SOCIEDADE BRASILEIRA DE TERAPIA INTENSIVA SOBRATI TRABALHO REALIZADO PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRE DO CURSO DE MESTRADO PROFISSIONALIZANTE DA SOBRATI AVALIAÇÃO DA IMUNIZAÇÃO CONTRA HEPATITE B EM PROFISSIONAIS DE SAÚDE DA UTI GERAL DE UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO EM JOÃO PESSOA - PB MESTRANDAS: MARLY COUTINHO BELTRÃO; GERLÂNIA SIMPLÍCIO DE SOUSA ORIENTADOR: PROF. Dr. DOUGLAS FERRARI JOÃO PESSOA, AGOSTO DE 2010 2 AVALIAÇÃO DA IMUNIZAÇÃO CONTRA HEPATITE B EM PROFISSIONAIS DE SAÚDE DA UTI GERAL DE UM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO EM JOÃO PESSOA – PARAIBA – BRASIL AUTORES: MARLY COUTINHO BELTRÃO; GERLÂNIA SIMPLÍCIO DE SOUSA RESUMO: O estudo tem como objetivo estimar a cobertura vacinal contra hepatite B em profissionais de saúde de uma UTI, bem como o percentual de exposição ocupacional a material biológico, por acidentes pérfurocortantes e quais as medidas adotadas após o acidente, nesses profissionais. A amostra é composta por cinquenta funcionários da UTI geral de um hospital universitário em João PessoaPb. Constatou-se que trinta e oito receberam imunização completa contra hepatite B, mas apenas quatorze realizou dosagem de anticorpos após a terceira dose da vacina; vinte e quatro dos entrevistados sofreram exposição a material biológico por acidentes pérfurocortantes e nenhum fez uso de imunoglobulina contra hepatite B; do total de acidentes, oito foram notificados ao SINAN-SUS e seis foram emitidos CAT. Concluiu-se que: a cobertura vacinal contra o vírus da hepatite B foi inferior ao que preconiza o Ministério da Saúde; houve subnotificaçâo dos acidentes; há necessidade de se intensificar as medidas de profilaxia contra hepatite B nesses profissionais. PALAVRAS CHAVE: IMUNIZAÇÃO; HEPATITE B; UTI; PROFISSIONAIS DE SAÚDE ABSTRACT: This study aims to estimate the vaccine coverage against Hepatitis B of healthcare professional works in one ICU, as the percent of occupational exposure to biological material from perforating accidents and what the preventive measures had been taken after the accident in these professionals. The sample 3 consisted of fifty workers of general ICU of university hospital in João Pessoa – PB. It was found that thirty- eight received full immunization against Hepatitis B, but only fourteen underwent determination of antibodies after the third dose of vaccine; twenty-four respondents have been exposed to biological material by perforating accidents and none made use of immunoglobulin against Hepatitis B; of all accidents, eight were reported to the SINAN/SUS and six were issued CATs. It was concluded that: the Hepatitis B vaccination coverage was lower than recommended by the Ministry of Health; there was underreporting of accidents; there is need to intensify measures for prophylaxis against Hepatitis B in these professionals. KEYWORDS: IMMUNIZATION; HEPATITIS B; ICUs INTRODUÇÃO A hepatite B é provocada por um vírus DNA da família Hepadnaviridae. Trata-se da forma mais freqüente de hepatite infecciosa, sendo considerada a nona causa de mortalidade no mundo. O vírus da hepatite B é altamente infectivo, permanece no sangue seco em temperatura ambiente durante sete dias e é resistente aos detergentes comuns. A transmissão se dá através da via sexual, transfusões de hemoderivados, procedimentos médicos e odontológicos (cirurgias, hemodiálise etc.) sem a observância das normas de biossegurança, transmissão vertical (mãe/filho), acidentes pérfurocortantes, compartilhamento de seringas, alicates de unha, lâminas de barbear etc. Ao contrário do vírus da Hepatite A (HAV) o vírus da Hepatite B (HBV) permanece no sangue durante os últimos estágios do período de incubação prolongada (quatro a seis semanas) e durante os episódios agudos de hepatite aguda e crônica. Cerca de 70% dos pacientes com hepatite B tem a forma anictérica da doença ou subclínica e a doença pode ser mais grave em pacientes co-infectados com outros vírus hepatotrópicos ou com doenças hepáticas subjacentes. Apenas 30% dos indivíduos apresentam a forma ictérica da doença, reconhecida clinicamente. Aproximadamente 5 a 10% dos indivíduos adultos infectados, cronificam. O diagnóstico laboratorial da Hepatite B, leva em conta as formas aguda e crônica da doença. 