Governo do Estado do Rio Grande do Sul Fundação de Articulação e Desenvolvimento da Política Pública para Pessoa Portadora de Deficiência e para Pessoa Portadora de Altas Habilidades do Rio Grande do Sul / FADERS Programa de Pesquisa da FADERS Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/ PUCRS Faculdade de Serviço Social/PUCRS Núcleo de Pesquisa em Demandas e Políticas Sociais/ NEDEPS/FSS/PUCRS Relatório de Pesquisa “Vulnerabilidade Social, Resiliência e Estratégias de Resistência na Condição da Deficiência e da Terceira Idade” Responsáveis técnicas pelo relatório: Clarissa Alliati Beleza Idilia Fernandes Rosane Arostegui de Azevedo Equipe de Pesquisadoras: Clarissa Alliati Beleza Gabriele Borges Valencio Idilia Fernandes Paula Fronza Potira dos Santos Rosane Arostegui de Azevedo Agosto de 2007 Sumário Apresentação Preliminar Questões de Pesquisa Procedimentos Metodológicos Análise Qualitativa dos Dados/ Análise de Conteúdo A Categoria Teórico-Reflexiva Vulnerabilidade Social Vulnerabilidade da Pessoa com Deficiência e da Pessoa na Terceira Idade A Categoria Teórico-Reflexiva Resiliência e Estratégias de Enfrentamento A Categoria Teórico-Reflexiva Processo Social da Participação e Organização Análise Quantitativa dos Dados/ Programa Sphinx Considerações Finais/ Resultados e Sugestões Bibliografia Apresentação Preliminar A proposta de parceria entre a Fundação de Articulação e Desenvolvimento da Política Pública para Pessoas Portadoras de Deficiência e Altas Habilidades no Rio Grande do Sul (FADERS) e o Núcleo de Pesquisa em Demandas e Políticas Sociais da Faculdade de Serviço Social da PUCRS (NEDEPS) teve como ponto de partida o desenvolvimento do projeto de pesquisa “EXCLUSÃO SOCIAL, VULNERABILIDADE SOCIAL E REDES DE INCLUSÃO”, bem como a construção e divulgação dos dados de pesquisa encontrados. A materialização desta parceria se realizou na construção de um subprojeto de pesquisa que se tornou um projeto de pesquisa intitulado “Vulnerabilidade Social, Resiliência e Estratégias de Resistência na Condição da Deficiência e da Terceira Idade”. Esse projeto foi executado pela equipe técnica do programa de pesquisa da FADERS e por bolsistas de iniciação científica do NEDEPS. O presente relatório apresenta os resultados da pesquisa “Vulnerabilidade Social, Resiliência e Estratégias de Resistência na Condição da Deficiência e da Terceira Idade”, realizada no período de abril 2006 a setembro 2007, tendo como campo de pesquisa o Centro de Extensão Universitária (CEU) na Vila Fátima, o Lar do Cego Idoso e Parque Esportivo da PUCRS. Os sujeitos de pesquisa: pessoas com deficiência (física e/ou sensorial) a partir da adultez e pessoas idosas na condição de vulnerabilidade social, foram entrevistadas 30 pessoas. A pesquisa foi projetada tendo como objetivo geral: investigar através de processos de pesquisa e de experiências de extensão as diversas formas como se manifestam os processos de vulnerabilidade social na condição da deficiência (física e sensorial) e da terceira idade bem como, a conformação e efetividade da rede de atenção dispostas na rede pública e/ou privada e as estratégias de enfrentamento, por eles utilizados, suas formas de organização, participação e controle social. E, como objetivos específicos: Realizar estudos sobre as diversas formas de vulnerabilidade social na condição da deficiência (física e sensorial) e da terceira idade, aprofundando conceitos e teorias que versam sobre a temática de modo a produzir conhecimentos e subsidiar políticas sociais. Identificar e avaliar os serviços que compõem a rede de atenção às populações vulnerabilizadas com vistas a dimensionar sua efetividade. Subsidiar processos de avaliação institucionais e possibilitar a realização de extensão na área de assessoria institucional. Contribuir para produção de metodologias de intervenção social e assessorias institucionais específicas. Possibilitar através da interface entre a instituição pública e a universidade a produção de conhecimento interdisciplinar que articule os múltiplos saberes para uma leitura ampliada sobre vulnerabilidade social, resiliência, redes de atenção e estratégias de resistência utilizadas pelos sujeitos. Reconhecer o protagonismo dos indivíduos sociais, através do conhecimento de suas organizações populares, de seus mecanismos de controle social e participação. Questões de Pesquisa 1. Que condições potencializam as situações de vulnerabilidades sociais, a partir da vivência dos sujeitos com deficiência e na terceira idade? 2. Como o sujeito pesquisado se percebe diante de situações consideradas adversas? 3. Que aspectos de autonomia e participação em espaços de inserção social existem na vida dos sujeitos entrevistados? 4. Quais lugares públicos e/ou do terceiro setor são utilizados pelos sujeitos entrevistados? 5. Como os sujeitos entrevistados avaliam a eficácia dos recursos encontrados para atender suas demandas? 6. Que alternativas e sugestões os sujeitos pesquisados propõem para melhoria de sua qualidade de vida? Procedimentos Metodológicos Metodologia de abordagem qualitativa. Amostra Intencional (mapeamento de locais) Entrevista semi-estruturada em um instrumento de pesquisa, construído a partir das questões de pesquisa. As entrevistas serão gravadas e transcritas para serem submetidas à análise de conteúdo e a categorização analítica. Análise e interpretação dos dados (análise de conteúdo e análise quantitativa) Sistematização dos conhecimentos adquiridos na pesquisa através de relatórios, artigos e construção de material didático expositivo (slides). Seminários internos entre Professores da Faculdade, Bolsistas e Técnicos da FADERS para debater os assuntos: pesquisa na área das ciências humanas; a questão da diversidade; o significado da Acessibilidade Universal; Exclusão e Vulnerabilidade Social; Redes de Inclusão; Vulnerabilidade na terceira idade; Vulnerabilidade da pessoa com deficiência. Servidores públicos da FADERS estarão em permanente capacitação na área da pesquisa, através do estudo específico de abordagens de pesquisa e análise de dados. Seminário Aberto à Comunidade acadêmica e aos funcionários da FADERS para socializar os conceitos estudados sobre vulnerabilidade Social, vulnerabilidade na condição da deficiência e da terceira idade. Debate com representantes do movimento social do idoso e da pessoa com deficiência sobre os conceitos estudados quanto à temática e apresentados no seminário aberto. Contato com representantes dos campos escolhidos para as abordagens. Apresentação do projeto de pesquisa no Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço Social em Recife. Seminário aberto à comunidade acadêmica e a comunidade em geral para devolução dos resultados de pesquisa. Apresentação dos resultados parciais e gerais de pesquisa em instituições interessadas na temática e em espaços acadêmicos pertinentes. Articulação entre instituições públicas, privadas e universidade para viabilizar ações, programas e/ou projetos sociais a partir dos dados obtidos na pesquisa que possam responder às demandas levantadas nos resultados de pesquisa. Reconhecimento das diferenças, os materiais impressos deste estudo como Projeto de Pesquisa, Termo de Consentimento, Instrumento, foram disponibilizados em Braille e impressos em tinta. Análise Qualitativa dos Dados/ Análise de Conteúdo Esta pesquisa foi desenvolvida na perspectiva qualitativa, articulando instrumentos e técnicas como a observação e um instrumento de entrevista semi-estruturada, na qual as entrevistas foram gravadas, transcritas e submetidas à análise de conteúdo. Trabalhamos com categorias teórico-reflexivas que se constituíram a partir da pesquisa documental e dos textos sobre a temática em pauta. De outra forma encontramos, a partir da transcrição e análise das falas dos sujeitos, algumas categorias emergentes. As categorias teóricoreflexivas e as categorias emergentes foram interconectadas e nomeadas da seguinte forma: Vulnerabilidade Social, Vulnerabilidade da Pessoa com Deficiência e da Pessoa na Terceira Idade (categoria teórica reflexiva). Categorias Emergentes Barreiras Arquitetônicas/ Barreiras do Preconceito/ Violência Doméstica/ Situação Difícil. Resiliência e Estratégias de Enfrentamento (categoria teórico-reflexiva). Categorias Emergentes Enfrentamento das dificuldades/ Sugestões de Mudança. Processo Social da Participação e Organização (categoria teórica reflexiva). Categorias Emergentes Expressões da Questão Social/ Vida em Comunidade A Categoria Teórico-Reflexiva Vulnerabilidade Social Vulnerabilidade da Pessoa com Deficiência e da Pessoa na Terceira Idade Sujeitos tornam-se vulneráveis em razão da precarização das relações de trabalho e as vulnerabilidades oscilam cotidianamente. É necessário perceber nestas situações um efeito de processo e não de uma situação autônoma, processos que o conjunto da sociedade atravessa. Os processos sociais se originam no centro e não na periferia da vida social. Então, o que está em questão não é “o excluído” e sim o processo social de exclusão. Para Costa (2004, p.8) há diversos vetores de destituição que se reforçam gerando situações de exclusão e reprodução permanentes. As atitudes, as relações sociais, as interações entre pobres e setores não pobres, a baixa auto-estima, sentimentos de resignação e subalternidade são fatores menos tangíveis, mas que acabam por reforçar a situação de vulnerabilidade na qual se encontram pessoas que estão em estado de pobreza. O reconhecimento de que pobreza é um fenômeno complexo, multicausal, multidimencional, dinâmico e processual tem impacto direto na formulação e execução de políticas públicas de combate à pobreza. Com uma leitura ampliada dos fatores que levam ao empobrecimento se reconhece nos caminhos da sociedade a diversidade de elementos que causam as vulnerabilidades sociais. “A vulnerabilidade tem sido entendida como uma condição de risco, de dificuldade, que inabilita de maneira imediata ou no futuro aos grupos afetados, na satisfação de seu bem estar – enquanto subsistência e qualidade de vida – em contextos sócio-históricos e culturalmente determinados” (PERONA apud COTOS, 2003, p.67). Conforme Almeida (2005, p.1), os eventos que vulnerabilizam as pessoas não são apenas de ordem econômica, não é apenas o resultado da ausência ou insuficiência de rendimento para a satisfação das necessidades básicas de sobrevivência, há outras variáveis que caracterizam este fenômeno como – dificuldade de acesso aos bens e serviços socialmente produzidos e a fragilização de vínculos afetivo-relacionais de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas ou por deficiência). Sob o rótulo de excluído estão todos que perderam ou nunca adquiriram vínculo com o social – pessoas idosas, com deficiência, desempregados de longa duração, minorias étnicas, etc. “Excluídos são todos aqueles que são rejeitados de nossos mercados materiais ou simbólicos, de nossos valores” (Wanderley apud Xiberras, 2004 p.17). Na sociedade capitalista, pautada por valores como consumo, lucro, beleza e aparência, as pessoas idosas ou com deficiência são colocadas em um lugar de incapacidade e menoridade, sofrendo discriminações de toda ordem. Este estigma, imposto socialmente a esta parcela da população, especialmente quando em situação de pobreza, aliada a dificuldade de acesso em áreas como saúde, educação, emprego, lazer e cultura, podem gerar maior fragilidade às pessoas idosas e às pessoas com deficiência, potencializando suas vulnerabilidades. Pessoas com deficiência e idosos, pela legislação atual, quando em situação de baixa renda, são passíveis de serem “assistidos” pelo Benefício de Prestação Continuada – BPC. A precária condição social e econômica associada à limitação física em função do avanço da idade ou de alguma deficiência (física ou sensorial) faz com que a situação de vulnerabilidade do sujeito idoso tanto quanto a do sujeito com deficiência tenha algo em comum e semelhante. O meio social supõe uma invalidez para pessoas com deficiência e para pessoas idosas, aproximando-as através de situações de interdições sociais como o não protagonismo, ausência de autonomia, preconceito, o mito da incapacidade e o não acesso aos meios e locais sociais. Na análise dos dados de pesquisa encontramos a categoria barreiras arquitetônicas como emergente da interpretação da análise qualitativa dos dados em relação à categoria teórico-reflexiva vulnerabilidade social, vulnerabilidade da pessoa com deficiência e da pessoa na terceira idade. A seguir ilustramos com as falas dos sujeitos que foram destacadas para demonstrar a construção dessa