4. Teoria e Políticas de Taxa de Juros e de Investimento

Propaganda
4. Teoria e Políticas de Taxa de Juros e de Investimento
4.1. A Taxa de Juros
4.1.1. As Funções da Taxa de Juros
4.1.2. Determinantes da taxa de juros do mercado
4.1.3. Políticas de Taxas de Juros, a Estabilização e o Crescimento Econômico
4.2. O Investimento
4.2.1. Cenários
4.2.2. Conceitos e Tópicos Gerais
4.2.3. Fatores Determinantes do Investimento
4.2.4. As Políticas de Promoção de Investimentos
4.3. As Teorias de Taxa de Juros e Investimento
4.3.1. A Escola Clássica e a Crítica de Keynes
4.3.2. A Síntese Neoclássica: o Modelo IS-LM
4.3.3. A Taxa de Juros e o Modelo Mundell-Fleming
4.3.4. A Teoria Keynesiana do Investimento
4.3.5. A Teoria Neoclássica do Investimento
4.1. A Taxa de Juros
O juro e a taxa de juros são conceituados de diversas formas em economia. Sob o ponto
de vista financeiro, o juro é a remuneração que o tomador de um emprétimo deve pagar
ao proprietário do capital emprestado. Os economistas clássicos atribuíam a cobrança de
juros à produtividade do capital, ou seja, ao lucro que o capital proporciona a quem o
possui. A cobrança também foi considerada como o pagamento de um serviço, isto é, da
possibilidade de se dispor de um capital.Marx também associa a taxa de juro à taxa de
lucro; considera o juro como a participação financeira no lucro (forma de expressão da
mais-valia) do capitalista produtivo, e afirma que a taxa de juro deve ser inferior à taxa
média de lucro, resultante da produção capitalista.
A contribuição decisiva para a teoria do juro foi oferecida por John M. Keynes, para quem
a quantidade de moeda, aliada à preferência pela liquidez, é que determina a taxa de
juros. A consequência prática da teoria keynesiana do juro foi possibilitar a manipulação
da oferta monetária disponível e, consequentemente, alterar a taxa de juros, transfomada
em instrumento de uma política de desenvolvimento econômico ou de combate à inflação.
Antes da expansão comercial e do desenvolvimento do capitalismo, a cobrança de juros
constituía um problema ético. Chamada de usura, era terminantemente proibida pela
Igreja da Idade Média. No século XVI, a reforma calvinista aceitou e justificou
“teologicamente” a cobrança de juros, mas foi somente no século XVIII que os estudiosos
começaram a buscar uma justificativa econômica para a cobrança de juros sobre os
empréstimos monetários. (Sandroni, p. 180)
4.1.1. As Funções da Taxa de Juros
A taxa de juros desempenha as seguintes funções na economia:
 representa o custo de oportunidade do consumo atual em relação ao consumo futuro.
Desta forma, ela influencia a decisão do setor privado relativa a consumo e poupança;
 representa um elemento do custo do capital. Desta forma, influencia tanto o montante
total dos investimentos como a sua distribuição;
 permite uma análise dos fluxos em termos de estoques e vice-versa, principalmente no
que se refere à conversão de preços de demanda e oferta de bens e serviços, e torna
também mais fácil a comparação dos custos e rendimentos de períodos diferentes;
 representa o rendimento da acumulação de ativos financeiros.
Assim sendo, a taxa de juros influencia o comportamento dos agentes econômicos não só
no setor financeiro interno como também em virtude das três primeiras funções acima, no
setor real da economia (consumo, investimento e produção).
Taxas de juros nominal e real
A taxa de juros que é relevante para o comportamento relacionado com as três primeiras
funções e, portanto, com o setor real da economia, é a taxa “real” de juros, isto é, a taxa
de juros líquida das flutuações previstas do nível de preços. Visto que diferentes taxas de
juros reais podem ser calculadas em um dado momento, numa determinada economia,
surge ainda a questão de qual das taxas de juros reais vigentes seria a mais relevante
para a análise das modificações produzidas no setor real da economia pelas mudanças
de comportamento dos agentes financeiros.
Pode-se alegar que uma taxa de juros real a longo prazo é mais relevante do que uma
taxa de juros real a curto prazo, já que as decisões relativas à poupança e ao
investimento se referem ao longo prazo. Contudo, o registro de taxas reais de longo
prazo, ou “históricas”, não influencia o comportamento econômico corrente, já que o
mesmo é influenciado pela taxa prevista de inflação.
Assim sendo, a melhor taxa de juros real para a análise de comportamento do setor
privado seria a taxa de juros real “esperada”, ou seja, a taxa de juros nominal ajustada
pela taxa de inflação esperada. Mas, como a taxa de inflação esperada não pode ser
observada diretamente, faz-se necessário substituir a taxa de juros real esperada por
outra variável, para fins não só de formulação de política como também de análise
empírica. A variável mais comumente utilizada para substituir esta taxa é a taxa de juros
nominal anterior ou atual, ajustada pela taxa de inflação observada. Uma medida mais
adequada da inflação esperada, porém, pode ser calculada por meio de um modelo de
“expectativas racionais”.
A taxa de juros real esperada influencia também a maneira pela qual os agentes
econômicos dividem seu patrimônio entre ativos financeiros e ativos reais. A maneira pela
qual eles repartem seu patrimônio entre ativos financeiros internos e externos, porém, é
influenciada pelas taxas de juros nominais, tanto do mercado interno como do mercado
externo, e pelas flutuações esperadas da taxa de câmbio.
4.1.2. Determinantes da taxa de juros do mercado
A escolha do modelo para identificar os determinantes da taxa de juros do mercado nos
países em desenvolvimento depende do grau de abertura do respectivo país. Nos países
com economia rigorosamente fechadas, a taxa de juros no mercado dependerá
principalmente das condições do mercado interno. Ao contrário, nos países com
economias com um alto grau de abertura e que não impõem restrições aos fluxos de
capital, a arbitragem fará com que a taxa de juros do mercado dependa principalmente
das taxas de juros mundiais, das flutuações previstas da taxa de câmbio e,
possivelmente, de algum fator de risco peculiar ao país em questão.
a) A taxa de juros numa economia fechada
Um modelo comumente utilizado para estabelecer os determinantes da taxa de juros de
mercado numa economia fechada tem sua origem em dois conceitos emitidos por I.
2
Fisher. No primeiro, a taxa de juros nominal ( i ) representa a soma1 da taxa de juros real
(r ) e da taxa de inflação esperada (e) (isto é, i = r + e). No segundo, a taxa de juros real
tende a flutuar ciclicamente, em torno do seu equilíbrio de longo prazo (r*). De acordo
com o segundo conceito de Fisher, as flutuações cíclicas ou de curta duração da taxa de
juros real podem refletir alterações da política econômica ou alterações excepcionais nas
condições vigentes no mercado de recursos para financiamento.
De modo semelhante, as variáveis orçamentárias exercem um efeito apenas temporário
sobre a taxa de juros real. Se, por exemplo, o déficit orçamentário for financiado por
empréstimos do banco central, um aumento do déficit (e do respectivo financiamento),
poderá acarretar um excesso (inesperado) de oferta de moeda e, portanto, uma queda da
taxa de juros real a curto prazo, que será compensada a médio prazo, visto que uma
renda maior aumenta a procura de moeda. De igual modo, se o déficit orçamentário for
financiado por meio da emissão de obrigações subscritas pelo setor não bancário interno,
um aumento do déficit poderá acarretar um excesso de procura de fundos para
financiamento, que, por sua vez, acarretará um aumento temporário da taxa de juros real.
Este efeito também é temporário, já que a persistência de taxas de juros reais elevadas
acabam por diminuir a renda e eliminar o excesso de procura de recursos para
financiamento.
b) A taxa de juros numa economia aberta
Visto que, numa economia aberta, os agentes econômicos podem dar origem ao ingresso
ou à saída de capitais, existe uma relação entre as taxas de juros internas e externas.
Numa economia aberta, que não impõe quaisquer restrições aos fluxos de capital,
deixando-se de lado as considerações relativas ao risco e ao custo das transações, o
comportamento dos agentes econômicos levará a uma equalização dos rendimentos
esperados no mercado financeiro interno e no mercado financeiro externo. Desta forma,
as taxas de juros internas, em um dado momento, serão determinadas pela seguinte
relação:
i t = i *t + e t
em que i*t é a taxa de juros no mercado mundial (para o mesmo ativo financeiro e o
mesmo prazo) e et é a depreciação esperada (a taxa de câmbio é definida como o preço
interno da moeda estrangeira).
O risco relativo à solvência, outros tipos de riscos e a existência de custos de transação
criam um diferencial entre a taxa de juros interna e a soma da taxa de juros no mercado
mundial com a taxa esperada de desvalorização da moeda. Em alguns países em
desenvolvimento, este diferencial pode ser considerável, por causa do risco político e do
custo das transações.
De modo semelhante, a existência de controles de capital que ainda vigoram em muitos
países em desenvolvimento, reflete-se num diferencial entre a taxa de juros interna e a
soma da taxa de juros no mercado mundial com a taxa esperada de desvalorização da
moeda. Neste caso, a reação dos fluxos internacionais de capitais às flutuações da taxa
de juros internas poderá ser fraca, em virtude da maneira como o mercado percebe os
riscos envolvidos.
1
A soma dos dois termos é uma aproximação. Uma expressão mais precisa, particularmente relevante no caso de países
com inflação elevada, está calcada no produto dos dois termos, ou seja: i = (1 + r) (1 + e) -1.
3
Neste sentido, a determinação da taxa de juros pelo mercado na maioria dos países em
desenvolvimento pode combinar fatores peculiares a uma economia aberta com fatores
peculiares a uma economia fechada.
A importância relativa desses dois tipos de fatores depende das restrições impostas sobre
os fluxos de capitais e da amplitude do diferencial provocado por essas restrições. Se, por
exemplo, as restrições forem relativamente pequenas, o diferencial também será pequeno
e a relação entre as taxas de juros interna e externa se aproximará da equação anterior.
Ao contrário, se as restrições forem severas, o diferencial será grande e as taxas de juros
internas dependerão principalmente das condições vigentes no mercado interno.
4.1.3. Políticas de Taxas de Juros, a Estabilização e o Crescimento Econômico
Em muitos países em desenvolvimento, em vez de serem determinadas pelo mercado, as
taxas de juros são controladas diretamente pelas autoridades. Os efeitos desta política
dependem da forma como as autoridades administram as taxas. Em alguns casos, as
taxas de juros são administradas de maneira flexível, acompanhando mais ou menos de
perto as variações de seus determinantes. Em alguns casos, contudo as taxas de juros
administradas carecem de flexibilidade e (…) elas se tornam consideravelmente mais
baixas do que a taxa de equilíbrio do mercado. Estas taxas de juros “reprimidas” têm
efeitos significativos na economia.
