UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – UNIJUI DHE – DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO CURSO DE PSICOLOGIA ANGELITA BRITES BECKER O TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA Ijuí, dezembro de 2015 ANGELITA BRITES BECKER O TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Curso de Psicologia da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – UNIJUI, como requisito parcial à obtenção do título de Psicólogo. Orientadora: Professora Me. Sonia Aparecida da Costa Fengler Ijuí, dezembro de 2015 Dedico este trabalho a todos os meus professores que durante o percurso acadêmico nos passaram sabedoria. Aos meus filhos, ao meu neto e ao meu amor, que não mediram esforços para que eu chegasse até aqui. À minha orientadora que foi suporte para a realização deste trabalho e às pessoas que sempre me deram apoio e estiveram comigo durante esta caminhada. Agradeço a Deus por ter-me dado forças durante esta etapa de minha vida, agradeço também aos meus filhos, ao meu neto e ao meu amor por entenderem minha ausência e minhas angústias. Aos meus colegas que sempre me deram apoio quando precisei e à professora Sonia que foi uma orientadora exemplar, dando-me suporte na construção de minhas considerações. RESUMO Este trabalho de conclusão de curso se organiza na forma de revisão bibliográfica e tem como tema: O Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) na Infância e Adolescência. O primeiro capítulo trata das considerações sobre o estudo do desenvolvimento biológico, neurológico e psicológico nesses indivíduos, seus marcos evolutivos, seu desenvolvimento linguístico, cognitivo, emocional, social e psicossexual. A partir do segundo capítulo a abordagem enfatiza os aspectos gerais do Transtorno Obsessivo-compulsivo, sua etiologia, bem como a caracterização e identificação dos sintomas desse transtorno, seus critérios diagnósticos, segundo o DSM5, diagnóstico diferencial, manifestações clínicas na criança e adolescente e as possibilidades de intervenção através das formas de tratamento, que pode ser através de psicofármacos e de psicoterapias. Palavras Chave: infância, adolescência, transtorno obsessivo-compulsivo, tratamento. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 7 1. CONSIDERAÇÕES SOBRE INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: UMA BREVE REVISAO DE LITERATURA SOBRE OS APECTOS ORGÂNICO, NEUROLÓGICO E PSICOLÓGICO........................................................................................................ 9 1.1 O Desenvolvimento Humano ao Longo do Ciclo Vital ........................................... 9 1.2 PRIMEIRA INFÂNCIA ......................................................................................... 10 1.3 SEGUNDA INFÂNCIA ......................................................................................... 12 1.4 PERÍODO PRÉ-ESCOLAR ................................................................................. 15 1.5 ANOS INTERMEDIÁRIOS .................................................................................. 16 1.6 ADOLESCÊNCIA ................................................................................................ 16 2 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE O TRANSTORNO OBSESSIVOCOMPULSIVO .......................................................................................................... 24 2.1 ETIOLOGIA ......................................................................................................... 25 2.2 SINTOMAS.......................................................................................................... 27 2. 3 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS SEGUNDO O DSM-5 (2014): ............................ 28 2.4 CONSEQUÊNCIAS PSÍQUICAS PARA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE....... 32 2.5 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DO TOC EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES .. 34 2.6 POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO .............................................................. 35 2.7 TRATAMENTOS FARMACOLÓGICOS .............................................................. 36 2.8 PSICOTERAPIAS ............................................................................................... 38 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 42 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 46 7 INTRODUÇÃO Esta pesquisa surgiu com o objetivo de identificar, descrever e compreender o que é o Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), suas características diagnósticas, sua etiologia, seus sintomas, formas de tratamento, interferência e consequências psíquicas desse transtorno e sua predominância na infância e adolescência. O Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOC) é um transtorno complexo, que tem como características pensamentos, impulsos ou imagens persistentes que chamamos de obsessões e/ou comportamentos repetitivos ou atos mentais que chamamos de compulsões. As obsessões são vivenciadas pelo indivíduo como intrusivas e indesejadas, enquanto que nas compulsões o indivíduo sente-se forçado a realizar tais comportamentos ou atos em resposta às obsessões. Essas obsessões e/ou compulsões tomam tempo ou afetam consideravelmente no dia-a-dia do indivíduo, no trabalho, nas atividades acadêmicas, na família e no social, além de causar intenso sofrimento. Por muitas razões, considera-se o TOC um transtorno mental grave, porque em torno de 10% dos casos, seus sintomas são muito prejudiciais e incapacitantes. Quando o TOC não é tratado, seu desenvolvimento é geralmente crônico, com os sintomas aumentando e diminuindo repetidamente (CORDIOLI, 2008). O Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOC) atinge aproximadamente 2,5% da população em geral. Em indivíduos do sexo masculino, tem idade mais precoce de início do que nos do sexo feminino. Em torno de 25% dos homens têm o transtorno antes dos dez anos. (DSM-5, 2014). O TOC pode permanecer durante a vida toda, se o início ocorrer ainda na infância e na adolescência. Esse transtorno é bem comum na infância, principalmente na adolescência e mesmo sendo extremamente prevalente em crianças e adolescentes, inúmeras vezes não é observado pela 8 família, o que acaba produzindo um imenso período entre o início dos sintomas e a busca por tratamento. O fato do TOC ser traiçoeiro, surgem dificuldades para que seus sintomas sejam identificados precocemente, possibilitando sua percepção quando os sintomas já estão interferindo de forma grave na rotina do indivíduo. (BORTONCELLO et al., 2014). Para caracterizarmos a infância, nesse percurso, partimos do pressuposto de que até o século XIII, era um termo desconhecido, e as crianças eram vistas como mini adultos. Sua evolução foi-se dando até chegarmos a Idade Moderna, em que podemos dividi-la em Primeira Infância, Segunda Infância, Idade Pré-escolar e anos intermediários. Para assinalarmos a adolescência, é necessário observar as mudanças evolutivas dos vários aspectos envolvidos como biológicos, psicológicos e sociais e também a crise de identidade que marca com frequência esse período do desenvolvimento. Assim, para dar conta dos objetivos propostos a investigação toma o seguinte caminho: o primeiro capítulo apresenta a infância e adolescência nos seus aspectos orgânicos (enfatizando o neurológico) e psíquicos, devido a necessidade de um conhecimento maior desses aspectos e, o segundo capítulo apresenta autores que trazem conceitos sobre o TOC entrelaçando com as características que marcam a infância e adolescência priorizadas no primeiro momento da pesquisa. 9 1. CONSIDERAÇÕES SOBRE INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: UMA BREVE REVISAO DE LITERATURA SOBRE OS ASPECTOS ORGÂNICO, NEUROLÓGICO E PSICOLÓGICO Para dar início a essa pesquisa, remeto minhas considerações a infância e seu nascimento, e logo após percebo a necessidade de transitar pelo desenvolvimento humano ao longo do ciclo vital, que também situa o lugar do infantil e do adolescente. O nascimento da infância se deu no século XIII e seu desenvolvimento foi acompanhado especialmente na história da arte e na iconografia dos séculos XV e XVI. Aproximadamente, até o século XII, a arte medieval não conhecia a infância ou não tentava representá-la. As crianças eram imagens de adultos, porém em tamanho menor. Mas as marcas de sua ampliação tornaram-se particularmente abundantes e expressivas a partir do fim do século XVI e durante o século XVII. (PHILIPPE ARIÈS, 1981). 1.1 O Desenvolvimento Humano ao Longo do Ciclo Vital A sistematização do estudo do ciclo vital deu-se no início do século XX, como consequência da preocupação da psiquiatria com o rumo do desenvolvimento da personalidade. As primeiras formulações verificavam o papel dos eventos psicológicos internos e as implicações do desenvolvimento infantil sobre a personalidade adulta. Recentemente, o substrato biológico do comportamento tem sido salientado, em vista de novos achados da ciência neural. O mapeamento do ciclo vital é essencial para um entendimento completo do comportamento humano e para a previsão das dificuldades que surgem durante o desenvolvimento humano. A premissa fundamental da teoria do ciclo vital sustenta que o desenvolvimento ocorre em estágios sucessivos e claramente definidos. Se os primeiros estágios não são apontados, todos os estágios seguintes refletirão um fracasso, como inadequação física, cognitiva, social e emocional. 10 Outra premissa básica da teoria do ciclo vital é que cada estágio distingue-se por um ponto crítico que deve ser conduzido com êxito. Uma crise demanda que o sujeito se adapte. Ela é um evento biopsicossocial, no sentido de que consiste da interação de fatores biológicos, psicológicos e sociais (SADOCK, 2008). As considerações sobre o desenvolvimento da infância serão apresentadas na forma de itens objetivos com o intuito de assinalar as marcas primeiras da criança, e permitir com isso uma visibilidade melhor desse período. 