DENISE CÁSSIA DA SILVA GOMES PETIÇÕES PROTOCOLIZADAS NA 2ª INSTÂNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL FACULDADE DE EDUCAÇÃO SÃO LUÍS NÚCLEO DE APOIO DE MOEMA JABOTICABAL – SP 2008 DENISE CÁSSIA DA SILVA GOMES PETIÇÕES PROTOCOLIZADAS NA 2ª INSTÂNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Educação São Luís, como exigência parcial para a conclusão do CURSO de Pós-Graduação Lato Sensu em Língua Portuguesa, Compreensão e Produção de Textos. Orientador: Profª Mara Regina Mellini Jabur. FACULDADE DE EDUCAÇÃO SÃO LUÍS NÚCLEO DE APOIO DE MOEMA JABOTICABAL – SP 2008 INTRODUÇÃO Gostaríamos, com este trabalho demonstrar que as petições elaboradas pelos advogados, bacharéis em direito, bem como, os requerimentos em geral, redigidos por qualquer indivíduo de nossa sociedade, pudessem ser mais objetivos e menos prolixos e que respeitassem as normas gramaticais, evitando assim, interpretações dúbias, incoerentes, suscitando com isso um maior tempo nas tomadas de decisões pelos desembargadores, juízes e detentores de poder de decisão. Este trabalho terá valor científico, cultural e social. Para a realização deste trabalho, nos utilizamos de pesquisa bibliográfica, seleção de algumas petições, observando se as mesmas encontram-se de acordo ou não, com as normas estabelecidas no Código de Processo Civil. O trabalho será estruturado da seguinte forma: 1º Capítulo – Petição judicial em conformidade com o Código de Processo Civil e aspectos positivos da simplificação da linguagem forense. 2º Capítulo – Principais elementos coesivos, coerência, estruturação de textos, sintaxe de concordância, uso de citações e principais erros gramaticais nos textos jurídicos . 1 O QUE É UMA PETIÇÃO A petição é o meio pelo qual se pleiteiam direitos perante a justiça. É o instrumento utilizado pelo advogado para obter uma decisão judicial que satisfaça ao interesse de seus clientes. Após a entrega da petição ao órgão competente, caberá ao juiz pronunciar-se. Para tanto, é necessário que a petição possua certas características capazes de provocar a reação jurisdicional, como a descrição dos fatos, os fundamentos legais nos quais se baseia a pretensão e o pedido, ou seja, aquilo que se espera da justiça. Além disso, é muito importante que a petição seja redigida, respeitando-se a norma culta da língua portuguesa e de forma concisa, contendo apenas palavras e dados suficientes para se alcançar o desejado. Na redação forense, o uso do vernáculo é obrigatório, exigência do art. 156 do Código de Processo Civil: “Em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso do vernáculo” e no artigo 157 do mesmo diploma legal lê-se: “Só poderá ser junto aos autos documento redigido em língua estrangeira, quando acompanhado de versão em vernáculo, firmada por tradutor juramentado”. Manuseando processos, analisando petições, o autor notou que existem muitos profissionais do Direito que não possuem noções básicas da língua portuguesa. Reza o artigo 13 da Constituição Brasileira promulgada aos 05.10.1988: “A língua portuguesa é o idioma oficial da República Federativa do Brasil”. Língua é “um sistema de signos convencionais usados pelos membros de uma mesma comunidade. Em outras palavras: um grupo social convenciona e utiliza um conjunto organizado de elementos representativos” (NETO, 1998, pág. 12). “A língua é um código de que se serve o homem para elaborar mensagens, para se comunicar” (SACCONI, 1998, pág. 8). Ensina o referido mestre que existem, basicamente, duas modalidades de línguas (línguas funcionais): 1) língua funcional de modalidade culta, língua culta ou língua padrão: que seria aquela usada pelos segmentos mais cultos e influentes da sociedade. Estriba-se na norma culta, na gramática normativa “que estabelece padrões de certo e errado para as formas do idioma” (NETO, 1998, pág. 16). 