Taxas de juros reprimidas e seus efeitos sobre a estabilidade econômica
Um efeito importante das taxas de juros reprimidas é que elas desestabilizam a situação
macroeconômica. Em primeiro lugar, na medida em que as taxas nominais reprimidas se
traduzem em taxas de juros reais (esperadas) muito baixas ou negativas, elas estimulam
o consumo e a demanda de investimento, visto que projetos que, de outra forma não
seriam rentáveis, parecem atraentes. De modo geral, a poupança interna tende a cair,
particularmente a poupança financeira, que é substituída parcialmente por haveres em
ativos reais. O excedente de investimento interno resultante em relação à poupança
interna implica um excedente de despesa interna em relação ao produto, o que se reflete
em um déficit da conta corrente do balanço de pagamentos.
Em segundo lugar, na medida em que as taxas de juros reprimidas se tornarem
internacionalmente competitivas - isto é, na medida que elas se tornarem mais baixas do
que as taxas externas - ajustadas pela desvalorização esperada da moeda nacional vultosas saídas de capital agravarão os problemas da conta corrente, provenientes de um
volume menor de poupança interna.
Com freqüência, as autoridades reagem ao desequilíbrio crescente do balanço de
pagamentos, mediante restrições à importação de bens e serviços e às saídas de capital.
Contudo, mesmo que estas medidas atinjam o objetivo de limitar o desequilíbrio externo,
elas aumentarão a despesa interna e o isolamento progressivo da economia encontrará
reflexo numa aceleração da inflação, o que tornará ainda mais aguda a repressão da taxa
de juros.
Os efeitos da taxa de juros sobre a relação entre a demanda agregada e o saldo global do
balanço de pagamentos explicam porque as políticas de taxas de juros são tão utilizadas
em programas de estabilização, juntamente com outras políticas, tais como contenção
orçamentária e monetária, depreciação da taxa de câmbio e ajuste dos preços internos
4
relativos de mercadorias e fatores. O objetivo imediato da política de taxa de juros é
ajustar a taxa de juros nominal, para que ela possa contribuir para a consecução dos
seguintes outros objetivos:
a) eliminação do excesso de demanda na economia e controle da inflação;
b) restauração dos ingressos líquidos de capital na economia, melhorando assim o
balanço de pagamentos; e
c) promoção de uma utilização mais eficiente de recursos produtivos.
Taxas de juros e crescimento econômico
A taxa de juros real esperada exerce um influência importante no crescimento econômico,
já que afeta não só o volume da poupança e dos investimentos, como também a
produtividade destes últimos.
a) Taxas de juros reais e distribuição da poupança
Pode-se representar o conjunto dos projetos de investimentos de um país por meio de
colunas verticais, como se vê no gráfico seguinte. A largura de cada coluna indica o custo
do projeto, ao passo que sua altura representa a produtividade marginal do projeto,
medida como a relação entre o acréscimo por ele trazido ao produto nacional anual e o
custo do projeto. Portanto, o eixo vertical indica também o nível máximo de taxa de juros
real que o projeto pode suportar.
Produtividade Mg do K (%)
Taxa de juros real (%)
Investimento ($)
Figura 01 - Espectro de projetos possíveis. O gráfico mostra os projetos em ordem
decrescente de rentabilidade, da esquerda para a direita.
Se conectarmos o topo das barras sucessivas, a linha obtida poderá ser chamada de
curva de demanda de investimento, o que pode ser visto no próximo gráfico. Assim
sendo, se o número de projetos de investimento a serem executados depender do
montante total de poupança (interna e externa) disponível, a seleção dos projetos que
serão executados dependerá do mecanismo que permitir coadunar a poupança e os
projetos de investimentos.
Se o sistema financeiro for eficiente, o mercado estabelecerá a taxa de juros de equilíbrio.
Todos os projetos que apresentarem uma taxa real de retorno esperado pelo menos igual
à taxa real do mercado ( r0 ) contarão com recursos financeiros. Mas, para os projetos
5
(inclusive projetos de auto-financiamento) cuja taxa de retorno esperado for inferior à taxa
do mercado, não serão destinados recursos, conforme mostra o gráfico.
Produtividade Mg do K (%)
Taxa de juros real (%)
A
r0
C
O
S0
Figura 02 - Seleção de projetos viáveis. Nestas condições e supondo-se um
determinado volume de poupança global, S0, apenas os projetos que se situarem entre o
ponto de origem e o ponto S0 no gráfico serão executados. Portanto, o total do
crescimento do produto seria expresso por OACS0.
b) Efeitos de taxas de juros reais baixas
Os efeitos das taxas de juros reais baixas (ou negativas) dependem dos motivos pelos
quais essas taxas estão baixas. Assim, por exemplo, elas podem estar mais baixas do
que as taxas de equilíbrio do mercado por causa de efeitos temporários de mudanças
conjunturais da política econômica, implementadas interna ou externamente, repassadas
por arbitragem ao país em questão. Na medida que essas mudanças são imprevistas,
essas taxas de juros baixas tendem a aumentar a demanda de investimentos e a diminuir
o preço relativo do consumo corrente. Portanto, essas taxas aumentarão a despesa
(consumo e investimento) e, na medida que a economia não estiver operando a plena
capacidade, elas aumentarão também a renda real.
Os efeitos de taxas de juros reais baixas por longo período de tempo são muito diferentes,
visto que elas geram um excesso “permanente” de demanda de crédito e um excesso
“permanente” de investimento em relação à poupança. Essas taxas têm a sua origem nos
controles sobre as taxas de juros pagas e cobradas pelos bancos.
Quando a demanda de recursos para projetos de investimento excede a disponibilidade
de poupança, produzindo um excesso de demanda de crédito, fazem-se necessários
alguns mecanismos administrativos de racionamento do crédito. Um destes mecanismos
consiste na adoção de políticas de crédito seletivas. Contudo, estas políticas tendem a
designar recursos financeiros indiscriminadamente para todos os projetos em setores
prioritários, às expensas de alguns projetos com taxas mais altas de rendimento em
outros setores. As políticas de crédito seletivas tendem, portanto, a diminuir a
produtividade do investimento global e a taxa de crescimento econômico.
Tendo em vista o racionamento do crédito, tanto em setores prioritários como em setores
não-prioritários, é evidente que o interesse dos bancos é emprestar aos tomadores de
6
empréstimos maiores (o que reduz os custos para os bancos), para aqueles que oferecem
garantias mais sólidas e àqueles que têm relações especiais com os bancos. Um
resultado freqüente desta prática é que o crédito acaba sendo concedido a ricos e a
grandes empresas, particularmente àquelas que têm projetos intensivos em capital, em
detrimento a empréstimos a empresas menores e que têm projetos mais produtivos e
intensivos em trabalho, capazes de arcar com taxas de juros mais elevadas. Este
mecanismo de racionamento utilizado pelos bancos tende a reduzir não somente o
crescimento, como também a demanda de mão-de-obra, repercutindo ao mesmo tempo
negativamente na distribuição de renda.
e) Efeitos de taxas de juros reais elevadas
A elevação das taxas de juros reais pode ocorrer por vários motivos. Taxas elevadas
podem, por exemplo, refletir uma política monetária restritiva ou uma política orçamentária
expansionista, segundo a qual o déficit orçamentário do governo é financiado por meio da
emissão de obrigações. Elas podem também refletir moedas sobrevalorizadas e a
expectativa de uma desvalorização.2 Em todos estes casos, é provável que as taxas reais
elevadas sejam um fenômeno temporário, que será eventualmente superado.
Essas taxas elevadas não prejudicam a eficiência do sistema financeiro. Embora as taxas
elevadas de juros reais tendam a reduzir o investimento, tendem também a estimular a
poupança. Por sua vez, a redução na demanda de investimentos tende a exercer um
efeito negativo sobre o crescimento durante um período bastante curto.
Por outro lado, uma maior persistência de taxas de juros reais elevadas pode ter causas e
efeitos diferentes dos mencionados acima. A persistência de taxas elevadas comumente
reflete um grande diferencial entre as taxas ativas e passivas das instituições financeiras,
por causa dos impostos explícitos sobre as transações financeiras, dos impostos
implícitos, na forma de reservas compulsórias e créditos setoriais obrigatórios, ou de
dificuldades estruturais em relação aos custos operacionais ou à composição dos ativos
das instituições financeiras (além da inadimplência observada ou potencial).
Nestes casos, as taxas ativas relativamente altas, que restringem a demanda de
investimentos, tendem a coexistir com taxas passivas reais bastante baixas, que não
permitem um aumento da poupança financeira real. Nessas circunstâncias, um resultado
comum é um sistema financeiro pouco desenvolvido, que entrava o crescimento dos
ativos financeiros e da intermediação financeira no país, estimulando, ao mesmo tempo, o
auto-financiamento e a proliferação de transações financeiras fora do mercado financeiro
organizado. Isto, por sua vez, limita a eficiência da utilização de recursos financeiros para
investimentos no país.
4.2. O Investimento
A teoria econômica estuda o investimento por várias razões. Em primeiro lugar, porque a
teoria do investimento permite que se entenda como, mediante o ato de poupar-se parte
da produção atual, pode-se ampliar a produção futura. Em segundo lugar, as flutuações
dos investimentos têm uma participação na determinação do nível do produto e do
emprego em uma economia. Em terceiro lugar, os investimentos contribuem para o
crescimento econômico a longo prazo. Em razão desses objetivos, existe interesse em
estudar-se a lógica teórica e política do investimento.
Neste caso, apenas a taxa real “medida” pode ser “alta”, mas não a taxa “esperada”, já que a inflação esperada também
refletirá o efeito da desvalorização esperada.
7
2
4.2.1. Cenário
O investimento não é apenas determinado por fatores microeconômicos inerentes ao
projeto, à empresa e ao mercado, mas também afetado pelas tendências
macroeconômicas que condicionam e influenciam esses fatores. Os investidores definem
as suas estratégicas de investimento com base em fatores econômicos objetivos e em
tendências, mediante a formação de expectativas sobre a evolução econômica de longo
prazo. Estes fatores, conjunturais e estruturais, determinam um cenário, onde ambos,
investidor e investimento, se inserem. O cenário é composto mediante o conhecimento e
a análise da evolução histórica, da situação presente e das tendências futuras de curto e
de longo prazo que, direta ou indiretamente, possam influenciar os investimentos
planejados. Apresenta-se a seguir um exemplo de cenário macroeconômico internacional
e de longo prazo.
O fato da recuperação atual da economia do mundo desenvolvido não se traduzir em
melhores índices de emprego evidencia que algo mais do que uma simples crise cíclica
está ocorrendo. A falha na geração de empregos é somente uma entre as muitas
manifestações da atual revolução econômica mundial. As várias mudanças estruturais
trazidas por essa revolução estão trazendo novas regras de jogo e pedindo um novo
“modus operandi” para todos os participantes da economia mundial.