4 Na hepatite B aguda temos os seguintes marcadores sorológicos: HBsAg: é o primeiro marcador que aparece no curso da infecção pelo HBV. Anti-HBc IgM: é o marcador de infecção recente, encontrado no soro até trinta e duas semanas após a infecção; pode estar presente na infecção crônica enquanto ocorrer replicação viral. Anti-HBc IgG: marcador de longa duração, presente nas infecções agudas e crônicas. Representa contato prévio com o vírus. HBeAg: marcador de replicação viral. Sua positividade indica alta infectividade. Anti-HBe: surge após o desaparecimento de HBeAg, indicando o fim da fase replicativa; Anti-HBs: é o único anticorpo que confere imunidade ao HBV, presente no soro, após o desaparecimento do HBsAg. Na hepatite B crônica temos os seguintes marcadores sorológicos: HBsAg: a presença deste marcador por mais de 32 semanas é indicativo de hepatite B crônica; HBeAg: na infecção crônica está presente enquanto ocorrer replicação viral, exceto nas cepas com mutação pré core ( não produtoras de proteína “e”) Anti-HBe: sua presença sugere a redução ou ausência de replicação viral, exceto, nas cepas com mutação pré-core (não produtoras de proteína “e”). HBV-DNA (quantitativo): aparece na fase de replicação viral intensa e é utilizado para monitorar o tratamento. Este teste é positivo quando o resultado for maior que 100.000 cópias/ ml. Níveis abaixo desse valor podem estar presentes em qualquer fase da doença. A prevalência da hepatite B em profissionais de saúde no Brasil é elevada, porém, em nossos hospitais, o índice de vacinação e o nexo da doença com o trabalho é muito pouco estudado e documentado. Segundo a Revista Brasileira de Infectologia 2005; nove (5): 384-389, nos hospitais brasileiros ocorrem, em média, trinta acidentes pérfurocortantes, para cada cem leitos e aproximadamente 50% deles não são notificados. Segundo o CDC/EUA, o risco de contrair hepatite B é dez vezes maior em profissionais de saúde do que na população em geral. É muito freqüente encontrarmos no meio hospitalar relatos de profissionais de saúde que 5 sofreram exposição a material biológico contaminado e não deram a devida importância ao ocorrido, talvez por ignorarem a gravidade da doença ou por não conhecerem o protocolo de imunização pós acidente. A vacinação para Hepatite B constitui uma prática médica importante, que atua na prevenção da doença em si e secundariamente na prevenção do hepatocarcinoma, complicação tardia da Hepatite B. Considerando ainda, que existe a forma assintomática da doença, a vacinação contribui também como um instrumento de controle da disseminação da mesma. A imunização ativa para Hepatite B já está incluída no calendário vacinal brasileiro. O recém nascido deve receber a primeira dose até doze horas do nascimento; a segunda dose é dada no primeiro mês de vida e a terceira e última dose, no sexto mês de vida. As crianças e adultos considerados sob riscos e neste grupo estão incluídos os profissionais de saúde, também devem receber as três doses da vacina, por via intramuscular. A segunda dose deve ser aplicada um mês após a primeira e a terceira dose, seis meses após a primeira. A vacina também deve ser aplicada após acidente pérfurocortante, se a pessoa exposta não for vacinada, devendo a primeira dose ser aplicada em até vinte e quatro, a quarenta e oito horas do acidente, seguida do esquema convencional. A vacina é feita com HBsAg recombinante e a soro-conversão (produção do antiHBs) ocorre em cerca de 90% dos adultos, mas pode ser menos eficaz em obesos, fumantes, idosos e pacientes imunodeprimidos. Quando o nível de produção do anti-HBs é alto, ou seja, a conversão sorológica é maior que 10 UI/ml, a proteção vacinal pode durar até dez anos. Mas caso o nível esteja abaixo deste, ou não ocorra a viragem sorológica, está indicado um novo esquema de três doses. Caso não ocorra a viragem sorológica após a repetição do esquema, o indivíduo será considerado não responsor, portanto, suscetível a doença. Por isso, é aconselhável o acompanhamento da viragem sorológica dos indivíduos sob alto risco, tais como profissionais de saúde, para se ter a certeza da efetividade da imunização. A imunização passiva, ou seja, a aplicação de imunoglobulina específica anti-HBs (HBIg) deve ser aplicada em todos os recém-nascidos filhos de mães HBsAg positivas, até doze horas do nascimento. A HBIg também deve ser aplicada em pessoas que foram expostas a material contaminado ou mesmo potencialmente 6 contaminado. O prazo para a administração deverá ser o mais rápido possível, entre