2) língua funcional de modalidade popular, língua popular ou língua cotidiana: que apresenta variações diversas, as gírias, os calões. “Não basta conhecer apenas uma modalidade de língua; urge conhecer a língua popular, captando-lhe a espontaneidade, a expressividade e enorme criatividade, para viver; urge conhecer a língua culta para conviver” (SACCONI, 1998, pág.8). Percebe-se, desde o início, a importância de se estudar técnicas de redação para que os operadores do Direito Pátrio – e estudiosos como um todo – possam expressarse de maneira correta e eficiente, em português culto, visando a seus fins. A redação trata-se de um instrumento de trabalho para os comunicadores em geral e, como tal, deve-se saber como utilizá-lo corretamente. O profissional do Direito que redige de maneira correta suas peças, que expõe de maneira harmoniosa suas teses, com clareza, coerência, simplicidade, objetividade, comunica-se bem, atinge sua meta. Torna penetrável seu texto a todas as pessoas, inclusive àquelas partes do processo que, desprovidas de conhecimento técnico-jurídico, querem saber como está sendo tratada sua causa em juízo. Esse profissional contribui no bom andamento da Justiça. Contribui no acesso à Justiça. Faz Justiça.Isso é o que se propõe provar nesse artigo. A Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, institui o Código de Processo Civil decretado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Presidente da República, normatiza em seus artigos 282 a 296 a petição inicial. 1.1 O que deve ser evitado na elaboração de uma Petição A estética e a escrita de acordo com o padrão culto da língua portuguesa são importantes no momento da redação da petição. Escrever corretamente não significa redigir uma petição utilizando palavras rebuscadas e incompreensíveis. O ideal é que o juiz tenha interesse em ler sua petição até o final, portanto: Evite abreviaturas Não devem ser usadas indiscriminadamente – aliás, o artigo 169, § único, do Código de Processo Civil, veda o su uso. Denotam preguiça de quem escreve e desprezo com o termo a que se refere – uma “r. sentença” é sempre menos respeitável que uma “respeitável sentença”, “Vossa Excelência ao invés de “V. Exª.”; • Evite inversões de períodos As inversões confundem o leitor, e exigem um esforço de leitura desnecessário. Neste caso, o juiz é o leitor e, por isso, uma redação “truncada” pode até trazer um resultado indesejado. No lugar de “Vale ressaltar que, de vários fatores alheios à pessoa do requerente, depende o sucesso do evento”, use: “Vale ressaltar, que o sucesso do evento depende de vários fatores alheios à pessoa do requerente”. • Evite citação excessiva de expressões em latim Os brocardos e expressões latinas só tem utilidade se forem do domínio da maioria dos operadores do direito. O seu uso indiscriminado não tornará o texto mais “bonito, elegante ou suntuoso”. Isso vai, de fato, criar um complicador. Utilize apenas expressões em latim que são mais conhecidas no mundo jurídico que suas próprias traduções em português como, por exemplo: Ex officio – em função, em decorrência do ofício, do cargo. “A suspensão da ação pode ser provocada por ele, pelo acusado ou decretada ex-officio pelo juiz”(M. Noronha). Obs.: na edição de 1990, 20ª ed. da obra “Curso de Direito Processual Penal, de M. Noronha, eliminou-se o hífen em ex officio. Ex tunc – desde então, com retroatividade. Latu sensu – em sentido amplo, geral. Pro rata – em proporção, proporcionalmente, etc. Manuseando processos, analisando petições, o autor notou que existem muitos profissionais do Direito que não possuem noções básicas da língua portuguesa. • Cuidado com erros ortográficos ou gramaticais Uma redação ruim depõe contra quem escreve. O domínio da ortografia e das regras gramaticais se dá pela prática, portanto, leia muito e sempre escreva muito e sempre. E, acima de tudo, sempre que estiver em dúvida, consulte um bom dicionário. A comunicação informal fica geralmente restrita às famílias, aos pequenos grupos, ou, na mais ambiciosa das hipóteses, ao mundo das diversões ao passo que a linguagem formal continua imperando nas altas esferas do poder, na ciência, nos debates dos parlamentares, nos tribunais. Assim como a linguagem informal é a condição da intimidade pessoal entre amigos e familiares, a linguagem formal é a condição da ordem, da justiça e da liberdade na sociedade política. Muitos juristas acreditam que falar e escrever difícil demonstra cultura, prestígio utilizam termos arcaicos, rebuscados, uma linguagem jurídica com muitas formalidades. Nos dias de hoje com o acúmulo de processos no judiciário e o volume que muitos deles têm, escrever muito não significa escrever bem, a prolixidade é um defeito e não uma qualidade. Ser prolixo no mundo atual é um retrocesso, escrever textos claros e objetivos são as