REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL Madalena Libério À partir da 2ª Guerra Mundial, de uma forma mais acentuada na Europa, ainda marcada pelos horrores que aqueles anos representaram, a assistência psiquiátrica, principalmente no que diz respeito aos direitos humanos dos pacientes, começou a ser discutida. Eram questionados, principalmente, os métodos de tratamento que os portadores de transtornos mentais graves recebiam, exclusivamente asilar. O asilo era, até então, tido como o lugar privilegiado de tratamento da loucura, desde o final do século XIX e começo do século XX, quando Philippe Pinel o institui (Birman e Costa, 1994). Nos anos após-guerra este dispositivo de cuidados é colocado em discussão, devido aos altos índices de cronicidade das doenças mentais detectados, e a sua conseqüente incapacidade social. Os movimentos surgidos na Inglaterra, com as Comunidades Terapêuticas, e na França, com a Psicoterapia Institucional, de acordo com Birman e Costa, iniciaram o debate no seio da estrutura asilar, embora ainda na perspectiva que esse seria o lugar da cura, por excelência, aos portadores dos transtornos psiquiátricos. Posteriormente, já nos anos 60, a Psiquiatria de Setor (França) e a Psiquiatria Comunitária ou Preventiva (Estados Unidos), trazem à cena a importância do meio cultural e social como estruturas a serem consideradas no tratamento dos pacientes. De acordo com estes autores acima, estes fatores apontavam para a superação das reformas relativas ao espaço asilar (Birman e Costa, 1994). Na década de 70, a Antipsiquiatria, de Laing e Cooper, provoca vigorosos debates acerca do papel repressor da Psiquiatria, enquanto na Itália, Franco Basaglia propõe a Desinstitucionalização, como desconstrução do modelo práticoteórico vigente da Psiquiatria (Amarantes, 1995). Os conceitos que Basaglia (1991) defende, e que orientaram a chamada Reforma Psiquiátrica Italiana, partem da hipótese, de acordo com Tykanori (1990), que: (...)“o mal obscuro da psiquiatria está em haver separado um objeto fictício, abstrato, a ´doença´, da existência global, ‘complexa’ dos pacientes e do corpo da sociedade. Foi sobre esta separação artificial que se construíram um conjunto de aparatos científicos, legislativos, administrativos (a Instituição, portanto), todos referenciados exclusivamente à doença. E é a este conjunto de aparatos que cumpre desinstitucionalizar, para retomar contato com a existência dos pacientes, enquanto existência doentia.” (Tykanori, 1990, p.78) Este movimento na Itália resultou em uma lei federal (Lei da Reforma Psiquiátrica, a chamada, Lei 180), que determinava a eliminação da internação psiquiátrica e a construção de serviços na comunidade que substituíssem inteiramente a própria internação (Tykanori, 1990). No Brasil, onde o primeiro hospício (Pedro II, localizado na Praia Vermelha) foi fundado em 1852, a assistência psiquiátrica também se centra no tratamento asilar. Desde aquela época, até o final dos anos 80, quando começa a tomar corpo o processo de transformação do modelo de atenção psiquiátrica, a assistência aos portadores de transtornos psíquicos graves acontece basicamente nos hospitais psiquiátricos. Apesar de não nos dedicarmos a uma exposição mais alongada sobre a história da Psiquiatria no Brasil, neste trabalho 1, é necessário que se destaque o trabalho de alguns psiquiatras que marcaram esta história por proporem modelos diversos de cuidados. Na década de 30, Ulisses Pernambucano defende que a assistência psiquiátrica seja organizada em um sistema de atenção que inclui ambulatórios, hospitais abertos e atenção ao egresso. Adauto Botelho, chefe do Serviço Nacional de Doenças Mentais, na década de 40, propõe a criação de ambulatórios psiquiátricos. Nas palavras de Carvalho (1999), “mesmo parecendo não se contrapor diretamente ao paradigma de exclusão da psiquiatria da época, foram 1 Sobre este tema ver Resende (1987), Costa (1989), Teixeira (1997). serviços importantes, cujos modelos puderam mais tarde ser expandidos, e oferecer algo diferente do aprisionamento asilar”. Ainda na década de 40, a psiquiatra Nise da Silveira inicia, no Centro Psiquiátrico Pedro II (Rio de Janeiro), o trabalho do Setor de Terapia Ocupacional. Através de oficinas de desenho, pintura e modelagem, tomando como base as teorias