vinte e quatro a quarenta e oito horas. Indicações da HBIg: RN de mães HBsAg positivas Vítimas de acidentes com material biológico positivo ou fortemente suspeito de infecção por HBV Comunicantes sexuais de casos agudos de hepatite B. Vítimas de abuso sexual Imunodeprimido após exposição de risco, mesmo que previamente vacinado. A rede de assistência às hepatites virais no SUS está dividida em três níveis: atenção básica, média e alta complexidade (assistência ambulatorial e hospitalar de alta complexidade). Os Centros de Referência para Imunológicos Especiais (CRIE) também fazem parte dessa rede, atende principalmente as pessoas sob maior risco de contrair o vírus HBV e realizam tanto a imunização ativa como a passiva, nesse grupo de risco. METODOLOGIA O presente estudo é resultado de uma pesquisa realizada no período de novembro de 2009 a agosto de 2010, na UTI geral adulto, de um Hospital Universitário, no município de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Trata-se de um estudo prospectivo, descritivo, cuja abordagem quantitativa envolveu coleta de dados, através da aplicação de um questionário padronizado e um termo de consentimento livre e esclarecido conforme Conselho Nacional de Saúde, atendendo às diretrizes referentes á elaboração deste trabalho, junto à instituição onde foi realizada a pesquisa, tendo-se como local de aprovação do projeto, o Comitê de Ética da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). A amostra é composta por cinquenta profissionais de saúde de uma UTI, que participaram espontaneamente e têm contato direto com pacientes internados nesta unidade 7 hospitalar ou manuseiam seus objetos. Dos cinquenta profissionais, dez são médicos, onze enfermeiros, cinco fisioterapeutas, vinte e três técnicos de enfermagem e um auxiliar de laboratório. Foram excluídos da pesquisa, aqueles que estavam de licença neste período ou que não tinham contato direto com os pacientes. OBJETIVOS O estudo teve como objetivos estimar a cobertura vacinal contra hepatite B em profissionais de saúde de uma UTI, bem como o percentual de exposição ocupacional a material biológico, por acidentes pérfurocortantes e quais as medidas adotadas em relação à hepatite B, nesses profissionais, após os acidentes, abrangendo as medidas profiláticas e as notificações. RESULTADOS Foram avaliados dezoito indivíduos do sexo masculino e trinta e dois do sexo feminino. Do total, trinta e dois se consideraram brancos, dezessete pardos e um negro. Três faixas etárias foram avaliadas: vinte a vinte e cinco anos incompletos, com um participante; vinte e cinco a quarenta e cinco anos incompletos, com quarenta e três participantes; maior de quarenta e cinco, com seis participantes. No que diz respeito à imunização contra hepatite B, dos cinquenta participantes da pesquisa, quarenta e seis foram vacinados, mas apenas trinta e oito completaram as três doses recomendadas da vacina. Dos que não completaram o esquema de vacinação (oito), três receberam apenas a primeira dose e cinco receberam a primeira e a segunda dose. Do total de indivíduos imunizados com as três doses da vacina (trinta) apenas quatorze dosaram os anticorpos contra hepatite B após a vacinação. Em relação à prevalência de hepatite B nesses profissionais, um participante da amostra referiu ter a doença. No que diz respeito à exposição desses profissionais a material biológico por acidentes pérfurocortantes, a pesquisa revelou os seguintes dados: dos cinquenta 8 participantes, vinte e quatro sofreram exposição a material biológico por acidentes de trabalho e desses expostos, nenhum recebeu imunoglobulina após o acidente. Do total de acidentes pérfurocortantes (vinte e quatro), apenas oito foram notificados ao SINAN-SUS e somente em seis deles foram emitidas as respectivas CATs (Comunicação de Acidente de Trabalho). DISCUSSÃO Tomando-se por base apenas os indivíduos que receberam as três doses da vacina, a cobertura vacinal para hepatite B foi estimada em 76%. Se levarmos em conta que a eficácia da vacina é de 90%, mesmo após a administração do esquema vacinal completo, observa-se que a cobertura vacinal para hepatite B nesses profissionais está bem abaixo do que recomenda o Ministério da Saúde (96%). Observou-se também que apenas quatorze indivíduos (36,8%), seja por desinformação, ou por não dar o devido valor a este procedimento, submeteram-se a dosagem de anticorpos, após