características de uma comunicação mais eficiente, tanto oral quanto escrita, pois o mais importante num processo comunicacional é se fazer entender. Uma peça processual com muitos arcaísmos, termos rebuscados e com abuso do latinismo pode ser reconstruída, substituindo por sinônimos, termos mais acessíveis a nossa época, sem que essas substituições interfiram no sentido jurídico do texto. Tudo o que estiver a mais, que não acrescenta em nada à tese a ser defendida, é eliminado, um texto prolixo torna-se um texto exato, conciso, mais enxuto, devemos incentivar os juristas a repensar o uso da linguagem forense. O ordenamento jurídico brasileiro expressa-se por meio da língua portuguesa, o mau uso da língua pode influir de maneira negativa, dentre outros fatores, no andamento da justiça, na sua celeridade. 1.2 Linguagem culta Trata-se da linguagem compromissada com as regras gramaticais. Exige sempre o conhecimento das regras da língua portuguesa.O operador do Direito tem o dever de conhecer as normas de acentuação, a concordância, a regência, a crase, a ortografia, a pontuação, etc. “Seja qual for a finalidade do seu texto (composição escolar, concurso público, obra literária, prazer de escrever etc), evite a linguagem coloquial, popular, descompromissada com a gramática.” (AQUINO, 2002, pág. 14). Paul Valery, poeta francês (1971-1945) – revelou um dos segredos da boa redação: “Entre duas palavras, escolha sempre a mais simples; entre duas palavras simples, escolha a mais curta”. A leitura de algumas petições iniciais demonstra que os operadores do direito não têm se aplicado ao estudo da Língua Portuguesa. Muitos erros de gramática aparecem frequëntemente na estrutura de parágrafos jurídicos e prejudicam a comunicação redacional. Erros de gramática causam obscuridade e ambigüidade na produção do texto jurídico. A linguagem utilizada na redação forense deve estar de acordo com a norma culta, isto é, deve obedecer às regras gramaticais. É fundamental conhecê-las para redigir excelentes petições iniciais, por isso é indispensável consultar sempre um livro de gramática. 1.3. Termos que devem ser evitados em Petições • Gírias “(...) palavra de uso familiar, coloquial ou mesmo restrito a um grupo social qualquer” (AQUINO, 2002, P. 36). Não devem ser usadas nas redações, mesmo entre aspas. Como ensina o mencionado mestre, ela empobrece o texto, é prova de pouco vocabulário. Nesse sentido, prega SACCONI (1998, p.11): “A língua escrita não a tolera, a não ser na reprodução da falta de determinado meio ou época, com a visível intenção de documentar o fato, ou em casos especiais de comunicação entre amigos, familiares, namorados, etc., caracterizada pela linguagem informal”. • Neologismos O português é uma língua rica em vocabulário. O ideal é não inventar palavras. “Há uma tendência popular de criar, principalmente a partir de prefixos e sufixos, novas palavras. É perigoso, dá margem a verdadeiras aberrações. Não o faça jamais. Ex.: Levou uma ovada na testa. O sufixo ada aparece em palavras como pedrada, bolada, facada etc. Não existe a palavra ovada”. (AQUINO, 2002, P.36). • Estrangeirismo “Nossa língua nativa é o português. Escrevemos e falamos em português. Não há razão para usar-se outra língua numa redação”. (AQUINO, 2002, p.37). No âmbito jurídico um problema que se tem observado é o uso excessivo de expressões latinas. Não se quer defender o total desuso dessas expressões. Mas quem as emprega, deve fazê-lo com parcimônia, para que a peça processual possa ser compreendida até mesmo pelas partes – maiores interessados no processo e que não detêm conhecimentos técnico-jurídicos. Algumas palavras trazem dúvidas quanto à escrita na dúvida seria adequado à consulta de um bom dicionário, ou a substituição da palavra por outra, cuja grafia seja conhecida. 