de Jung, Dra. Nise considera que os pacientes possam expressar suas emoções e se reestruturarem internamente (Carvalho,1999). No Brasil, as décadas de 60 e 70 foram marcadas pelo aumento acentuado de leitos psiquiátricos, havendo por parte da Previdência Social uma priorização quanto à compra dos serviços de hospitais privados, mediante convênios e credenciamentos. Como conseqüência, ocorreu um acentuado aumento de internações, reinternações e do Tempo Médio de Permanência Hospitalar (TPMH), contrariando as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), à época, que preconizava que se fizesse, preferencialmente, a assistência ambulatorial (Mello, 1977). Como conseqüência observou-se, no início dos anos 80, à chamada crise da previdência, que gerou a Co-gestão Interministerial, entre o Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) e o da Saúde (MS), como tentativa de solução a este problema. Essa Co-gestão teve importante repercussão na assistência psiquiátrica no Rio de Janeiro, como veremos posteriormente. (Amarantes, 1995) Concomitante à gradativa distensão do movimento de redemocratização, à partir do final da década de setenta, vê-se a crescente apropriação dos grandes temas nacionais por setores da sociedade civil organizada, que articula-se para trazer à cena questões até então discutidas apenas em fóruns oficiais, com participações de setores restritos. Neste sentido, na perspectiva da assistência psiquiátrica, organiza-se o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental em vários Estados. Mais tarde esse movimento se transforma no Movimento Nacional da Luta Anti-Manicomial, e passa a contar, já àquela época, com a participação de usuários dos serviços psiquiátricos. A questão principal, desse movimento, abrange a discussão dos modelos de assistência psiquiátrica, predominantemente hospitalocêntrico, com características asilares, assim como questões relacionadas aos direitos dos pacientes. A discussão destes temas toma corpo com a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde, em 86, e se amplia com a 1ª Conferência de Saúde Mental, em 1987, provocando ampla mobilização de todos os setores envolvidos com a assistência, formuladores de políticas de saúde e setores da população (Venâncio, 1990) Toda essa discussão vem per e passo com o importante movimento da Reforma Sanitária, imprescindível para as avançadas propostas seladas num capítulo da Constituição de 1988, considerada “A Constituição Cidadã”. Sob o lema “Saúde - direito de todos e dever do Estado”, o capítulo da saúde consagra os princípios e diretrizes do Sistema Único de Saúde, os quais serão, posteriormente, regulamentados pela Lei Orgânica da Saúde, a Lei 8080/90. Estes princípios e diretrizes estão agrupados nas seguintes categorias: descentralização, universalidade, eqüidade, integralidade e controle social. A descentralização compreende repassar aos municípios a atribuição de gerenciar (planejar, acompanhar, supervisionar e avaliar) os seus recursos humanos, infra-estrutura (físicos e financeiros) assim como as ações de saúde. Importante frisar que esta é uma questão determinante na criação da rede dos Centros de Atenção Psicossocial da Secretaria Municipal de Saúde da Cidade do Rio de Janeiro, à qual voltaremos posteriormente. Universalidade, a garantia de acesso de toda e qualquer pessoa a todo e qualquer serviço de saúde público ou por este contratado. Eqüidade, implicando na garantia de acesso de toda e qualquer pessoa em igualdades de condições, de acordo com a sua necessidade, aos diferentes níveis de complexidade do sistema, além da afirmação de que as ações coletivas serão dirigidas por prioridades ampla e publicamente reconhecidas. A integralidade diz respeito ao reconhecimento de que as pessoas devem ser vistos em sua totalidade, e o sistema, portanto, deve organizar-se para oferecer ações de promoção, proteção e recuperação da saúde conjuntamente. E o controle social implica na participação da população, através de suas organizações sociais, no processo de formulação das políticas de saúde, do controle e da execução de ações, em todos os níveis da administração pública, ou seja, do federal ao municipal (Cerqueira, 1999). Em 1990, é aprovada a Declaração de Caracas, na Conferência Regional para a Reestruturação da Atenção