categoria emergente: “Para cadeira em rodas, pois há muito pedregulho.” “Tenho um amigo de cadeira de rodas que nunca pode ir lá em casa, não tem como passar.” “Sei que eles não conseguem ir aos lugares.” “É difícil de entrar, quase sempre com escadarias, meu marido não sai muito de casa, eu saio mais.” “Onde eu ando não tem nada, é só rua.” “Não tem acesso nenhum, para uma cadeira de rodas não teria como passar, se eu tivesse que usar uma não sei como seria.” “Alagamento das ruas, não tem asfalto, não tem nada.” “Muita sujeira, as pessoas não se conscientizam que têm que cuidar do seu lixo, das sujeiras feitas pelos seus animais, cavalos, cachorros, tudo muito sujo.” “Para tomar banho.” (necessita de ajuda, pois o banheiro da casa não é adaptado) “Calçadas altas, muitas pedras nas ruas que não são calçadas e alguns lugares com lixo acumulado.” “Eu acho que isso o pessoal discrimina muito, no ônibus também tem alguns lugares que não tem acesso para pessoas que andam em cadeira de rodas. Nos bancos não têm problema, os bancos têm acesso para os deficientes, mais têm outros lugares que falta muito acesso para a pessoa deficiente.” “Tem muitas escadas em todos os lugares e em alguns não tem elevador ou rampa, o que dificulta o acesso.” “Não há nada.” (rampas, elevadores, etc.) “Conforme a distância que eu saio, não posso sair só. Se vem um carro e buzina, não enxergo e posso me assustar”. “Muito apertado o beco, muito lixo, uma pessoa de cadeira de roda não passa”. “Andar por lugares complicados e escadaria, andar nas ruas, atravessar as ruas não é fácil, sair da cidade pior ainda”. “O pedaço da rua que eu moro é terra e pedra, para mim que não tenho uma perna é muito ruim, para meu marido que anda em cadeira de roda é péssimo.” “Para atravessar as ruas, para andar de ônibus, nem todos tem elevador. Para as crianças a escola não aceita, complica tudo. Nada é fácil, a vida é uma batalha todo o dia para a gente, mas a gente vai levando”. “Carroças, carros velhos nas ruas da vila.” (referindo que isto impede a circulação das pessoas) “Subir escadas e atravessar a rua.” (pessoa com dificuldade de locomoção). “Carros, carroças, cachorros, crianças, tudo no meio da rua, como a gente pode passar?” “Esgotos estourados, os buracos”. “Sofro muito com minha cadeira de roda para andar nas ruas para ir até os lugares, para chegar aqui no posto de saúde e me tratar na fisioterapia”. “Para entrar nos locais é difícil para quem está numa cadeira de roda, são poucos lugares, se o cara é pobre feito eu mais difícil, já vi ‘nego’ sem perna desfilar de carrão, mas isso é só para os que têm grana, gente pobre e aleijada é tudo difícil”. “Não participo, pois, não tem como eu entrar com a cadeira de rodas” (se referindo as associações de bairro de sua comunidade). Na análise dos dados de pesquisa encontramos a categoria outras barreiras: discriminação/preconceito como emergente da interpretação da análise qualitativa dos dados em relação à categoria teórico-reflexiva vulnerabilidade social, vulnerabilidade da pessoa com deficiência e da pessoa na terceira idade e abaixo segue falas dos sujeitos que foram destacadas para demonstrar a construção desta segunda categoria emergente: “Sim, isso a gente sofre. Em todo lugar que a gente vá, a gente sofre discriminação. E a gente é normal, só não enxerga.” “Acho que é igual e é a mesma coisa que o negro sofre. Eu sou três vezes discriminada, mas eu nem tô!” (se referindo à discriminação às pessoas com deficiência, idosas e negras) “Sim, da terceira idade, tem uma senhora aí que saiu e voltou a família não agüentou, diz que ela está louca, vive gritando, troca o dia pela noite. A coitada está doente. Mas, aqui é assim, tudo que cai aqui é doente, com problema e a família joga aqui.” “Gostaria de ter uma companheira e casar, para casar tem que enxergar.” “Eu já senti muita discriminação em outros lugares. Eu deixei de ser discriminada quando eu vim para cá” (se referindo a instituição que reside). “O que não foi fácil de enfrentar, mas que eu já lutei foi a discriminação da família, eu brigava muito, pois não queria ser menos que elas (irmãs), dependendo. Eu consegui me separar delas, eles (família) sentiam vergonha de sair comigo.” “Eu acho horrível quando eles (PPD) vão subir no ônibus, eu vi um dia que um subiu até um pedaço e o motorista mandou descer porque não tinha carteirinha. Com os cegos também as pessoas dão informação errada para eles, ensinam errado. A pior droga que tem é isso, a juventude de hoje não respeita cego, velho, aleijado. Já notou?” “Eu no ônibus sofro discriminação, eu tenho carteirinha e fico na frente e às vezes as pessoas pensam que eu não tenho nada e que eu não sou idosa, então ficam me olhando como se eu não devesse estar ali. As pessoas não vêem que eu tenho todo esse problema nas mãos, nos pés. Acho que pessoas muito dependentes que não conseguem fazer as coisas, são discriminadas.” “Olha, eu nunca senti assim que alguém tivesse sendo preconceituoso comigo, nunca sofri.” “Não comigo não, na lembrança assim não. Tu sente as pessoas, o preconceito existe, tu sente o olhar da pessoa, mas é normal, isso aí eu já superei.” “A minha juventude, aquela fase de adaptação, até eu me aceitar, é difícil tu se aceitar, pelo preconceito das pessoas, tu é rejeitado, é indiferente para os outros, os outros te vêem como ‘o coitadinho’, uma pessoa que não é capaz de nada, infelizmente ainda é assim, mas acho que isso está mudando, mas é isso.” “Preconceito existe em tudo, não é só com o deficiente, uma pessoa diferente, uma mais gorda, outra mais magra, a mais feia, a mais bonita, o preconceito vai existir sempre, não tem como mudar isso, a diferença vai ter sempre.” “Todo mundo trata bem e eu tenho um sobrinho que é mudo, surdo também, está na escola, é bem inteligente. Até os coleguinhas ajudam bastante ele.” “Isso é normal, eles (surdos) também são muito curiosos. No ônibus quando sobem as crianças riem um do outro”. “Têm muitos idosos que querem sentar de qualquer jeito. Há xingamentos, a terceira idade não respeita os mais moços e estes também não respeitam, dizem: não vou dar lugar para velho”. “Solteira, solteirinha da Silva. Não deixaram eu casar, não deixaram nem namorar. Sabe por quê? Eu sou assim deficiente desde a idade de dois aninhos, não deixaram. O meu irmão uma vez correu de faca atrás de um que estava me rodeando e ele deu no pé!” “Parece assim que Jesus é que dá um pouco de esclarecimento para essas outras pessoas terem um pouco de consideração e de respeito com as pessoas que não enxergam e têm idade”. “Em alguns lugares, mas só para os que não se governam e que precisam ajuda.” “Tem muita gente que não gosta de idoso e de preto”. “Não vejo essas pessoas por aqui” (referindo-se as pessoas com deficiência). “Discriminação dentro da família, abandono, invalidez, ter que ser cuidado na velhice”. “É tu chegar numa pessoa, mesmo sem conhecer e perguntar as horas e a pessoa virar as costas pra ti, te ignorar pelo fato de tu seres deficiente”. “Todos acham que o deficiente é ‘coitadinho’, a gente não pode entrar num ônibus que eles já querem dar lugar, já querem que tu sente, ‘ah meu filho senta aqui’, quando por exemplo, uma pessoa idosa, com bem mais necessidade do que a gente poderia ocupar aquele lugar, porque além da idade avançada a pessoa tem os ossos fracos, a pessoa pode sofrer um solavanco dentro do ônibus e não se segurar, a pessoa tem que pensar que o deficiente físico não é coitadinho”. “As pessoas são diferentes, as pessoas têm deficiência, as pessoas isso e aquilo, hoje em dia são poucas as pessoas que dizem: deficiente, as pessoas chamam de aleijado, te ignoram. ‘oh, da muleta’ - nunca chegam gentilmente em ti, ou dão um tapinha formal nas tuas costas, é sempre insultando, o deficiente é mais forte por saber baixar a cabeça muitas vezes e aceitar, aceitar que chamem de aleijado, tem que aceitar, tu vai fazer o quê? Tu não tem opção, é isso”. “Idoso e deficiente é tudo igual, gente que não é valorizada na sociedade e não tem muito espaço para eles”. “A pessoa que é, como se diz assim no popular, aleijada, eles não dão valor.” “Todos os tipos de discriminação passam uma pessoa aleijada, as pessoas não têm idéia do que é o preconceito dos outros, como se não fossem um dia ficar velhos, doentes e quem sabe aleijados” “O idoso pobre é bem aceito na família porque é quem sustenta, quem larga o dinheirinho da aposentadoria para comprar o pão, têm famílias que maltratam, exploram , mas acho que não é maioria. Na sociedade em geral o velho é considerado estorvo, veja no ônibus quanta gente irritada com a ‘velharada’ sentada na frente, que tu achas?” “Às vezes o pessoal da casa não entende a minha dificuldade.” “No ônibus algumas pessoas reclamam quando vai pegar um ônibus adaptado, um passageiro reclama que tem horário, não pode se atrasar e aí reclamam e xingam até o motorista que está fazendo o serviço dele. A gente não tem culpa, o deficiente também é gente, também tem direito de usar os serviços públicos.” “Até um cobrador de ônibus uma vez, tinha uma pessoa que queria subir, ele disse que o ônibus estava cheio, porque a pessoa estava de cadeira motorizada e aí é mais difícil. Eles a deixaram e mandaram pegar o de trás.” “As pessoas não se aceitam nem se toleram. Há muita discriminação com os negros, mas eu não estou nem aí para essa gente”. “Há muita gente que pensa que pessoa numa cadeira de roda é coitadinha, que não tem dignidade, que não pode andar sozinha. Sociedade tem muito preconceito e muito que aprender com quem tem uma deficiência, como no meu caso. Eu fiquei aleijado com uma bala nas costas e achei um mundo cheio de barreiras depois disso”. “Tem coisas que as pessoas não dizem, mas está na cara quando tem pena da gente ou quando não gostam da nossa presença, parece que a gente incomoda por estar aí. Tem gente boa que se oferece para ajudar, que trata todo mundo bem”. “Eu vejo preconceitos de todos os tipos, até pelo cheiro, tem gente que acha que gente pobre, gente velha, gente com deficiência cheira mal, juro que eu mesma já ouvi isso. A pessoa não tem respeito, furam a fila, não respeitam os lugares reservados para PPD”. “Por eu precisar de ajuda tenho que esperar os outros darem as coisas, para tudo dependo da boa vontade, tudo”. “A gente tem que esperar tudo, as pessoas darem na mão da gente.” “As pessoas aleijadas, cegas, eles olham a gente com outros olhos, olham a gente com pena, como quem não têm condições. Antes era mais, mas ainda tem bastante preconceito com a pessoa deficiente. Até na rua, no ônibus, no serviço, é horrível”. “Poucas pessoas respeitam as pessoas idosas. Poucos têm aquele carinho e respeito pelos idosos”. Na análise dos dados de pesquisa encontramos a categoria violência doméstica/maus tratos como emergente da interpretação da análise qualitativa dos dados em relação à categoria teórico-reflexiva vulnerabilidade social, vulnerabilidade da pessoa com deficiência e da pessoa na terceira idade. A seguir ilustramos com as falas dos sujeitos que foram destacadas para demonstrar a construção dessa categoria emergente: “Estudei a parte elementar, me formei lá no Paula Soares, tinha oito anos de curso e daí encerrava. Eu rodava (na escola) porque a minha tia me dava tanto serviço que eu não conseguia estudar. Eu rodei uns cinco anos e continuei. A minha outra tia, irmã da minha mãe, não me deixava parar de estudar”. “Hoje está bom, antes era brabo ele só não me batia porque não é louco, mas me tratava muito mal, uma vez disse até que eu era uma limpadora de m” (quando trabalhava era empregada doméstica) “No dia das mães eu dormi porque uma neta me magoou, minhas filhas não ligam para mim”. “Os velhos tratados com violência.” “Violência contra seus idosos, há famílias que não se preocupam com seus idosos, só querem receber o dinheiro deles. Se eles ficam dependentes, às vezes nem recebem comida, ajuda para o banho.” Situação difícil foi mais uma categoria que emergiu da interpretação da análise qualitativa desta categoria teórico-reflexiva - vulnerabilidade social, vulnerabilidade da pessoa com deficiência e da pessoa na terceira idade e abaixo estarão sendo apresentadas as falas dos sujeitos entrevistados. “É o que eu estou passando. Minha mãe não acreditava que eu estivesse ficando cega.” “Para mim a situação mais difícil foi eu ter perdido a minha visão.” “Uma situação que eu não esperava foi a morte de minha mãe. Depois que minha mãe morreu é que eu vim para cá.”