2 COESÃO, COERÊNCIA E CLAREZA Os elementos de um texto devem ser devidamente relacionados. Do contrário, seu sentido lógico estará comprometido, apresentando contradições, argumentos desconexos, ambigüidades. Como bem definiu Renato Aquino: “Texto é um conjunto harmônico de elementos, associados entre si por processos de coordenação e subordinação” (AQUINO, 2004, pág.14). Explica o autor a diferença entre coesão e coerência: “coesão é a ligação, a união entre partes de um texto; coerência é o sentido lógico, o nexo”. Nota-se que, uma vez desrespeitada a coesão, o período fica incoerente, contraditório, sem nexo, sem clareza. O uso de frases curtas e simples é uma boa alternativa para quem deseja redigir de forma clara. A própria lei exige textos harmônicos. Concisão - dizer muito em poucas palavras. Evitar as digressões - desvio de rumo ou de assunto - inúteis, as palavras supérfluas. O vício contrário é a prolixidade. O fundamento não é medido pelo tamanho da petição, ou da decisão, mas pela força do seu argumento. Montesquieu (Charles-Louis de Secondat), filósofo político francês, já alertara, discorrendo sobre as “coisas que devem ser observadas na composição das leis”, que “seu estilo deve ser conciso”. Clareza – A clareza obtém-se com a simplicidade, pois tudo se pode dizer com palavras simples e exatas. Reflete o que já foi chamado de “limpidez do pensamento”, ou, também, capacidade de organização mental. Certas expressões, comuns nos autos, poderiam ser facilmente substituídas por outras, muito mais claras e objetivas. Damos a seguir alguns exemplos: • "Pretório Excelso", "Excelso Sodalício", ou "Egrégio Pretório Supremo": por "Supremo Tribunal Federal". • "Peça exordial", "peça vestibular", "peça preambular": por "petição inicial". • "Vistor", ou "expert": por "perito". • "Cônjuge sobrevivente" ou "consorte supérstite": por "viúvo (a)". • "Com tal proceder, tisnou várias regras insculpidas no caderno repressor": por “com tal proceder, violou vários artigos do Código Penal”. A clareza opõe-se à anfibologia (ambigüidade) e à obscuridade. Precisão – Empregar palavras apropriadas, exatas e adequadas. Escolha acertada do tempo próprio da palavra exata para a idéia que se quer exprimir. O próprio Montesquieu menciona um bom exemplo dizendo que “as Leis das Doze Tábuas são um modelo de precisão: as crianças as aprendiam de cor”. E, ainda, que “é essencial que as palavras das leis despertem em todos os homens as mesmas idéias. Naturalidade – Forma simples e espontânea da linguagem. Ferem a naturalidade o uso sistemático dos termos difíceis, a frase rebuscada, a expressão empolada e pedante, enfim, tudo o que denota artificialismo e afetação. Evita o supérfluo, o aparato, o requinte. Mas, não se deve confundir naturalidade com vulgaridade ou desleixo. Originalidade – um texto que tem origem no indivíduo (ou grupo) que o produziu. Deve ser elaboração personalizada do autor e não mera reprodução ou requentamento de clichês ou fórmulas pré-fabricadas. Nasce de uma visão pessoal do mundo e das coisas. O oposto é o uso indiscriminado de estereótipos, a imitação servil, o estilo postiço e a vulgaridade. Nos bancos acadêmicos, ensina-se aos futuros profissionais do Direito que, para escrever ou falar, é necessário que o faça com correção e clareza. E, por força dessa orientação, desacompanhada de maiores auxílios práticos, constatamos, com muita freqüência, peças processuais com uma argumentação superficial . Em se tratando da linguagem jurídica, a escrita contemporânea exige uma responsabilidade maior, um cuidado tanto com a forma (estética), como com o conteúdo (a idéia, as correções gramaticais, concordâncias, entre outras). 2.1. Os principais erros gramaticais encontrados nos textos jurídicos Freqüentemente, os profissionais do Direito escrevem “Requer a paralização dos autos do processo pelo prazo de 15 dias”, “O juiz de direito analizou detidamente as provas” etc. Escrevem-se os verbos “paralizar” e “analisar” com “s” e não com “z”. Outro defeito do estilo muito comum na redação forense é o excessivo abuso do “que” (pronome relativo ou conjunção integrante), como os seguintes e jocosos exemplos: “1) Disseram-me que o homem que aqui veio, que me procurou e que não quis deixar o nome, é o mesmo que ontem me telefonou [...]; 2) A moça, que estuda, que toca piano e que pinta, pode considerar-se de talento[...]; 3) Quiseram que o enfermo se recolhesse ao hospital, mas a família ordenou que o levassem para o interior [...]