a terceira tríade, ou espírito, segundo hegel e proclo

Propaganda
A TERCEIRA TRÍADE, OU ESPÍRITO, SEGUNDO HEGEL E PROCLO
Lucas A. Marcanti (ICV – Unicentro), Manuel Moreira da Silva (Orientador – Dep. de
Filosofia/UNICENTRO), e-mail: [email protected]
Palavras-chave: Proclo, Hegel, Intelecto inteligível.
Resumo
Trata-se de uma consideração imanente em torno do desenvolvimento interior do Uno
segundo o processo triádico, relativo ao desdobramento do ser inteligível ao intelecto
inteligível, tal como explicitado por Proclo em sua Teologia Platonica. Mais precisamente,
da interpretação hegeliana da terceira tríade, na qual, segundo Hegel, o intelecto
inteligível, em sua conversão ao Uno, retorna a si mesmo dentro de si. Isso, de modo a
verificar em que medida a identificação hegeliana da filosofia especulativa e da
mistagogia do Uno se mostra pertinente.
Introdução
Segundo a interpretação hegeliana, de acordo com Proclo, enquanto em si mesmo, isto é,
antes da produção e da geração do ser e dos seres, o Uno pode ser tomado como a
tríade dos inteligíveis, isto é, ser inteligível, vida inteligível e intelecto inteligível; sendo
que, por sua vez, cada um desses momentos comporta em si uma tríade análoga. No que
diz respeito à terceira tríade, Proclo nos diz que a mesma não atua como causa, como o
primeiro ser, nem revela o todo como a segunda, sendo que é ela o todo, como ato e
manifestação; por isso ela é também, ao mesmo tempo, no sentido de Hegel, o limite do
pensado. De acordo com Hegel, a terceira tríade é o pensamento mesmo como tal, o
Nous; o qual, como terceira unidade, estabelece em torno de si o Nous pensado e o
preenche com a unidade divina servindo de união entre ela e o ser absoluto, assim
preenche a este com ela e o faz que reverta a si. Cada tríade é por si mesma uma
totalidade, mas todas as três retornam à unidade. No Nous as duas primeiras tríades são
somente momentos, pois o espírito consiste justamente em abarcar a totalidade das duas
primeiras esferas. Eis aí, portanto, a razão pela qual ela é o limite inferior de todos os
inteligíveis; bem como, segundo Proclo, estas três unidades proclamarem de um modo
místico a causa totalmente desconhecida do primeiro e inefável Deus.
Método
A metodologia empregada no presente trabalho consistiu num tipo de pesquisa
inteiramente teórico e bibliográfico, tendo como ponto principal a leitura interna dos
capítulos 7-14 do Livro III da Teologia platonica de Proclo e o comentário de Hegel aos
mesmos, no volume III de sua História da filosofia. Discutiu-se sobretudo a pertinência da
interpretação hegeliana no que diz respeito aos problemas que Proclo se pusera, bem
como no que tange ao sentido da retomada dos mesmos por Hegel e ao significado da
identificação netre mistagogia e filosofia especulativa.
Resultados
[1] A constatação da identidade do modo como se dá o desdobramento do ser inteligivel
ao intelecto inteligivel em Proclo e o modo como se dá o desdobramento do ser ao
conceito, ou da esfera do lógico à esfera do espírito, em Hegel.
[2] Delineamento de alguns problemas exclusivos de Proclo que não aparecem na
retomada hegeliana do mesmo ou que não são levados em conta pelo filósofo alemão em
seu cometário da mistagogia procliana.