O rápido e contínuo crescimento do Leste Asiático, desde o fim dos anos 60, levou-nos a
uma redistribuição do poder econômico mundial, cujo impacto e implicações apenas
começam a se fazer sentir. Talvez o mais espetacular componente da revolução em curso
seja a mudança do centro de gravidade da dinâmica econômica internacional para a Ásia,
onde se configurou um novo pólo de emprego e produção mundial. Esse fenômeno está
no coração da revolução econômica mundial, pois quebrou a tradição previamente
existente entre alta tecnologia, alta produtividade, alta qualidade e altos salários. Foi essa
ligação que uma vez pareceu garantir a constante melhoria de padrão de vida nos países
desenvolvidos.
Hoje, no entanto, é possível ter alta tecnologia, alta qualidade e baixos salários. Com o
amadurecimento dos países nessa situação podemos esperar que as atuais diferenças
salarais diminuam. De agora em diante, a questão mais importante nas discussões
comerciais não será a nacionalidade de um produto, mas sim onde e para quem esse
produto criará empregos. O desafio representado pela criação de novos empregos
pressupõe uma “revolução cultural” nas empresas e nos países, tanto naqueles que
aspiram galgar novos e mais altos patamares de emprego e renda, quanto naqueles que
desejam preservar o padrão de vida conquistado antes das mudanças geradas pela
globalização em curso.
Um componente polêmico desta revolução é a restauração da flexibilidade do mercado de
trabalho, de forma a estimular a criação de novos empregos. Outro ponto relevante é a
necessidade de um crescente foco nas tecnologias-chave do futuro por meio das quais os
países industrializados ainda possam esperar vantagens competitivas. E, finalmente,
destaca-se a necessidade de ajuste nos sistemas de educação e treinamento, para criar
recursos humanos capazes de gerar mais valor agregado na atividade econômica.
Este cenário macroeconômico de transformação, criação e destruição de empregos indica
uma tendência de disputa mundial por novos investimentos, o que significa a
8
oportunidade das empresas desfrutarem de novos e mais amplos incentivos à atração de
investimentos, destinados a reduzir o custo do capital. Estes incentivos, aliados à nova
associação entre alta produtividade do trabalho e baixos salários, significa uma
revitalização do lucro para as diversas formas de capital, estimulando, assim, a realização
de novos investimentos, principalmente nos países e regiões que se articularem para
responder ao desafios da economia globalizada.
4.2.2. Conceitos sobre Investimento
O investimento é um conceito de fluxo, isto é, compreende um volume de recursos
aplicado ao longo de um determinado período de tempo. Já o capital é um conceito de
estoque, pois corresponde aos volumes acumulados de bens de produção, de
mercadorias e de imóveis existentes em um determinado momento no tempo.
O fluxo de investimento apresenta-se sob variadas qualificações, porque o estoque de
capital está presente sob diversas formas na economia. Tradicionalmente, o fluxo de
investimento destina-se à formação e manutenção de estoques de capital fixo, como as
máquinas, equipamentos, obras civis e instalações, de estoques de mercadorias prontas
ou semi-elaboradas e à construção de imóveis.
Os investimentos em estoques de mercadorias, apesar de serem uma uma fração dos
investimentos em bens de capital fixo e em imóveis, derivam a sua importância do fato de
serem o tipo mais volátil de investimento e, portanto, com participação significativa nos
ciclos econômicos de curto prazo, conforme mostra o modelo IS-LM.
Mas a abrangência do conceito deve ser ampliada para incluir também o fluxo de
investimentos para a formação de ciência e tecnologia e para a formação de capital
humano. A ênfase recente nestes fatores de crescimento e de incentivo ao investimento é
dada porque uma parcela substancial e crescente do aumento da produção e da renda
moderna está sob a forma de inteligência, de tecnologia e de informação, que aumentam
a capacidade competitiva das empresas, ainda que não sejam contabilmente registráveis,
por serem intangíveis, citando-se como exemplo os gastos em formação e treinamento de
recursos humanos, em pesquisa e desenvolvimento de novos e melhores produtos e
processos e em métodos de gestão mais eficientes e eficazes.
Neste sentido, um conceito amplo de investimento deve abranger todo esforço de
acumulação e de renovação de capital, com a finalidade de preservar e ampliar a
capacidade de produção e de distribuição de bens, serviços e ativos na economia, tendo
em vista a obtenção de lucro e a expansão capitalista. Outros conceitos associados ao
termo investimento são:
a) investimento autônomo e induzido;
b) investimento bruto e líquido.
Os Investimentos autônomos são exógenos, isto é, são aqueles que não estão
relacionados com alterações no nível de renda. Os investimentos realizados pelo setor
público e os investimentos em inovações tecnológicas são considerados investimentos
autônomos.
Os Investimentos induzidos são endógenos, isto é, realizam-se em decorrência de um
aumento de renda, na medida em que o aumento da renda induz a uma elevação do
9
consumo e, consequentemente, a um incremento no fluxo de uso e, mediante novos
investimentos, na própria dimensão da capacidade de produção. Os investimentos são
igualmente endógenos quando flutuam na proporção inversa da variação da taxa de juros
na economia.
O Investimento bruto é o investimento total que, deduzido da depreciação, isto é, da parte
do investimento que se destina a compensar o desgaste do capital durante o processo
produtivo, se transforma em investimento líquido. Portanto, uma parte do investimento
total serve para repor o capital em depreciação, enquanto o restante serve para aumentar
o estoque de capital.
Finalmente, menciona-se a existência dos conceitos de capital “reproduzível” e de capital
“não reproduzível”. O capital “reproduzível” pode aumentar por meio da nova produção as empresas podem reinvestir em novos prédios e equipamentos, as pessoas podem
construir novas casas etc. O capital “não reproduzível”, que inclui terras e depósitos
minerais, não pode aumentar por meio da produção. Em termos econômicos, a extração
de petróleo e a exploração de minérios é uma forma de investimento negativo (ou seja,
um desinvestimento), porque o estoque do recurso natural diminui com a extração.
Os gastos com investimentos são muito mais voláteis que os gastos com consumo. Os
consumidores que procuram a otimização vão querer nivelar os níveis de consumo no
tempo, mas as empresas que querem a otimização têm menos motivos para nivelar os
gastos com investimentos. O investimento é o componente mais volátil do PNB. Quando
os gastos com bens e serviços declinam durante uma recessão, boa parte dessa redução
costuma concentrar-se nas despesas de investimento.
O valor do investimento na economia tende a ser bastante subestimado e o valor dos
gastos em consumo costuma ser superestimado. Isto porque os registros oficiais na
contabilidade nacional não levam em conta vários tipos de capital não-físico que deveriam
ser considerados parte do estoque de capital da nação, como, por exemplo, uma força de
trabalho bem treinada, que representa o capital humano, pois o treinamento aumenta a
futura capacidade produtiva do trabalhador. Os gastos em pesquisa e desenvolvimento
representam outra forma de investir no estoque de capital não-físico da economia, pois o
nível tecnológico mais avançado faz parte do estoque total do capital da economia.
4.2.3. Fatores Determinantes do Investimento
Os investimentos são realizados tendo em vista a expectativa de lucro. Entretanto, o
principal determinante do investimento é a inovação, na medida que esta é que motiva a
possibilidade de lucro. Na teoria econômica foi Schumpeter quem classificou as
categorias de inovação, como segue:
a)
b)
c)
d)
e)
a fabricaçäo de um bem novo;
a introduçäo de um método novo de produçäo;
a abertura de um novo mercado;
a conquista de uma nova fonte de matérias primas ou de produtos intermediários; e
a realizaçäo de uma nova organizaçäo de mercado, por exemplo, a criaçäo de um
monopólio.
10
Observa-se que as duas primeiras categorias estão diretamente associadas com a
inovação tecnológica. Ressalta-se que a introdução de tecnologias de novos produto pode
ser dividida da forma seguinte, conforme o seu grau de complexidade:
a) tecnologia de uso;
b) tecnologia de fabricação; e
c) tecnologia de desenvolvimento.
Destaca-se aqui a importância do valor agregado representado pelo investimento
proveniente da tecnologia de desenvolvimento de novos produtos e métodos de
produção. Antes que uma empresa ou família possam utilizar a inovação, elas devem
comprar bens de investimento. A invenção da estrada de ferro não teve valor algum
enquanto não se fabricaram vagões e se colocaram trilhos. A idéia do computador só se
tornou produtiva quando os equipamentos foram produzidos. A inovação tecnológica leva
a um aumento da demanda por investimento.
As firmas aumentam o capital, isto é, investem, até o ponto em que o rendimento
esperado do investimento é igual ao custo de utilização do capital acrescentado. O custo
de utililização tem três componentes. Um, a depreciação, consiste em obsolescência e em
desgaste pelo uso. O segundo é a taxa de juro que a firma tem de pagar para levantar os
fundos que ela investe, ou a taxa de juro imputada que ela cobra de si mesma quando
investe uma parte dos lucros não-distribuídos. O terceiro é o prêmio de risco que
compensa a firma por arriscar os fundos (Mayer, Duesenberry, Aliber, p.298)
rendimento do
capital
r1
Produtividade
marginal do capital
r2
k1
k2
estoque de capital
A figura mostra o rendimento do capital como uma função do estoque de capital existente.
À medida que se acrescenta mais capital, o rendimento dessa parcela adicional, a
produtividade marginal do capital, diminui. Dada a decrescente produtividade do capital
mostrada na figura, seria de se esperar, ao longo do tempo, enquanto o estoque de
capital aumenta, que a produtividade marginal do capital está sempre caindo. Mas a figura
mostra a produtividade marginal do capital com base no pressuposto de que o tamanho
da força de trabalho seja constante e que a tecnologia fique inalterada. Uma força de
trabalho crescente aumenta a demanda de capital, e muitas vezes a nova tecnologia
também faz isso. O resultado é que, apesar do crescente estoque de capital, não há
razão para se presumir que a produtividade marginal do capital caia continuamente ao
longo do tempo.
Se algum fator, como uma nova tecnologia, elevar a produtividade marginal do capital, ou
se o custo de utilização do capital cair, as firmas realizam novo investimento até que o
11
rendimento marginal do capital volte a ser igual ao custo marginal de utilização do capital.
Mas aqui enfrentamos uma complicação. Mesmo que se saiba o quanto um firma quer de
capital adicional, não se sabe qual é a taxa de investimento dessa firma. Uma firma que
aumente o seu estoque de capital de, digamos, $ 20 milhões para $ 30 milhões, pode
investir por um mês à razão de $ 10 milhões por mês, ou por cinco anos à razão de $ 2
milhões por ano. A rapidez com que uma firma atinge o seu estoque de capital ótimo
depende dos custos relativos de funcionar durante algum tempo com capital insuficiente,
multiplicados pelos custos que resultam da aceleração do investimento.