. Como resolver essa abusiva repetição? Substituindo o “que” pela vírgula, a título de elipse. A concordância verbal é exatamente importante para a boa construção do parágrafo jurídico.Lembre-se de que o verbo sempre concorda com o sujeito. Especial atenção merece a concordância dos verbos acompanhados pela partícula apassivadora “se” em construção deste tipo: “alugam-se casas”, “emitem-se cheques”, “consertam-se relógios”. Os substantivos casas, cheques e relógios sofrem a ação verbal. Devem concordar com o verbo no plural ou no singular: ”aluga-se casa”, “emite-se cheque”, “conserta-se relógio”. A regência verbal também ocupa lugar de destaque na elaboração das Petições Iniciais. Entende-se por regência verbal a relação de subordinação existente entre duas palavras ligadas entre si (verbo e preposição), de tal modo que uma dependa gramaticalmente da outra. No caso da regência verbal, alguns verbos exigem determinadas preposições e não outra. No caso da regência verbal, alguns verbos exigem determinadas preposições e não podem ser usadas com outras preposições sob pena de ocorrer erro gramatical ou mudança de sentido. Leia, atentamente, este exemplo retirado do art. 344, parágrafo único do CPC: “É defeso, a quem ainda não depôs, assistir ao interrogatório da outra parte.” Note-se que o verbo “assistir” exige a preposição “a”. Ele é verbo transitivo indireto no sentido de “ver”, “presenciar”, portanto exige objeto indireto, representado pela preposição “a”, por isso, deve-se escrever: “assistir ao depoimento”, “assistir ao filme”, “assistir à audiência” etc. Se o legislador tivesse escrito: “É defeso, a quem ainda não depôs, assistir o interrogatório”, o sentido da frase seria outro. O verbo “assistir” também é transitivo direto, na acepção de “acompanhar”, “socorrer”, “ajudar”. Por esse motivo, ele não exige preposição “a”. Assim, a interpretação do artigo seria outra: a testemunha que ainda não depôs, não pode ajudar o interrogatório da outra parte. Imagine uma testemunha ajudando o juiz a interrogar a testemunha que está depondo. Existirão aquelas pessoas que, certamente, afirmariam que o legislador, na verdade, proibiu que uma testemunha ajudasse a outra em seu depoimento. Observe- se que uma única preposição ligada ao verbo pode causar problema de correção gramatical com reflexos na interpretação da lei. Com a petição inicial acontece o mesmo. Se o operador do Direito não cuidar da regência verbal, pode escrever incorretamente ou, dependendo do verbo que aceita ou não preposição de acordo com a frase, pode dar sentido diverso à sua redação. O erro de regência verbal mais comum encontrado nas petições iniciais é com a utilização dos verbos “residir” e “domiciliar”. Estes verbos exigem a preposição “em” e não exigem a preposição “a”. Leia este exemplo retirado do art. 953 do CPC: “Os réus que residem na comarca serão citados pessoalmente; os demais, por edital.” O legislador utilizou corretamente a gramática: “residir na comarca” e não da forma incorreta: “residir à comarca”. Utiliza-se a mesma regência verbal com relação ao verbo “domiciliar”. Observe-se este exemplo retirado do art. 88, inc. I, do CPC: “É competente a autoridade judiciária brasileira quando: I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil”. Infere-se, portanto, destes exemplos que se deve escrever, na petição inicial, “residente e domiciliado na Rua[...]”. Outro verbo utilizado freqüentemente de forma incorreta é o “visar”. Com o sentido de “ter por finalidade”, “objetivar”, ele é transitivo indireto com a preposição “a”. Por exemplo: “Os bacharéis em direito visam à aprovação no exame da OAB”. Os bacharéis visam a quê? Resposta: à aprovação no exame da OAB. O verbo visar” apresenta-se também como verbo transitivo direto , no entanto, muda-se o significado. Será transitivo direto quando significar “apontar a arma contra”. Exemplo: “O Policial Militar visou o alvo com segurança”. Também será verbo transitivo direto quando significar “pôr o sinal de visto em”, “rubricar”, “assinar” etc. Exemplo: “O gerente do banco visou o cheque do industrial”. O verbo “despachar”. Com o sentido de “pôr despacho em um documento”, “atender”, “resolver”, é verbo transitivo direto. Exemplo retirado do art. 644 do CPC: “Na execução de obrigação de fazer ou não fazer, fundada em título extrajudicial, o juiz, ao despachar a inicial, fixará multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação e a data a partir da qual será devida.” Como se pôde observar, a regência verbal influencia na redação das peças processuais, sobretudo na petição inicial, por isso, o livro de gramática é indispensável ao operador do Direito, a fim de consultar os verbos e