(pessoa institucionalizada). “A deficiência.” “Perder a minha avó, que me criou, eu dormia com ela até ela morrer.” “Quando a gente tenta fazer uma coisa e não dá certo.” “O derrame foi difícil passei a noite toda sozinho caído e ninguém viu. Só de manhã quando abriram a porta é que me viram, daí já foi!” “A situação que eu acho mais difícil é a pessoa não poder caminhar, estar numa cadeira de roda, não ter as pernas. Além de cego, não ter as pernas. Eu acho uma situação precária, muito braba.” “Ter perdido a Dona E. e a M. isso foi difícil! (ex-patroas falecidas que a ajudavam muito, ela refere que a ensinaram muito) Perder minha mãe não foi difícil porque quando a gente era pequeno, ela deixou nós tudo espalhado na casa dos outros.” “Salário mínimo.” “A morte do meu marido, criar dois filhos sozinha com pouco dinheiro.” “Para ajudar os netos não dá, para ajudar os filhos não dá, precisa buscar renda extra.” “Quando perde alguém, eu já perdi três filhos por doença.” “A morte dos filhos em hospitais que não deram boa assistência. Não ter dinheiro para ir ao hospital, a demora da ambulância, lidar com doenças sem dinheiro.” “Não usando drogas a família fica bem. O difícil é cuidar da mãe de 94 anos com esse problema da artrite e das mãos ficarem cada vez mais tortas.” “Quando a pessoa fica totalmente dependente das outras. Eu já tive assim sem poder fazer nada, nem poder tomar um remédio, mas tive ajuda e consegui passar pela dificuldade.” “Isso que eu estou fazendo agora (risos), eu corria para não dar entrevistas, mas agora eu estou mais calmo.” “Difícil eu acho que é a vida que a gente vive. Sem dinheiro, sem trabalho, sem aposentadoria, sem nada, não é fácil.” “Minha vida toda eu trabalhei, não foi fácil para mim não. Sempre foi com muita luta; muito sacrifício. Desde nova até agora. É difícil! Trabalhar toda a vida com trabalho pesado. Trabalhava em casa de família, de faxina, de tudo. Minha vida sempre foi difícil.” “Às vezes meu filho me ajuda também, mas ele também tem três filhos, não é fácil.” “Às vezes falta um pouco”. (dinheiro) “Minha água está cortada por falta de pagamento”. “A vida que a gente está levando, serviço (falta de) para os mais novos.” “Difícil é o problema da saúde, o problema da saúde aí é diário mesmo. A gente precisa ficar ali, quem pode até paga ficha. Isso aí está muito difícil. Quem sofre mais é a criança e pessoas da terceira idade.” “O problema da saúde, me foi recomendado uma operação e não foi feita (...). Estou aguardando outros médicos para ver como é que fica.” “Devido ao trabalho, devido à idade também, a gente tem 70 anos lutando, não é muito fácil.” “Uma pessoa que tenha caído em um problema como de uma cadeira de roda e não tem um apoio, uma orientação, um acompanhamento, simplesmente a pessoa baixa o hospital e dizem: ‘ó tu está em uma cadeira de roda e agora te vira’”. “Perdi dois anos da minha vida, os primeiros seis meses em depressão, os primeiros três meses só na cama, até descobrir que o mundo existia através da minha janela e resolver sair por conta própria.” “Não tem mais ninguém, morreu tudo: pai, mãe, irmã, irmão, só eu que fiquei”. “O que eu considero difícil é uma pessoa não ter apoio e ter que passar por todo esse processo que eu passei até aprender. Digamos que se eu tivesse tido apoio e orientação durante esse período, esses 16 anos que eu estou na cadeira e recém agora eu estou conseguindo alguma coisa, poderia ter resumido isso em cinco.” “Faz 16 anos, eu tomei um tiro aos 16 anos. Para ter uma idéia do que eu perdi na época, eu jogava no Internacional, estava fazendo teste para passar para o juvenil, eu fazia kung-fu, nos horários que eu não jogava e nos finais de semana eu era recreacionista de festa infantil para ganhar meu dinheiro, eu era o palhaço, o Mickey, Pateta, até a Minnie eu já fui porque faltou personagem.” “Foi quando eu perdi a minha mãe, quem não tem mãe não tem nada.” “A droga e a bebida, meu filho drogado” “Morar junto com outras pessoas até poder fazer uma casa, eu ganhava pouco e não tinha dinheiro para fazer a casa”. “Vou ficar até amanhã contando. Uma de eu ter sido abandonado e ter sido adotado por uma freira, outra de ter que dormir várias vezes na rodoviária, por falta de moradia, outra por eu ter que viajar muitas vezes sem ter paradeiro, sem ter para onde ir, outras coisas mais que aconteceram na minha vida.” “Perder alguém amado da família por falta de comida, de remédio de atenção nos hospitais.” “Casal desempregado e com filho, estar mau de saúde” “A pessoa que está aí velhinha, as pessoas não tem paciência, mandam para o asilo”. “Quando meu marido ficou doente, tinha problema de coração, tive que assumir muita coisa”. “Eu estou achando difícil porque eu dependo do pessoal, não estou trabalhando para ter as coisas direitinhas em casa.” “Eu acho que quando minha mãe morreu, para aprender a viver sozinha. Eu tinha um filho só, depois fui fazer mais dois, tive que aprender a ser mulher, deixar de ser criança, adolescente, mesmo com o filho, foi mais difícil, bastante difícil, passei bastante fome, meu marido não trabalhava com carteira assinada, era a reciclagem, aquele lugar ali e tive que passar bastante necessidade, aprender a ser gente e dona de casa, porque minha mãe sempre me ajudou”. “A doença da minha esposa. Eu lutei muito com ela, eu nem vinha muito no basquete porque ficava cuidando dela em casa. Gostava dela, ela tinha 38 anos, isso para mim foi o mais difícil, quando eu perdi ela, não aceitei, 5 anos juntos, isso foi muito ruim para mim, mas agora tem que lutar para frente, porque ela não vai voltar mais, eu sei que ela não vai voltar mais”. “Uma situação difícil é quando uma pessoa está precisando de socorro e as vezes tem dificuldade para alguém ajudar a socorrer. Na minha vida foram várias situações. Eu criei nove filhos sozinha, sempre trabalhando, para mim foi uma situação muito difícil, porque era eu para tudo”. “Porque para mim era muito difícil, deixar meus filhos sozinhos em casa, passava o dia todo trabalhando, quando eu chegava em casa tinha que atender eles, dar banho, fazer comida, lavar roupa e de manhã sair de novo”. “Viver numa cidade que não tenha rampas e não tenha ônibus adaptado”. “Ver que as pessoas são tão egoístas e tão complicadas, que não se aceitam umas às outras.” “Hoje as dificuldades que eu vejo são só as financeiras, eu queria ter um pouco mais, para ter mais qualidade de vida, qualquer outro tipo de situação não vejo problema.” “Eu fico nervosa, na escada eu fico com medo de cair, na faixa eu fico nervosa, com medo de que um carro me pegue, porque eu sou fácil de cair. Eu não caí no meio da rua ainda, mas pode acontecer (pessoa com deficiência física). “Me criei para fora e vim terminar de me criar dentro de cidade grande. Claro que não é grande, mas para quem vem de fora é. Foi tudo estranho para mim, tudo difícil, até agora já é mais fácil, fazer tudo, estou acostumada, mas no começo foi difícil”. “Difícil acho que é quando uma pessoa vai procurar um serviço, de repente até para uma pessoa que é deficiente, é difícil também a gente conseguir um serviço, porque também tem que ter pelo menos o primeiro grau completo para conseguir serviço ou então não tem vaga para uma pessoa deficiente.” As falas recortadas e pontuadas neste estudo apresentam sujeitos em situação de vulnerabilidade social em ambas as condições de vulnerabilidade, tanto por desvantagem pessoal no caso das pessoas com deficiência como em condições de vulnerabilidade por questões de circunstância e conjuntura – migrantes, vítimas de maus tratos, trabalho infantil, desagregação familiar, drogadição, etc. Neste estudo também apresentamos sujeitos vulnerabilizados por condições próprias do ciclo de vida – idosos assistidos pelo Benefício de Prestação Continuada. E, não raro temos falas de sujeitos que “enquadram-se” nas três condições apresentadas - por desvantagem pessoal, por circunstância e conjuntura e pelo ciclo de vida. Até aqui apresentamos recortes referentes à categoria teórico reflexiva vulnerabilidade social, vulnerabilidade da pessoa com deficiência e da pessoa na terceira idade e a seguir iremos conceituar a categoria teórico reflexiva resiliência e estratégias de enfrentamento e a categoria processo social da participação e organização. Na análise freqüêncial das falas interpretadas nas entrevistas, referente a essa categoria analisada, aparece o que segue: Pessoas que não percebem ou não sabem se há barreiras arquitetônicas 18 Pessoas que não percebem ou não sabem se há barreiras atitudinais 17 Situações difíceis vivenciadas se devem a que fatores: econômicos 10 pessoais 14 sociais 7 religiosos 2 saúde pública 11 emocionais 2 outros 1 A Categoria Teórico-Reflexiva Resiliência e Estratégias de Enfrentamento Resiliência é um conceito que vem da física e significa a capacidade de um objeto recuperar-se, de se moldar novamente depois de ter sido comprimido, expandido ou dobrado, voltando ao seu estado original. A adaptação deste conceito para as ciências humanas é pontuada por dúvidas e questionamentos diversos, oriundos da complexidade do ser humano em suas interrelações, visto estarmos no campo da “não exatidão”. A resiliência na área da psicologia e da psiquiatria é um conceito recente, os estudos começaram a ser aprofundados no final da década de 1970 e vivenciamos ainda o processo de construção deste conceito. “Desde o final da década de 1970, o conceito de resiliência começou a ser estudado com mais afinco pela psicologia e pela psiquiatria, designando a capacidade de resistir às adversidades, a força necessária para a saúde mental estabelecer-se durante a vida, mesmo após a exposição a riscos. Passou a significar a habilidade de se acomodar e de se reequilibrar constantemente frente às adversidades” (Assis, 2006, p.18). No decorrer desse período a forma de entender a resiliência vem evoluindo, já foi considerada o contrário de vulnerabilidade, vista como a capacidade individual de adaptação num ambiente desfavorável e como qualidade flexível do ser humano. Sob esta perspectiva a resiliência fica restrita a uma habilidade pessoal, desconsiderando a dimensão social e cultural dos processos sociais que já mencionamos ser central à vida em sociedade. Embora a forma de entender o conceito resiliência seja influenciada pela visão políticoideológica de cada grupo social o conceito em si já evoluiu bastante. “Felizmente, nos últimos anos, a noção de resiliência vem complexificando-se, sendo abordada como um processo dinâmico que envolve a interação entre processos sociais e intrapsíquicos de risco e proteção. A resiliência está ancorada em dois grandes pólos: o da adversidade, representado pelos eventos desfavoráveis, e o da proteção, voltado para a compreensão de fatores internos e externos ao indivíduo, mas que o levam necessariamente a uma reconstrução singular diante do sofrimento causado por uma adversidade” (Assis, 2006, p.19). Na pesquisa “Vulnerabilidade Social, Resiliência e Estratégias de Resistência na Condição da Deficiência e da Terceira Idade” entendemos resiliência como a capacidade de superação que o ser humano desenvolve frente às adversidades da vida, considerando as influências sócio-culturais do contexto. Ressaltamos o “caráter construtivo da resiliência, que não nasce com o sujeito nem é uma aquisição exclusiva de fora para dentro, mas sim um processo interativo entre a pessoa e seu meio, o qual capacita e fortalece o indivíduo para lidar positivamente com a adversidade” (Assis apud Lindström, 2006, p.20). Percebemos a resiliência como um potencial a ser desenvolvido. Como coloca Assis, todas as pessoas possuem um potencial para desenvolver resiliência em maior ou menor grau (Assis, 2006, p.20). Vulnerabilidade e resiliência são conceitos distintos que se articulam mutuamente. Em relação a uma pessoa ou grupo podemos dizer que quanto mais se desenvolve a resiliência, mais a vulnerabilidade é minimizada e vice-versa. O fator social e cultural aqui tem um papel importante na construção da resiliência e demarca seu caráter processual e dinâmico. A resiliência é afetada por vários fatores como as experiências concretas vivenciadas, a percepção subjetiva frente a essas experiências, as oportunidades ofertadas ou negadas pelo meio social, os ciclos de vida e muitos outros fenômenos da mais variada natureza. Em relação à categoria teórico-reflexiva resiliência e estratégias de enfrentamento as categorias que emergiram foram enfrentamento das dificuldades e sugestões de mudança. Na categoria emergente enfrentamento das dificuldades encontramos a resiliência nos seus vários potenciais. Abaixo trechos da entrevista de uma pessoa portadora de deficiência física que demonstra ser bastante resiliente no enfrentamento das