Pode-se traçar uma curva relacionando o rendimento do investimento não ao estoque de
capital, mas ao total que é investido a cada ano. Essa curva, mostrada na figura seguinte,
mede a eficiência marginal do investimento. É essa curva, e não a curva da produtividade
marginal do capital que determina diretamente o investimento. Ela mostra que, à medida
que a taxa de juro cai, o investimento aumenta. Enquanto houver investimento, o estoque
de capital cresce. Com o estoque de capital subindo, a produtividade marginal do capital
cai. A curva da eficiência marginal do investimento, portanto, se desloca para baixo. Em
dado momento, no equilíbrio, o investimento líquido está de volta ao seu nível anterior,
embora o investimento bruto seja maior, porque o aumento do estoque de capital significa
que a demanda para reposição é maior. (Mayer, Duesenberry, Aliber, p.300)
rendimento do
investimento
r1
Eficiência
marginal do investimento
r2
I1
I2
Investimento
O Custo de Utilização do Capital
Um dos componentes do custo de utilização do capital, a taxa de depreciação, depende
da tecnologia e, por isso, não será discutido aqui. Um outro componente é a taxa de juro
real. Quanto mais alta a taxa de juro, mais baixo o valor atual do fluxo de renda que o
capital irá render no futuro. (…) O valor atual de um fluxo futuro de pagamentos de $Y por
ano é:
PV = Y/(1 + r) + Y/(1 + r)2 + Y/(1 + r)3 + … + Y/(1 + r)n
Obviamente, quanto maior for r, menor o valor atual de uma quantia dessas. Em
particular, como mostra a tabela seguinte, os pagamentos mais distantes perdem valor
muito rapidamente. Assim, a uma taxa de juro de 10%, $ 100 daqui a dez anos têm um
valor atual de apenas $ 39,00. A uma taxa de juro de 20%, o seu valor atual é de apenas
$ 16,00. Por isso, para alguns tipos de investimento que só vão começar a gerar retornos
daqui, digamos, a cinco anos, e então irão fazer isso durante vinte anos, a taxa de juro é
de uma importância esmagadora. (Mayer, Duesenberry, Aliber, p.302)
Valor atual de $ 100 recebido em várias datas
12
Número de anos a
partir de agora
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Descontado à taxa Descontado à taxa Descontado à taxa
de juro de 20%
de juro de 10%
de juro de 5%
83
91
95
69
83
91
58
75
86
48
68
82
40
62
78
33
56
75
28
52
71
23
46
68
19
42
65
16
39
61
Produção e Investimento
Como a única razão para usar capital é obter produção, a produtividade marginal do
capital, e com isso a taxa de investimento, depende do volume de produção e do custo de
utilização do capital. Suponha que os salários reais, o custo de utilização do capital e a
tecnologia sejam constantes. Pense no investimento líquido, isto é, no investimento acima
daquilo que é necessário para compensar a depreciação. Quanto é que uma firma irá
investir? Se a sua produção for constante, seu investimento líquido não será apenas
constante, será zero. Com a produção constante, o estoque de capital desejado pela firma
também é constante, de modo que ela não precisa aumentar o capital investindo. Se a
produção cai, a firma tem mais capital do que deseja e irá desinvestir, ao não substituir o
capital que se deprecia. Só se a produção aumentar é que a firma irá fazer novos
investimentos (líquidos).
Se a produção aumentar numa taxa crescente (isto é, se acelerar), o aumento do
investimento pode ser dramático. A tabela seguinte dá um exemplo. Enquanto a produção
for constante em $ 100, o único investimento que ocorre é $ 50 de investimento de
reposição. Mas quando a produção sobe de $ 100 para $ 120, a firma acrescenta $ 100
de capital novo. Como resultado, o investimento bruto (que é o investimento nominal mais
o investimento de reposição) sobe para $ 150. Assim, um aumento de 20% na produção
não elevou o investimento em apenas 20%, mas triplicou-o.
Produção e Investimento
Valor da
Valor das máquinas Investimento de
Investimento
Investimento
produção
necessárias
reposição
novo
bruto
$ 100
$ 500
$ 50
$0
$ 50
$ 100
$ 500
$ 50
$0
$ 50
$ 120
$ 600
$ 50
$ 100
$ 150
Observações:
a) são necessários $ 5 de máquinas para produzir $ 1 de produto;
13
b) a depreciação é igual a 10% das máquinas do período anterior;
c) investimento de reposição mais investimento novo.
(Mayer, Duesenberry, Aliber, p.302)
A Estabilidade do Investimento
Como, de tempos em tempos, a produção aumenta realmente em ritmo acelerado, o
chamado acelerador, ou princípio da aceleração, parece indicar que o investimento é
altamente errático. Mas existe um fator que melhora a situação. O provável é que as
firmas se desloquem devagar em direção ao seu estoque de capital ótimo, de modo que o
investimento por ano nada tem de tão variável assim. Há vários motivos para isso.
Primeiro, uma firma não reage de forma impensada a um estoque de capital inferior ao
ótimo. Em vez disso, ela opera com o velho estoque de capital se espera que a procura
maior seja apenas temporária (sazonal). Segundo, a alta taxa de investimento atrapalha
as outras atividades da firma, de modo que as firmas tentam distribuir o investimento ao
longo do tempo. Terceiro, quando uma firma levanta mais empréstimos, seus custos de
capital podem subir. Isto poderia limitar o investimento da firma. Quarto, quando muitas
firmas tentam investir ao mesmo tempo, o custo de bens de capital pode aumentar
bastante, induzindo algumas delas a adiar o investimento. (Mayer, Duesenberry, Aliber,
p.303)
A Interação entre Investimento e Consumo: o Multiplicador do Investimento
Pelo princípio da aceleração, sabemos que alterações da demanda e, com isso, da
produção, provocam alterações no investimento. E o multiplicador do investimento mostra
como alterações no investimento geram alterações no consumo. A idéia básica do
multiplicador do investimento é simples e óbvia. Quando uma firma faz investimento, sua
despesa gera renda para outras pessoas. Os recebedores dessa renda consomem uma
parte dela, e seu consumo cria renda para outras pessoas, e assim por diante. Por isso,
em cada elo da cadeia só uma parte das receitas maiores é consumida, de modo que a
seqüência de gastos é decrescente. A cadeia de dispêndios é:
$ 1c + $ 1c2 + $ 1c3 + ... + $ 1cn,
onde c é a propensão marginal a consumir.
Essa série se aproxima de uma soma de 1/(1- c). Suponha, por exemplo, que devido aos
impostos e à propensão marginal a poupar, as pessoas consumam apenas 50% de sua
renda antes do imposto. Quando se soma toda a cadeia, a renda aumentou não $ 1, mas
$ 2.
4.3. As Teorias de Taxa de Juros e Investimento
4.3.1. O Investimento e a Taxa de Juros na Teoria Clássica
Os clássicos reconheciam que nem toda a renda gerada era consumida, pois parte dela
teria que ser destinada ao investimento. A poupança é a fonte de recursos para a
realização dos investimentos. O mecanismo que determina que cada unidade poupada
seja utilizada na produção de bens de capital, garantindo pleno emprego dos recursos, é
a taxa de juros.
A poupança é uma função direta da taxa de juros, sendo esta a medida da sua
remuneração. Quanto mais alta for a taxa de juros, maior será o volume que a
coletividade estará disposta a poupar e, quanto mais baixa a taxa de juros, menor será a
disposição da coletividade para poupar. O investimento é uma função inversa da taxa de
14
juros, com esta se apresentando como o preço dos bens de capital. Assim, os
investidores só estariam dispostos a ampliar suas instalações, adquirir equipamentos ou
construir novas unidades de produção se a taxa de juros for relativamente baixa.
Uma forma de entender esta representação é pressupor que os bens de capital sejam
arrendados pela empresa produtora de bens de consumo, em troca de um renda mensal
paga à empresa proprietária do capital físico. A proporção entre esta renda mensal e o
valor do capital arrendado corresponde à taxa de juros clássica, que é um fenômeno real
e não uma taxa de juros monetária.
Assim, os economistas clássicos atribuiam a cobrança de juros tanto à produtividade do
capital, ou seja, ao lucro que o capital proporciona a quem o possui, como ao pagamento
de um serviço, isto é, da possibilidade de se dispor de um capital.
Definidos poupança e investimento dessa maneira, os clássicos sustentavam que, se as
curvas de poupança e investimento caminham em direção inversa, haveria um ponto em
que elas se interceptariam, que seria o ponto de equilíbrio entre a demanda de
investimento e a oferta de poupança. A taxa de juros de equilíbrio (re) é determinada
então pela interseção das duas curvas S = S(r) e I = I(r). Graficamente, temos:
r
r1
S
re
I
I1
S = S(r)
I = I(r)


Se=Ie
S1
S,I
quando r aumenta, S também aumenta
quando r aumenta, I diminui, e vice-versa.
Figura 03 - O equilíbrio clássico entre poupança e investimento. A taxa de juros r =
re, onde Se = Ie, determina como a renda real é repartida entre consumo e poupança e,
portanto, como a produção é alocada entre bens de consumo e bens de capital. A uma
taxa de juros r1 > re  S1 > I1, o que significa que parte dos recursos destinados à
produção de bens de consumo é deslocada (e não utilizada) para a produção de bens de
capital, o que significa desemprego de recursos, pois há excesso de poupança em
relação ao volume de investimento. Nesta situação, uma queda da taxa de juros
restauraria o equilíbrio. A única taxa de juros compatível com o equilíbrio de pleno
emprego é a taxa de juros re. Esta relação entre poupança, investimento e taxa de juros
ocorre, portanto, em um contexto de equilíbrio de pleno emprego, pressuposto este
inerente ao pensamento clássico.
A Crítica de Keynes à Teoria Clássica do Investimento, Poupança e Taxa de Juros
15
Segundo Keynes, o ajustamento automático sustentado pelos clássicos não era
verdadeiro. Keynes argumentou que, apesar da influência que a taxa de juros tinha sobre
os volumes de poupança e de investimento, nada garantiria que ela fosse condutora da
igualdade entre esses dois elementos. O montante do Produto Nacional poderia
desempenhar um papel muito mais importante, tanto na determinação do volume da
poupança, quanto do investimento, e mais, as decisões de poupança da coletividade não
apresentavam qualquer vinculação com as decisões de investimento das empresas. Os
que poupam e os que investem são levados a isso por motivos diferentes e pertencem a
grupos também diferentes.
Keynes sustenta que, ao negligenciar as variações no nível da renda, a escola clássica
erra ao considerar a taxa de juro como o fator que realiza a igualdade entre poupança e
investimento, isto é, entre a procura de fundos investíveis e a oferta de fundos de
poupança. Isto pode ser representado por meio do diagrama seguinte.
Taxa de
juros
ID1
SY1
ID2
i1
q
I1,S1
Volume de Inv. e Poupança
Figura 04 - A taxa de juros e o volume de investimentos. A taxa de juros e o volume
de investimentos se determinam pelo ponto de interseção da curva de procura de
investimento, ID1, e da curva de oferta de poupança, SY1. A curva de procura de
investimento (ID1) é a curva da eficácia marginal do capital de Keynes. A curva SY1
representa a quantidade de poupança associada a um nível de renda Y1 que, segundo os
pressupostos clássicos, seria o nível de renda correspondente ao pleno emprego.