Psiquiátrica, promovida pela Organização PanAmericana da Saúde / Organização Mundial de Saúde (OPAS/OMS), em Caracas, Venezuela, que contou com 200 participantes de 11 países latino-americanos. Este documento postula a necessidade dos países reverem o papel do hospital psiquiátrico enquanto componente central da atenção psiquiátrica. Esta recomendação decorre do entendimento que este tipo de dispositivo promove o isolamento do paciente do seu meio, gerando assim, uma maior incapacidade social; produz condições desfavoráveis que põem em perigo os direitos humanos e civis do doente; consome a maior parte dos recursos financeiros e humanos destinados pelos países aos serviços de saúde mental. Como estratégia de mudança a Declaração de Caracas propõe que os serviços comunitários tornemse o principal meio para se obter um atendimento preventivo, acessível, descentralizado, participativo e contínuo. E que haja, por parte dos governos, o incentivo à criação de modelos alternativos, centrados na comunidade, e integrados às suas redes sociais. Igualmente defende a revisão das legislações nacionais, como forma de assegurar o respeito aos direitos humanos e civis dos doentes mentais (OPAS / OMS,1990). Ainda no ano de 1990 a XXIII Conferência Sanitária Pan-Americana aprovou a resolução XIII, que trata das “Orientações Estratégicas e Prioridades Programáticas para a Organização Pan-Americana da Saúde no Quadriênio 19911994”, visando atingir, de acordo com o modelo democrático, os objetivos de saúde e desenvolvimento social. Estas orientações pressupõem que os programas de saúde mental devem ter um importante papel na promoção de políticas sociais, tais como: melhorar a qualidade de vida dos indivíduos, da família e da sociedade, e reforçar a interação entre a saúde e o desenvolvimento humano (Levav e cols., 1994). A Resolução XIII defende o “fortalecimento e o desenvolvimento de sistemas locais de saúde” buscando um modelo de serviço que assegure maior eqüidade e seja mais eficaz, eficiente e participativo (Levav e cols., 1994). Em 1991, ainda por conta da crescente preocupação com os direitos humanos dos portadores de transtornos mentais, a ONU elabora uma carta de direitos relativa aos Princípios para a Proteção dos Doentes mentais e o Aperfeiçoamento da Atenção à Saúde Mental, que aponta os pressupostos acima citados (Levav e cols., 1994). A partir destas medidas, vai se consolidando, em diversos países da América Latina, e no Brasil, uma ampla discussão do modelo assistencial psiquiátrico. Isto acontece amparado em resoluções de organizações internacionais e dos principais fóruns nacionais, com ampla participação de todos os grupos envolvidos nesta questão. É neste contexto que o Deputado Paulo Delgado (PT/MG) apresenta o projeto de lei n.º 3657/89, o qual não só propõe a extinção progressiva dos manicômios, mas a proibição da construção de novos hospitais psiquiátricos públicos, assim como a proibição, pelo governo, da contratação de novos leitos psiquiátricos na rede privada. O projeto prevê a regulamentação das internações involuntárias, e determina a sua comunicação à autoridade judiciária no prazo de vinte e quatro horas. A outra questão abordada refere-se à competência da assistência, que delega às Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde a função de organização do sistema de atendimento, através da implantação de unidades psiquiátricas em hospitais gerais, criação de hospitais-dia, hospitais-noite e dos Centros de Atenção Psicossocial, como dispositivos substitutos à internação. Este projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 1990, entretanto ficou no Senado até 1999. Em razão de ter sido votado com modificações foi reencaminhado à Câmara, onde ainda aguarda a votação final. Segundo Cerqueira (1999), ao tecer considerações sobre o período acima abordado: “(...) a passagem da década de 80 para 90 foi marcada por uma série de acontecimentos que somaram-se em prol de uma significativa transformação na assistência em Saúde Mental no Brasil”. (…) esta Reforma Psiquiátrica ganha cada vez mais contornos outros que não aqueles estritamente ligados ao campo da assistência. Desta forma inaugura-se um diálogo permanente com os campos jurídico, cultural e social. Nesta perspectiva o Brasil incorpora estes pressupostos e passa a orientar