situações difíceis nos diversos aspectos de sua vida: “Eu estou escrevendo um livro, um projeto que eu tenho, onde eu conto a história dos primeiros anos que foram bem complicados, os sete primeiros anos que eu chamo de anos de vacas magras, onde tu cais justamente neste ponto, tu estás numa cadeira de rodas, tu não sabe o que fazer. Quem sou eu? O que eu faço? O mundo acabou e ninguém me olha, não arrumo mais namorada, eu não vou mais estudar, não vou sair, não vou fazer nada. Enorme erro, depois que isso tudo aconteceu, eu perdi uns dois ou três anos de vida até acordar, decidi que queria estudar, continuei estudando, houve uma briga com minha mãe, fui morar com meu pai, briguei com meu pai e fui morar sozinho. As pessoas falavam, tu vai morar sozinho numa cadeira de rodas? Como eu fiz? Fui morar numa pensão, meu pai queria se mudar para o mato, numa casa de campo, o que eu ia fazer no meio do mato? Tirando leite de vaca? Quem vai saber que eu existo? Eu quero trabalhar, estudar.” “Eu ganhava R$130,00 de salário, era o salário mínimo da época e pagava R$100,00 de pensão, eu tinha que sobreviver com R$30,00. Eu me lembro até hoje o nome da bolachinha que eu comia que se chamava Fominhas, era tão bom que depois da segunda semana eu raspava o recheio e botava fora para conseguir comer e dividia essa bolacha em duas partes, para comer uma de manhã e uma de noite. Eu era a pessoa que odiava feriado porque eu almoçava na empresa e quando tinha feriadão eu tinha que arrumar um lugar para comer durante quatro dias, aí eu comecei a desenvolver uma técnica de ir buscar o almoço em outros lugares, como eu fiz isso? Eu descobri que tinha o Trensurb, eu ia empurrando minha cadeira quadras e quadras, uns cinco quilômetros até o trem, em Porto Alegre existe ônibus adaptado a todo o momento, eu comecei a visitar os amigos, claro eu visitava os amigos na hora do almoço, café, ficava para janta, às vezes eu dormia lá, então assim eu fui resolvendo algumas coisas, não cheguei a me abater”. “Eu tinha muita raiva, raiva da vida, dos outros, só que eu transformei essa raiva em força, canalizei essa raiva em objetivos: um carro, uma casa, trabalhar, estudar, algumas coisas foram acontecendo, foi melhorando ao longo da vida, eu passei fome, mas isso foi indo, fui levando, eu comecei a procurar emprego, não tinha carro, rodava com a cadeira quatro ou cinco quilômetros por dia para ir atrás de transporte, nunca tive medo, corri atrás das coisas. “Quando eu comecei no meu emprego, depois de certa experiência, onde eu trabalho hoje (...) e me pagam um salário melhor, eu já tinha o meu carro, aí algumas pessoas que eu conheci me incentivaram a estudar, trabalhar e hoje eu tenho “n” objetivos.” “Morava com minha mãe, meus pais são separados. Ali eu tinha meu dinheiro, sempre tentei ter o que era meu, nunca gostei de depender da mãe, do pai, essas coisas. Talvez isso tenha me dado um pouco de força para correr atrás das coisas. Eu sou uma pessoa ambiciosa, eu busco o que eu quero, eu corro atrás do que eu quero, não tenho medo de enfrentar hoje qualquer tipo de situação, tanto eu ter ficado na cadeira e receber apoio da família, a minha família deu o que ela sabia, buscaram uma cadeira de rodas porque era o que eu precisava no momento, tentaram me apoiar da melhor forma possível, erraram, acertaram, mas como toda a família que não tem experiência e acaba passando por uma situação dessas.” “Hoje eu me considero uma pessoa reabilitada para vida, não tenho dificuldade para procurar emprego, eu tenho carro, mas se eu tiver que pegar ônibus eu pego, não tenho problemas com isso, se eu tiver que fazer tudo de novo, pegar a cadeira e empurrar, vou lá e empurro. A minha dificuldade é essa ânsia de crescer, ânsia de atingir o sucesso que eu busco hoje, que é trabalhar nessa área, eu escolhi o curso de comunicação social porque eu gosto disso, eu gosto de relações públicas, eu tenho vários desejos, tenho vontade de ser locutor de rádio, trabalhar com palestras, consultoria, digamos que eu tenha planos A, B, C, D e E, se um deles não funcionar eu tenho outros para continuar tentando e todos eles com a mesma dedicação”. “Eu trabalho, estudo, jogo basquete e tenho alguns projetinhos particulares que eu faço por fora. Eu só não assumi mais nada porque eu ainda não consegui dormir menos do que 5 horas, se eu conseguir desenvolver essa técnica pode ser que eu faça mais alguma coisa”. Em nossa pesquisa também encontramos pessoas que se apegam a idéia de Deus e à religião como um recurso para o enfrentamento de seus problemas, nesses casos o potencial de resiliência se vincula ao aspecto místico, mas essas pessoas apresentam maior ou menor potencial de resiliência, de acordo com a complexidade das situações vivenciadas ao longo da vida: “Eu rezo, eu me agarrei no senhor da divina misericórdia. Eu ganhei da igreja um quadro dele e fiz moldura e tenho lá em casa. Quando o J. fazia as dele, eu não tinha ninguém e quem me ajudou foi o senhor da divina misericórdia.” “Vou toda semana à casa espírita, tomo passe, assisto palestras, gosto muito de estar entre eles, lá tem escada e faço o sacrifício de subir, mas para mim até isso é uma benção de Deus”. “Com muita fé em Deus, não me entrego não, sofro, mas não esmoreço e luto até o final para ficar de pé, foi assim nos momentos de doença, ponho na balança tudo que tenho de bom na vida e vejo que o bem ainda é maior”. “Eu rezo, eu rezo toda hora, vou à igreja, leio em casa a minha bíblia e peço para Deus me ajudar, o cara para lutar nesse mundo tem que ter Deus, só isso”. “Eu queria que Deus me ajudasse que eu tivesse a minha visão para eu ter um trabalho, gosto tanto de trabalhar, trabalhei fora toda a minha vida, parei quando Deus me tirou a visão. Gostaria de sair para passear, namorar.” “Eu fico triste o dia inteiro, cabeça baixa ali na mesinha redonda, o pessoal passa e às vezes nem me vê. Fico horas meditando, o que há não tem remédio, deixa ficar, seja feita a vontade de Deus.” “Não tenho ajuda de ninguém, só de Deus.” Conforme já ressaltamos, os ciclos de vida também influenciam de diferentes modos o potencial de resiliência, muitas vezes é na terceira idade que a pessoa se mostra mais resiliente, outras vezes não. Alguns depoimentos mostram esse aspecto: “Ganhar conhecimento, eu aprendo mais hoje, na velhice, do que na mocidade. Minha terceira idade está mais fácil do que foi a infância, muito difícil.” “Quando eu era forte, feliz e jovem, tudo era possível enfrentar, agora é bem difícil enfrentar os problemas.” “Ainda não fiquei doente e gosto de estar lutando pela vida.” “Antes eu não me deprimia, enfrentava melhor as coisas, agora já me deprimo mais, mas enfrento, sinto mais fome, tenho vontade de comer mais doce.” “Antigamente eu reagiria agressivamente, hoje eu baixo a cabeça e saio como eu posso dizer, como um covarde, baixo a cabeça e saio normal, não enfrento mais nada, não enfrento porque não vale a pena discutir, bater boca, brigar, porque isso é uma bola de neve, só vai aumentando, aumentando e nunca leva a nada, então tu deixa as coisas esfriarem”. “Achava que ia sentar numa cadeira de balanço na minha idade, mas não”. “Tudo que eu posso eu faço para me distrair, mas fico muito em função das crianças da minha netinha, cuido muito dele (o marido) ele tem mais dificuldade do que eu para caminhar. Desde o acidente nossa vida mudou muito”. Afirmamos que abordar a questão da resiliência numa perspectiva exclusivamente individual dificulta o desenvolvimento de políticas públicas e de ações que venham propor transformações na garantia de acesso aos bens da sociedade. Quando fica centralizada no sujeito a capacidade ou incapacidade de superação das vulnerabilidades sociais não se busca reduzir as desigualdades que geram oportunidades díspares entre seres humanos que fazem parte de igual espaço social. Nessa perspectiva de entendimento dos “problemas” como individuais nega-se a dimensão coletiva da vulnerabilidade e sua característica de ser resultado ou expressão da questão social. Portanto, alertamos para o cuidado de não transformar o conceito de resiliência em mais um rótulo de sucesso ou fracasso, pois, na realidade capitalista, tal visão pode contribuir para manter a desigualdade social vigente e “culpabilizar a vítima” por sua situação. Ademais as entrevistas mostram que uma situação social desfavorável não condiciona automaticamente a um baixo potencial de resiliência. As condições como deficiência física ou sensorial também podem influenciar a resiliência, mas nunca ser impedimento para o desenvolvimento desse potencial. Nos depoimentos abaixo fica evidente a diversidade da vida. O modo como cada um enfrenta suas dificuldades varia de pessoa para pessoa e sofre influência do contexto de modo positivo ou negativo: “Eu fico nervosa, meio agressiva, choro.” “Não reajo muito bem porque eu sou muito ‘fracola’, quanto mais nervosa eu estou mais eu me fecho, não falo, não digo nada, não reclamo e isso é ruim.” “Tem que seguir, se é trabalho, procura outro.” “Guardava aquele sentimento para mim, ficava quieta, mas estava sabendo de tudo.” (...) “Gás, gasto pouco, tenho fogão a lenha, água tenho reservatório que pego água da chuva – para regar as plantas, lavar roupa, pôr no vaso.” “Fiz a casa, juntando jornal velho para vender e depois trocava por tijolo.” “Faltam coisas, mas tenho que fazer ser, eu contorno a situação.” “Não lembro, nada para mim é ruim, tudo está bom.” “Há probleminhas, mas eu consigo contornar, o mais difícil é o filho alcoolista, o outro é separado da mulher, meio deprimido e dois adolescentes que sempre é difícil na vila, mas dá para organizar.” “Não adianta a gente se entregar, eu reajo bem, não me entrego muito, tem que enfrentar tudo que vem pela frente, então não adianta, tem sempre que reagir numa boa.” “Quando eu nasci assim, eu custei a acreditar o que estava acontecendo comigo, mas com a força da família fui levando tudo, não me entreguei, sempre tive força de vontade e vivo bem na família, fora da família, procurando sempre fazer algum exercício, alguma atividade. Sempre tenho as minhas amizades, vivo bem.” “Uma situação difícil eu procuro enfrentar, mas quando não dá mesmo, eu me afasto, prefiro me afastar e ficar de lado, deixar assim, está errado eu sei, tinha que enfrentar, mas eu prefiro me afastar em uma situação difícil.” “Ah, a gente tem que enfrentar adversidade, a gente tem que lutar. Não se entregar”. “Não me entrego jamais, vou à luta e consigo o que eu preciso para sobreviver neste mundo cão”. “Não desanimo, levanto a cabeça e vou em frente. Minha mãe me deixou uma grande herança por ter me ensinado viver com humildade, tratar todas as pessoas bem e não roubar, isso passei para os meus filhos. Que seria de nós se não tivesse o mínimo”. “(...) os dois com dificuldade para caminhar nem tudo é flor, mas a gente vai vivendo, criando os filhos, a dificuldade maior é a deficiência mental tem que brigar muito no colégio para a pessoa poder participar”. “Perder a perna não foi fácil, mas se adaptar ao mundo foi sendo possível, ver minha neta com deficiência mental não ter escola para estudar isso pesa muito mais, por ela eu daria a outra perna. Mas a vida a gente vai levando e sempre tem um jeitinho para tudo, só para morte, essa não tem, sou bem otimista, já passei bastante trabalho nessa vida, mas me acho uma vitoriosa”. “A gente se vira com o dinheirinho, economiza o que pode e não chega faltar. Às vezes eu pego uns bicos, faço coisas para vender, revendo Avon, loteria, até distribuo papelzinho nas ruas em época de eleição para político que paga alguma coisa” “Tudo está muito caro, mas a gente tem que saber fazer economia, comprar mais barato, aproveitar até a casca dos alimentos”. “Como eu me sinto numa situação difícil, eu fico muito deprimida, eu me fecho, por causa da situação das minhas filhas eu entro em depressão, ainda me trato. Agora estou bem, procuro não levar muito a sério, procuro ficar mais calma”. “Enfrentava todas, agarrava tudo.” “Arrumei um velho, mas já estou mandando embora, ele é muito ruim, não quer dar mais dinheiro em casa, o problema era só o velho, mas a casa é minha com as minhas netas e bisnetas. Estamos bem agora só nós.” “Procuro o que for possível, procuro reagir.” “Todos têm problemas, tem que saber enfrentar, o que a gente tem que passar não adianta querer desviar, tem que passar mesmo.” “A gente vai fazer o que? Nada, até que eu sou uma pessoa calma. Eu procuro trabalhar um pouco para ajudar com alguma coisa. Esses dias estava ajudando o primo da minha nora na padaria, para ganhar um pouco de dinheiro e pagar meu