Keynes está de acordo com a teoria clássica, quando esta supöe que, dado o nível da
renda, a taxa corrente de juros se situa no ponto de intersecçäo da curva da procura de
investimento com a curva da poupança que se pratica, às várias taxas de juros e ao nível
de renda dado. Keynes diverge dos clássicos quando estes dão um passo a mais e
postulam que, se a curva da procura de investimento se desloca até a posiçäo ID2, a
intersecçäo desta nova curva da procura de investimento com a antiga SY1, no ponto "q"
do gráfico, determinará a nova taxa de juros. O erro clássico está em supor que a curva
de procura do investimento pode variar sem que varie o nível de renda.
A diminuiçäo do investimento leva a uma reduçäo do nível de renda e, de uma renda
diminuída, se poupará menos. Assim, pois, é insustentável supor que a curva da procura
de investimento (ID) possa deslocar-se sem que, ao mesmo tempo, ocorra um
deslocamento na curva de poupança (SY). Como a curva SY também se desloca, näo
podemos determinar qual será a taxa de juros, nem qual será o volume de poupança e do
16
investimento. No gráfico dos clássicos näo há dados suficientes para obter-se esta
informaçäo.
Para achar a curva da poupança que é relevante para a curva do novo investimento, temse que determinar primeiro a taxa de juros, mediante a introduçäo do estado da
preferência pela liquidez (demanda de moeda) e da oferta de moeda para especulação. A
curva adequada SY será a que corta ID2 imediatamente em frente à nova taxa de juros,
seja ela qual fôr.
Taxa de
juros
ID2 ID1
SY’2 SY2 SY1
i1
i2
q
Volume de Inv. e Poupança
Figura 05 – Taxa de juros e volume de investimento. Se a nova taxa de juros for i2, a
curva da poupança que interessa é SY2 na figura anterior. A quantia de investimento (e de
poupança) é determinada agora no eixo horizontal, imediatamente abaixo do ponto de
interseção das curvas ID2 e SY2. Se a taxa de juros permanece sem alteraçäo em i1 porque o estado da preferência de liquidez e a quantidade de moeda pelo motivo
especulaçäo permanecem os mesmos - a curva da poupança de rendimento que
interessa é SY'2 e o ponto em que esta curva intercepta ID2 indicará a quantidade da
poupança e do investimento de equilíbrio. O ponto "q" indica a solução dada pela teoria
clássica, que supõe que a renda, o produto e a poupança permanecem inalterados, no
nível de pleno emprego, quando muda o volume de investimento.
O aspecto distintivo da teoria de Keynes, em relaçäo aos clássicos, é representado no
diagrama pelas curvas SY. Há uma curva SY diferente para cada nivel de renda. Keynes
argumentou que a Renda Nacional é que determina o nível de emprego e, para que se
chegasse ao nível de pleno emprego, teria-se que determinar a renda nacional que
proporcionaria tal situação e tomarem-se as providências para que ele fosse mantido, se
houvesse o desejo de manter tal situação.
Como o montante da renda nacional é dado pelo montante do consumo mais o montante
do investimento realizado pelas empresas particulares e pelo Governo, o equilíbrio de
pleno emprego poderia ser alcançado e mantido se o Governo adotasse uma política
compensatória que suprisse as eventuais deficiências do investimento e do consumo,
elevando para níveis desejados o montante da renda nacional e, consequentemente, o
volume de emprego.
Resumindo, para os clássicos só haveria equilíbrio com pleno emprego, enquanto para a
teoria keynesiana o que determina o equilíbrio é a igualdade entre a produção global,
geradora de renda, e a demanda agregada como um todo, que se pode dar não somente
17
ao nível de pleno emprego, mas a qualquer outro nível em que existe desemprego dos
fatores de produção.
4.3.2. A Síntese Neoclássica: o Modelo IS-LM
O modelo de demanda agregada IS-LM é uma interpretação relevante da teoria
macroeconômica keynesiana. O modelo é composto pela curva IS e pela curva LM. A
curva IS se refere a investimento (I) e poupança (S), representando o equilíbrio no
mercado de bens e serviços. A curva LM se refere a liquidez (L) e moeda (M),
representando o equilíbrio entre a oferta e demanda de moeda para especulação, no
mercado financeiro.
Uma vez que a taxa de juros influi tanto sobre o investimento quanto sobre a demanda
por moeda, esta é a variável que liga as duas metades do modelo IS-LM que, juntas,
determinam a demanda agregada de equilíbrio (ainda que este equilíbrio não seja,
necessariamente, o de pleno emprego).
O Mercado de Bens, a Cruz Keynesiana e a Curva IS
A curva IS mostra a relação entre taxa de juros e nível de renda que se estabelece no
mercado de bens e serviços. Para entender esta relação, começa-se com uma teoria
simples da demanda por bens e serviços conhecida como cruz keynesiana. Para construir
a cruz keynesiana, inicia-se observando os determinantes da despesa planejada.
Despesa planejada é o montante que famílias, empresas e governo estão dispostos a
gastar na compra de bens e serviços. Supondo uma economia fechada, de modo que as
exportações líquidas sejam iguais a zero, a despesa planejada, E, é:
E = C + I + G = Despesa Planejada, onde: C = Consumo
I = Investimento Planejado
G = Compras do Governo
A esta equação acrescenta-se a função consumo:
C = Ca + c(Y - T) = Função Consumo, onde
Ca = consumo autônomo e
(Y - T) = renda disponível
A função consumo diz que o consumo depende da renda disponível (Y - T). A renda
disponível é a renda total, Y, menos os impostos, T. Considera-se ainda que o
investimento planejado é fixo:
__
I = I = Investimento Planejado
e a política fiscal - isto é, os níveis de despesas do governo e impostos - também é fixa:
__ _
G=G
|
__
> = Política Fiscal
T = T. _|
__
__ __ __
Combinando estas igualdades, tem-se:
E = Ca + c(Y - T) + I + G.
Esta equação diz que a despesa planejada é função da renda, Y, do nível exógeno do
investimento planejado e das variáveis exógenas de política fiscal.
18
E = Despesa
planejada
_
_ _ _
E = Ca + c(Y - T) + I + G
PMgC
1
Renda, produto
Figura 06 - Despesa Planejada como Função da Renda. A linha se inclina para cima
porque uma renda mais alta determina um consumo maior e, portanto, uma despesa
planejada maior. A declividade desta linha é a propensão marginal a consumir (PMgC),
que mostra o quanto a despesa planejada aumenta quando a renda se eleva em uma
unidade monetária.
Considera-se agora que a economia está em equilíbrio, de modo que a despesa
observada é igual à despesa planejada. Recorde-se que o PNB representa tanto a renda
quanto a despesa da economia. Assim, Y é igual não só à renda total, mas também à
despesa total em bens e serviços observada (realizada). Escreve-se esta condição de
equilíbrio como:
Despesa Observada = Despesa Planejada
 Y=E
A reta de 450 que aparece na figura seguinte liga os pontos que atendem a esta condição.
Acrescentando a função de despesa planejada, esta figura se torna a cruz keynesiana.
E = Despesa Planejada
Y=E
_
_
_ _
E = Ca + c(Y - T) + I + G
Y1
E1
E2
A
Y2
Y2 renda de equil.
Y1
Renda, produto (Y)
Figura 07 - A Cruz Keynesiana. O equilíbrio na cruz keynesiana está no ponto A, onde a
renda é igual à despesa planejada. Como é que a economia alcança o equilíbrio? Para
muitas empresas, os estoques têm um papel destacado no processo de ajustamento. Se
as empresas produzem mais bens do que aqueles que os consumidores estão dispostos
a comprar, o excedente é somado ao estoque. Inversamente, se as firmas produzem
menos do que as pessoas desejam, os estoques atendem essa demanda. Estas
variações não planejadas nos estoques levam as empresas a mudar o nível de produção.
19
O Ajustamento ao Equilíbrio na Cruz Keynesiana. Se as empresas produzem no nível
Y1, a despesa planejada é inferior à produção, de modo que as empresas acumulam
estoques. Estes estoques levam as empresas a reduzir a produção. Da mesma forma, se
as empresas produzem ao nível Y2, a despesa planejada, E2, supera a produção e as
empresas esgotam seus estoques. Esta queda nos estoques leva as empresas a
aumentar a produção.
A cruz keynesiana mostra como a renda é determinada, dados os níveis de investimento
planejado, I, e de variáveis de política fiscal, G e T. Contudo, é simplista ao supor que o
nível de investimento planejado seja fixo, na medida em que este, de fato, depende da
taxa de juros. Para incluir a relação entre taxa de juros e investimento no modelo,
representa-se o investimento planejado por:
I = I(r)
onde r = taxa de juros real
Destaca-se, assim, que a taxa de juros relevante para a determinação do nível de
investimento não é a nominal e sim a real, ou seja, a taxa nominal descontada da inflação
esperada. A função investimento mostra porque o investimento depende da taxa de juros
real. Um aumento na taxa de juros real aumenta o custo do capital. Portanto, reduz tanto
o lucro decorrente da posse do capital como o incentivo para acumular mais capital. De
forma análoga, uma redução na taxa de juros real reduz o custo do capital e incentiva o
investimento. Assim, a curva de investimento, que relaciona o investimento à taxa de
juros, tem inclinação negativa.
A curva IS resume a relação entre taxa de juros e nível de renda, a partir da função
investimento e da cruz keynesiana.
E = Despesa Planejada
(B) A Cruz
Keynesiana
Y=E
E = Ca + c(Y - T) + I(r1) + G
20
I
E = Ca + c(Y - T) + I(r2) + G
(A) A Função Investimento
Y2
Y1
Y
(C) A Curva IS
r
r
r2
r2
r1
r1
IS
I(r2)
I(r1)
I
Y2
Y1
Y
Figura 08 - Derivando a Curva IS. O gráfico A mostra a função investimento: um
aumento na taxa de juros de r1 para r2 reduz o investimento planejado de I(r1) para I(r2).
O gráfico B mostra a cruz keynesiana: uma redução no investimento planejado de I(r1)
para I(r2) reduz a renda de Y1 para Y2, O gráfico C mostra a curva IS, resumindo a
relação entre taxa de juros e renda: quanto mais alta a taxa de juros, menor o nível de
renda.
A curva IS é negativamente inclinada, porque um nível mais alto de taxa de juros reduz os
gastos com investimento, reduzindo a demanda agregada e o nível de equilíbrio da renda.
A inclinaçäo da curva depende da sensibilidade dos gastos com investimento em relaçäo
às variaçöes na taxa de juros e também sobre o multiplicador.