1.2 PRIMEIRA INFÂNCIA Segundo Sadock (2007, p. 41) “o parto do feto marca o início da primeira infância, sendo que o recém-nascido médio pesa cerca de 3.400g”. Marcos Evolutivos: Reflexos e sistemas de sobrevivência do recém-nascido: existem reflexos presentes ao nascer. Eles incluem o reflexo de sucção (estirar os lábios em resposta à estimulação perioral), reflexo de preensão, reflexo de plantar (de Babinski), reflexo paletar, reflexos abdominais, reflexo de sobressalto (de Moro) e reflexo tônico cervical. Em uma criança normal, o reflexo de preensão, de sobressalto e tônico cervical desaparecem por volta do quarto mês. Os sistemas de sobrevivência – respiração, sucção, deglutição e homeostase circulatória e térmica – são relativamente funcionais ao nascer. Os órgãos sensoriais não estão completamente desenvolvidos. A diferenciação das funções neurofisiológicas depende de um processo ativo de reforço estimulatório do ambiente externo, como pessoas tocando e acariciando o bebê. (SADOCK, 2007) Desenvolvimento linguístico e cognitivo: Quando nascem, os bebês emitem ruídos, o choro, porém não vocalizam até aproximadamente oito semanas. Neste período, sons guturais ou balbucios acontecem de forma espontânea como retorno à mãe. A perseverança e evolução das vocalizações dependem da ajuda parental. Segundo Sadock (2007) o desenvolvimento da linguagem ocorre em estágios claramente definidos: 0-6 meses: mostra respostas de surpresa e susto a sons altos ou inesperados; 7-11 meses: preparação do estágio da linguagem; 12-18 meses: 11 estágio da palavra única; 18-24 meses: estágio das mensagens de duas palavras; 24-36 meses: estágio de formação da gramática; 36-54 meses: estágio de desenvolvimento da gramática; 55 meses: estágio da verdadeira comunicação. Desenvolvimento emocional e social: Com três semanas de vida, os bebês imitam os movimentos faciais dos adultos que cuidam dele. O bebê abre a boca e estica a língua em resposta a um adulto que faz o mesmo. Os comportamentos imitativos supostamente são os precursores da vida emocional dos bebês. Os estágios do desenvolvimento emocional parecem-se aos do desenvolvimento cognitivo. Os bebês são dependentes dos adultos para que sobrevivam. Através de um intercâmbio satisfatório e previsível, o repertório comportamental do bebê amplia-se, como efeito das respostas sociais dos cuidadores. A tabela abaixo apresenta a idade e capacidade de expressões durante a infância. Desenvolvimento Emocional durante a Infância Idade Capacidade de Expressão Emocional Nascimento Prazer, surpresa, desgosto, aflição 6-8 semanas Alegria 3-4 meses Raiva 8-9 meses Tristeza, medo 12-18 meses Ternura, vergonha, (inicia aos 18 meses) 14 meses Orgulho 3-4 anos Culpa, Inveja, 5-6 anos Insegurança, humildade, confiança Tabela adaptada de Joseph Campas na University of Denver e de outros pesquisadores (SADOCK, 2007) No primeiro ano, o humor do bebê é muito variável e está intimamente relacionado aos estados internos, como a fome. Quando sente-se internamente confortável, um sentido de interesse e prazer com o mundo e com seus cuidadores prevalece. 12 O afastamento prolongado da mãe (ou de um cuidador importante) nos primeiros seis meses de vida, pode levar a criança à depressão, podendo prosseguir até a fase adulta como parte do caráter do sujeito. (SADOCK, 2007) 1.3 SEGUNDA INFÂNCIA O segundo ano de vida é caracterizado pela aceleração do desenvolvimento motor e intelectual. A capacidade de caminhar concede à criança um grau de controle sobre suas ações, isso permite que a criança determine quando aproximarse e quando retrair-se. A aquisição da linguagem expande intensamente os horizontes da criança, ela aprende a dizer “não”, antes de dizer “sim”. O negativismo da criança neste período, exerce um papel essencial no desenvolvimento da independência. Se o comportamento opositor for constante, contudo, terá conotação problemática. Em alguns momentos para melhor compreensão, na segunda infância, esses marcos evolutivos segundo Sadock (2007) serão apresentados separadamente. Desenvolvimento linguístico e cognitivo: as crianças começam a escutar explicações que podem auxiliá-las a tolerar a demora relacionadas a coisas que desejam. Exibem capacidades diversas de concentração e auto-regulação. Desenvolvimento emocional e social: no segundo ano, o prazer e desprazer diferenciam-se ainda mais. Demonstra excitação exploratória, inclusive provocar e surpreender ou “enganar” pai ou mãe (p. ex. esconder-se). A criança apresenta a capacidade organizada de demonstrar amor e de protestar, como por exemplo correr e beijar ou fugir, chorar, chutar. A ansiedade pode estar relacionada com a desaprovação e à perda de um cuidador querido, podendo ser desorganizadora. Desenvolvimento sexual: desde o nascimento, a diferenciação sexual é percebível, pois os pais vestem e tratam as crianças de modos diferentes devido às expectativas evocadas pelo sexo. As crianças assumem comportamentos que suas culturas demarcam como adequados para seus papéis sexuais através de imitação, recompensas e coação. Apresentam curiosidade sobre o sexo anatômico e quando 13 essa curiosidade é reconhecida como salutar e auferida com respostas honestas e adequadas para a idade, as crianças sentem-se confortáveis com seus papéis. Controle dos esfíncteres e do sono: O segundo ano de vida é um período de crescentes demandas sociais para a criança. O controle urinário diurno geralmente está completo por volta dos dois anos e meio e o controle noturno normalmente se concretiza aos quatro anos. Nesta fase, as crianças podem apresentar dificuldades para dormir, relacionando ao medo do escuro. Aos dois anos, a criança leva cerca de 30 minutos para iniciar o sono e os pais devem estar cientes de que, nessa idade, as crianças precisam ser tranquilizadas antes de ir para a cama. Cuidados parentais: nesta fase, os pais devem ser firmes em relação aos limites do comportamento admissível e encorajamento para a emancipação progressiva da criança; devem ter o cuidado para não ser autoritários em demasia, devem consentir que as crianças atuem por si próprias e aprendam com seus erros, resguardando e ajudando quando os desafios estiverem longe de suas aptidões. No decorrer deste período, as crianças têm a tendência de lutar pelo amor e pelo cuidado exclusivos de seus pais, isso inclui rivalidade com os irmãos e com um dos pais pela função principal na família. Ainda que estejam iniciando a compartilhar, as crianças o fazem de modo relutante. É provável que uma competição ciumenta em relacionamentos com amigos e parceiros amorosos surja como resultado de exigências de posse exclusiva que não foram resolvidas de forma efetiva. Os pais precisam balancear a repreensão e a permissividade e colocar limites realistas para o comportamento da criança. (SADOCK, 2007) Já Jerusalinski, enfatiza que as matrizes organizadoras dos modos de relação do sujeito, se constituem na criança de um a três anos de vida quando afirma: Hoje, é consenso entre as mais diversas disciplinas dedicadas ao estudo do funcionamento mental que é principalmente durante os três primeiros anos de vida que se estabelecem as matrizes organizadoras dos modos de relação do sujeito com o mundo circundante, inclusos nisso, seus semelhantes. Marcas, traços singulares, língua, traumas, hábitos elementares, identificações primárias, tendências sexuais, diferenciação de coisas e pessoas (no referente a seu valor e função), posição do corpo na cultura e a fronteira entre o familiar e o estranho se definem nesse período e persistem como modos prevalentes (embora não exclusivos) durante a vida toda. [...] Para Lacan, as experiências infantis estruturam-se como inscrições, já que elas têm valor de letras em um texto (o texto do romance 14 familiar). Eis aqui a razão pela qual o inconsciente está estruturado como uma linguagem e, então, porque aquele responde de modo tão sensível ao campo da palavra. (JERUSALINSKI, 2012, p. 81 e 83). Vorcaro e Lamberte (2012) trazem sua contribuição nessa investigação a partir de pensar no modo como a criança de três a cinco anos faz sua escalada à dimensão simbólica, partindo do reconhecimento da impossibilidade de manter-se na dimensão imaginária em que se presume em reciprocidade integral com o agente de seus cuidados. Até então, a criança dependia dos cuidados da mãe, experimentando a ilusão de que poderia toma-la incondicionalmente como alvo das satisfações desejadas, enquanto assimilava sua relação de objeto do desejo materno e se precipitava em se dar nesse lugar. Almejando que a mãe responda aos seus apelos, a criança verifica que a intensidade das demandas é mútua, porque os investimentos maternos apontados a ela também são extraordinários; ainda que queira a mãe, tomando-a como objeto de suas demandas, a criança acanha-se ao intuir o risco de ser o objeto do desejo materno mesmo que, queira ser e não seja coincidente com o que falta à mãe. Deve-se observar que a incompletude de todo sujeito faltante faz dele um sujeito desejante e que todo desejo é desejo daquilo que falta, sentida mesmo que desconhecida. Deste modo, ao passo em que a criança realiza o desejo materno de filho, cobre uma falta materna. O velamento da condição de falta, faz da criança o falo materno, assim chamado na psicanálise, ou seja, o que completa o desejo materno. Anterior ao período edípico, a criança na condição de falo materno podia presumir uma correlação biunívoca entre ela e a mãe. Contudo, ela percebe um impasse: não tem como atender os investimentos caprichosos da mãe nem defender sua singularidade, com o risco de ser invalidado, a serviço do “querer” e do “não querer” materno. Ao procurar algo que a proteja do desejo materno, a criança verifica que assim como ela, a mãe também está sujeita a privações. Distingue a incidência sobre as duas, de uma barreira instransponível que as afasta. Para que a criança assimile essa barreira, primeiramente edificará o mito paterno onipotente, que domina a “voracidade materna”. (VORCARO E LAMBERTE, 2012). Pela transição mítica, a criança acaba com as permutações entre posições e funções, formando uma integração de medida simbólica da relação da criança à 15 alteridade. Daí a criança verifica que a divisão da lei, simultaneamente, regula as condições e assegura a realização do desejo. Essa passagem do complexo do édipo, busca trazer elementos que podem ser úteis acerca do que pode estar associado aos aspectos subjetivos à sintomatologia nessa faixa etária, assim como a reativação de conflitos em outras fases da vida. (VORCARO E LAMBERTE, 2012). 