Discussões
Pode-se constatar a identidade da mistagogia do Uno e da filosofia especulativa na
medida em que, segundo o próprio Hegel, a terceira tríade é o pensamento mesmo como
tal, o Nous; de onde a mesma, como terceira unidade, estabelecer em torno de si o Nous
pensado e o preencher com a unidade divina, servindo de união entre ele e o ser
absoluto, e assim preencher este último com ela e o fazer com que reverta a si. Contudo,
observando atentamente o que nos diz Proclo acerca desse ponto, não nos parece que o
processo triádico, tal como o descreve o filosófo de Atenas, ocorra precesamente assim;
isso porque, de acordo com Proclo “da mesma forma que a primeira hénada, que vem na
següência da causa transcendente, tem revelado o ser inteligível e que a segunda hénada
tem revelada a vida inteligível, da mesma forma a terceira hénada fará existir, em relação
com ela, o Intelecto inteligível e o preenche de uma unidade divina, fazendo vir a
existência a potência pela qual ela preenche esse ser e o converte para ela mesma no
ponto médio entre ela mesma e o ser” (Proclo, 2003, p. 49). A interpretação de Hegel
parece levar em conta apenas o aspecto formal do desenvolvimento do processo triádico,
identificanado a terceira hénada, o intelecto inteligível, a potência que ela faz vir a
existência e o ser; de nossa parte, para além da identificação formal, pensamos estar em
jogo para Proclo algo bem mais complexo do que aquilo que a interpretação hegeliana
admite. De fato, quando Hegel em sua citação não completa o pensamento de Proclo
precisamente com o fragmento “no ponto médio entre ela mesma e o ser”, tudo se passa
como se a terceira hénada, o intelecto inteligível e o ser fossem uma e a mesma coisa;
ainda que o texto de Proclo permita essa interpretação, alguns problemas daí decorrentes
ficam em suspenso, por exemplo, os próprios momentos constitutivos dessa terceira
tríade e a função que nela o intelecto inteligível deve cumprir, à distinção do papel
cumprido por ela própria. Outro problema é o da medida mesma em que, por um lado, as
hénadas são concebidas como unidades, portanto, como inerentes ao Uno e, por outro,
se mostram também como mônadas e mesmo como idéias, as quais além de participadas
pelos seres, referem-se de modo bi-unívoco a eles; o que, apesar da identidade das
hénadas e do Uno-em-si, este, ao transcendê-las também delas se distingue, razão pela
qual, de acordo com Proclo, embora se possa produzir os seres imediatamente a partir
do Uno, “não encontraremos em nenhua parte o caráter próprio do Uno em toda a sua
pureza” (Proclo, 2003, p. 31). Isso porque, ainda de acordo com Proclo, “nenhum ser é
idêntico ao Uno (ao contrário ele participa do Uno), nem o Primeiro é verdadeiramente
um: ele é superior mesmo ao Uno” (Proclo, 2003, p. 31); o que nos impõe, enfim, um
último problema, a saber, o de onde encontrar de modo absoluto o Uno em sentido
próprio, ao que Proclo responde como sendo em nenhuma parte, pois, “há antes do ser
um Uno que faz existir o ser e é causa primeira do ser, pois este o que é anterior a este
um é, como sabemos, além da unidade e da causalidade, porque trascendente com
relação a todos ele escapa a toda referência e a toda participação” (Proclo, 2003, p. 31).
Não obstante, no sentido de Proclo, estas três tríades proclamam de modo místico a
causa totalmente desconhecida do primeiro e inefável Deus, que é o princípio da primeira
unidade, mas que se manifesta nas três: uma expressa sua unidade inespremível, outra a
superabundância de todas as forças e a terceira o nascimento perfeito dos seres em
geral. Interpretando isso, Hegel dirá que o místico consiste em que todas estas
diferenças, determinadas como totalidades, como deuses, apareçam concebidas como
uma unidade. Enfim, pode-se ainda afirmar, com Proclo, que é também nessa tríade que
a totalidade da multiplicidade inteligível faz sua aparição e de fato esse ser é todas as
coisas sob o modo inteligível – isto é, intelecto, vida e essência – e ele não o é nem
enquanto causa, como ser a título primeiro, nem enquanto manifesta todas as coisas,
como o ser do segundo grau, mas ele é todas as coisas, por assim dizer, em ato e de
uma maneira evidente. O que, finalmente, na medida em que é o próprio intelecto
inteligível quem faz com que todas as coisas retornem ao Uno, ele nos proporciona de
modo adequado o conhecimento desta, para Proclo, maravilhosa e incognocivel
transcendência; esse, o ponto exato apartir do qual hegel poderá designar a mistagogia
procliana do Uno como filosofia especulativa.
Conclusões
Buscou-se verificar neste trabalho alguns aspectos da interpretação hegeliana do
desdobramento do ser inteligivel ao intelecto inteligivel, ou espírito, no âmbito do proceso
triádico estabelecido por Proclo; principalmente a terceira tríade. Apesar da constatação
da identidade da mistagogia do Uno e da filosofia especulativa tal como concebidas por
Hegel, notamos algumas diferenças no que diz respeito ao desenvolvimento interno da
terceira tríade tal como tematizada por Proclo. Verificou-se a exatidão formal da
interpretação hegeliana de um tal desenvolvimento interno; porém, ainda não foi possível
verificar de modo adequado se a identificação hegeliana da terceira hénada do intelecto
inteligível e do ser ele mesmo se mostra pertinente. Essa, a questão que para nós
permanece em aberto e que procuraremos solucionar no desenvolvimento subsequente
de nosa pesquisa.
Agradecimentos
Agradeço a minha família, pelo apoio recebido, e ao Professor Manuel Moreira da Silva,
que me orientou e possibilitou a oportunidade de desenvolver esta pesquisa.
Referências
HEGEL, G. W. F. Lecciones sobre la historia de la filosofia III. Mexico: FCE, 1997.
PROCLUS. Théologie platonicienne, Livre III. Paris: Les Belles Lettres, 2003.
Download