INPS”. “Fico muita nervosa e preciso de ajuda de alguém”. “A minha deficiência é Poliomielite, eu ando mais de muleta, eu tenho uma força excessiva nos braços, eu posso ficar em pé no ônibus, se ele trancar eu me tranco ali e não caio, então eu prefiro dar lugar para as pessoas, eu não sento em ônibus, não sento e não sentarei, eu prefiro ceder meu espaço”. “Apesar da perna amputada sou bem independente” “É, fico nervosa, é horrível, começo a chorar me atacar (se referindo a dificuldade para atravessar uma rua). Eu peço ajuda, eu peço ajuda para uma pessoa que esteja atravessando a rua também, eu digo: ah! me ajuda aqui que eu estou com medo, daí ela vem me ajudar. Eu peço só para mulher, não vou pedir para homem, eu espero chegar uma mulher, não peço para homem. Os homens são muito passados, não dá para confiar neles não”. “O próprio deficiente, ele se fecha, as pessoas às vezes querem ajudar, mas não sabem como, o próprio deficiente tem que mostrar que ele é capaz.” “Fazendo alguma coisa de útil, me sentindo útil para alguma coisa”. “Eu não acho nada difícil, sou uma pessoa que sempre fui à luta”. “Ah não, não estudei nada, não sei nada do mundo. Aprendi com o rádio, o rádio foi meu professor!” As entrevistas que realizamos mostram que os entrevistados possuem diferentes potenciais de resiliência e na categoria emergente sugestões de mudança percebe-se uma consciência social, todas as sugestões apontam para a transformação do social de algum modo. Com certeza uma sociedade justa e igualitária propiciará mais oportunidades para as pessoas melhorarem suas vidas nos mais diversos aspectos e isso influenciará de modo positivo a questão da resiliência. Seguem trechos das entrevistas: “A parte de higiene. A gente chama, chama e mandam esperar um pouquinho, bem no fim não dá para esperar”(vida em instituição). “Melhorar o posto, os remédios. Precisam de novas cadeiras de roda no posto”. “Em minha opinião é o telefone toca e custam para atender. No meu ponto de vista só isso que atrapalha” (vida em instituição). “Limpeza das ruas, tirarem os ratos, se preocupar com a saúde das pessoas”. “O posto da (...) deveria ter ambulância igual à SAMU.” “Ter mais serviços para essa vila, outras vilas têm bem mais coisas que beneficiam as pessoas.” “Aumentar os horários de atendimento e por uma fisioterapia.” (em relação ao posto de sua comunidade) “Eu vejo que falta um serviço de orientação, tu descobriu que alguma pessoa tem algum problema, sofreu um acidente, uma cirurgia, foi baleado ou qualquer coisa, que ela tenha uma orientação, um acompanhamento social, particular, sei lá, que possa orientar a outra pessoa a ter uma vida normal.” “Esses bandidos que chegam aí matando e acontecendo, não teria cadeia... Esses que matam assim a sangue frio para que ter o bom? Pode matar. Se eu mato, que me matem eu também!” “Só com muita paz, muita fé e amor, se a gente pedir a paz, o entendimento para todas as criaturas é que a gente pode chegar lá”! “Tinha que melhorar tudo, eles tinham que roubar menos, ter mais serviços do governo na vila e as pessoas pararem de usar drogas”. “As escolas deveriam melhorar seus atendimentos para as crianças e aceitar crianças que têm deficiências” “Mais fichas para não precisar vir de madrugada, uma maneira de ser atendido imediato” (se referindo aos postos de saúde da comunidade). “Mais ajuda, atendimento para as crianças.” (se referindo aos postos de saúde). “Como esse negócio da ficha, a gente vai lá para o posto arriscar a vida, se ele puder chegar lá antes, a pessoa chega lá e recebe. Quem pegou, pegou. Quem não pegou pega amanhã, mas pelo menos não fica ali arriscando a vida.” (se referindo a distribuição de fichas para atendimento nos postos de saúde). “Ah, eu acho assim, tem muitos menores sem ocupação, poderiam ter uma atividade, uma escola que ensinasse uma profissão, que aqui não tem. Tem tantas crianças aí sem fazer nada que podiam estar aprendendo coisas boas, se ficassem menos tempo nas ruas”. “Colocar rampa no mundo, não construir mais escadas e colocar mais gente para atender na saúde, nas escolas”. “Tu não sabe onde comprar uma cadeira de roda, tu não sabe o que fazer, tu não tem orientação nenhuma, tu não sabe que tu tem que te prevenir contra escaras, que tu tens que te prevenir contra infecções urinárias, te prevenir contra inchaço nas pernas, tu tem que continuar a tua vida. Algumas orientações legais como, por exemplo, sofreu um acidente de carro tu buscares um seguro que possa não recuperar o problema, mas suplementar aquele gasto e despesa, isso eu vejo como um problema, a pessoa digamos assim ganhar esse problema, receber essa situação e não uma orientação.” “Esse é o trabalho que eu busco fazer, quero trabalhar ainda com palestras motivacionais, meu sonho é montar uma consultoria, tudo isso eu fui aprendendo ao longo da vida, mas a dificuldade é essa, a falta de informação, falta de orientação. Eu quero fazer um projeto nessa área, eu quero orientar as pessoas que não tem orientação nenhuma sobre isso, é um desfio aí para o pessoal da assistência social, buscar um trabalho, quem sabe um projeto de TCC (Trabalho de Conclusão de Curso).” “O que eu vejo que falta é, por exemplo, um trabalho social mais focado, ou seja, tu pegar e atacar o problema pela raiz. Existem deficientes que não estão no mercado de trabalho, não estão na universidade, não estão no convívio social, não praticam um esporte, muitas pessoas ficam presas dentro de casa, porque não sabem que o mundo existe depois da cadeira, essas pessoas precisariam de uma orientação para sair, precisariam de transporte adaptado, para que elas pudessem se locomover livremente e ver que o mundo ainda é mundo, que as coisas ainda existem e que a cadeira é só um detalhe, tu pode ir a qualquer lugar que a outra pessoa também vá. Eu não vejo discriminação em si, eu vejo a falta de uma preocupação, falta de vontade de exercer um trabalho sério e determinado para resolver esse tipo de situação.” “Para resolver o governo deveria evitar gastar muito com coisas não importantes e dar mais educação para as crianças. As crianças se recebessem mais carinho e mais diálogo não serão violentas na mocidade.” “Ter mais postinhos e polícia.” “Se os impostos que a gente paga fossem revertidos para sociedade em ações sociais, como realmente se propõe aqueles impostos que estão ali, a vida seria uma beleza, todo mundo teria acesso a muita coisa”. “Olha a solução teria que partir dos governantes, presidente, governadores, prefeitos, se preocupar com a sociedade, distribuir melhor aquele dinheiro público que está sendo jogado fora, roubos, desvios de verba, a gente está cada vez mais pagando impostos e não tem retorno nenhum disso, todo o recurso que existe para uma determinada finalidade vira ‘maracutaia’, vira sujeira”. Conforme o depoimento das pessoas, através das entrevistas realizadas, constata-se que há potencial de resiliência que se desenvolve mais ou menos de acordo com as situações vivenciadas ao longo da existência. Vimos também que a maior parte das pessoas tem a percepção dos problemas da sociedade, embora não vislumbre de modo claro alternativas para superação dos mesmos. Tanto as pessoas idosas, como as pessoas com deficiência necessitam que o meio social propicie oportunidades para que possam desenvolver seus potenciais e habilidades, somente assim a sociedade vai caminhar rumo à acessibilidade universal. Na análise freqüêncial das falas interpretadas nas entrevistas, referente a essa categoria analisada, aparece o que segue: Pessoas que consideram que há solução para as situações difíceis da vida em sociedade 15 Pessoas consideram que não há solução 14 não respondeu1 Pessoas que não têm nenhuma sugestão para mudança da sociedade 15 A Categoria Teórico-Reflexiva Processo Social da Participação e Organização Processo social é o que está sendo produzido, constantemente, na dinâmica das relações sociais. É, portanto, também, resultado destas relações, das interações entre os sujeitos, entre os grupos, entre as nações. Nas relações sociais os seres humanos se aproximam ou se afastam, se incluem ou ficam de fora das diversas instâncias societais. Os processos sociais são produzidos constantemente nas interações entre os sujeitos do mundo. Essa produção pode ser de aproximação entre pessoas, grupos, nações, tanto quanto poderão ser de afastamento, hostilidade, discriminações e segregações. Há uma dinâmica presente nas interações entre as pessoas, dinâmica essa que é mediatizada por uma série de fatores econômicos, culturais, históricos, locais e globais. Há uma interação de reciprocidade e interdependência dos indivíduos entre si e o seu contexto histórico social. “[...] Embora o homem seja um indivíduo único - e é justamente esta particularidade que o torna um indivíduo, um ser comunal realmente individual - ele é igualmente o todo, o todo ideal, a existência subjetiva da sociedade como é pensada e vivenciada” (Marx, 1983, p119). A dinâmica da realidade social, sempre em construção, propicia resultados também dinâmicos, por isso, os processos sociais estão em constante processualidade e construção. Entretanto, existem alguns processos sociais que permanecem existentes no movimento histórico dos povos e da civilização. Bem como no processo histórico de consolidação da sociedade de classes, mediada pela relação entre capital e trabalho, que produz mais valia, sociedade salarial e inúmeras desigualdades entre os indivíduos. Processo social é ação, é o que acontece na interação, não é algo simbólico ou metafísico, é práxis, pois transforma o real, com o seu movimento e sua rede de inter-relações. A sociedade do tempo presente se apresenta de forma multifacetada e atravessada pelas diversas expressões da questão social. A conseqüência central das relações sociais, mediada pela construção da sociedade do capital, é justamente a questão social. Isso significa dizer que a sociedade produz, em seu movimento humano e contraditório o acirramento da luta de classes, das desigualdades e das resistências contra tudo isso. De um lado o capitalismo concentra riquezas e informações nas mãos de poucos privilegiados da sociedade, ocasionando necessariamente miséria para muitos outros não privilegiados e que se tornam alheios da maioria dos bens produzidos socialmente. Por outro lado esses indivíduos apartados dos bens sociais precisam produzir coletivamente formas estratégicas de enfrentar toda a desigualdade construída em um sistema de injustiças e segregações. Definir a questão social, na conseqüência da relação entre capital e trabalho, significa tomar como objeto de atenção, de preocupação e de intervenção profissional o movimento e o resultado da mesma na vida em sociedade. Significa, de outra forma, buscar uma interpretação da sociedade que supere uma visão simplificada, fragmentada da vida social e, perceba sua totalidade permeada por inúmeras contradições, marcada por uma historicidade específica, em um campo social determinado pelas relações de trabalho. A questão social se materializa em suas inúmeras expressões, tais sejam: miséria, violência, desemprego, preconceitos raciais, preconceitos de diversas ordens, não acesso à saúde, à educação, ao lazer e o não acesso aos demais bens da sociedade. Por outro lado as inúmeras expressões da questão social se materializam, também, nas diferentes formas que os sujeitos enfrentam e resistem aos imperativos da sociedade capitalista, nas suas formas de organização e mobilização social. Na análise dos dados de pesquisa encontramos a categoria expressões da questão social como emergente da interpretação da análise qualitativa dos dados em relação à categoria teórico-reflexiva processo social da participação e organização. A seguir ilustramos com as falas dos sujeitos que foram destacadas para demonstrar a construção dessa categoria emergente: “A violência, muito grande, está cada vez pior.” “A violência, a certa hora da noite fica ruim de andar por aí.” “Quantos carros e as pessoas na sinaleira param os carros e são assaltadas”. “Isso não só eu, mas qualquer um vai dizer que o pior problema aí é a saúde e a violência. O problema da violência está terrível. Aqui na nossa vila, por exemplo, tem coisas aqui que a gente vê e faz que não vê.” “Não gosto nem de pensar! A mortandade que tem os bandidos e alguns desastres que dá nas conduções que vão andando”. “Têm tantos. O maior problema da vida são essas pessoas que ficam rolando na rua, passando trabalho, sem ter lar, sem ter nada. Isso daí é um problema muito sério, essas crianças abandonadas são os problemas que eu acho maior”. “Eu tinha uma casinha