O Mercado de Moeda, a Preferência pela Liquidez e a Curva LM
A curva LM descreve o equilíbrio no mercado monetário. Sua equação se obtém
igualando a oferta de liquidez real (M/P) à demanda por liquidez real keynesiana L(r,Y):
M/P = L(r,Y)
Na equação acima considera-se fixo o nível de preços, determinado a partir do salário
nominal (suposto rígido enquanto a economia se encontra abaixo do pleno emprego), da
alíquota de mark-up e da produtividade média do trabalho. Além de P, o traçado desta
curva no plano r x Y supõe dada a oferta monetária.
A curva LM representa a relação entre a taxa de juros e o nível de renda que se dá no
mercado de saldos monetários. Para entender esta relação, começaremos por uma teoria
simples da taxa de juros: a teoria da preferência pela liquidez.
21
A teoria da preferência pela liquidez é a mais simples interpretação da teoria keynesiana
da taxa de juros. A teoria explica como a oferta e a demanda de saldos monetários reais
determinam a taxa de juros.
Começa-se pela oferta de saldos monetários reais. Se M representa a oferta de moeda e
P, o nível de preços, M/P é a oferta de saldo monetários reais. A teoria da preferência
pela liquidez pressupõe que há uma oferta fixa de saldos monetários reais, isto é:
_ _
s
(M/P) = M/P.
M é o nível de oferta monetária determinado pelo Banco Central. Logo, é uma variável de
política econômica exógena. O nível de preços P também é uma variável exógena, neste
modelo. Considera-se o nível de preços como sendo dado porque o modelo IS-LM
considera o curto prazo, em que o nível de preços é fixo. Estas hipóteses sugerem que os
saldos monetários reais ofertados são constantes e, portanto, não dependem da taxa de
juros.
Vejamos agora a demanda por saldos monetários reais. A teoria da preferência pela
liquidez postula que o montante de saldos monetários reais demandados depende da taxa
de juros. A taxa de juros é o custo de oportunidade de se guardar moeda: é o que se
perde quando se guarda moeda, que não rende juros, em lugar de colocá-la em depósitos
de poupança ou títulos, que rendem juros. Em consequência, quando a taxa de juros
sobe, as pessoas desejam manter uma menor quantidade de sua riqueza em forma de
moeda. Representamos a demanda por saldos monetários reais por:
(M/P)d = L(r),
onde a função L(r) denota a demanda pelo ativo líquido - a moeda.
A igualdade nos diz que o montante dos saldos monetários reais demandados é uma
função da taxa de juros.
Para chegar-se a uma teoria da taxa de juros, combinaremos a oferta e a demanda de
saldos monetários reais, no âmbito da teoria da preferência pela liquidez.
Se a taxa de juros for muito alta, o montante de saldos monetários reais oferecidos
excede o montante demandado. Os detentores da oferta excedente de moeda tentarão
transformar parte da moeda que não rende juros em depósitos remunerados ou em
títulos. Os bancos e os emissores de títulos, que preferem pagar juros mais baixos,
respondem a este excesso de moeda reduzindo os juros cobrados. Já quando os juros
são muito baixos, de modo que a quantidade de moeda demandada excede o montante
oferecido, algumas pessoas tentam obter moeda através da venda de títulos ou o saque
de depósitos, elevando assim a taxa de juros. À taxa de juros de equilíbrio todos estão
satisfeitos com suas carteiras de ativos monetários e não monetários.
Taxa de juros
equilíbrio na
taxa de juros
oferta de M/P
r
(M/P)s = (M/P)d = equilíbrio
22
L( r )
_ _
M/ P
Saldos monetários reais = M/P
Figura 09 - A Oferta e a Demanda de Saldos Monetários Reais. A curva de oferta de
saldos monetários reais é vertical porque a oferta não depende da taxa de juros. Como a
taxa de juros é o custo da retenção de moeda, uma taxa de juros maior reduz o montante
dos saldos monetários reais demandados, o que explica a declividade negativa da curva
de demanda de saldos monetários reais.
A Teoria da Preferência pela Liquidez. A taxa de juros se altera até que o montante de
saldos monetários reais demandados seja igual ao dos saldos monetários oferecidos, o
que assegura o equilíbrio do mercado de moeda. O ajustamento da taxa de juros a este
equilíbrio da oferta e da demanda de moeda ocorre porque as pessoas procuram ajustar
sua carteira de ativos quando a taxa de juros está fora do nível de equilíbrio.
Usaremos, agora, a teoria da preferência pela liquidez para chegar à curva LM. Veremos
que a taxa de juros de equilíbrio - aquela que é igual à oferta e à demanda de moeda depende do nível de renda. Esta relação entre nível de renda e taxa de juros é
representada na curva LM.
Até aqui consideramos que apenas a taxa de juros influenciava a demanda por saldos
monetários reais. Contudo, é mais realístico considerar que o nível de renda, Y, também
afeta a demanda por moeda. Quando a renda é alta, a despesa também é elevada, de
modo que as pessoas realizam maior número de transações, o que exige o uso de uma
quantidade maior de moeda. Portanto, uma renda maior implica uma demanda maior por
moeda. Representaremos a função de demanda por moeda através de:
(M/P)d = L(r,Y).
O montante dos saldos monetários reais demandados varia inversamente à taxa de juros
e diretamente à renda.
Através da teoria da preferência pela liquidez, é possível constatar o que acontece com as
taxas de juros quando o nível de renda se altera.
A curva LM resume esta relação entre taxa de juros e renda. Quanto mais alto o nível de
renda, maior a demanda por saldos monetários reais, e, portanto, mais alta a taxa de
juros de equilíbrio.
A. O Mercado de Saldos Monetários Reais
r
B. A Curva LM
r
23
LM
L(r,Y2)
r2
r2
L(r,Y1)
r1
r1
__
M/ P
M/P = Saldos
monetários reais
Y1
Y2
Y = Renda,
produto
Figura 10 - Obtendo a Curva LM. O gráfico A mostra o mercado de saldos monetários
reais: um aumento na renda de Y1 para Y2 aumenta a demanda por moeda e, logo, a
taxa de juros de r1 para r2, para equilibrar o mercado de saldos monetários reais. Assim,
um aumento de renda provoca um aumento na taxa de juros. O gráfico B mostra a curva
LM que resume esta relação entre taxa de juros e renda: quanto mais alto o nível de
renda, mais alta a taxa de juros. É por isso que a curva LM é ascendente, como mostra a
figura 12B.
Observe-se em particular que, quanto maior a sensibilidade da demanda por moeda à
taxa de juros, menor será a inclinação da LM. Para taxas de juros suficientemente baixas,
admite-se, dentro dos moldes da argumentação keynesiana sobre a preferência pela
liquidez, que a procura de moeda seja infinitamente elástica com relação a esta variável.
Isto confere à LM um formato praticamente horizontal. Neste caso, denominado de
"armadilha da liquidez", a política monetária é incapaz de afetar a taxa de juros, pois os
agentes econômicos estão dispostos a manter qualquer quantidade de encaixes
monetários ao juro vigente, à espera de uma queda de preços dos títulos.
Por deferência aos neoclássicos, entretanto, apresenta-se um trecho quase vertical desta
curva. Supõe-se que isto ocorra quando, para taxas de juros suficientemente altas, a
moeda só seja utilizada para fins transacionais, quando então a demanda por liquidez real
L(r,Y) se reduziria à forma kY, independentemente da taxa de juros (k denotando a
constante marshalliana).
É importante lembrar que, ao traçarmos a LM no gráfico r,Y, tivemos que supor
constantes o nível de preços e a oferta monetária M. Se qualquer uma dessas variáveis
muda de valor, ou se a função de demanda por liquidez real sofre uma modificação
(dados r e Y), a curva LM se desloca. Este deslocamento se dará para a direita e para
baixo no caso de:
a) um aumento da oferta monetária M;
b) uma queda de P, decorrente de uma diminuição dos salários nominais, de um aumento
de produtividade da mão-de-obra ou de uma queda das margens de oligopólio;
c) uma diminuição da procura de moeda, resultante de inovações financeiras que
reduzam os custos fixos ou os riscos nas trocas de títulos por moeda e vice-versa.
É claro que os deslocamentos para a esquerda da curva LM se darão no caso de
variações nos parâmetros do modelo contrárias àquelas acima listadas.
24
Conclusão: O Equilíbrio de Curto Prazo
Temos agora todos os componentes do modelo IS-LM. As duas equações do modelo são:
Y = Ca + c(Y - T) + I(r) + G
M/P = L(r,Y)
IS
LM
O modelo considera a política fiscal, G e T, a política monetária, M, e o nível de preços, P,
como sendo exógenos. Dadas estas variáveis exógenas, a curva IS mostra as
combinações de r e de Y que satisfazem a equação que representa o mercado de bens, e
a curva LM representa as combinaçòes de r e de Y que satisfazem a equação que
representa o mercado de moeda.
r = taxa de juros
LM
Taxa de juros
de equilíbrio
IS
Nível de
equilíbrio da renda
Y
Figura 11 - Equilíbrio no Modelo IS-LM. A interseção das curvas IS e LM representa o
equilíbrio simultâneo nos mercados de bens e de saldos monetários reais.
A Incerteza e suas Implicações
Já vimos a interpretação-padrão da teoria econômica keynesiana, resumida no modelo ISLM, no qual duas curvas mais ou menos estáveis e previsíveis se cruzam para determinar
o PNB. Essa análise é fiel a um dos aspectos do pensamento de Keynes. Mas há um
outro componente da obra desse autor que salienta a incerteza, imprevisibilidade e
instabilidade. Essas idéias foram apanhadas por alguns economistas que, embora tendo
pontos de vista divergentes sobre muitos problemas, formam o grupo dos póskeynesianos.
Keynes salientava a grande incerteza inerente às decisões econômicas. Esse aspecto do
pensamento de Keynes não se traduz bem num diagrama IS-LM, mas é preservado e
ampliado pelos pós-keynesianos. O próprio Keynes salientou que o comportamento
errático do mercado de ações mostrava que os preços dos ativos não são apenas o
resultado de deliberações calmas e racionais, mas também dependem de medos e
esperanças, de ondas de otimismo e pessimismo. As expectativas dos pós-keynesianos
nada têm de racionais.
25
Eles alegam que o alto grau de incerteza com que as decisões econômicas são tomadas
tem importantes implicações para a teoria monetária. Ao guardar moeda, nós aliviamos o
ônus de não sabermos o que o futuro nos reserva, porque o dinheiro nos permite adiar
decisões até que saibamos melhor o que vai acontecer. Se você guardou uma parte de
sua renda e está preocupado com que os preços de ações, bônus e outros ativos caiam,
poderá evitar esse risco mantendo sua poupança sob a forma de moeda, até ter uma
idéia melhor sobre os preços futuros das ações e dos bônus. Por conseguinte, seria de se
esperar que a demanda de moeda dependesse do grau de incerteza e, assim, não fosse
uma função estável e previsível da renda, das taxas de juro ou de outras variáveis
mensuráveis.