as três doses da vacina, a fim de avaliar a viragem sorológica e a efetividade da imunização. O Comitê Consultivo de Práticas de Imunização Americano (Center for Desease Control and Prevention, 2001 – CDC/EUA) aconselha, a todos os profissionais sob riscos, dentre eles os profissionais de saúde, a dosagem dos anticorpos (anti-HBs) após a terceira dose da vacina contra hepatite B, como forma de se ter certeza da imunidade. A mesma medida é indicada pelo Ministério da Saúde, através do “Protocolo de Exposição a Material Biológico” (2006), porém muitos profissionais de saúde desconhecem essa recomendação. O percentual de exposição a material biológico por acidentes pérfurocortantes no grupo estudado foi de 48%. Corroborando com a literatura pertinente ao tema, que retrata o não cumprimento, pelos profissionais de saúde do protocolo que deve ser seguido após acidente pérfurocortante, a pesquisa demonstra que 100% dos expostos a material biológico por acidentes pérfurocortantes, não fizeram uso de imunoglobulina para profilaxia da hepatite B. 9 A subnotificação dos acidentes de trabalho ao SINAN/SUS também é evidente nesta pesquisa atingindo um percentual de 66,6%; a subnotificação pela não emissão da CAT ainda é maior, de vinte e quatro acidentes, em apenas seis foram emitidas as CATs, atingindo um percentual de 75%. CONSIDERAÇÕES FINAIS (CONCLUSÃO) Observa-se através dos resultados que a cobertura vacinal para hepatite B nesses profissionais está bem abaixo do que recomenda o Ministério da Saúde (96%). Os dados revelam que 100% dos participantes que sofreram acidentes do trabalho com material contaminado não fizeram uso de HBIg, situação agravada pelo fato de que 8,3% deles não são vacinados e 16,6% têm vacinação incompleta. Considerando que os profissionais de saúde que trabalham em hospitais, apresentam um risco dez vezes maior que a população em geral de sofrerem exposição, a material biológico contaminado, por acidentes pérfurocortantes, concluímos que há urgência em se encontrar outros caminhos, planejar novas formas de abordagem que permitam intensificar as medidas de profilaxia contra hepatite B nesses profissionais. A notificação dos acidentes de trabalho ao SINAN/SUS e a emissão da CAT, por serem instrumentos que norteiam o planejamento das ações de saúde governamentais, perdem totalmente o seu significado diante da subnotificação encontrada nessa pesquisa (66,6%). Diante das evidências, pretendemos apresentar esse trabalho à Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) da Instituição onde foi realizada a pesquisa, sugerindo algumas medidas a fim de melhorar a profilaxia contra Hepatite B no grupo estudado, bem como, fomentar as notificações dos acidentes ocupacionais e o seguimento dos profissionais de saúde que porventura venham a sofrer acidentes ocupacionais. Educação permanente abrangendo o tema em questão, campanha de vacinação contra Hepatite B direcionada aos profissionais de saúde, disponibilidade e fácil acesso aos formulários de notificação em todos os setores do hospital são algumas medidas sugeridas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 10 1. Brandi S, et al. Ocorrências de acidentes do trabalho por material perfuro cortante entre trabalhadores de enfermagem de um Hospital Universitário da cidade de Campinas, estado de São Paulo. Rev. Esc. Enf. USP. 1998 2. Coelho, H; Santana T; Silva, J.C.; Genuíno, C.F; Sidoni, M. Avaliação da resposta vacinal contra hepatite B em profissionais de saúde do Instituto Fernandes Figueira/ FIOCRUZ-Rj-Brasil. 2008 3. Jozeane Pinheiro et Regina Célia G. Zeitoune. Hepatite B: Conhecimento e medidas de biossegurança e a saúde do trabalhador de enfermagem. Ver Esc. Anna Nery Rio de Janeiro. 2008 4. Luiz A.S. Ciorlia and Dirce M.T. Zanetta. Hepatitis B in Healthcare Workers: Prevalence, Vaccination and Relation to Occupational Factors. Rev.Occupational Medicine Service, Medical school of São José do Rio Preto, SP, Brasil,2005 5. MS/SVS. Doenças Infecciosas e Parasitárias - Guia de Bolso. Rev. 2006 6. Mohammad Zeeshan, Kauser Jabeen, Anita Nausheen Akbar Ali, Ailia Wilayat Ali, Saadia Farroqui, Vikram Meharaj and Afia Zafar. Evaluation of immune response to Hepatitis B vaccine in healthcare workers at a tertiary care hospital in Pakistan: an observational prospective study. Department of Pathology and microbiology – Aga Khan University Hospital, Karachi, Pakistan. 2007.