1.4 PERÍODO PRÉ-ESCOLAR Segundo Sadock, (2007) este período é caracterizado por um enorme crescimento físico e emocional da criança. Elas estão aptas a frequentarem a escola ao final deste estágio, aos 5 ou 6 anos. Dominam as atividades de socialização primária – controle dos intestinos, vestir-se e alimentam-se sozinhas, conter crises de choro e ira – na maior parte do tempo. Desenvolvimento linguístico e cognitivo: neste período a linguagem se amplia, as crianças começam a formar frases e pensar de forma simbólica. São incapazes de se colocar na posição de outra criança e de sentir empatia. Comportamento emocional e social: no início do período pré-escolar, as crianças são capazes de expressar afetos complexos, como amor, infelicidade, ciúme e inveja, nos níveis tanto não-verbal quanto verbal. Suas emoções ainda são naturalmente influenciadas por episódios somáticos, como cansaço e fome. A ansiedade relaciona-se à perda de uma pessoa amada, do qual a aprovação e aceitação a criança está sujeita. Contudo, ainda que seja potencialmente desorganizadora, a ansiedade é melhor aceita do que no passado. A expansividade, a curiosidade, o orgulho e a alegria são equilibrados com timidez, introversão, medo, ciúme e inveja, na relação consigo mesma e com a família. A vergonha e a humilhação são evidentes. Podem ocorrer sentimento de culpa. 16 Este período se conclui em um momento em que a consciência da criança já está formada. 1.5 ANOS INTERMEDIÁRIOS A partir daí surge o que se é nomeado de Anos Intermediários segundo Sadock (2007). Chamamos de anos intermediários o período entre os seis anos de idade e a puberdade. As crianças entram no ensino fundamental e as cobranças formais de aprendizagem e desempenho escolar tornam-se determinantes do desenvolvimento da personalidade. Neste período, as habilidades conceituais estão desenvolvidas, o pensamento se torna organizado e lógico. Nos anos intermediários, meninos e meninas buscam identificação com outros adultos, como os professores e orientadores. No começo dos anos intermediários começam a surgir a empatia e a preocupação com os outros. As emoções referentes a diferenciação sexual surgem na forma de excitação ou timidez frente ao sexo oposto. Ainda que os anos intermediários sejam chamados de “período de latência”, entende-se que uma grande quantidade de interesse sexual conserva-se no decorrer desses anos. As brincadeiras e curiosidades sexuais são corriqueiros entre meninos e meninas. Os meninos fazem comparações com os órgãos genitais, em alguns casos, participam de masturbação em grupo. (SADOCK, 2007) 1.6 ADOLESCÊNCIA A adolescência se caracteriza por mudanças evolutivas biológicas, psicológicas e sociais profundas. O início biológico da adolescência é marcado pela aceleração rápida do crescimento esquelético e pelo começo do desenvolvimento sexual. O início psicológico evidencia-se pela aceleração do desenvolvimento 17 cognitivo e pela consolidação da formação da personalidade. Do ponto de vista social, a adolescência é o período de preparação intensificada para o papel iminente do jovem adulto. O início da adolescência às vezes é marcado por rituais religiosos, sendo ainda reconhecida como um estágio do desenvolvimento humano. Porém, como fase definida, a adolescência é variável – na idade de início, na duração, no ritmo de crescimento, no desenvolvimento sexual e na maturação mental. A adolescência costuma ser dividida em três períodos: inicial (idades de 11 a 14), intermediária (idades de 14 a 17) e tardia (idades de 17 a 20). Essas divisões são arbitrárias. O crescimento e o desenvolvimento ocorrem ao longo de um continuum, que varia de pessoa para pessoa. A puberdade, um processo físico de mudança caracterizado pelo desenvolvimento de características sexuais secundárias, difere da adolescência que é um processo psicológico de mudanças amplas. Sob circunstâncias ideais, os processos são síncronos. Quando não ocorrem simultaneamente, e muitas vezes não ocorrem, os adolescentes enfrentam desequilíbrio e um estresse maior. A adolescência termina na idade adulta (SADOCK, 2007). O início da puberdade é marcado pela secreção de esteroides sexuais. Essa atividade hormonal produz as manifestações da puberdade tradicionalmente definidas como características sexuais primárias, envolvidas diretamente na relação sexual e na reprodução, e secundárias, que incluem seios e quadris maiores em meninas e pelos e voz mais grave em meninos. A altura e o peso aumentam antes nas meninas do que nos meninos. Aos 12 anos, elas geralmente são mais altas e pesam mais do que eles. Crescimento precoce ou retardado, acne, obesidade (cerca de 15% dos adolescentes), assim como glândulas mamárias aumentadas em meninos e seios pequenos ou abundantes em meninas, são alguns dos desvios do padrão de maturação esperado. Embora essas condições possam não ser significativas do ponto de vista médico, muitas vezes causam sequelas psicológicas. Os adolescentes são sensíveis às opiniões de seus amigos e se comparam com os outros constantemente. Qualquer desvio, real ou imaginado, pode levar a 18 sentimentos de inferioridade, baixa auto-estima e perda da confiança. (SADOCK, 2007) O início da puberdade varia, começando para as meninas de 12 a 18 meses antes dos meninos. A idade média é de 11 anos para elas (variando de 8 a 13) e de 13 para eles (variando de 10 a 14). A idade de início tem diminuído gradativamente ao longo dos últimos 100 anos. Uma das consequências é um período mais longo de maturidade sexual antes que o indivíduo seja cultural e socialmente considerado adulto. De modo geral, a puberdade precoce é uma vantagem para os meninos e uma desvantagem para as meninas. (SADOCK, 2007). No que se refere ao impulso sexual é desencadeado por determinados andrógenos, como a testosterona, que estão em níveis mais altos durante a adolescência do que em qualquer outra época da vida. No início da adolescência, os jovens frequentemente liberam as necessidades da libido por meio da masturbação, uma forma segura e natural de satisfazer impulsos sexuais, neste momento da vida. Como as meninas entram na puberdade dois anos antes que os meninos, podem começar a namorar e ter relações sexuais com uma idade mais precoce, mas as adolescentes são menos ativas sexualmente que os meninos da mesma idade, isso geralmente devido as questões culturais presentes ainda na sociedade atual. Anna Freud descreveu, que nesse período pode ocorrer a intelectualização e o ascetismo como dois mecanismos de defesa que os adolescentes usam normalmente para lidar com seus impulsos sexuais. A intelectualização se manifesta pelo envolvimento com ideias e livros. O asceticismo, como um recolhimento em grandes ideias e a renúncia aos prazeres corporais. A maioria dos adolescentes luta com o controle dos impulsos da libido. No início da adolescência, ainda estão apegados a suas famílias e, às vezes, têm sentimentos edipianos recorrentes e até mesmo fantasias sexuais com o progenitor do mesmo sexo ou do sexo oposto. Esses pensamentos e sentimentos normalmente são reprimidos, e a sexualidade é direcionada externamente. Paixões, idolatria de heróis e idealização de estrelas da música e do cinema são características desse estágio. 19 Na adolescência intermediária, o comportamento sexual e a experimentação de uma variedade de papéis sexuais são comuns. A masturbação ocorre como uma atividade normal para ambos os sexos nessa época, mas uma criação religiosa rígida pode produzir fortes sentimento de culpa. Paixões heterossexuais são comuns, muitas vezes para com uma pessoa inalcançável da mesma idade ou mais velha. Experiências homossexuais, ainda que passageiras, também pode ocorrer na adolescência intermediária. Muitos adolescentes precisam de garantias acerca da normalidade de uma experiência homossexual isolada, que não indica uma orientação homossexual permanente. Para outros, a orientação homossexual já está determinada nessa época. Esses adolescentes podem necessitar de aconselhamento sobre como lidar com sua orientação sexual. Embora muitos experimentem o sexo em uma idade precoce, pesquisas recentes indicam que a idade média para o primeiro intercurso sexual em ambos os sexos é 16 anos. (SADOCK, 2007) O desenvolvimento, a necessidade dos pares e a moralidade na adolescência. No início da adolescência, o pensamento normalmente se torna abstrato, conceitual e orientado para o futuro. Muitos adolescentes apresentam uma criatividade notável, que expressam em escrita, música, arte e poesia. A criatividade também é refletida nos esportes e em interesses pelo mundo das ideias – questões humanitárias, moral, ética e religião. Uma importante tarefa da adolescência é adquirir um sentido seguro de identidade. A crise de identidade é parcialmente resolvida pela passagem da dependência para a independência. “Não, eu não posso fazer sozinho. Não me diga como cortar o meu cabelo. Não me diga o tamanho da saia que posso usar”. Esse negativismo é uma tentativa renovada de dizer aos pais e ao mundo, que os jovens têm ideias próprias. Isso se torna uma maneira ativa e verbal de expressar raiva. 