na Restinga e batia muito ladrão.” “Os assaltantes, a violência. Acho que não vai ter remédio, os assaltantes cada vez aumentam mais. Policiamento resolve um pouco.” “Os roubos, os assaltos, os crimes, as drogas. Não está fácil eu no fim nem ouço notícias, procuro uma rádio que tenha só música.” “Eles dão remédio, só que os remédios que o governo dá é pouco.” “Está tudo caro pelo que eu ganho.” “Maconha. Um dia um guri foi lá em casa e me pediu arruda para cheirar, pois ele não tinha outra coisa para cheirar. Isso não tem solução.” “As drogas, o mundo está afundando por causa disso. Não tem solução, nunca vai acabar isso porque é vício.” “A miséria e a violência” (se referindo à violência urbana). “A corrupção é o problema mais sério, tem que acabar com isso, tem horas que ouvindo o rádio dá vontade de quebrar.” “A dificuldade maior é na emergência que às vezes não tem leito e as cirurgias marcadas que vão sendo adiadas” (se referindo à saúde pública). “Problema econômico, problema de saúde, problema também no serviço público, nos ônibus, é isso aí”. “Saúde e violência” (se referindo a saúde pública e violência urbana). “Ah muita gente nos hospitais. Eu fui ali ver meu cunhado essa semana, minha nossa! O que tinha de gente esperando para ser atendida. (...) A pessoa fica muito tempo esperando para ser atendida.” “Fui muito mal atendido no hospital X e desisti, no posto sou bem atendido.” “Isso é porque a gente precisa depender do SUS, a gente não tem plano de saúde. Isso aí é generalizado, não sou só eu. Depender do SUS é uma questão de sorte.” “Problema do alcoolismo, problema do desemprego, problema da violência, de tudo.” “Isso aí é um problema que vem de cima (se referindo à saúde pública). Problema do governo, só ele poderia ajudar, ajudar não, só ele poderia resolver este problema. Ter mais postos de saúde, mais médicos. Isso aí a gente está vendo no dia-a-dia, (...) tem inclusive gente com problema de locomoção passando noites nas filas para pegar uma ficha para poder consultar, quando consulta.”. “O que me apavora é a matação, que tão matando. Está cada vez pior, a pessoa sai de casa para trabalhar e não sabe se volta viva”! “Os principais problemas da sociedade é a péssima distribuição de renda, isso ocasiona todos os problemas sociais, ocasiona falta de emprego, aumenta a criminalidade, exclui as pessoas de algumas coisas. Eu penso da seguinte forma, uma pessoa que ganha muito, tem muito dinheiro, tem fama, tem sucesso, ela pode viver todas as situações do mundo, o que muitas pessoas vêem através de uma revista ela pode um dia olhar para aquela revista e dizer ‘eu já estive aqui’ e outras sabem que vão viver a vida inteira e não vão chegar nem perto do que essas poucas pessoas que ganham muito têm a possibilidade de chegar”. “As pessoas na parte de cima do topo, elas não sabem o que é ter pouco e aquilo nada mais é do que um dinheiro que eles vão colocar fora, mas esse dinheiro é o da pessoa pobre que está contribuindo com os impostos e deveria receber algum retorno social, algum retorno para vida delas e não estão recebendo, isso eu considero um problema seriíssimo”. “A educação desse país, a falta de escola e trabalho para os jovens, muita discriminação, racismo, mas no fundo o povo é bom”. “Assalto, roubo, principalmente os políticas, os ladrões roubam às vezes até para comer e eles (os políticos) roubam do povo e vai ficando por isso mesmo”. “O que eu acho que é o maior problema é a violência contra a criança, contra as pessoas, não só as crianças, as pessoas. Às vezes está muito bem e recebe um tiro aí uma bala perdida, uma coisa, agora pouco mesmo morreu uma criança aí na vila. “O maior problema é o governo mesmo”. “São os assaltos. Da semana para cá eu fui pegar serviço e tinha dois corpos lá na vila, um aqui no campo e outro lá para baixo. E a gente que sai para trabalhar de manhã cedo? Eu saio 9 horas, mas quem sai 4h, 5h da manhã, está arriscando a vida. Eu acho muito arriscado”. “A falta de união entre as pessoas” “O povo não quer mais conversar, só querem brigar com faca, tiro, tem que sentar assim como nós estamos aqui e um conversar com o outro, fazer uma reunião, ter um cabeça para fazer a reunião, só isso que eu penso”. “A violência, antes levavam as crianças no campo (futebol), agora qualquer hora dá tiroteio, a gente tem medo”. “O problema é que os ricos são muito ricos e os pobres são muito pobres, como vai ser para viver assim com isso? A solução é começar tudo de novo criar um novo mundo sem miséria”. “Falta de estudo. Se tivesse estudado, se tivesse me formado em alguma coisa talvez não fosse tão difícil.” “Desemprego, não estar à altura do trabalho” (não estar capacitado para o mercado de trabalho) “Se os políticos não ‘metessem a mão’”! Há expressões da questão social que indicam a situação vivenciada especificamente pelas pessoas idosas e por pessoas com deficiência, conforme as falas que segue: “Que eles chupam o dinheiro dos aposentados, aqueles parlamentares que vão passear para todo lado. Quero ver eles viver com um salário mínimo”. “Para fazer hemodiálise tem que pagar, não há recursos públicos na área da saúde”. “É o preconceito, a falta de conhecimento, a falta de estrutura que as pessoas têm com o deficiente físico”. “Há alguns anos atrás eu descobri que existe doação de cadeiras de rodas para pessoas que não têm condições, tu vai lá, faz o pedido e espera dois anos, tu ganha uma cadeira, só que trancaram essa doação por quase quatro anos porque desviaram o dinheiro das cadeiras de rodas para cobrir outras coisas, outros gastos que o governo tinha”. “Não passa transporte perto” (se referindo ao transporte coletivo) “O problema é o preconceito ainda, muito. As pessoas têm que abrir mais a cabeça, ainda estão muito fechadas, eu acho que é isso.” (se referindo ao preconceito com as pessoas idosas e com deficiência) “A situação atual do mundo, hoje não há respeito, eles respondem (filhos e netos). Os pais não podem bater nos filhos por causa dos políticos, conselho tutelar e aí há filho que mata pai, pai que mata filho. Falta educação”! “O respeito (falta de) não só com os mais velhos, mas com todos. Não dá para deixar filho e neto bater na mãe, na avó. O mundo todo está muito estressado”! “Não tem médico para eles” (se referindo às pessoas com deficiência). O ser humano é o ser das relações sociais da vida em comunidade, entretanto a sociedade industrial e de consumo vai levando ao isolamento e a uma vida de individualismo. Ter a possibilidade de participar da vida social é uma questão que deveria ser pertinente aos sujeitos que fazem parte de uma sociedade. “A participação não é uma questão do pobre, do miserável, ou do marginal, é questão a ser refletida e enfrentada por todos os grupos sociais que não chegam a penetrar as decisões que dizem respeito às suas condições básicas da existência. Por esse ângulo, a participação, longe de ser política de reprodução da ordem, é, sobretudo, questão social” (Souza, 1993, p.81). Historicamente temos que no período da ditadura militar no Brasil (1964-85) é o Estado que controla a sociedade, o controle social é exercido por instituições estatais e não há participação da população nas decisões da vida política. A participação social passa a ter legalidade a partir da constituição de 1988, pois, os direitos sociais relativos à saúde, à educação, ao trabalho, ao lazer, à segurança e à previdência social adquirem legalidade no art. 6º da Constituição de 1988. A primeira concepção de controle social é a do controle do Estado sobre a sociedade em favor de interesse da classe dominante por meio de políticas sociais para amenizar os conflitos de classe. As instituições estatais através de programas sociais buscam o controle social. Num segundo momento da vida política a concepção é o controle da sociedade sobre as ações do Estado. A lógica do controle social é a de quem paga indiretamente os serviços públicos, por meio de impostos, é a própria população que deve decidir onde e como os recursos públicos devem ser gastos. O controle social só pode acontecer de fato sobre as políticas públicas, se houver, por parte dos setores organizados, a participação na definição da alocação de recursos, pois a política social se desenha de acordo com a utilização deste fundo. “O controle social envolve a capacidade que a sociedade civil tem de interferir na gestão pública, orientando as ações do Estado e os gastos estatais na direção dos interesses da maioria da população. Conseqüentemente, implica o controle social sobre o fundo público” (Correia, 2002, p.132). Muito embora a vida em comunidade deva refletir a possibilidade de participação das pessoas no seu meio de vida, nem sempre isso acontece, por vezes, algumas pessoas têm maiores possibilidades de expressão e participação. Outras pessoas se restringem a seu espaço de vida privada sem maiores possibilidades de expressão em seu contexto. “A dominação se realiza, sobretudo através da aceitação e é mais plena e maior quanto mais as ideologias e práticas políticas em geral levam os segmentos majoritários da população a aceitarem a dominação e a exploração” (Souza, 1993, p.80). Na pesquisa que aqui apresentamos pode se encontrar nas falas dos sujeitos tantos elementos da participação quanto da impossibilidade da mesma. A Categoria vida em comunidade emerge da interpretação qualitativa dos dados da pesquisa complementando o sentido dado ao conceito do processo social da participação e organização enquanto categoria teórico-reflexiva. A seguir as falas dos sujeitos que ilustram o significado da construção dessa categoria: “Eu vou de vez em quando (noutro local), eu vou mais ao grupo de jovens da igreja católica.” “Me sinto bem, como se estivesse na minha família é uma segunda família para mim. Eu estou sempre em atividade com o pessoal, quando tem as festas na comunidade, algum jantar, alguma coisa eu estou sempre, sempre junto com o pessoal, sempre para esquecer um pouco dos problemas que eu vivo em casa, é uma segunda família.” “Tomo chimarrão e vou ao grupo de hipertensos no posto.” “Neste ano fui para praia com grupo de idosos”. “Só do grupo da 3ª idade na comunidade (associação de bairro)”. “As pessoas vão lá para ver os direitos do idoso.” “Conheço várias pessoas, conversam, trocam informações” (em relação ao grupo de idosos). “Aqui o problema é a água, problema de canalização aqui, seguidamente tem que ficar chamando até os fiscais da prefeitura, porque aqui a água invade muito a minha casa, porque ela é rebaixada. É um problema quase que diário aí.” “É a gente também não tem ido mais ao orçamento participativo. É agora não avisam mais quando é que tem. Isso também é muito importante. Eu sabia quando eu era da associação ali, eu sabia estava lá dentro, mas agora ninguém mais avisa quando tem reunião.” “Na comunidade me sinto bem, me distraio conversando com as pessoas, mas por causa das drogas na vizinhança nem durmo às vezes, é muito barulho, é muita violência que me tira o sono”. “Vivo aqui há 30 anos, vivia numa fazenda o pai enriqueceu e perdeu tudo em jogo, empobreceu e viemos para Vila. Aqui na Vila me sinto bem aceito, já fui candidato ao conselho tutelar”. “Aqui na Vila é um verdadeiro horror para meu marido andar de cadeira (de rodas), para mim já estou acostumada, às vezes as pessoas são gentis, auxiliam, mas têm muitos que não tão nem aí com a gente”. “Há muita violência e drogas na comunidade. Vejo pessoas idosas fumando maconha, homens bêbados que são pai de famílias. “Aqui na Vila fico com medo da violência, mas feliz ao mesmo tempo esse é meu canto há tanto tempo, só queria que tivesse mais espaço para os deficientes principalmente nas escolas para as crianças” “Eu jogo bola na ‘estalagem’, meus irmãos moram lá, a gente faz um time e jogamos, vou para lá no fim-de-semana. Basquete também é bom de jogar” (se referindo a um grupo de esportistas em cadeira de rodas). “Aqui na Vila sempre que a gente precisa alguma coisa, alguma orientação a gente sempre procura a Assistente Social lá para saber. Tem o grupo de idosos, tem o grupo de diabéticos.” (se referindo aos atendimentos na comunidade). “Moro aqui há 32 anos, me sinto bem, aqui há muita violência, mas não conosco, não atinge a vida da gente, não me intrometo nesse meio.” (sobre sua vida na vila) “Ganhei casa de madeira do DEMHAB, mas consegui fazer uma de material com ajuda da assistência social da igreja”. “Me sinto feliz da vida na minha comunidade, conheço os ladrão há mais de 40 anos, me chamam de tia, me respeitam, não me fazem nada, mas sei que a violência é forte aqui.” “Eu sou católica, participava de