verificar quais são as preposições corretas e seus vários sentidos no uso redacional. O verbo “chegar” não é bem utilizado.Não se diz: “ontem, cheguei no fórum logo pela manhã”. Quando o sentido for o de atingir um determinado ponto, deve-se dizer: “ontem, cheguei ao fórum logo pela manhã”. Aproveite para corrigir esta frase: “Eu cheguei em minha casa cedo”. Corrija para: “Cheguei à casa cedo”. A palavra composta “abaixo-assinado” e “abaixo assinado” são formas corretas na língua portuguesa, mas possuem significados diferentes. Abaixo-assinado é o documento, a petição, o requerimento assinado por várias pessoas. A palavra que indica individualmente a pessoa que assinou o abaixo-assinado é “abaixo assinado”. Veja este exemplo: “O autor vem, mui respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, por meio de seu advogado abaixo assinado requerer a paralisação dos autos do processo por 15 dias”. Com freqüência, é abusivo o uso de o(a) mesmo(a), do (a), nos textos jurídicos. Exemplificando, temos: “A autora encontrou apoio de seus familiares que concordaram que a mesma...”; “O autor, após juntar todos os documentos, encaminhou os mesmos[...]”; “Além disso não foi alegada fraude ou irregularidade na contratação de serviços entre as mesmas[...]” A contratação do mesmo é ilegal[...]”. Convém esclarecer que essas expressões não devem ser utilizadas em substituição a pronomes. As construções adequadas seriam: “[...] concordaram que ela”; “[...] encaminhou-os”; “[...] entre elas[...]”; “a contratação dele [...]”. Outro problema é o uso do onde, que equivale a lugar, entretanto, é muito comum encontrarmos seu emprego indevidamente. Vejamos alguns exemplos: “Conforme o artigo[...] onde compreende-se que[...]”,ora, artigo não equivale a lugar, portanto, não cabe o uso de onde “A ação que lhe move[...]onde são apresentados[...]”, ação também não equivale a lugar; “As informações constantes nos autos, onde se pode[...]”, autos também não possui idéia de lugar. Em todos esses exemplos, o onde deveria ter sido substituído por: no(a) qual, nos (nas) quais ou em que. O uso indevido da 1ª. Pessoa do singular (EU) e da 1ª. Pessoa do plural (NÓS) também tem sido observado em algumas petições e em demais textos jurídicos: “Ainda podemos constatar que o referido instrumento[...]”; “Fica-nos bastante evidente que o réu[...]”; “Ainda que isso fosse verdadeiro, não nos parece[...]”; Diante disso, requeremos[...]”. Sabendo-se que o advogado está na condição de procurador, este escreve em nome de alguém, no caso, de seu cliente, sendo assim, o texto deve ser redigido na 3ª pessoa do plural (eles/elas), a não ser que o profissional esteja advogando em causa própria, aí cabe o uso do EU, fora isso, não cabe esse tipo de construção. Por iguais razões, destaco o termo excelência. Há petições iniciais recheadas de excelência na narrativa dos fatos. A cada parágrafo, o profissional utiliza esse termo como se estivesse falando com o juiz e não escrevendo a ele. E aqui convém esclarecer ainda que, uma petição inicial é um pedido no qual, além de outras coisas, os fatos devem ser claramente relatados, todavia, há aqueles que a confundem com uma carta ou com um bilhete endereçado ao juiz. Observamos os exemplos tirados de peças processuais: O requerente é pessoa aposentada, excelência e recebe por mês[...]”; Ainda que tal acusação fosse verdadeira, excelência[...]”; Diante de tal situação, excelência, a autora procedeu[...]”; Fica evidente, excelência, que tudo isso causou [...]”. Há que se perceber nesses exemplos o quanto é comum o uso desse termo na escrita, o qual tornou-se, a meu ver, um vício, um costume, que só deveria ser utilizado na língua falada, nos atos da conversação. Os termos suplicante e suplicado são mais uma incorreção na linguagem jurídica. Conforme definição de Silveira Bueno, suplicar significa “rogar, pedir humildemente”.Ora, costuma-se suplicar algo a Deus, assim, esses termos se encaixam muito bem numa prece, mas não numa petição inicial,na qual o autor tem o direito de requer, postular, pleitear. Suplicar não. Observemos os seguintes exemplos: “ O suplicante é proprietário do imóvel residencial[...]”; “O suplicante em momento algum criou dificuldades[...]”; “O suplicante é modesto comerciante na cidade de[...]”. Talvez esse seja mais um vício que deva ser corrigido. .