20 A maioria dos jovens consegue conciliar as exigências da escola e da vida familiar com poucas dificuldades. Transtornos sérios do humor e do comportamento durante a adolescência devem ser considerados sintomas potenciais de psicopatologias e exigem investigação. Quando começam a se sentir independentes de suas famílias e quando estas apoiam e encorajam sua maturidade crescente para constituir seu próprio sistema de crenças, o qual as questões “Quem sou eu?” e “Para onde vou?” começam a ser respondidas. Muitas vezes as respostas surgem quando da entrada em outras instituições que não familiares, podendo ser a entrada na escola a primeira dessas instituições. A experiência escolar acelera e intensifica a separação da família. Os adolescentes buscam estabelecer uma identidade pessoal distinta de seus pais, mas próxima o suficiente para que a estrutura da família seja incluída. Os adolescentes muitas vezes se veem através dos olhos do grupo de iguais, e qualquer desvio na aparência, modo de vestir ou comportamento pode resultar em uma diminuição da auto-estima. Os pais devem estar cientes nas mudanças frequentes e repentinas em amizades, aparência pessoal e interesses, mas devem renunciar à sua autoridade. Já a moralidade para os adolescentes é definida como a conformidade com padrões, direitos e deveres compartilhados. Quando dois padrões socialmente aceitos entram em conflito, a pessoa aprende a fazer julgamentos com base em um sentido de consciência individualizado. O estágio adolescente do desenvolvimento internaliza princípios éticos e o controle da conduta. O final da adolescência ocorre quando as pessoas começam a assumir as primeiras tarefas da idade adulta, que envolvem escolher uma profissão e desenvolver sentido de intimidade, que leva, na maioria dos casos, ao casamento e à paternidade, não que a ocorrência desses fatos indique o final da adolescência no que se refere ao psicológico. A taxa de depressão pode ser de até um em cada oito adolescentes. Estes muitas vezes rejeitam o cuidado de saúde por temerem que os médicos possam revelar a seus pais informações confidenciais sobre questões delicadas. Contudo, 21 em muitas situações, é possível que tomem as próprias decisões no que diz respeito à sua saúde. (SADOCK, 2007). O Adolescente e sua Singularidade Segundo Maria Teresa Lamberte e Eda Tavares (2012), para conhecermos os processos constitutivos na adolescência é preciso verificarmos alguns aspectos estruturais da sua subjetividade: O termo adolescência, mesmo não tendo se originado na psicanálise, pode ser situado como uma etapa constitutiva da formação do sujeito, desde Freud. Embora este nunca o tenha empregado (referiu-se à puberdade), ao construir todo um campo de fundamento sobre a formação do psiquismo no falante, junto à condição da sexualidade, trouxe importante contribuição no entendimento sobre a adolescência, para além dos marcos biológicos e mesmo de uma restrição na temporalidade cronológica do ser em seu desenvolvimento (2012, p.119). Arminda Aberastury e Maurício Knobel descrevem a Síndrome Normal da Adolescência1 em dez itens: busca de si mesmo e de identidade, tendência grupal, necessidade de intelectualizar e de fantasiar, crise religiosa que pode ir do ateísmo ao misticismo, não situação temporal, evolução sexual que vai do autoerotismo à heterossexualidade genital manifesta, atitude social com tendências antissociais, contradições sucessivas nas manifestações de conduta, separação progressiva dos pais, constantes flutuações do humor e do ânimo, vivência de luto (perda do corpo infantil, perda da identidade infantil e perda da relação com os pais da infância). (LAMBERTE E TAVARES, 2012). Conforme Lamberte e Tavares: A passagem da infância para a vida adulta diz respeito a uma ruptura com a situação subjetiva anterior. A adolescência é justamente o período dessa ruptura. O sujeito, despertado pelas mudanças pubertárias, assim como pelo que passa a ser convocado em seu mundo de relações, vê-se estruturalmente em um estado de vulnerabilidade, à medida que os valores de até então necessitarão de uma ressignificação (2012, p. 123). 1 Citação de Arminda Aberastury e Maurício Knobel e o título é da autora: Síndrome da Adolescência Normal. 22 Agora, deverá haver decisão a ser tomada, o caminho a seguir, como resposta própria, para além do ideário recebido como legado daqueles que o antecederam. Como escreveu Françoise Dolto, “tempo de provas”, em que o maior avaliador será o próprio sujeito, ao deparar-se com o que será possível buscar realizar, para além do mundo dos sonhos. Segundo Lamberte e Tavares (2012, p.124) “A adolescência será o tempo que cada um levará para concluir sobre sua tomada de decisão, diante da vocação, das escolhas amorosas e da sexualidade”. A puberdade provoca alterações acentuadas em nível fisiológico, com significativas transformações corporais. Mas o que permite que essas transformações adotem uma relevância singular vai se lançar no lugar que elas ocupem no funcionamento psíquico do adolescente. Sabem-se que, em algumas doenças psíquicas graves, essas alterações ocorrem quase despercebidamente ou se manifestam como desordem, turbulência ou estados de ansiedade cuja fonte é uma excitação sem destino. Portanto, depende de como esse adolescente e os demais que o cercam vierem a adotar esse período que vai ser determinante nas manifestações próprias da adolescência. Perante as alterações que a puberdade insere, as sociedades tradicionais proporcionavam rituais de passagem através dos quais essas alterações se inscreviam, assim adotando a nova posição do adolescente. A carência desses rituais na sociedade deixa aos adolescentes o trabalho psíquico solitário de ter de responder por si próprio, o que comumente os induz a inventar rituais próprios. A busca de reconhecimento de sua nova posição como sujeito sexuado e as pequenas possibilidades de encontra-lo é o que faz com que o adolescente se precipite na paternidade e na gravidez precoce (LAMBERTE E TAVARES, 2012). Segundo Lamberte e Tavares: As modificações corporais desse momento recolocam em causa a imagem corporal e a necessidade de se reapropriar dela. Se, durante todo o período da infância, a relação e o olhar dos pais era elemento privilegiado na construção da imagem corpórea da criança, há uma modificação importante desse na adolescência. A importância de encontrar um lugar no mundo, de deixar a posição de criança, faz com que o olhar privilegiado, que antes era dos pais, passe a ser dos pares e, principalmente, do outro sexo: um corpo 23 a ser desejado e que deseja e, assim, se iniciará na paquera, no olhar e ser olhado (2012, p. 127). Os temas referentes a violência, a delinquência e a sexualidade, questões que cruzam a clínica da adolescência, ganharão distintas representações sociais em cada período, mas é um imperativo irredutível indagar quem é o sujeito do sintoma, em sua singularidade, para além das marcas sociais que a cultura envolve nas nosologias, nas nomeações diagnósticas (LAMBERTE E TAVARES, 2012). Referente a adolescência, Maria Teresa Lamberte e Eda Tavares concluem: A adolescência é o período que o sujeito leva para se desvencilhar de suas velhas roupagens da infância, dos cenários domésticos de seus amores parentais e, após este, reposicionar-se com autonomia em suas escolhas amorosas e vocacionais. É um período marcado por perdas, transformações, descobertas, vulnerabilidade. Um período de necessidade irredutível de experimentação, de sair progressivamente do casulo, de dar voz a sua palavra, de decisão. Esses elementos poderiam ser situados isoladamente em qualquer outra etapa da vida em que também ocorreram transformações biológicas, como gravidez, doenças, envelhecimento, etc., mas, na adolescência, pode-se dizer que é o período inaugural no qual as consequências sobre o exercício de sua sexualidade, a partir da prontidão somática, convocarão o sujeito a responder a partir de um novo lugar, sobre seu desejo e, sobretudo, a responsabilizar-se por suas escolhas e atitudes. Sobre os aspectos psíquicos, a adolescência, assim como é tomada no campo médico, é uma etapa iniciada pelos marcos pubertários. Seu término, no entanto, dependerá do tempo necessário que cada um levará nessa travessia (2012, p. 131). Neste momento da pesquisa encerramos as considerações sobre infância e adolescência, tendo clareza que muito ainda poderíamos percorrer nesse campo, porém se faz necessário, entrelaçarmos esses conhecimentos com a patologia que é objetivo especifico desse trabalho de conclusão de curso. Sendo assim abordaremos no capítulo seguinte considerações sobre o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e procurar, na medida do possível, relacionar suas consequências ao período da infância e adolescência. 24 2 CONSIDERAÇÕES COMPULSIVO GERAIS SOBRE O TRANSTORNO OBSESSIVO- No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), da Associação Psiquiátrica Americana, o capítulo que trata do Transtorno ObsessivoCompulsivo (TOC) e Transtornos Relacionados, vem após o capítulo dos Transtornos de ansiedade, devido à íntima relação entre esses transtornos. O TOC é um transtorno heterogêneo, que pode manifestar-se por meio de uma grande diversidade de sintomas. Considerado raro até pouco tempo, hoje se reconhece que o TOC é um transtorno mental muito comum, acometendo entre 1,6 a 2,3% dos indivíduos durante a vida ou quase um em cada 40 a 60 indivíduos. (CORDIOLI, 2008). Conforme Aristides Volpato Cordioli: O TOC hoje em dia é considerado uma doença mental grave por vários motivos: de acordo com a Organização Mundial de Saúde, está entre as 10 maiores causas de incapacitação das pessoas; acomete preferencialmente indivíduos jovens ao final da adolescência – e muitas vezes começa ainda na infância, sendo raro seu início depois dos 40 anos. Seu curso geralmente é crônico e, se não tratado, tende a manter-se por toda a vida, raras vezes desaparecendo por completo de forma espontânea. Em aproximadamente 10% dos casos, seus sintomas são graves e tendem a agravar-se de forma progressiva, podendo incapacitar os portadores para o trabalho e acarretar limitações significativas à convivência com os demais, além de submeter seus portadores a um grande e permanente sofrimento. (2008, p. 12). As características fundamentais do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) são obsessões ou compulsões repetitivas, suficientemente graves para acarretar sofrimento evidente. As obsessões e as compulsões gastam tempo e intervêm de modo expressivo na rotina habitual do indivíduo, na execução ocupacional, nas atividades usuais e nos relacionamentos. O paciente pode apresentar obsessão, compulsão ou ambas. Segundo Sadock: A obsessão é um pensamento, sentimento, ideia ou sensação recorrente e intrusiva. Em contraste com esta, que é um acontecimento mental, a compulsão é um comportamento. Especificamente, uma compulsão é um comportamento consciente, padronizado, recorrente, como contar, verificar 25 ou evitar. O paciente com TOC se dá conta da irracionalidade das sensações e experimenta tanto a obsessão como a compulsão como egodistônicas (i.e., comportamentos indesejáveis). (2007, p. 657). Apesar de o ato compulsivo consistir em uma tentativa de atenuar a ansiedade associada à obsessão, quase não existe êxito em realiza-lo. Concluir o ato compulsivo pode não afetar a ansiedade, mas inclusive ampliá-la. A ansiedade também aumenta quando o indivíduo resiste à realização da compulsão (SADOCK, 2007). Segundo o DSM-5: Muitos indivíduos com TOC têm crenças disfuncionais. Essas crenças podem incluir senso aumentado de responsabilidade e tendência a superestimar a ameaça; perfeccionismo e intolerância à incerteza; e importância excessiva dos pensamentos (p. ex. acreditar que ter um pensamento proibido é tão ruim quanto executá-lo) e necessidade de controla-los. (2014, p. 238) 2.1 ETIOLOGIA Uma das perguntas mais comuns feitas pelos portadores do TOC é em relação à causa desse transtorno. Tem sido registrado como fatores que influenciam no aparecimento e na manutenção dos sintomas, os fatores neurobiológicos e os psicológicos. Realmente, não se sabe com exatidão qual é a causa (ou as causas). Segundo Cordioli: Até há bem pouco tempo, acreditava-se, a partir das teorias de Freud, que as obsessões e as compulsões eram manifestações de problemas psicológicos inconscientes, consequências do chamado “determinismo psíquico”, que obrigaria as pessoas a repetirem ao longo da vida padrões mal-adaptativos de conduta, em razão de conflitos não-resolvidos nos primeiros anos de vida, e que conseguir compreender e resolver tais conflitos era o caminho para a cura dos sintomas. (2008, p. 33). A Terapia de Orientação Analítica ou a Psicanálise buscavam retirar os sintomas tratando esses conflitos. Na prática, não se confirmou a relação dos sintomas obsessivos compulsivo com conflitos inconscientes advindos da infância, tampouco as terapias baseadas nessa teoria se manifestaram eficazes para retirálos. (CORDIOLI, 2008). 