do justo plenamente formulada, podemos simplesmente esquecer a concepção da posição original e aplicar esses princípios como faríamos com qualquer outros. Rawls apresenta a sociedade como uma associação de pessoas que devem se sujeitar às regras de conduta obrigatórias num sistema de cooperação que vise à promoção do bem-comum, em que pleitos individuais devem ser compatíveis entre si sem ocorrerem graves frustrações, levar a fins sociais compatíveis com a justiça e formar um sistema de cooperação estável a ser regularmente observado. Essa sociedade será considerada bem-ordenada, além de planejada para promover o bem de seus membros, se também houver uma concepção pública de justiça (FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do direito. p. 136: “[...] para Rawls, em seu neocontratualismo, a teoria da justiça deveria ser elaborada tendo como sujeito fundamental a estrutura básica da sociedade, de modo que esta só estaria em ordem quando, efetivamente, regulada por um conceito público de justiça, o qual deveria ser visto como propiciador de um padrão e, ao mesmo tempo, como parte de um ideal social”.) sendo reconhecidos, por todos, os mesmos princípios de justiça satisfeitos pelas instituições básicas (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. p. 5). Ciente da falta de unanimidade entre os diversos princípios socialmente aceitos, Rawls entende que as diversas concepções de justiça devem afastar as arbitrariedades na atribuição de direitos e deveres básicos, exigindo-se certo equilíbrio nas reivindicações concorrentes (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. p. 6 e 7). A forma utilizada para distribuir direitos e deveres fundamentais determinando a divisão de vantagens provenientes da cooperação social estrutura básica da sociedade é considerada por Rawls como o objeto primário da justiça (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. p. 7.) Reconhece intuitivamente que nessa estrutura encontramos as desigualdades sociais sobre as quais devem ser aplicados os princípios da justiça reguladores da escolha de uma constituição política e os elementos principais do sistema econômico social (RAWLS, John. Uma teoria da justiça. p. 8).