Texto de apoio ao curso de Especialização Atividade física adaptada e saúde Prof. Dr. Luzimar Teixeira SÍNDROME PÓS-POLIO A poliomielite foi um dos maiores flagelos do mundo no século XX, não só porque abreviou diversas vidas, mas também por ter criado um número significativo de crianças e adultos com seqüelas e incapacidades variadas. Hoje, para muitas pessoas, a palavra "pólio" é apenas o nome de uma vacina ou de uma doença do passado. A maior parte não faz idéia do caráter devastador que a poliomielite assumiu no Brasil e no mundo ao longo do século passado. Em 1952, somente nos EUA, mais de 50.000 pessoas foram afetadas, sendo que cerca de 6.000 delas vieram a falecer. Só com a introdução da vacina injetável com o vírus morto da pólio de Jonas E. Salk, em 1955, e da vacina oral com o vírus vivo enfraquecido de Albert Sabin, seis anos mais tarde, iniciou-se o combate efetivo à doença. No Brasil, devido à falta de registros precisos, é praticamente impossível identificar o número de pessoas atingidas. Somente a partir de 1968 foi implantado um sistema de notificação semanal de algumas doenças transmissíveis, entre as quais, a poliomielite. Só assim, ficamos sabendo que, entre os anos de 1968 e 1971, foram notificados 7.458 casos de poliomielite no Brasil. É fato notório que nesta época já havia sido introduzida em nosso país a vacina desenvolvida por Sabin, mas, mesmo assim, no final década de 1970, depois da Índia, o Brasil era o país que registrava o maior número de casos de poliomielite em todo o mundo, segundo dados da OMS (Organização Mundial de Saúde) publicados em 1979. Ao longo da década de 1980, felizmente a doença foi erradicada do Brasil e, na década seguinte, do continente americano, embora ainda seja uma doença endêmica em países pobres, como a Índia, por exemplo. A infecção ocorre por via oral, quando da ingestão de água ou alimentos contaminados. A transmissão é mais comum nas regiões de pior controle sanitário, estando claramente associada, nos dias de hoje, às condições sanitárias locais e ao nível sócio-econômico. A ampla maioria de pessoas contaminadas não tiveram nenhum sintoma ou apenas apresentaram febre e desarranjos gastro intestinais durante alguns dias. O poliovírus se reproduz nos tecidos linfáticos da garganta e intestino, viajando no sangue para todas as partes do corpo. Apenas em 1% a 2% das pessoas infectadas o vírus invade o sistema nervoso central e produz o quadro típico de sua forma paralítica aguda, caracteristicamente assimétrica, flácida e que pode causar insuficiência respiratória. Após a instalação da paralisia, a pessoa afetada tem uma recuperação espontânea, durante a qual se observa um gradativo aumento da capacidade funcional. Essa fase de recuperação é seguida de estabilidade funcional, na qual o paciente não nota ganho ou perda frente a suas incapacidades durante décadas. MAS, E OS SOBREVIVENTES DA PÓLIO? A pólio era tida pela medicina como uma doença neurológica não progressiva, estática. Acreditava-se que após a reabilitação e a reeducação a maioria dos sobreviventes atingiria um patamar de estabilidade funcional e neurológica que duraria indefinidamente. Contudo, no final dos anos 1970, começaram a vir à tona relatos de pessoas que haviam se recuperado da pólio paralítica décadas atrás e que estavam desenvolvendo problemas de saúde inesperados e restritivos, como: - fadiga incontrolável; - fraqueza muscular; dores musculares e de articulações; distúrbios do sono; maior sensibilidade à anestesia, ao frio e à dor; dificuldade de deglutição e respiração; Estes sintomas ocorrem cerca de 30 a 40 anos após o ataque do pólio-vírus em até 80% dos paralíticos e, eventualmente, em sobreviventes "não paralíticos". Visto que havia pouca informação sobre mudanças neurológicas tardias em sobreviventes de pólio, a reação inicial dos médicos era a da negação do problema. Estima-se que existam cerca de 20 milhões de sobreviventes da pólio em todo o mundo. Essas pessoas, sofrendo os seus efeitos tardios, finalmente começaram a atrair a atenção da comunidade médica, e, no início dos anos 80, foi cunhado o termo "Síndrome Pós-Pólio". O importante é estarmos atentos ao fato de que muitos ignoram esta possibilidade de uma complicação tardia, tanto os médicos como os próprios seqüelados. A SPP é real, existe! O QUE CAUSA A SPP? A hipótese mais aceita é a de que a SPP não é causada por uma nova atividade do poliovírus, mas sim pelo "uso excessivo" dos neurônio motores ao longo dos anos. O vírus pode danificar até 95% dos neurônios motores matando pelo menos 50% deles. Sem esse neurônio os músculos não respondem aos estímulos, o que provoca a paralisia e a atrofia. Embora danificado, os neurônios remanescentes compensam o dano enviando "ramos" como linhas de telefone extras para ativar músculos que ficaram órfãos quando seus neurônios foram mortos. Esses ramos desenvolvidos pelos neurônios agora estão falhando e morrendo pelo excesso de uso, causando fraqueza muscular e fadiga. O uso excessivo destes músculos enfraquecidos causa a dor muscular e das articulações, além da dificuldade de respiração e de deglutição em casos mais raros. HÁ TRATAMENTO PARA A SPP? Sim. Os sobreviventes da pólio necessitam "conservar para preservar", ou seja, conservar energia, parar com o excesso de uso e com o abuso de atividades para, desta forma, preservar sua capacidade funcional. As estratégias para o tratamento da SPP incluem um tratamento multidisciplinar, com profissionais especializados e que conheçam a síndrome, como, por exemplo: - fisioterapia (principalmente a hidroterapia); - terapia ocupacional, com técnicas de conservação de energia; - modificações do estilo de vida; - aconselhamento psicológico; - perda de peso; - uso de auxiliares de marcha (aparelhos, bengalas, muletas, cadeiras de rodas); - medicação específica para os novos problemas musculares. CONSCIENTIZAÇÃO E EXERCÍCIO DA CIDADANIA Preocupados com a ocorrência da SPP no Brasil, fenômeno que pode se tornar uma questão de saúde pública em nosso país, um grupo de pacientes em vinculados ao Setor de Doenças Neuromusculares da Escola Paulista de Medicina da Unifesp em São Paulo vem procurando chamar a atenção de alguns setores da sociedade para o problema, objetivando aprimorar o desenvolvimento das pesquisas científicas, as medidas de tratamento e a melhora da qualidade de vida dos pacientes. Assim, é fundamental a divulgação deste documento, especialmente aos profissionais de saúde, administradores públicos, meios de comunicação e, principalmente, aos sobreviventes da pólio e seus familiares. Para tanto, nos colocamos à disposição de todos para que possamos unir esforços com todos que queiram buscar soluções e conhecer melhor a SPP. e-mail: [email protected] tel: (11) 5579.2668 Grupo Pró Associação Brasileira de Síndrome Pós-Pólio