26 Referente aos fatores neurobiológicos, Segundo Cordioli (2008, p. 35) “pesquisas têm evidenciado com frequência que o cérebro de portadores do TOC apresenta algumas diferenças quando comparado ao cérebro de não portadores, especialmente no seu funcionamento”. Também têm sido evidenciadas, embora haja controvérsias, alterações anatômicas, o que fortalece a presunção de o TOC ser uma doença neuropsiquiátrica. Cordioli (2008, p. 35) destaca entre essas evidências “redução dos sintomas obsessivos-compulsivos (OC) com uso de medicamentos, os estudos de neuroimagem e os estudos de imagens do cérebro em funcionamento, que são identificadas áreas cerebrais hiperativas nos portadores, assim como alterações anatômicas e neuroquímicas”. Sadock (2007) também aponta algumas evidências causadoras do TOC: Fatores Biológicos: Neurotransmissores (sistema serotonérgico): as diversas experiências clínicas com medicamentos abordam a hipótese de que a desregulação da serotonina esteja envolvida na etiologia das obsessões e compulsões, mas esta hipótese ainda não apresenta clareza, devido à necessidade de maiores investigações nos mecanismos de ação dos medicamentos. Genética: as informações genéticas disponíveis sobre o TOC abordam a hipótese de que o mesmo tem um componente genético significativo. Entretanto, não diferenciam ainda os fatores hereditários da extensão dos efeitos culturais e comportamentais sobre a difusão do transtorno. Outros dados biológicos: estudos eletrofisiológicos, com eletroencefalograma (EEG) de sono e neuroendócrinos contribuíram com informações que sugerem alguns fatos comuns entre transtornos depressivos e o TOC. Ocorre uma incidência mais elevada do que o habitual de anormalidades inespecíficas no EEG em pacientes com TOC. (SADOCK, 2007). Fatores comportamentais: Segundo os teóricos do aprendizado, as obsessões são estímulos condicionados. Um estímulo relativamente neutro passa a se associar a medo ou ansiedade por um processo de resposta condicionada. Dessa maneira, objetos e 27 pensamentos antecipadamente neutros tornam-se estímulos condicionados capazes de provocar ansiedade e desconforto. As compulsões são postas de maneira diferente. Quando o indivíduo acha que certa ação reduz a ansiedade ligada a um pensamento obsessivo, desenvolve estratégias ativas de evitação sob a forma de compulsões ou rituais para controlar a ansiedade. (SADOCK, 2007). Fatores psicossociais a) Fatores da personalidade: o TOC se diferencia do transtorno da personalidade obsessivo-compulsivo. Somente 15 a 35% de pacientes com TOC têm traços obsessivos pré-mórbidos. b) Fatores psicodinâmicos: a condição que atualmente se denomina TOC, Freud definiu neurose obsessiva. No caso “O Homem dos ratos”, ele indicou que as obsessões e as compulsões eram manifestações do inconsciente, ocorridos nos primeiros anos do desenvolvimento, na chamada fase anal do desenvolvimento psicossexual. Na neurose obsessiva, aconteceria uma regressão da fase edípica para a fase anal-sádica do desenvolvimento, em virtude de fixações nessa fase. (CORDIOLI, 2008). 2.2 SINTOMAS As obsessões e compulsões se apresentam de forma heterogênea em adultos e em crianças e adolescentes. Em um mesmo paciente, os sintomas podem se sobrepor e alterar com o tempo, porém o TOC tem quatro tipos de sintomas principais: contaminação, dúvida patológica, pensamentos intrusivos e simetria. A obsessão de contaminação é o sintoma mais comum, acompanhada pelo lavar ou pela compulsão de evitar objetos contaminados. Por vezes é difícil evitar o objeto temido (p. ex. germes, urina, fezes, poeira). Literalmente os pacientes podem arrancar a pele das mãos pela lavagem excessiva ou podem ser impossibilitados de sair de casa por medo dos germes. Geralmente os pacientes acreditam que a contaminação se transmite de pessoa a pessoa, de objeto a objeto com o mínimo de 28 contato. A vergonha e o nojo obsessivo também são repetitivos, apesar da ansiedade ser a resposta emocional mais comum ao objeto temido. A obsessão da dúvida é o segundo sintoma mais comum, acompanhado pela compulsão de verificar. A obsessão às vezes provoca certo perigo de violência (p. ex. esquecer-se de desligar o fogão ou não trancar a porta). A verificação pode ocasionar várias idas até a casa para verificar o fogão. No terceiro tipo de sintoma, há pensamentos obsessivos intrusivos sem compulsão. Geralmente, essas obsessões são pensamentos repetitivos de um ato sexual agressivo que é imperdoável para o paciente. Pacientes obstinados com pensamentos de práticas agressivas ou sexuais podem se denunciar à polícia ou a se confessar a um padre. A obrigação de simetria ou precisão que pode levar a compulsão ou lentidão é o quarto tipo. Os pacientes podem levar horas para fazer uma refeição ou barbear o rosto. Há outros padrões de sintomas comuns em pacientes com TOC como obsessões religiosas e o poupar compulsivo. A tricotilomania (arrancar cabelos compulsivo) e morder as unhas podem ser compulsões relacionadas ao transtorno. (SADOCK, 2007). 2. 3 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS SEGUNDO O DSM-5 (2014): A Tabela abaixo apresenta os critérios para o diagnóstico do TOC, e, também para diferenciá-lo a partir da sintomatologia outros tipos de transtornos. Critérios Diagnósticos 300.3 (F42) A. Presença de obsessões, compulsões ou ambas: Obsessões são definidas por (1) e (2): 1. Pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes que, em algum momento durante a perturbação, são experimentados como intrusivos e indesejados e que, na maioria dos indivíduos, causam acentuada ansiedade ou sofrimento. 29 2. O indivíduo tenta ignorar ou suprimir tais pensamentos, impulsos ou imagens ou neutralizá-los com algum outro pensamento ou ação. As compulsões são definidas por (1) e (2): 1. Comportamentos repetitivos (p. ex. lavar as mãos, organizar, verificar ou atos mentais (p. ex. orar, contar ou repetir palavras em silêncio) que o indivíduo se sente compelido a executar em resposta a uma obsessão ou de acordo com regras que devem ser rigidamente aplicadas. 2. Os comportamentos ou os atos mentais visam prevenir ou reduzir a ansiedade ou o sofrimento ou evitar algum evento ou situação temida: entretanto, esses comportamentos ou atos mentais não têm uma conexão realista com o que visam neutralizar ou evitar ou são claramente excessivos. Nota: crianças pequenas podem não ser capazes de enunciar os objetivos desses comportamentos ou atos mentais. B. As obsessões e compulsões tomam tempo (p. ex. tomam mais de uma hora por dia) ou causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo do funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. C. Os sintomas obsessivo-compulsivos não se devem aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex. droga de abuso, medicamento) ou a outra condição médica. D. A perturbação não é mais bem explicada pelos sintomas de outro transtorno mental (p. ex. preocupações excessivas, como no transtorno de ansiedade generalizada; preocupação com a aparência, como no transtorno dismórfico corporal; dificuldade de descartar ou se desfazer de pertences, como no transtorno de acumulação; arrancar os cabelos, como na tricotilomania (transtorno de arrancar o cabelo); de beliscar a pele, como no transtorno de escoriação (skin-picking); estereotipias, como no transtorno de movimento estereotipado; comportamento alimentar ritualizado, como nos transtornos alimentares; preocupação com substâncias ou jogo, como nos transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos; preocupação em ter uma 30 doença, como no transtorno de ansiedade de doença; impulsos ou fantasias sexuais, como nos transtornos parafílicos; impulsos, como nos transtornos disruptivos, do controle de impulsos e da conduta; ruminações de culpa, como no transtorno depressivo maior; inserção de pensamento ou preocupações delirantes, como nos transtorno do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos; ou padrões repetitivos de comportamento, como no transtorno do espectro autista). Especificar se: Se com insight bom ou razoável: o indivíduo reconhece que as crenças do transtorno obsessivo-compulsivo são definitivas ou provavelmente não verdadeiras ou que podem ou não ser verdadeiras. Com insight pobre: o indivíduo acredita que as crenças do transtorno obsessivo-compulsivo são provavelmente verdadeiras. Com insight ausente/crenças delirantes: o indivíduo está completamente convencido de que as crenças do transtorno obsessivo-compulsivo são verdadeiras. Especificar se: Relacionado ao tique: o indivíduo tem história atual ou passada de um transtorno de tique. Fonte: DSM 5, 2014, p. 237. O termo insight, no contexto do TOC, refere-se à experiência para identificar obsessões e compulsões como absurdas, excessivas e irracionais apesar de, com frequência, não resistirem aos impulsos de praticarem rituais. (BORTONCELLO et al, 2014). Para que seja confirmado o diagnóstico do TOC, recomenda-se avaliar, além da presença de obsessões e ou compulsões, o quanto os sintomas causam intenso sofrimento, tomam o tempo ou interferem de modo considerável nas rotinas do dia a dia, no desempenho escolar, nas relações sociais e interpessoais da criança e do adolescente. O DSM 5 estabelece que as obsessões ou os rituais se apresentem em pelo menos uma hora por dia. (BORTONCELLO et al, 2014). 