Uma outra inferência que os pós-keynesianos tiram da existência de uma incerteza
penetrante é que as decisões sobre investimentos são movidas tanto, ou mais, por
esperanças e medos do que por cálculos racionais, por aquilo que o próprio Keynes se
referia como “espírito animal”. Por conseguinte, o investimento também é instável. Os
pós-keynesianos acreditam, portanto, que o setor privado não é apenas muito mais
instável do que pensam os monetaristas, mas também mais instável do que pensam os
keynesianos da vertente central. (Mayer, Duesenberry, Aliber, p.429)
4.3.3. A Taxa de Juros e o Modelo Mundell-Fleming
Amplia-se agora a análise das flutuações econômicas para incluir os efeitos do comércio
e das finanças internacionais. Os mercados mundiais desempenham um papel
fundamental nas economias modernas. Em outras palavras, a maior parte das economias
mundiais é aberta. As economias abertas exportam parte dos bens e serviços que
produzem e importam parte dos bens e serviços que consomem. As economias abertas
também emprestam e tomam empréstimos nos mercados financeiros mundiais.
O modelo que será desenvolvido, chamado modelo Mundell-Fleming, é uma versão do
modelo IS-LM para economias abertas. Ambos os modelos consideram que o nível de
preços é constante e mostram o que provoca flutuações econômicas na renda agregada.
Ambos destacam a interação entre os mercados de bens e serviços e os mercados
financeiros. A diferença principal entre eles é que o modelo IS-LM pressupõe uma
economia fechada, enquanto o modelo Mundell-Fleming considera uma pequena
economia aberta.
Componentes do Modelo
Começa-se apresentando as três equações que formam o modelo. São elas:
Y = c(Y - T) + I(r) + G + NX(e)
M/P = L(r,Y)
r = r*
IS
LM
A primeira equação descreve o mercado de bens. Diz que a renda agregada, Y, é o
somatório do consumo, C, do investimento, I, das despesas de governo, G, e das
exportações líquidas, NX. O consumo é uma função direta da renda disponível, (Y - T). O
investimento é uma função inversa da taxa de juros, r. As exportações líquidas são uma
função inversa da taxa de câmbio, e. Define-se a taxa de câmbio como a quantidade de
moeda estrangeira por unidade de moeda nacional. Por exemplo, e pode ser equivalente
a 100 ienes por dólar norte-americano, ou, ainda, igual a um dólar por real. No modelo
Mundell-Fleming não precisamos fazer a distinção entre taxa de câmbio nominal e real.
26
Como o modelo supõe preços constantes, mudanças na taxa de câmbio real são
proporcionais às variações da taxa de câmbio nominal, isto é, quando a taxa de câmbio
nominal aumenta, os bens importados se tornam mais baratos, comparados àqueles
produzidos internamente, deprimindo as exportações e estimulando as importações.
A segunda equação descreve o mercado de moeda. Diz que a oferta de saldos
monetários reais, M/P, é igual à demanda, L(r,Y). A demanda de saldos monetários reais
é uma função inversa da taxa de juros e uma função direta da renda. A oferta de moeda,
M, é uma variável exógena determinada pelo Banco Central. Como o modelo IS-LM, o
modelo Mundell-Fleming também considera o nível de preços uma variável exógena.
A terceira equação diz que a taxa de juros mundial, r*, determina a taxa de juros da
economia analisada, ou seja, a economia é tão pequena que pode emprestar ou tomar
emprestado no mercado mundial o quanto deseje, sem afetar o nível das taxas de juros
no mercado internacional.
As três equações descrevem completamente o modelo Mundell-Fleming. Nossa tarefa é
verificar as implicações destas equações sobre as flutuações de curto prazo numa
pequena economia aberta.
O Modelo no Gráfico Y-r
Uma das formas de apresentar o modelo Mundell-Fleming é através de um gráfico, cujo
eixo horizontal representa a renda, Y, e cujo eixo vertical representa a taxa de juros, r. É
uma apresentação análoga à da economia fechada no modelo IS-LM. Como mostra a
figura seguinte, a curva IS tem declividade negativa e a curva LM declividade positiva. A
novidade do gráfico é a reta horizontal, que representa a taxa de juros mundial.
r
LM
taxa
de
juros
r = r*
IS(e)
renda, produto
Y
Figura 12 - O Modelo Mundell-Fleming em um Gráfico Y-r. Esta apresentação do
modelo Mundell-Fleming é semelhante à da economia fechada no modelo IS-LM. Na
pequena economia aberta, contudo, a posição da curva IS depende da taxa de câmbio.
Esta se ajusta para garantir que a curva IS corte a curva LM no ponto em que esta última
cruza a reta horizontal que representa a taxa de juros mundial, r*.
Dois aspectos do gráfico merecem atenção especial. Primeiro, como a taxa de câmbio
exerce influência sobre a demanda por bens, a curva IS é traçada levando-se em conta
uma dada taxa de câmbio (digamos 100 ienes por dólar norte-americano ou, no caso do
27
Brasil, US$1.00 por R$1,00). Um aumento na taxa de câmbio (para 200 ienes por dólar,
por exemplo) torna mais caros, em relação aos bens estrangeiros, os bens produzidos
nos EUA, o que provoca uma redução das exportações líquidas. Por conseguinte, um
aumento na taxa de câmbio desloca a curva IS para a esquerda. Para recordar que a
posição da curva IS depende da taxa de câmbio, rotulamos a curva IS como IS(e).
Segundo, as três curvas da figura anterior se cruzam num mesmo ponto. Pode parecer
demasiada coincidência. Mas, de fato, a taxa de câmbio se ajusta para garantir que as
três curvas se cortem no mesmo ponto.
Para verificar porque as três curvas têm que se cruzar em um único ponto, imaginemos
uma situação hipotética, em que isso não ocorre, como aquela representada na figura
seguinte. Nesse caso, a taxa de juros interna, o ponto em que as curvas IS e LM se
cortam, seria superior à taxa de juros mundial. Como os EUA (ou o Brasil) estariam
oferecendo uma taxa de retorno superior àquela vigente nos mercados financeiros
internacionais, os investidores de todo o mundo desejariam comprar ativos norteamericanos (ou brasileiros). Mas, antes de fazê-lo, esses investidores terão que adquirir
dólares (ou reais). No processo, eles elevarão o valor do dólar (ou do real). O aumento da
taxa de câmbio deslocará a curva IS para a esquerda, até que a taxa de juros interna se
iguale à taxa de juros mundial.
Imagine-se agora o caso em que as curvas IS e LM se cruzam em um ponto abaixo da
taxa de juros mundial, isto é, quando a taxa de juros interna é menor que a taxa de juros
do mercado financeiro internacional, como se vê no gráfico B. Uma vez que os EUA (ou
o Brasil) estariam oferecendo uma taxa mais baixa, os investidores norte-americanos (ou
brasileiros) desejarão aplicar seus recursos no mercado internacional. Mas, para comprar
ativos estrangeiros, terão de converter seus dólares em moeda estrangeira. No processo,
a variação na taxa de câmbio deslocará a curva IS para a direita, até que a taxa de juros
interna se iguale à mundial.
A. A Taxa de Juros é Muito Baixa
r
LM
taxa de juros
interna
taxa de juros
mundial
r = r*
B. A Taxa de Juros é Muito Alta
r
LM
taxa de juros
mundial
taxa de juros
interna
IS(e)
r = r*
IS(e)
renda, produto
Y
renda, produto
Y
Figura 13 - O Modelo Mundell-Fleming com a taxa de juros no nível errado. Esta
figura mostra porque a curva IS deve cruzar o ponto de intersecção entre a curva LM e a
reta r = r*. No gráfico A, como as três curvas não se cortam em um mesmo ponto, a taxa
de juros interna é superior à taxa de juros mundial. Os investidores estrangeiros tentarão
aplicar seus ativos nos EUA (ou Brasil). No processo, elevarão o preço do dólar (real) e
28
deslocarão a curva IS para a esquerda. No gráfico B, a taxa de juros interna é inferior à
vigente no mercado mundial. Os investidores norte-americanos (brasileiros) tentarão
investir seus ativos no exterior. No processo, o valor do dólar será reduzido e a curva IS
se deslocará para a direita.
Resumindo, o equilíbrio , neste gráfico, se encontra onde a curva LM corta a linha que
representa a taxa de juros mundial. A taxa de câmbio se ajusta e desloca a curva IS, de
modo que esta corta aquele mesmo ponto.
4.3.4. A Teoria Keynesiana do Investimento
A teoria keynesiana do investimento pode ser resumida nos pontos que se seguem. Ao
comprar determinado bem de capital, um agente econômico adquire a expectativa de
receber uma sequência Q1, Q2,...,Qn de rendimentos líquidos por n períodos futuros.
Esta sequência é o resultado de projeções do adquirente do bem de capital, e refletem o
maior ou menor grau de otimismo espalhado pela economia. Presume-se que os valores
Q1, Q2,...,Qn já incluam os prêmios de risco exigidos pelo agente econômico, em razão
do fator incerteza.
A esta sequência de rendimentos contrapõe-se o preço de oferta Z do bem de capital em
questão. Já que estamos interessados no investimento, isto é, na aquisição de novos
bens de capital, Z deve ser entendido como o custo de reposição do ativo em questão,
isto é, como o preço pelo qual os fornecedores do bem de capital estão dispostos a
vendê-lo.
A eficiência marginal do bem de capital é definida por Keynes como sendo a taxa que
iguala o valor descontado da sequência de rendimentos esperados ao preço de oferta do
bem. Em suma, designando po "e" a eficiência marginal do capital em questão:
n
-k
Z =  (1 + e) Qk
k=1
n
Qk
isto é: Z =  ----------- = preço de oferta do bem de K
k=1 (1 + e)k
O termo eficiência marginal do capital, empregado por Keynes, é sinônimo da "taxa de
rendimento interno" (ou taxa interna de retorno), definida por Irving Fisher, sendo que o
agente econômico se decidirá em favor do investimento se e somente se a eficiência
marginal do bem de capital for maior ou igual à taxa de juros de mercado, referente a
aplicações financeiras em prazo semelhante ao de uso do bem de capital.
Alternativamente, pode-se definir o preço de procura do bem de capital como sendo o
valor atual dos rendimentos que se espera ele venha a proporcionar, ao longo de k
períodos sucessivos, calculando-se a taxa de desconto com base na taxa de
remuneração dos títulos financeiros de longo prazo, na forma seguinte:
n
D =  dkQk = preço de procura do bem de K
k=1
onde: dk = (1 + rk)-k = 1/(1 + rk)k
sendo dk = valor presente de um pagamento unitário diferido por k períodos
rk = taxa de remuneração dos títulos financeiros de longo prazo
29
O projeto de investimento será aceito se e somente se D maior ou igual a Z. O volume de
investimentos em cada setor se equilibrará no ponto em que se igualem os preços de
oferta e procura dos bens de capital correspondentes, como na figura abaixo:
D,Z
Z
D
I
Figura 14 - Equilíbrio entre demanda e oferta de investimento, onde D = preço de
procura do bem de k e Z = preço de oferta do bem de k.