retiros, andava sempre nas igrejas. Agora não faço nada.” “Atualmente nem posso dizer nada, saio tão pouco.” “A gente aprende muita coisa com os outros, conversando, cada um tem uma história para contar da vida.” “Eu não conheço aí fora nada, mas, aqui eles se reúnem, fazem reunião para resolver os assuntos das dificuldades dessa gente. Os moradores não participam, é muita queixa.” “Sou católico, as irmãs vieram, eu participo da ceia sagrada.” “Gosto muito, é um remédio para mim.” “Falta de oportunidade. A gente não pode caminhar sozinha então não dá para fazer essa espécie de atividade.” “Uma vez a gente foi numas palestras lá no correio. Falaram sobre direitos das pessoas com deficiência. Palestra muito bonita com slides, quem enxergava dizia o que passava.” “Não, por falta de oportunidade.” “É bom, a gente fica mais instruída.” “Vou à Igreja Nossa Senhora de Fátima, no santuário, tem missa a semana toda.” “Sim o J. (marido) vai ao AA do (...), eu vou com ele todos os domingos. Ali é bom.” “Grupo de Idosos.” “Aprender muita coisa, como eu não fui ao colégio nem sabia conversar, agora eu sei. Não pegava ônibus agora eu pego”. “Me sinto bem participando.” “Aqui no grupo da terceira idade.” “São pessoas que aprendem umas com as outras e se unem para se ajudar.” “Aprender coisas, ter explicações, como sobre o estatuto do idoso que eu conheci. É muito bom, ajuda muito, a gente conta os problemas, os outros contam também os seus.” “Não tem muita gente que participa como deveria ser.” “Eu gosto, é uma participação muito boa, para a gente dialogar com as pessoas e sempre falar o que a gente sente, vive. Essa participação é melhor para enfrentar os problemas, a gente esquece um pouco dos problemas, é uma coisa muito boa, eu gosto.” “Basquete e a aula da dança, o grupo de jovens da igreja católica todo o sábado e o grupo na localidade X.” (não com muita freqüência) “Sim conheço a (...), eles vão à casa dos deficientes para dar apoio, para ajudar, para conversar, para levantar o astral, fazem reuniões. Eu não freqüento”. “Eu participava ali, como é que eu vou dizer das reuniões que tinham na prefeitura aqui em cima, inclusive com a secretaria da saúde, eu participava. (...) Participei de reuniões muito interessantes, mas agora não tenho ido mais também.” “Aqui? Aqui tem um lugar que eles fazem reunião”. “Não me interessa”! (se referindo ao motivo de não participar de reuniões). “As reuniões são para direção, não é para os moradores, os moradores não participam”. “Lutar pelas melhorias da comunidade, reivindicar pela melhoria das ruas, os asfaltos. Quem não participa não consegue nada, tem que participar”. “Pessoas que participam são mais ativas conseguem mais as coisas, quem participa consegue mais asfaltos. “Assim, depende das pessoas, porque muitas pessoas participam e elas entram como integrantes, como elas entram como integrantes, elas como têm um grande conhecimento, é como um emprego, se tu fores remunerado tu vais aumentando teu cargo. Essas pessoas entram para conhecer, e começam a fazer parte, mais e mais e começam a ter um cargo dentro do grupo, e isso sobe a cabeça, como todo o ser humano isso sobe a cabeça, então eu não posso julgar as pessoas, depende da pessoa”. “Associação de bairro tem muito aqui na vila, lá no Postão o pessoal se reúne para brigar pela saúde dos postos, tem muita gente boa lutando, mas tem gente revoltada também. Esse lugar deve ser bem legal diz que a união faz a força”. “Não tenho tempo nem condições físicas para participar de reuniões da comunidade, a maioria dos lugares é difícil de chegar de noite, para meu marido é difícil sair de casa, me acompanhar, para mim também não é tão fácil a locomoção” (pessoa com deficiência física). “Tenho uma vizinha que é muito ativa, já conseguiu muitas melhorias para nós no Orçamento Participativo no tempo do PT” “É bom participar e ir em busca de projetos e coisas para a comunidade. O pessoal da Associação Bom Jesus participa na comunidade e vai assumir a velha associação”. “Ah, não ficar muito em casa, conversa com um depois conversa com outro, elas fazem pergunta e a gente vai, para não ficar juntando só os nervos em casa. Pelo conhecimento” (se referindo as reuniões na comunidade). “É, me ajudou porque eu tenho mais orientação para me cuidar, alimentação, medicamento uma coisa assim. Para mim foi bom, só que agora eu não estou indo mais, porque eu fico com as crianças e não tenho mais tempo” (se referindo a sua participação nos grupos da comunidade). “É importante participar, na união as pessoas conseguem muitas coisas e conseguem perder um pouco da ignorância, pois, começam a aprender a viver”. “Nem todas as pessoas conseguem reagir, até acompanhei algumas pessoas, quando eu soube que aconteceu (se referindo a situações de pessoas que ficaram com alguma deficiência) e passei algumas dicas que foram bem úteis, e as pessoas melhoraram um pouco a qualidade de vida delas.” “Às vezes eu vou à igreja aqui no Sarandi.” Pessoas idosas e pessoas com deficiência que residem em instituições expressaram sua vida em comunidade como a vida do grupo institucionalizado do qual fazem parte, como se pode observar nas falas abaixo: “Não posso avaliar, não conheço nada aqui, antes de vir para cá morava em Viamão.” “Me sinto bem, assim que eu vim para cá eu sofri muito, mas já passou.” “Passo uma vassourinha no quarto e ajudo outros moradores.” “Aqui ninguém tem vergonha por isso minha vida melhorou quando eu vim para cá. Eu não tenho coragem de ir embora daqui.” “Me sinto melhor do que com a família, a minha família mesmo está aqui. Aqui eu tenho a liberdade que eu não tinha lá com os meus, aqui é só felicidade, é sempre céu aberto.” “Tem aqueles que ajudam na lavanderia, nas lidas da casa. Tem grupo da Igreja, da religião católica toda quarta-feira de manhã tem um grupinho desses, uma senhora que vem rezar. De primeiro tinha um padre, um que fazia às vezes de padre, hoje não tem”. “Melhor não tem, porque nós somos uma porção de moradores. Às vezes tem que atender eu, noutras a N. (amiga), um monte de pessoas”. “Acostumei já, estou aqui há mais de três anos” “Eu estou aqui há três anos e nunca me deram um centavo, isso é contra a lei, eu tinha direito a uma mesada.” “Já conheço as pessoas pelas vozes, então já sei que estou acompanhada” (depoimento de uma pessoa cega). “Tem uma guria que vem aqui nas quintas-feiras e nos leva para conversar na pracinha, daí a gente conversa tudo.” Conforme Souza (1993 p. 79) “... a participação é um processo existencial concreto que se produz na dinâmica da sociedade e se expressa na própria realidade cotidiana dos diversos segmentos da população”. Por mais que sejam contraditórias as formas como se apresentam essas possibilidades para os sujeitos sociais, é a partir da participação que a sociedade vai evoluindo e comportando a diversidade de seus sujeitos. Há uma necessária transformação nos processos sociais para alterar os modos de vida e a cultura na dinâmica que vai sendo processada nas relações sociais. Essa transformação requer qualidade de participação popular e para tanto é requisito uma alteração na forma como as pessoas podem experienciar a participação. Souza nos alerta para os “componentes pedagógicos” da participação, que são a conscientização, a organização e a capacitação (1993 pp. 84/96). Esses componentes vão qualificando a possibilidade de expressão e inserção dos sujeitos em seu contexto. A conscientização requer ampliar os horizontes da consciência, ter uma visão mais ampla da realidade, perceber suas contradições, é a superação da consciência ingênua para uma consciência crítica. Quando as pessoas despertam para o sujeito coletivo de ações articuladas, percebem que as inúmeras expressões da questão social é um problema da sociedade e não do sujeito isolado. Dessa forma as pessoas encontram a necessidade de buscar a organização, de se organizarem enquanto grupos de pressão. Para que essa organização aconteça de forma qualificada é preciso o terceiro elemento, ou seja, a capacitação que vem a ser o conteúdo técnico e político significativo para planejar intervenções concretas diante das situações vivenciadas. O processo social da participação é a possibilidade de fazer frente às inúmeras vulnerabilidades, por parte dos sujeitos dessa sociedade, tendo em vista que o processo social da desigualdade apartou esses mesmos sujeitos do direito de usufruir os bens produzidos socialmente. Entretanto a possibilidade e o exercício de cidadania da participação também é um fenômeno complexo, haja visto as inúmeras dificuldades encontradas nas falas do sujeito para poder fazer parte de seu contexto. Homens, mulheres, crianças, adolescentes, pessoas idosas, pessoas com deficiência ou sem deficiência, todos fazem parte deste sistema social no qual as relações sociais são mediadas pela relação entre capital e trabalho. As inúmeras interdições sociais, entendendo-se pelo termo os impedimentos que existem no meio social para que a pessoa tenha acesso ao mesmo, levam às inúmeras vulnerabilidades sociais. Os conceitos desenvolvidos neste relatório de pesquisa e as falas dos sujeitos aqui apresentadas demonstraram os conceitos de vulnerabilidade social, resiliência e do processo da participação em uma perspectiva que localiza o sujeito no emaranhado das relações sociais e sua conseqüência. Indivíduos e contextualidade fazem parte da mesma totalidade permeada por severas contradições sociais e construída num tempo histórico, no qual é possível criar e (re) criar possibilidades, foi o que nos indicou o resultado da análise dos dados coletados nesta pesquisa e aqui publicados. Na análise freqüêncial das falas interpretadas nas entrevistas, referente a essa categoria analisada, aparece o que segue: Expressões da questão social: drogadição 10 violência urbana 13 violência doméstica 3 miséria 15 falta de união entre as pessoas 5 preconceitos 7 barreiras arquitetônicas 6 corrupção 4 Pessoas que conhecem lugar para se reunir, de reivindicações, de organização: conhecem 10 não conhecem 17 não sabem 3 Pessoas que participam desses lugares 9 que não participam 21 Pessoas que conhecem alguém que seja referência de participação 12 que não conhecem 18 Pessoas que não sabem o conceito de participação 12 Análise Quantitativa dos Dados/ Programa Sphinx A análise quantitativa dos dados de pesquisa será apresentada a seguir como resultado do processo de dados submetidos ao programa sphinx. Esse programa de computador organiza os dados em tabelas estabelecendo porcentagens da população pesquisada conforme características das mesmas. O programa sphnix foi um facilitador para a sistematização da coleta e análise de dados. O resultado desse processamento se coloca no que segue na tabulação dos dados quantitativos retirados da primeira parte do instrumento – questões fechadas: Análise e Tabulação de Dados Quantitativos Idade Sexo Feminino 20 66.7% Masculino 10 33.3% Total Média = 62.27 Desvio-padrão = 16.47 Mediana = 67.00 33.3% 66.7% 30 100.0% Estado Civil Solteiro 12 40.0% Viúvo 10 33.3% Casado 5 16.7% Outros 2 6.7% Separado 1 3.3% Total 40.0% 33.3% 70 e mais 13 43.3% De 60 a 69 8 26.7% De 30 a 39 4 13.3% De 40 a 49 2 6.7% 6.7% De 50 a 59 2 6.7% 6.7% Menos de 30 1 3.3% 3.3% Total 16.7% 43.3% 26.7% 13.3% 30 100.0% 6.7% 3.3% 30 100.0% A maioria dos sujeitos entrevistados é do sexo feminino na faixa-etária dos 70 anos ou mais e o estado civil é de solteiro. Feminino Masculino N N % % Total N % Qual o tipo de defic iênc ia? Solteiro 6 50.0% 6 50.0% 12 100.0% Deficiência Física 16 45.7% Viúvo 8 80.0% 2 20.0% 10 100.0% Deficiência Visual 8 22.9% 22.9% Casado 3 60.0% 2 40.0% 5 100.0% Sem deficiência 7 20.0% 20.0% Outros 2 100.0% 0 0.0% 2 100.0% Outra 4 11.4% Separado 1 100.0% 0 0.0% 1 100.0% Total 10 33.3% 30 100.0% Total 20 66.7% 35 100.0% 45.7% 11.4% Deficiência Física N % Deficiência Visual N Sem deficiência % N % Outra N Total % N % Solteiro 10 62.5% 4 25.0% 1 6.3% 1 6.3% 16 100.0% Casado 1 25.0% 0 0.0% 3 75.0% 0 0.0% 4 100.0% Viúvo 3 30.0% 2 20.0% 2 20.0% 3 30.0% 10 100.0% Separado 1 50.0% 1 50.0% 0 0.0% 0 0.0% 2 100.0% Outros 1 33.3% 1 33.3% 1 33.3% 0 0.0% 3 100.0% 16 45.7% 8 22.9% 7 20.0% 4 11.4% 35 100.0% Total Dos sujeitos solteiros, a maior parte é constituída por pessoas com deficiência. Munic ípio de Residênc ia Taxa de resposta: 100.0% PORTO ALEGRE 28 93.3% CANOAS 1 3.3% 3.3% VIAMÃO 1 3.3% 3.3% Total 93.3% 30 100.0% Nasc eu em meio urbano ou rural? Rural 12 40.0% Urbano 12 40.0% 6 20.0% Não sabe Total 20.0% 40.0% 40.0% 30 100.0% Munic ípio de Nasc imento Porto Alegre Interior do RS Total 9 30.0% 21 70.0% 30 100.0% 30.0% 70.0% A maior