31 Diagnóstico diferencial Após o estabelecimento do diagnóstico, é essencial distinguir os sintomas Obsessivos-Compulsivos (OC) de outros transtornos que também se apresentam por preocupações (obsessões) e comportamentos compulsivos. Os tiques e Transtorno de Tourette, TDAH, Transtorno do controle de impulsos (tricotilomania, comportamentos auto mutilativos), Transtornos cognitivos e do desenvolvimento (transtornos globais do desenvolvimento, autismo, síndrome de Asperger, Prader Willi), Transtornos neuropediátricos associados a infecções pelo estreptococo são comuns de serem confundidos com o TOC. (BORTONCELLO et al, 2014). Comorbidades Crianças com TOC são mais predispostas a apresentarem transtornos psiquiátricos comórbidos. Deve-se averiguar juntos aos pais e a própria criança se já apresentou outros problemas psiquiátricos e se já fez ou vem fazendo tratamentos. Segundo Bortoncello et al (2014, p. 11) “identificar essas comorbidades antes do início da Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) e trata-las antes ou durante a terapia se for o caso, pode melhorar os resultados do tratamento”. E continua essa afirmação apresentando dados de um estudo: Um estudo com 96 crianças e adolescentes, verificou que pelo menos 74% delas preenchiam critérios para pelo menos uma comorbidade. O número de comorbidades se correlacionou negativamente com os resultados da TCC. A presença de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), depressão maior e transtorno do comportamento disruptivo teve um impacto negativo na resposta ao tratamento, que não foi afetado pela presença de tiques. Outro estudo com 75 pacientes crianças e adolescentes verificou que 36% delas tinham um ou mais diagnósticos em eixo I; 10,7% apresentavam depressão, 9,3% apresentavam tiques, 6,7% transtorno do espectro do autismo, 4% Sindrome do Tourett; 2,7% transtorno alimentar, 2,7% Transtorno Desafiador Opositor (TOD), 2,7% outros transtornos de ansiedade, e 2,7% transtorno de ansiedade de separação. (BORTONCELLO et al, 2014, p. 11). Tal como em adultos, em adolescentes a depressão é a comorbidade mais habitual. Um estudo recente constatou que 16% dos adolescentes com TOC manifestavam depressão associada, sendo que foi mais comum em meninas. 32 Estava também associada a maior gravidade dos sintomas obsessivos compulsivos (OC), maior comprometimento funcional e a maiores níveis de acomodação familiar. (BORTONCELLO et al, 2014). 2.4 CONSEQUÊNCIAS PSÍQUICAS PARA A CRIANÇA E O ADOLESCENTE O Transtorno Obsessivo-compulsivo, tem uma íntima relação com o transtorno de ansiedade, por essa razão, no DSM-5, o TOC é um capítulo que vem após os Transtornos de Ansiedade. De acordo com Junior, Alvarenga e Manfro (2012): A ansiedade é um estado emocional decorrente da resposta cerebral antecipada a um estímulo percebido pelo indivíduo como perigoso. É caracterizada pela presença de sintomas físicos, acompanhados de uma representação cognitiva e de modificações no comportamento em curto e longo prazo. Em diversas circunstâncias essa resposta emocional, cognitiva e comportamental constitui-se em um mecanismo evolutivo que auxilia o indivíduo a adotar medidas necessárias para lidar com o “perigo”. Por essa razão, certo grau de ansiedade diante de uma situação potencialmente ameaçadora é esperado e é um comportamento adaptativo para o ser humano. A ansiedade passa a ser caracterizada como um transtorno psiquiátrico quando se torna uma emoção desagradável e incômoda, que surge sem um estímulo externo definido ou proporcional para explica-la. Nesses casos, intensidade, duração ou frequência são desproporcionais, causam sofrimento ao sujeito e estão associadas a uma série de desfechos negativos quanto à saúde geral, prejuízo no desempenho escolar, social e profissional. (2012, p. 193). O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é muito normal na infância e, especialmente na adolescência, pelo simples motivo de que na maior parte das vezes tem início nessas faixas etárias, provavelmente muito cedo, antes dos dois anos. (BORTONCELLO et al, 2014). Os hábitos diários no momento de comer, vestir, dormir, ir para a escola, participar de esportes e atividades, fazer as tarefas de casa e inclusive atividades prazerosas como brincar com outras crianças, podem ser visivelmente alteradas pelo transtorno. As próprias crianças com TOC veem seu comportamento como esquisito e diferenciado do comportamento dos seus companheiros, têm vergonha, e diversas vezes necessitam disfarçar ou retirar-se para realizar seus rituais compulsivos. Ocasionalmente não utilizam o banheiro da escola, nem se aproximam 33 de seus colegas para impossibilitar qualquer contato físico e receiam que possam estar ficando “loucos”. Como princípio, o TOC nessas etapas da vida causa sofrimento enorme, prejudicam no rendimento escolar, nas relações sociais e, acima de tudo, no andamento familiar. Não incomum, os sintomas são muito intensos e incapacitantes e vêm seguidos de medos fortes que podem suceder a ataques de pânico, impossibilitando a criança ou o adolescente de frequentar a escola ou de relacionar-se com os colegas. Embora sendo excessivamente prevalente em crianças e adolescentes, o TOC diversas vezes não é identificado pela família, o que acaba ocasionando um extenso período entre o começo dos sintomas e a busca de tratamento. Um dos obstáculos para o reconhecimento precoce está no fato de o começo do TOC frequentemente ser traiçoeiro, o que faz com que várias vezes, seja percebido somente quando já está afetando intensamente no cotidiano da criança. Diante disso, alguns familiares são aptos a indicar o momento certo em que a criança manifestou os primeiros sintomas. (BORTONCELLO et al, 2014). Para os pais é dificultoso diferenciar o que é um comportamento normal do que é excessivo, não raro dando-se conta de que algo não está certo quando os sintomas já estão fortes (p. exemplo quando o filho demora muito tempo no banho, quando demora em se vestir, não quer mais dormir sozinho ou quando faz a mesma pergunta repetidas vezes). O primeiro sinal em muitas crianças e adolescentes acontece na escola, quando os pais são solicitados a comparecer por motivo de comportamentos anormais como retirar-se dos colegas na hora do recreio, não desejar brincar na caixa de areia ou não querer mais usar o banheiro. Esses sinais frequentemente são seguidos de nítida queda no rendimento escolar e eventualmente por não querer mais frequentar as aulas. Ressalta-se ainda que o TOC pediátrico frequentemente esteja relacionado à comorbidades como tiques ou síndrome de Tourette (ST), depressão, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno de oposição desafiante (TOD), comportamento disruptivo, caracterizando uma condição diversas vezes complexa e de árduo manejo. O TOC em crianças e adolescentes acarreta muita perturbação no funcionamento familiar. Os rituais compulsivos modificam as rotinas da família pela 34 exigência aos demais membros de normas referentes ao TOC, como a limitação ao uso do banheiro, poltronas, controle da TV ou do computador. (BORTONCELLO et al, 2014). Bortoncello et al (2014) reforçam que: Na infância comportamentos repetitivos, rituais, medos e fobias eventuais, fazem parte do desenvolvimento normal e devem ser diferenciados dos sintomas do TOC. Por exemplo, crianças pré-escolares apresentam rituais principalmente nos horários de dormir (formas ritualizadas de dizer “boa noite”, rezas), esses comportamentos repetitivos tendem a ser ainda mais frequentes entre os 2 e 4 anos de idade (Evans et al, 1997). Na idade escolar, rituais permeiam os jogos, que passam a ter regras rígidas, intensamente discutidas e negociadas, frequentemente consumindo mais tempo que a própria brincadeira. São comuns os interesses por coleções (figurinhas, modelos de carros, aviões, acessórios do Herry Potter ou do Senhor dos Anéis, etc. (2014, p. 04) Já no que se refere à adolescência eles comentam que: Na adolescência, são esperados interesses intensos por celebridades, artistas, estilos musicais ou por uma determinada banda, bem como a coleção de objetos, roupas ou lembranças de um ídolo. Na maior parte das vezes, essas atividades tem um caráter lúdico, são prazerosas, persistem durante uma determinada fase do desenvolvimento, mas não interferem nas atividades diárias ou prejudicam o desempenho escolar, ao contrário dos rituais obsessivos que são acompanhados de medos, angústias e evitações. (2014, p. 04) 2.5 MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DO TOC EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES É importante realizar uma busca ativa de sintomas associados aos transtornos de ansiedade na infância, tendo em vista que muitas vezes esses sintomas aparentemente não são percebidos pela família ou pela criança como problemas. Os sintomas podem ser físicos (dificuldade de respirar, dor de cabeça, dor de barriga, palpitação, tremor, sudorese excessiva, náusea, tontura), cognitivos (medo de perder o controle, medo de não atingir as expectativas, preocupação com o futuro, obsessões) e comportamentais (timidez excessiva, medo de dormir fora de casa, comportamentos repetitivos ou acentuação das rotinas normais). O TOC é tido como de início precoce ou na infância quando se manifesta antes da puberdade e tardio ou adulto quando se manifesta durante a adolescência ou após dela. Os sintomas mais frequentes na infância são: os medos de 35 contaminação seguidos de compulsões de limpeza e lavagens (ex. não dividir um lanche, evitar utilizar o banheiro da escola ou da casa de um amigo por achar nojento/sujo, lavagens excessivas e ritualizadas das mãos), dúvidas seguidas de verificações ou de perguntas repetidas ou da necessidade de confirmações, seguidos muitas vezes por evitações. Também é sintoma frequente as preocupações com simetria, alinhamento ou exatidão (ex. os temas de casa, reler inúmeras vezes uma página de um livro), acumulação compulsiva (ex. guardar brinquedos quebrados, cadernos e folhas velhas e dificuldades de descarta-las). Um estudo constatou que os meninos apresentavam mais obsessões de conteúdo sexual indesejado (34% vs. 18%) e as meninas mais compulsões por acumular (53% vs. 36%). (BORTONCELLO et al, 2014). 