a sua Política de Saúde Mental em consonância com o ideário da Reforma Psiquiátrica, já difundida, também, entre os países da América Latina.” (Cerqueira, 1999, p.105) Em vários estados e municípios o processo de discussão acerca da Saúde Mental, Psiquiatria, e dispositivos de assistência desencadeado, ganha espaço na mídia e traz para o centro do debate vários segmentos da sociedade, propiciando uma ampla participação acerca dos novos rumos que estas mudanças propunham e os desafios que traziam. É interessante notar que, gradativamente, a partir do final da década de 80, em um número crescente de municípios são desenvolvidos Programas de Saúde Mental em consonância com a Reforma Psiquiátrica. Utilizando projetos que mudaram o sistema de atendimento aos portadores de transtornos psiquiátricos, através da criação de redes de serviços de atenção diária, ou que dispunham também de leitos-noite, reorganizando o sistema de internação com a criação de enfermarias em hospitais-gerais, entre outras formas possíveis de propiciar àquelas pessoas a possibilidade de serem atendidas de acordo com a suas necessidades. Exemplos marcantes, com experiências que resultaram em transformações significativas da assistência, são Santos (SP), São Lourenço do Sul (RS), e Quixadá (CE) (Cerqueira, 1999). O Ministério da Saúde, através da Coordenação de Saúde Mental, tem desenvolvido um papel fundamental na paulatina mudança quanto ao destino e utilização dos recursos financeiros públicos. Estas mudanças realizadas através de portarias, definem o pagamento de novos serviços, incentivam a criação de dispositivos de assistência, tais como hospitais-dia, leitos psiquiátricos nos hospitais gerais, centros de atenção psicossocial, consultas individuais ou em grupos por profissionais de diferentes categorias. Foram criadas, também, exigências de condições físicas e de recursos humanos que os hospitais psiquiátricos devem atender. Exemplo disto, foi a Portaria 224/MS, em 1992, que definiu as regras para que os hospitais psiquiátricos pudessem passar para a chamada Psiquiatria IV, através do estabelecimento de novos parâmetros de qualidade mínima a serem cumpridos para fazerem jus às diárias mais altas. Foram criadas, também, portarias que regulam a proibição de celas fortes, a inviolabilidade da correspondência, o direito às visitas diárias, protocolos do uso da eletroconvulsoterapia, entre outras questões, como forma de resguardar os direitos dos pacientes (Cerqueira, 1999). A continuidade do trabalho de uma mesma equipe, à frente da Coordenação de Saúde Mental (COSAM), do Ministério da Saúde, ao longo de, aproximadamente, seis anos, no início da década de 90, permitiu que se desse início à desconstrução do aparato asilar no país. Estas mudanças foram realizadas de forma cuidadosa, mas afirmativa, impondo-se pela inteligência de sua estratégia, em meio a grandes e múltiplas pressões das mais diversas ordens. Tal como, de todo o setor privado contratado pelo SUS, setores acadêmicos mais retrógrados, corporativismos dos diversos grupos que sentiam-se ameaçados em suas posições de poder (Cerqueira, 1999). Embora este movimento de reforma da assistência psiquiátrica ainda não tenha atingido muitos municípios deste país continental, é fato que ao longo desses anos tem se observado um número cada vez maior de estados e municípios que estão empenhados neste sentido, como já mencionamos acima. Entre as mais importantes medidas tomadas pela COSAM, está a criação do “Grupo de Acompanhamento de Assistência Psiquiátrica Hospitalar”. Com a função de avaliação, controle e fiscalização, este grupo tem como objetivo monitorar e garantir a efetiva implantação das normas e portarias que visam a melhoria da assistência prestada pelas unidades credenciadas ao sistema único de saúde, inclusive com poderes para descredenciar as instituições que não estejam cumprindo as normas preconizadas pelo Ministério. Ainda apresenta, como uma de suas funções, definir em qual dos níveis de financiamento estabelecidos pelo Ministério da Saúde, Psiquiatria I, II, III e IV, de acordo com as condições encontradas, será enquadrada a instituição (Alves e cols.,1996). Uma equipe constituída por profissionais, indicados pelas associações científicas das várias categorias profissionais da área de saúde mental, familiares