Keynes conclui que o volume de investimentos depende do estado de expectativas dos
agentes econômicos e da taxa de juros. Uma redução das taxas de juros pode estimular
os investimentos, por deslocar para a direita a curva de demanda de bens de capital, isto
é, por aumentar os seus preços de procura. Contudo, a volatilidade das expectativas é a
principal razão para a instabilidade do nível de investimentos.
4.3.5. A Teoria Neoclássica do Investimento
A teoria neoclássica do investimento trata dos incentivos que levam as empresas a
aumentar ou reduzir seu estoque de capital, de modo que começaremos examinando os
benefícios e os custos de possuir capital.
A Remuneração do Capital
A remuneração real proporcionada pela posse de cada unidade de capital é R/P. Em
equilíbrio, R/P é igual à Produtividade Marginal do Capital (PMgK). Para observar quais as
variáveis que influem sobre a remuneração real proporcionada pela posse de capital
considere-se o caso da função Cobb-Douglas, que muitos economistas consideram como
uma aproximação bastante adequada de como a economia transforma trabalho e capital
em bens e serviços. A função Cobb-Douglas é:
Y = A K  L1 - 
A produtividade marginal do capital é, portanto:
PMgK = A (L/K)1 - 
onde K é o capital, L, o trabalho, A, um parâmetro que mede o nível tecnológico e  um
parâmetro, variando entre um e zero, que mede a participação do capital no produto.
Como, no equilíbrio, a remuneração proporcionada pelo capital é igual à produtividade
marginal do capital, podemos escrever:
30
R/P = A (L/K)1 - 
Esta expressão identifica as variáveis que determinam a remuneração real do capital e
mostra que:
 quanto menor o estoque de capital, maior a remuneração real do capital;
 quanto maior a quantidade de trabalho empregada, maior a remuneração real do
capital;
 quanto melhor a tecnologia, maior a remuneração real do capital.
Eventos que reduzem o estoque de capital (um terremoto), ou aumentam o emprego (uma
expansão da demanda agregada), ou aperfeiçoam a tecnologia (uma descoberta
científica), aumentam a remuneração real do capital de equilíbrio.
O Custo do Capital
O custo da posse de capital é mais complexo. Em cada período de posse de uma unidade
de capital, a empresa incorre em três custos:
1. quando a empresa compra uma unidade de capital, perde o juro que poderia ter
auferido, depositando no banco o preço de aquisição do capital. Ou, o que é equivalente,
se a empresa levanta um empréstimo para comprar o bem de capital, terá de pagar juros
sobre o empréstimo. Se Pk é o preço de aquisição de uma unidade de capital e i é a taxa
de juros nominal, então iPk é o custo em termos de juro;
2. Enquanto a empresa está de posse do capital, o preço do capital pode variar. Se o
preço do capital cai, a empresa perde porque o valor de seu ativo se reduziu. Se o preço
do capital aumenta, a empresa ganha, porque o valor de seu ativo aumentou. O custo
desta perda ou deste ganho é - Pk;
3. Enquanto o bem de capital está operando sofre desgaste: a chamada depreciação. Se
 é a taxa de depreciação, a fração do valor perdido a cada período devido ao desgaste,
então o custo em dólar ou real da depreciação é Pk.
O custo total de possuir uma unidade de capital é, portanto:
Custo do Capital = iPk - Pk + Pk = Pk (i - Pk/Pk + )
O custo do capital depende do preço do capital, da taxa de juros, da taxa de variação dos
preços do capital e da taxa de depreciação.
Por exemplo, considere-se o custo de capital de uma locadora de automóveis. A empresa
compra carros a US$ 10.000 a unidade e os aluga a outras empresas. A locadora se
depara com uma taxa de juros de 10% ao ano, de modo que o custo, em termos de juros,
iPk, é de mil dólares por automóvel. Os preços dos automóveis aumentam 6% ao ano, de
modo que, excluindo o desgaste, a empresa tem um ganho de capital, Pk, de US$ 600
ao ano. Os carros se depreciam 20% ao ano, de modo que a perda decorrente do
desgaste, Pk, é de US$ 2.000 ao ano. Portanto, o custo de capital da locadora é:
Custo de capital = US$ 1.000 - US$ 600 + US$ 2.000 = US$ 2.400
31
Assim, para a locadora, o custo de manter um carro em seu estoque de capital é de US$
2.400 ao ano.
Para tornar a expressão do custo de capital mais simples e facilitar o entendimento,
vamos supor que o preço dos bens de capital sobe com os preços dos outros bens. Neste
caso, Pk/Pk é igual à taxa de inflação,  . Como (i - ) é igual à taxa de juros real, r,
podemos escrever a expressão do custo de capital como:
Custo do Capital = Pk (r + )
Esta equação mostra que o custo do capital depende do preço do capital, da taxa de juros
real e da taxa de depreciação.
O Lucro e a Decisão de Investimento
Considere-se agora a decisão da empresa quanto a aumentar ou reduzir seu estoque de
capital. Em cada unidade de capital a empresa aufere uma receita real, R/P, e incorre em
um custo real, (Pk/P)(r + ). O lucro real por unidade de capital é:
Lucro (real) = Receita (real) - Custo (real)
Lucro = R/P - (Pk/P)(r + )
Como, no equilíbrio,a receita real proporcionada pelo capital é igual à produtividade
marginal do capital, podemos escrever o lucro na forma:
Lucro = PMgK - (Pk/P)(r + )
A empresa tem lucro quando o produto marginal do capital é maior do que o custo do
capital. Caso contrário, terá prejuízo.
Pode-se ver, agora, os incentivos econômicos que estão por trás da decisão de
investimento da empresa. A variação do estoque de capital, o chamado investimento
líquido, depende da diferença entre a produtividade marginal do capital e o custo do
capital. Se o produto marginal do capital excede o custo do capital, as empresas
consideram lucrativo aumentar seu estoque de capital. Se o produto marginal do capital é
inferior ao custo do capital, elas deixarão o estoque de capital reduzir-se.
O Equilíbrio e o Estado Estacionário
Finalmente, considere-se o que acontece à medida que este ajustamento do estoque de
capital avança no tempo. Se, no início, o produto marginal é superior ao custo do capital,
o estoque de capital aumenta e o produto marginal cai. Se, no início, o produto marginal
do capital é inferior ao custo, o estoque de capital cai e o produto marginal aumenta.
Finalmente, à medida que o estoque de capital se ajusta, o produto marginal do capital se
aproxima do custo do capital. Quando o estoque de capital atinge o nível do estado
estacionário, podemos escrever:
PMgK = (Pk/P)(r + )
Assim, no longo prazo, a produtividade marginal do capital é igual ao custo real do capital.
A velocidade do ajustamento em direção ao estado estacionário depende da rapidez com
32
que as empresas ajustam seus estoques de capital, o que, por sua vez, depende do custo
de fabricar, entregar e instalar o novo capital.
O Mercado de Ações e o q de Tobin
Muitos economistas vêem um elo entre as flutuações no investimento e as flutuações no
mercado de ações. Ações representam participações na propriedade das empresas e
mercado de ações é o mercado em que essas participações são negociadas. Como as
empresas têm mais valor quando têm muitas oportunidades de investimento lucrativo, os
preços das ações refletem os incentivos a investir.
James Tobin, economista e ganhador do Prêmio Nobel, considera que as empresas
baseiam suas decisões de investimento na seguinte razão, que agora é chamada q de
Tobin:
Valor de Mercado do Capital Instalado
q = ---------------------------------------------------------Custo de Reposição do Capital Instalado
O numerador do q de Tobin é o valor do capital existente nas empresas, tal como avaliado
pelo mercado de ações. O denominador é o preço do capital se fosse comprado hoje.
Tobin raciocinou que o investimento líquido deveria depender do fato de q ser maior ou
menor do que um. Se q é maior do que um, o mercado de ações considera que o capital
instalado vale mais do que seu custo de reposição. Neste caso, os empresários poderiam
aumentar o valor de mercado de suas empresas comprando mais capital. De forma
análoga, se q é menor do que um, o estoque de capital é menor do que seu custo de
reposição. Neste caso, os empresários não substituiriam o capital à medida que este se
desgasta.
A vantagem do q de Tobin como medida do incentivo ao investimento é que reflete a
lucratividade esperada futura do capital, bem como a lucratividade corrente. Por exemplo,
suponha-se que o Congresso passe uma lei reduzindo o imposto de renda da pessoa
jurídica a partir do próximo ano. Esta queda esperada no imposto implica lucros maiores
para os donos de capital. Esses lucros esperados mais altos aumentam o valor do
mercado de ações no presente, elevam o q de Tobin e, portanto, estimulam o
investimento hoje. Assim, a teoria do investimento, q, de Tobin, destaca que as decisões
de investir dependem não só das políticas econômicas correntes, mas também das
políticas esperadas para o futuro.
A teoria q de Tobin é também útil porque proporciona uma forma simples de interpretar o
papel do mercado de ações na economia. Suponha-se, por exemplo, que se observa uma
queda nos preços das ações. Como o custo de reposição do capital é bastante estável, a
queda no mercado de ações implica, em geral, uma queda no q de Tobin. Uma queda em
q reflete o pessimismo dos investidores quanto à lucratividade, corrente ou futura, do
capital. De acordo com a teoria q, a queda em q provocará uma redução no investimento,
que poderia reduzir a demanda agregada. Em resumo, a teoria q oferece uma razão para
esperar que as flutuações no mercado de ações estejam estreitamente relacionadas com
flutuações no produto e no emprego. Assim, não surpreende que o mercado de ações
seja um dos indicadores mais observados do rumo da atividade econômica.
33
Referências Bibliográficas:
Dornbusch e Fisher, Macroeconomia, 5.ediçäo, Makron Books, Mcgraw-Hill, 1991.
Dillard, Dudley. A Teoria Econômica de John Maynard Keynes. Enio Matheus Guazzelli &
Cia Ltda, São Paulo, 1971.
Simonsen, Mario Henrique e Cysne, Rubens Penha. Macroeconomia. Editora Atlas S.A.
Rio
de Janeiro, 1995
Sandroni, Paulo. Novo Dicionário de Economia, 2a. edição, Editora Best Seller, São
Paulo,
1994.
Mankiw, N. Gregory. Macroeconomia. Livros Técnicos e Científicos S.A. Rio de Janeiro,
1995.
Mayer, Thomas; Duesenberry, James e Aliber, Robert. Moeda, Bancos e a Economia.
Editora Campus, 1993.
Fundo Monetário Internacional, Instituto do FMI, Política de Taxa de Juros e Reforma
Financeira (apostila).
34
Download