2.6 POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO Tratamento As formas de tratamento do Transtorno Obsessivo-Compulsivo podem ser através da Farmacoterapia (Inibidores Seletivos da Recaptação de Serotonina (ISRS), Clomipramina e outros medicamentos), da Terapia Cognitivo- Comportamental, da Psicoterapia e outros Tratamentos. Segundo Sadock: Com a crescente evidência de que o TOC é, em grande parte, determinado por fatores biológicos, a terapia psicanalítica clássica tem sido desfavorecida. Além disso, em vista de os sintomas parecerem refratários à psicoterapia psicodinâmica e à psicanálise, os tratamentos farmacológicos e comportamentais se tornaram comuns. No entanto, os fatores psicodinâmicos podem ser de benefício considerável na compreensão do que precipita as exacerbações do transtorno e no tratamento de várias formas de resistência ao mesmo, como a não adesão aos medicamentos. (2007, p. 663). Diversos pacientes com TOC lutam fortemente aos esforços de tratamento, recusando-se a tomar a medicação até a realização de tarefas recomendadas pelos terapeutas comportamentais. De acordo com Sadock (2007, p. 663) “os sintomas obsessivo-compulsivos por si só, não importa o quão baseado em dados biológicos, podem ter significados psicológicos importantes que tornem os pacientes relutantes 36 em abandoná-los. A exploração da psicodinâmica da resistência ao tratamento pode melhorar a adesão”. 2.7 TRATAMENTOS FARMACOLÓGICOS Pesquisas criteriosas constataram que a farmacoterapia, a terapia comportamental ou a combinação das duas é eficaz para diminuir os sintomas de maneira expressiva. A disposição sobre que tratamento empregar funda-se na avaliação e no conhecimento do clínico e na concordância, pelo paciente, das diversas modalidades. Conforme Sadock: A eficácia da farmacoterapia no TOC foi comprovada em vários ensaios clínicos e é reforçada pela observação de que os estudos verificam uma taxa de resposta a placebo de apenas cerca de 5%. Os medicamentos, alguns utilizados para tratar transtornos depressivos e outros transtornos mentais, podem ser administrados em suas faixas habituais de dosagem. Os efeitos iniciais costumam ser observados após 4 a 6 semanas de tratamento, embora 8 a 16 semanas sejam, em geral, necessárias para se obter o benefício terapêutico máximo. O tratamento com antidepressivos ainda é controverso, e uma proporção significativa de pacientes com TOC que respondem ao tratamento com antidepressivos parece ter recaída quando essa abordagem é interrompida. (2007, p. 663). A intervenção-padrão é dar início ao tratamento com ISRS ou com a clomipramina e, a seguir, trocar para outras táticas farmacológicas se a medicação exclusiva para a serotonina for ineficaz. A probabilidade de pacientes com TOC responderem ao tratamento com serotonérgicos aumentou para 50 a 70%. (SADOCK, 2007). Os ISRSs disponíveis nos Estados Unidos – fluoxetina (Prozac), fluvoxamina (Luvox), paroxetina (Aropax) e sertralina (Zoloft) – foram aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) para o tratamento do TOC. Mesmo que os ISRSs possam ocasionar transtornos do sono, náuseas, diarreia, cefaleia, ansiedade e inquietação, essas decorrências adversas tendem a ser passageiras e em geral, pouco perturbadoras do que as ocorrências adversas ligadas aos antidepressivos tricíclicos, como a clomipramina. Os ISRSs, quando 37 empregados em combinação com a terapia comportamental incidem em melhores resultados clínicos. A eficácia da clomipramina em relação à receptação da serotonina só é desempenhada pela sertralina e pela paroxetina. A clomipramina foi o primeiro medicamento a ser aprovado pela FDA para o tratamento do TOC. Quando o tratamento com clomipramina ou um ISRS não tem êxito, muitos terapeutas potencializam o primeiro medicamento com o acréscimo de valproato (Depakene), lítio (Carbolitium) ou carbamazepina (Tegretol). Outros medicamentos que podem ser tentados são a venlafaxina (Efexor), o pindolol (Visken e os inibidores de monoaminoxidase, principalmente a fenelzina (Nardil). (SADOCK, 2007). Comumente, a criança e o adolescente têm o pediatra e o hebiatra como os principais médicos a recorrerem em situações de adoecimento psíquico. Além do que, por consequência da grande prevalência de transtornos mentais, é comum haver pacientes em tratamento medicamentoso para essas situações. A utilização de psicofármacos em crianças e adolescentes começa a ser incluído na atividade clínica a partir de 1980, apesar de já existir relatos desde meados da década de 1930. Posto que, as intervenções sociais, familiares e individuais (não medicamentosas) foram e continuam primordiais. Em 1989 foi realizado estudo duplo-cego com clomipramina para o tratamento do TOC e em 1990 o primeiro relato de tratamento com fluoxetina em crianças com TOC. Hoje, diversos psicofármacos apresentam indicações similares aos estabelecido para os adultos, ao passo que outros ainda requerem mais estudos nos indivíduos infanto-juvenis. (BOARATI, ANDRADE E MAIA, 2012) Vejamos na tabela abaixo, as principais classes de psicofármacos utilizados em crianças e adolescentes com TOC: Medicação Dose efetiva Aprovação FDA Antidepressivos Fluoxetina 2,5 a 40mg Acima de oito anos 38 Sertralina 25 a 200mg Aprovado apenas para o TOC Fluvoxamina 12,5 a 200mg Aprovado apenas para o TOC, a partir dos 10 anos Tricíclicos Clomipramina Até 3mg/kg/dia Aprovado a partir dos 10 anos Fonte: Livro Psiquiatria da Infância e Adolescência. Guilherme Venoni Polanczyk e Maria Teresa Martins Lamberte, p. 370-371. Segundo Cordioli, em Psicofármacos (2011, p. 511) “os ISRS ainda são considerados de primeira escolha no tratamento do TOC em crianças e adolescentes”. De acordo com Boarati, Andrade e Maia: O tratamento farmacológico é parte da abordagem terapêutica das diferentes condições psicopatológicas presentes na infância e na adolescência, devendo sempre vir associada a outras abordagens não farmacológicas (psicoterápicas, psicoeducacionais, orientação, etc.). (2012, p. 380) 2.8 PSICOTERAPIAS Inicialmente chamada de cura pela fala, a psicoterapia tem suas origens na medicina antiga, na religião, na cura pela fé e no hipnotismo. (CORDIOLI, 2008). Conforme Cordioli: As psicoterapias, na atualidade, fazem parte do plano de tratamento de praticamente todos os transtornos mentais, além de serem reconhecidamente eficazes no auxílio a pessoas que estejam passando por problemas emocionais, dificuldades em relações interpessoais ou toda sorte de crises existenciais. (2008, p. 11) O começo da psicoterapia com crianças e adolescentes ocorre com o princípio da psicoterapia em si, sendo as informações iniciais de casos encontrados na literatura procedentes da psicanálise e do behaviorismo, nessa ordem o pequeno 39 Hans e o jovem Peter. A partir das informações iniciais de caso, a pesquisa com terapia de crianças e adolescentes transformou-se significativamente e sucedeu um aumento exponencial do número de pesquisas nessa área. (LILIAN LERNER CASTRO et al, p. 356) Segundo Lilian Lerner Castro et al: A primeira metanálise realizada com estudos em psicoterapia infantil revisou e codificou 64 estudos controlados de terapias, comportamental, psicodinâmica e centrada no indivíduo para jovens (até 12 anos de idade). Esta revisão mostrou que o tamanho de efeito médio para psicoterapia foi significante de 0,71 em relação ao grupo-controle. Ainda evidenciou que, para algumas medidas, a terapia comportamental mostrou-se mais efetiva que a não comportamental. (2012, p. 357) A Terapia Comportamental (TC) fundamenta-se nas teorias e nos princípios da aprendizagem para esclarecer o aparecimento, a conservação e a eliminação dos sintomas. O condicionamento clássico (Pavlov), o condicionamento operante (Skinner), a aprendizagem social (Bandura) e a habituação estão dentro desses princípios. (CORDIOLI, 2008). De acordo com Cordioli (2008, p.33) “a eficácia da terapia comportamental está bem estabeleida no tratamento de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (especialmente os rituais)”. Apesar de terem sido realizadas mínimas comparações, a terapia comportamental é, de acordo com Sadock (2007, p. 664) “tão eficaz quanto a farmacologia no TOC, alguns dados indicam que os efeitos benéficos são mais duradouros com a primeira”. A exposição e a prevenção de resposta são as abordagens comportamentais fundamentais. A terapia cognitiva há hipóteses de que os sentimentos e os comportamentos dos indivíduos são motivados por sua percepção dos eventos. A terapia cognitiva sugere que o pensamento distorcido ou disfuncional, que domina o humor e o comportamento do paciente, seja geral a todos os transtornos psicológicos. Já a terapia comportamental ocupa-se dos princípios da aprendizagem para explicar o surgimento, a manutenção e a eliminação dos sintomas (LILIAN LERNER CASTRO et al, 2012). 40 Segundo Lilian Lerner Castro et al: A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma abordagem integrativa, que parte do princípio que tanto os processos cognitivos como os comportamentais podem causar e manter a ansiedade. Dificuldades comportamentais e outros sintomas dos transtornos são, frequentemente, resultados disfuncionais entre pensamentos, sentimentos e comportamentos. (2012, p. 360). A Terapia Cognitivo-comportamental agrega a maior soma de evidências em termos de eficácia, podendo ser aplicada individualmente como em grupo. A forma grupal parece ter a mesma eficácia que a forma individual para certos transtornos psiquiátricos, especialmente os quadros de ansiedade. A TCC grupal pode beneficiar diversas crianças e adolescentes com transtornos mentais. A psicoeducação, relaxamento, reestruturação cognitiva, resolução de problemas, modelagem e procedimentos baseados em exposição são componentes da TCC. A psicoeducação é o primeiro estágio do tratamento, segundo Lilian Lerner Castro et al (2012, p. 360) “que visa construir uma relação marcada pela empatia e assegurar que a criança entenda a natureza dos sentimentos, dos pensamentos e dos sintomas”. O relaxamento pode ser colocado em prática para auxiliar as crianças a aprimorarem o entendimento e o controle sobre as reações fisiológicas e musculares. Segundo Lilian Lerner Castro e Cols. (2012, p. 360) “as crianças precisam aprender como seus corpos se sentem quando elas estão tensas ou ansiosas versus quando estão calmas ou relaxadas”. A reestruturação cognitiva, geralmente baseia-se em identificar o pensamento por trás da emoção negativa, buscar evidências para o pensamento, apreciar o pensamento e examinar as consequências do evento temido (LILIAN LERNER CASTRO et al, 2012). A modelagem, segundo Lilian Lerner Castro et al (2012, p. 361) “deriva suas raízes conceituais do paradigma da aprendizagem social, no qual o comportamento não temeroso é demonstrado em situações que produzem medo para ilustrar respostas apropriadas para a criança”. 