e usuários, vem desempenhando seu papel nos vários estados e municípios brasileiros. Esse grupo vem sendo imprescindível no auxílio à muitas coordenações de saúde mental, corroborando na fiscalização do sistema contratado. Como resultante do trabalho de normatização e controle, os relatórios do Ministério da Saúde apontam que, entre 91 e 96, foram fechados entre hospitais psiquiátricos, públicos e privados contratados, 44 unidades, e foram desativados 22.523 leitos. Concomitante, observa-se a abertura de leitos em hospitais gerais (434 leitos), de serviços em sistema de Hospitais-Dia, NAPS, CAPS, num total de 106 unidades em todo o país (Alves e cols.,1996). Na perspectiva da organização da sociedade civil é possível observar o surgimento de várias associações de familiares e usuários, que foram se organizando ao longo deste período, ocupando espaços nos fóruns de debate, posicionando-se contra ou a favor das questões da Reforma, e que hoje têm assento em vários Conselhos Municipais e Estaduais de Saúde, além de, como já mencionado, na Comissão Nacional de Saúde Mental. Por outro lado, os profissionais dão continuidade ao Movimento Nacional da Luta Anti-Manicomial, realizando encontros periódicos, como o II Encontro Nacional da Luta AntiManicomial, em 1995 (Cerqueira, 1999). A votação, pelo Senado Federal, do Projeto de Lei 3.657/89, do Deputado Paulo Delgado, em abril de 1999, mobilizou todos os setores sociais envolvidos. Isto requereu amplas negociações para a elaboração e aprovação do texto do relator Sebastião Rocha. Neste, os pontos principais são: assegura direitos de cidadania e preserva direitos humanos dos portadores de transtornos psíquicos. Redireciona a assistência em saúde mental, enfatizando a construção de uma rede diversificada de serviços extra-hospitalares, apontando para a obrigação do governo de destinar recursos para tal fim. Limita a internação considerando-a como último recurso assistencial. Restringe a construção e financiamento pelo setor público de novos hospitais psiquiátricos, que só serão autorizados em caráter excepcional, com aprovação dos três níveis gestores e respectivos órgãos de controle social (conselhos). Define e regulamenta de três tipos de internação (voluntária, involuntária e compulsória). A internação involuntária deve ser comunicada ao Ministério Público em 72 horas, bem como a correspondente alta. Determina que o Poder Executivo defina política específica para pacientes com longo tempo de internação hospitalar, objetivando sua alta e reinserção social (Schechtman, 1999). A repercussão deste projeto e suas propostas pode ser percebida nos inúmeros estados e municípios que incorporaram à sua legislação projetos de lei sobre a assistência e direitos devidos aos portadores de transtornos psiquiátricos, como no Rio Grande do Sul, Distrito Federal, Pernambuco, Ceará, entre outros. Em 06 de abril de 2001 é promulgada, afinal a Lei 10.216, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. E em 19 de fevereiro de 2002 o Ministério da Saúde publica a portaria que define os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) como o modelo de assistência aos portadores de transtornos psiquiátricos graves e persistentes. A análise destes fatos, elencados nesta breve retrospectiva, mostra que o movimento da reforma psiquiátrica, iniciado após a 2ª Guerra Mundial, na Europa e Estados Unidos, trouxe à tona os resultados efetivos que o modelo psiquiátrico, centrado na internação, produz nos seus usuários. Tais como exclusão, gerando incapacidade social, e desrespeito aos seus direitos mais elementares de cidadão. O movimento ganha vulto e passa a produzir ecos na América Latina e no Brasil, que na época se encontrava em pleno processo de redemocratização, e, portanto, ávido por mudanças. O processo de discussão sobre a assistência psiquiátrica se espalha por todo o país. Observa-se, então, a inclusão dos atores diretamente envolvidos na questão, usuários e familiares. Estes ganham voz e espaço para também opinar. Novos projetos de lei, que buscam a modificação dos sistema de oferta de serviços e dos direitos dos pacientes são apresentados. O Ministério da Saúde se posiciona estrategicamente na defesa das mudanças e vai tornando-as realidade através de normatizações e definição do uso dos recursos públicos.