parte dos entrevistados reside na capital, mas são migrantes nascidos no interior do Estado - 62,5%. Esc olaridade analfabeto 5 16.7% alfabetizado fora da escola 2 6.7% 6.7% Mobral 1 3.3% 3.3% 15 50.0% primário completo 3 10.0% ginasial incompleto 1 3.3% 3.3% ginasial completo 1 3.3% 3.3% secundário completo 1 3.3% 3.3% superior incompleto 1 3.3% 3.3% primário incompleto Total Deficiência Física N 16.7% 50.0% 10.0% 30 100.0% Deficiência Visual % N Sem deficiência % N % Outra N Total % N % analfabeto 0 0.0% 1 25.0% 2 50.0% 1 25.0% 4 100.0% alfabetizado fora da escola 1 50.0% 0 0.0% 0 0.0% 1 50.0% 2 100.0% Mobral 1 50.0% 1 50.0% 0 0.0% 0 0.0% 2 100.0% primário incompleto 9 50.0% 5 27.8% 3 16.7% 1 5.6% 18 100.0% primário completo 2 50.0% 1 25.0% 1 25.0% 0 0.0% 4 100.0% ginasial incompleto 0 0.0% 0 0.0% 1 100.0% 0 0.0% 1 100.0% ginasial completo 1 50.0% 0 0.0% 0 0.0% 1 50.0% 2 100.0% secundário completo 1 100.0% 0 0.0% 0 0.0% 0 0.0% 1 100.0% superior incompleto 1 100.0% 0 0.0% 0 0.0% 0 0.0% 1 100.0% 16 45.7% 8 22.9% 7 20.0% 4 11.4% 35 100.0% Total Observa-se aqui a relação entre vulnerabilidade social e baixa escolaridade: 50% dos entrevistados possuem primário incompleto (equivalente as séries iniciais do ensino fundamental) e 16,7% são analfabetos. Qual a sua renda mensal em R$? Qual a princ ipal fonte de renda? aposentadoria por tempo de serviço aposentadoria por invalidez BPC e outros salário 2 7 7 4 6.3% 21.9% aposentadoria e pensão 4 12.5% não tem renda 3 9.4% outros 5 15.6% Total 21.9% 21.9% 12.5% Menos de 01 salário mínimo 6.3% 21.9% 12.5% 12.5% 9.4% 3 10.0% 19 63.3% 02 salários mínimos 3 10.0% 03 salários mínimos 1 3.3% não tem renda própria 3 10.0% 1 3.3% 01 salário mínimo não sabe Total 10.0% 63.3% 10.0% 3.3% 10.0% 3.3% 30 100.0% 15.6% 32 100.0% Mais de 50% percebe um salário mínimo, proveniente de aposentadoria por invalidez ou programas assistenciais (BPC) Da renda familiar a princ ipal despesa é: Qual a renda mensal de sua família em R$? Menos de 01 salário mínimo 1 01 salário mínimo 8 3.3% 26.7% 02 salários mínimos 7 23.3% 03 salários mínimos 4 13.3% não sabe 1 3.3% outros 9 30.0% Total 3.3% 26.7% 23.3% 13.3% 3.3% 30.0% 30 100.0% 11 37.9% Não 11 37.9% 7 24.1% Mais ou menos Total 18 41.9% habitação 10 23.3% remédios 6 14.0% outros 4 9.3% vestuário 2 4.7% 4.7% saúde 2 4.7% 4.7% lazer 1 2.3% 2.3% Total A renda é satisfatória para seu sustento? Sim alimentação 41.9% 23.3% 14.0% 9.3% 43 100.0% 24.1% 37.9% 29 100.0% 37.9% A maior despesa dos sujeitos entrevistados é com alimentação, seguida por habitação – cabe esclarecer que o dado habitação se refere aos entrevistados que residem em instituição. Apesar do salário mínimo recebido, 37,9% consideram que isto é satisfatório para o seu sustento, enquanto mesmo percentual considera que esta renda é insatisfatória. Como avalias tua independênc ia e autonomia para a realizaç ão das atividades diárias? ótima 9 30.0% 11 36.7% razoável 6 20.0% ruim 2 6.7% 6.7% péssima 2 6.7% 6.7% boa Total Como são suas relações familiares? satisfatório 30.0% 36.7% 20.0% 20 66.7% insatisfatório 3 10.0% não mantém relações familiares 6 20.0% outros 1 Total 3.3% 20.0% 3.3% 10.0% 30 100.0% 66.7% 30 100.0% A maioria dos entrevistados avalia sua independência como boa ou ótima e considera satisfatória sua relação com familiares. Partic ipa de alguma atividade assoc iativa? associação religiosa 12 35.3% não paricipa 11 32.4% associações comunitários 3 8.8% 8.8% associação esportiva 3 8.8% 8.8% associação recreativa 2 5.9% 5.9% associação assistencial/caritativa 2 5.9% 5.9% outros 1 2.9% Total 34 100.0% 35.3% 32.4% 2.9% A maior parte dos entrevistados participa de atividades ligadas à religião ou então não participa de atividades associativas. Há atendimentos e serviç os nas proximidades de sua moradia? Não 3 10.0% Sim 25 83.3% 2 6.7% Não sabe Total 6.7% 10.0% 83.3% 30 100.0% V oc ê utiliza serviç os públic os ou ONGs em seu dia-a-dia? Não 11 36.7% Sim 18 60.0% 1 3.3% Não sabe Total 30 100.0% Saúde N Área dos serviços públicos e/ou ONGs que utiliza: % 3.3% 36.7% 60.0% Educação Comércio Segurança Transporte N N N N % % 0 % Outros % N Total % N % 8 42.1% 2 10.5% 0.0% 0 0.0% 0 0.0% 9 47.4% 19 100.0% Área dos atendimentos e serviços próximos de sua moradia: 22 48.9% 8 17.8% 11 24.4% 1 2.2% 1 2.2% 2 4.4% 45 100.0% Total 30 46.9% 10 15.6% 11 17.2% 1 1.6% 1 1.6% 11 17.2% 64 100.0% Os entrevistados referem que há serviços nas proximidades de sua moradia (públicos e privados) e utilizam estes serviços majoritariamente na área de saúde. Há barreiras físic as que estejam impedindo a sua c irc ulaç ão? Não 15 50.0% sim 12 40.0% 3 10.0% não sabe Total 10.0% 50.0% 40.0% 30 100.0% Como é a possibilidade de c irc ulaç ão nas proximidades do lugar em que moras? ótima 5 16.7% boa 8 26.7% regular 4 13.3% ruim péssima não sabe Total 3 7 3 10.0% 23.3% 10.0% 16.7% 26.7% 13.3% 10.0% 23.3% 10.0% Nos lugares de c irc ulaç ão há: não há 17 36.2% rampas 12 25.5% corrimão 9 19.1% elevadores 5 10.6% escadas 4 8.5% Total 36.2% 25.5% 19.1% 10.6% 8.5% 47 100.0% 30 100.0% Os entrevistados referem ausência de rampas, corrimões e afins, 50% afirmam não haver barreiras físicas que impeçam a circulação, mas 40% fazem referência a barreiras. RECURSOS/LOCAIS CITADOS NAS ENTREVISTAS: 1 Posto da PUC 2 SAMU 3 Grupo da 3ª idade (Centro de Extensão Universitária) 4 Igreja Deus é Amor 5 Casa Lar do Cego Idoso 6 Igreja do Sarandi 7 Escola Paula Soares 8 Posto de Saúde Costa e Silva 9 Escola Santa Luzia 10 Parceiros Voluntários 11 Hospital Conceição 12 Igreja Santa Rita de Cássia 13 ACELB 14 Correio 15 Santuário de Fátima 16 Posto de Saúde próximo a Alvorada 17 AA Centro Vida Humanístico 18 CEASA 19 Grupo de Idosos da Vila Fátima 20 OP Zona Leste 21 OP Zona Sul 22 Grupos de esporte basquete e futebol para pessoas com deficiência física 23 Associação de moradores da Vila Bom Jesus – Bonju de Artesanato 24 Associação de Bairro da Zona Sul 25 Postinho ACM 26 Postão Vila dos Comerciários 27 Hospital de Clínicas 28 SCD Frater 29 Brigada Militar 30 Hospital São Lucas 31 Hospital Cristo Redentor 32 FASC Considerações Finais Conforme identificado na análise dos dados, os sujeitos tornam-se vulneráveis em razão da precarização das relações de trabalho e as vulnerabilidades oscilam cotidianamente. É necessário perceber nestas situações um efeito de processo e não de uma situação autônoma. Os processos sociais se originam no centro e não na periferia da vida social. Os sujeitos entrevistados nesta pesquisa encontram-se em três condições de situação de vulnerabilidade social, evidenciadas na análise. A primeira por desvantagem pessoal no caso das pessoas com deficiência, a segunda por questões de circunstância e conjuntura – migrantes, vítimas de maus tratos, contexto familiar, drogadição, etc. E a última por condições próprias do ciclo de vida – idosos assistidos pelo Benefício de Prestação Continuada. A maioria dos sujeitos entrevistados encontra-se em situação de vulnerabilidade pelas três condições apresentadas - por desvantagem pessoal, por circunstância e conjuntura, e pelo ciclo de vida. Os campos de pesquisa apresentam uma diversidade de situações, algumas que se assemelham entre si e outras que são típicas de cada campo. Na Vila Fátima as principais expressões da questão social apontadas foram a violência, a drogadição, a carência de recursos na área da saúde pública e a questão do meio ambiente, com o lixo pelas ruas ocasionando poluição e barreiras físicas para pessoas com deficiência. Entendemos que estas vulnerabilidades sociais são oriundas do processo de acumulação capitalista, que gera desigualdades e miséria para muitos cidadãos, que ficam sem acesso aos bens de consumo e aos direitos como saúde, educação, emprego, etc. No Parque Esportivo, os entrevistados (atletas com deficiência física) demonstraram um bom potencial de resiliência, além de participarem da comunidade através do esporte e de outros grupos sociais como entidades religiosas, associações, clubes, etc. Um diferencial observado nesse grupo foi um melhor nível de escolaridade e a busca por qualificação profissional, inclusive apontando as dificuldades nas áreas de escolarização e profissionalização como uma expressão da questão social. Em instituição para cegos idosos a violência urbana e a questão das drogas são apontadas como problemas sociais que preocupam. As pesquisadoras observaram que os moradores referem poucas vivências fora do âmbito institucional, alguns moradores participam de grupo interno ligado à religião e/ou grupo de trabalhos manuais. Um fator que surpreendeu as pesquisadoras é que de um total de quarenta moradores, somente 46 uma pessoa utilizava o Sistema Braille. Observamos também que muitos não souberam assinar seu nome no Termo de Consentimento. Nos três campos pesquisados os sujeitos demonstraram preocupação com a situação da violência urbana, que se destacou como uma expressão da questão social preponderante, seguida pela drogadição. Através das entrevistas realizadas foi possível perceber como a vulnerabilidade social afeta a vida concreta das pessoas e das suas comunidades, ora como limite, ora como desafio na busca da transformação das questões colocadas nas dinâmicas das relações sociais. Ratificamos que, quando as pessoas despertam para o sujeito coletivo de ações articuladas percebem que as inúmeras expressões da questão social é um problema da sociedade e não do sujeito isolado. Contribuição aos Campos Pesquisados Instituição para cegos idosos: Devido constatação de que muitos moradores não sabem assinar seu nome, pensamos em desenvolver, com moradores interessados, a aprendizagem da assinatura. De acordo com o Projeto Assino Embaixo desenvolvido pelo Centro de Apoio Pedagógico - CAP de Belo Horizonte a grafia do nome e a assinatura favorecem a construção de identidade das pessoas cegas. Este projeto tem como objetivos: Substituir a impressão digital pela assinatura em tinta, Estimular e promover a emancipação, autonomia e o sentido de privacidade, Possibilitar o fortalecimento da confiança em si mesmo e a auto-estima, Respeitar a individualidade e exercer a capacidade de decisão. Outra idéia que surgiu, partindo da análise das entrevistas, é propiciar aos moradores a participação em reuniões internas para que possam expressar no coletivo suas necessidades e demandas, também sugerimos fazer devoluções de receita e pagamentos (contas) da casa aos moradores, evitando assim sentimentos de não participação ou de exploração. A casa apresenta instalações e dependências bastante equipadas para o desenvolvimento de atividades de vida prática e ocupacional. Alguns moradores relataram ter interesse em realizar atividades na horta, cozinha e lavanderia o que 47 certamente favoreceria a participação e autonomia destes moradores como expressa a fala citada na página 23 deste relatório – “Fazendo alguma coisa de útil, me sentindo útil para alguma coisa.” Observamos ainda que a maioria dos entrevistados refere poucas vivências fora do âmbito institucional em passeios, grupos externos, etc. Sugerimos, na medida do possível, criar espaços para atividades fora da instituição como caminhadas guiadas, piqueniques nos arredores do Lar e outras similares. Tais atividades contribuirão para o desenvolvimento de maior autonomia e para ampliação da socialização. Bibliografia ALMEIDA, Laura M.P. Vulnerabilidade Social, Conceito. Desenvolvimento Humano no Recife. Atlas Municipal, 2005. ASSIS, Simone Gonçalves et al. Resiliência - enfatizando a proteção dos adolescentes. POA: Artmed, 2006. BEHRING, E. Contra-reforma do Estado. Seguridade Social e o lugar da filantropia. In. Serviço Social & Sociedade. São Paulo. Ano XXIV n.73, março 2003. CASTEL, Robert. As Metamorfoses da Questão Social: uma crônica do salário. 4.edição. Tradução de Iraci D. Poleti RJ: Editora Vozes, 1998. CASTEL, Robert. As Armadilhas da Exclusão. In: Desigualdade e a Questão Social. 2.ed. SP: EDUC, 2000. COHN, A. A Saúde na Previdência Social e a Seguridade Social: antigos estigmas e novos desafios. In: COHN, A et al. Saúde no Brasil. Políticas e Organizações de Serviços. 3 Ed. Revista e ampliada. São Paulo, Cortez: CEDEC, 1999. COSTA, Bruno L. D. Implicações do Enfoque da Exclusão Social sobre as Políticas Públicas: desafios para o desempenho governamental. Belo Horizonte: Escola de Governo Fundação João Pinheiro, 2004. GALIETA, Isabel Camilo. Resiliência, o verdadeiro significado. Consulta ao site www.debas.eel.usp.br , ano 2007. POTYARA A. P. Pereira. Necessidades Humanas: subsídios a critica dos mínimos 48 sociais 2.ed. 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