41 Os procedimentos baseados em exposição, conforme Lilian Lerner Castro et al: O componente comportamental da TCC tem seu funcionamento nas práticas baseadas em exposição. As tarefas de exposição colocam o jovem em uma experiência que evoca medo, na imaginação ou in vivo, para ajudálo a se habituar à situação angustiante e para fornecer oportunidades para a prática de suas habilidades de confronto dentro de situações simuladas ou reais. (2012, p. 361) A Terapia Familiar surgiu do descontentamento de vários clínicos com a melhora muito lenta dos pacientes quando tratados particularmente ou decepcionados com o fato de que, diversas vezes, tais evoluções eram anuladas pelos demais membros da família. A Terapia Familiar é indicada quando gera alto grau de problema familiar e tem como finalidades gerais melhorar a comunicação entre os membros da família, desenvolver a autonomia e a individualização dos vários indivíduos, descentralizar e tornar mais flexíveis os padrões de liderança e tomada de decisões, reduzir os conflitos interpessoais e os sintomas, além de melhorar o desempenho individual. (CORDIOLI, 2008). Há comprovações na literatura que propõem tratamentos psicoterápicos para crianças e adolescentes com efeitos positivos e a aplicação de técnicas diretivas incidem para que as intervenções comportamentais sejam mais efetivas que as abordagens não comportamentais, sendo fundamental que os profissionais envolvidos na saúde da criança e do adolescente identifiquem aspectos emocionais e comportamentos que possam mostrar a presença de psicopatologia, e assim, solicitar, à família, encaminhamento ao psiquiatra ou ao psicólogo da infância e adolescência para avaliação especializada e tratamento (LILIAN LERNER CASTRO et al, 2012). 42 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa transitou pela infância e adolescência na necessidade desse percurso, pois o TOC afeta, com muita frequência, esses períodos do desenvolvimento. Assim, foi apresentada a primeira infância que surge com o nascimento da criança e é marcada por marcos evolutivos tais como: reflexo de sucção, de preensão, plantar, entre outros. Sabe-se também que os órgãos sensoriais não estão completamente desenvolvidos e que a diferenciação das funções neurofisiológicas depende de um processo ativo de reforço estimulatório do ambiente externo. Os comportamentos imitativos, tão encantadores aos olhos dos adultos, supostamente são os precursores da vida emocional dos bebês sendo que no primeiro ano, o humor do bebê é muito variável e é pertinente aos estados internos, como a fome. O afastamento demorado da mãe (ou de quem exerce essa função) nos primeiros seis meses de vida, pode levar a criança à depressão, podendo persistir até a fase adulta. O segundo ano de vida é importante retomar, pois se caracteriza pela aceleração do desenvolvimento motor e intelectual. O negativismo (dizer não a tudo) da criança neste período exerce um papel efetivo no desenvolvimento da independência, porém se o comportamento oponente (de oposição) for constante, entretanto, poderá vir a ter conotação problemática. A criança nesse momento expõe a capacidade para demonstrar sentimentos sejam eles positivos ou negativos em relação aos que o cercam. As crianças adquirem comportamentos a partir do que é transmitido pelas suas culturas e também irão organizar seus papéis sexuais no social. Demonstram curiosidade sobre o sexo anatômico e quando essa curiosidade é reconhecida como saudável e respondida de modo honesto e apropriado para a idade, as crianças sentem-se confortáveis com seus papéis. É uma fase de muitas demandas sociais 43 para a criança. Neste período, os pais devem procurar ser firmes no que se refere aos limites do comportamento aceitável e também incentivar a emancipação progressiva da criança. O período pré-escolar é marcado por um grande crescimento físico e emocional da criança e também marca uma fase de atividades de socialização primária. Suas emoções ainda são intensamente influenciadas por acontecimentos do orgânico, como cansaço e fome. A ansiedade está relacionada com o receio de perder alguém amado, porém a criança aceita melhor essa sensação do que no período anterior. Surge nesse momento, com intensidade a expansividade, a curiosidade, o orgulho e a alegria que são equilibrados com timidez, introversão, medo, ciúme e inveja, na relação consigo mesma e com a família. Denomina-se de anos intermediários o período entre os seis anos de idade e a puberdade. As crianças ingressam no ensino fundamental e com isso vem as exigências formais de aprendizagem e atuação escolar sendo que isso torna-se determinantes do desenvolvimento da personalidade. No que diz respeito a diferenciação sexual as emoções transparecem na forma de excitação ou timidez em relação ao sexo oposto. A adolescência é marcada por modificações evolutivas biológicas, psicológicas e sociais intensas. O biológico da adolescência se caracteriza pela aceleração do crescimento esquelético e pelo início do desenvolvimento sexual. O psicológico evidencia-se pela aceleração do desenvolvimento cognitivo e pela constituição da personalidade. No que se refere ao âmbito do social, a adolescência é o período de elaboração intensa para o papel iminente do jovem adulto. Uma enorme tarefa que é atribuída a adolescência é adquirir uma identidade. Esta crise de conquista de identidade pode ser resolvida parcialmente na passagem da dependência para a independência. Nesse período então transtornos sérios do humor e do comportamento devem ser considerados sintomas potenciais de psicopatologias e exigem investigação de profissionais especializados. Considerando que o Transtorno Obsessivo-compulsivo (TOC) vem sendo cada vez mais diagnosticado na infância e adolescência, é importante pesquisas e 44 olhares atentos a esse fato, pois este pode vir a ter um impacto profundo numa criança em desenvolvimento. Devido a isso, neste trabalho de conclusão de curso o intuito foi pesquisar as questões relacionadas a infância, a adolescência, tomar conhecimento do que é o TOC e suas consequências psíquicas nesses sujeitos. Como conceituado anteriormente, O TOC é uma patologia que se caracteriza pela presença de obsessões e/ou compulsões que se apresentam de forma intrusiva e repetitiva, causando intenso sofrimento à criança e adolescente portadores deste transtorno. O indivíduo sofre de ideias e comportamentos que podem parecer absurdas ou ridículas para a própria pessoa e para os outros, e são incontroláveis, repetitivas e persistentes. O TOC pode desencadear outras comorbidades como: tiques e síndrome de Tourette, TDAH e depressão. Assim, crianças e adolescentes acometidos por este transtorno, enfrentam prejuízos escolares, pois gastam muito tempo refazendo as atividades em aula e em casa, evitam encostar-se nos colegas e usar os sanitários da escola com medo de contaminação. Além do intenso sofrimento, interfere ainda, nas relações sociais e familiares. As atividades de vida diária como comer, se vestir, dormir, ir para a escola, participar de esportes e outras atividades, fazer os temas de casa e inclusive, atividades como brincar com outras crianças podem ser expressivamente alteradas por essa patologia. É possível perceber esfoliação nas mãos, causadas pelo excesso de lavagem. Os indivíduos com TOC percebem e muitas vezes escondem-se para realizar os atos compulsivos. Uma das perguntas mais comuns feitas pelos portadores do TOC é em relação à causa desse transtorno. Na pesquisa realizada, verificou-se que fatores neurobiológicos e psicológicos influenciam no aparecimento e manutenção dos sintomas, mas que realmente, não se sabe com exatidão qual é a causa (ou as causas). Conforme a Terapia de Orientação Analítica ou a Psicanálise buscava-se retirar os sintomas obsessivos-compulsivos tratando dos conflitos inconscientes advindos da infância. Mas na prática, não se confirmou tal relação, tampouco as terapias baseadas nessa teoria se manifestaram eficazes para retirá-los. Referente aos fatores neurobiológicos, pesquisas evidenciaram que o cérebro de portadores do TOC apresenta algumas diferenças quando comparado ao cérebro 45 de não portadores, especialmente no seu funcionamento, e apesar de controvérsias, também têm sido evidenciadas alterações anatômicas presumindo-se que o TOC ser uma doença neuropsiquiátrica. O diagnóstico do Transtorno Obsessivo-compulsivo é clínico, levando-se em conta para esse diagnóstico a duração, frequência e intensidade dos sintomas. A forma de tratamento do TOC atualmente se apresenta através da Farmacoterapia, incluindo especialmente os antidepressivos, e Psicoterapia sendo que a terapia cognitiva comportamental (TCC) é a que representa maiores índices de eficácia na estabilização dos sintomas. O mais indicado é a combinação entre esses tratamentos. Assim, esse percurso de pesquisa atinge os objetivos propostos que é percorrer a infância e a adolescência, proporcionando um conhecimento amplo desse sujeito e, também adquirindo conhecimentos específicos sobre o TOC, com a possiblidade de relacionar esse transtorno e sua frequência nesses períodos do desenvolvimento, também transitando ainda que sucintamente pelas possiblidades de intervenção, enfatizando a eficácia de algumas psicoterapias. 46 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. Rio de Janeiro, RJ: Zahar Editores, 1981. BOARATI, Miguel Angelo; ANDRADE, Ênio Roberto de; MAIA, Ana Paula Ferreira. Tratamentos Farmacológicos. In: POLANCZYK, Guilherme Vanoni; LAMBERTE, Maria Teresa Martins Ramos. Psiquiatria da Infância e Adolescência. Barueri, SP: Manole, 2012. BORTONCELLO, Cristiane Flôres; GOMES, Juliana Braga; BRAGA, Daniela T.; ISOLAN, Luciano; CORDIOLI, Aristides Volpato. 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