Instituto de Ciências Jurídicas Mariana Espindola Kirkpatrick

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Instituto de Ciências Jurídicas
Mariana Espindola Kirkpatrick
A CONDIÇÃO JURÍDICA DO ESTRANGEIRO
Cabo Frio
2009
1
Instituto de Ciências Jurídicas
A CONDIÇÃO JURÍDICA DOS ESTRANGEIROS
Monografia de Conclusão de Curso
apresentada à Faculdade de Direito da
Universidade Veiga de Almeida, como
requisito parcial para obtenção do título de
Bacharel em Direito.
Orientadora: Prof. MS. Fabianne Manhães
Maciel
Cabo Frio
2009
2
Dedico esta monografia a todas as pessoas
que me apoiaram durante todos esses anos
de curso.
Ao meu pai Roberto Espindola e à minha
mãe Maria Elizabeth Espindola que foram
essenciais para a conclusão deste curso.
3
Agradecimentos
Primeiramente a Deus, que está
sempre comigo, em todos os
momentos da minha vida.
Ao meu pai, Roberto Espindola
que foi o responsável por eu ter
podido concluir esta faculdade, já
que foi ele quem financiou meus
estudos.
À minha mãe, Maria Elizabeth
Espindola que me deu palavras de
carinho e incentivos nas horas
primordiais de minha vida.
Ao meu irmão Renato Espindola,
pelos grandes momentos da
minha infância e juventude.
À minha querida ajudadora Ionice
Miranda, que sempre me deu
palavras de conforto e me
entendeu em momentos difíceis.
À
grande
Francesconi.
amiga
Lívia
À minha orientadora, Prof.
Fabianne Manhães Maciel.
A todas as pessoas que aqui não
foram relacionadas, mas que de
alguma forma ajudaram para o
meu
enriquecimento
como
pessoa.
4
“Uma coisa não é justa por ser lei,
mas deve ser lei porque é justa.”
Montesquieu
5
SUMÁRIO
SUMÁRIO ............................................................................................................................................6
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................7
CAPÍTULO 1 – A PROTEÇÃO DA PESSOA HUMANA E A NACIONALIDADE .......................10
1.1 - NACIONALIDADE .....................................................................................................................23
1.1.1 - AQUISIÇÃO POR BENEFÍCIO DA LEI...................................................................................28
1.1.2 - CASAMENTO ..........................................................................................................................30
1.2 - MUTAÇÕES TERRITORIAIS.....................................................................................................30
1.2.1 -“JUS LABORIS” ........................................................................................................................31
1.2.2 - NATURALIZAÇÃO .................................................................................................................31
CAPÍTULO 2 – O DIREITO DE IR E VIR DO ESTRANGEIRO ...................................................36
2.1 - O INGRESSO DO ESTRANGEIRO NO BRASIL........................................................................36
2.2 - VARIEDADE DOS VISTOS........................................................................................................37
2.2.1-VISTO DE TRÂNSITO...............................................................................................................38
2.2.2 - VISTO DE TURISTA................................................................................................................38
2.2.3 - CRITÉRIO DA RECIPROCIDADE...........................................................................................39
2.2.4 - VISTO TEMPORÁRIO .............................................................................................................39
2.2.5 - VISTO PERMANENTE ............................................................................................................40
2.2.6 - VISTO OFICIAL , VISTO DE CORTESIA E VISTO DIPLOMÁTICO.....................................41
2.3 - IGUALDADE DE DIREITOS .....................................................................................................41
2.4 - REFUGIADOS ............................................................................................................................45
2.5 - DIREITO DE ASILO ...................................................................................................................48
CAPÍTULO 3 – MEDIDAS COMPULSÓRIAS DE SAÍDA .............................................................53
3.1- DEPORTAÇÃO ............................................................................................................................53
3.2 - EXPULSÃO.................................................................................................................................55
3.3 - EXTRADIÇÃO............................................................................................................................57
CAPÍTULO 4 – EXTRADIÇÃO NO CASO CONCRETO (CASO BATTISTI) .............................61
4.1 - CRONOLOGIA ...........................................................................................................................62
4.2 - DECISÕES ..................................................................................................................................64
CONCLUSÃO ....................................................................................................................................66
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...............................................................................................68
6
INTRODUÇÃO
O estrangeiro é, para nós, o indivíduo natural de outro país. Pode estar entre
nós em caráter provisório, seja como visitante, turista ou em missão especial, seja de
caráter cientifico, técnico, diplomático, seja em caráter permanente, a exemplo do
imigrante.
Muitos estrangeiros têm sido discriminados em quase todo o mundo
ultimamente, sendo considerados indesejáveis, por ocupar espaços dos nativos em
diversos segmentos da sociedade, especialmente no setor de emprego e/ou mão-de-obra.
A xenofobia é quase natural e histórica, entretanto, não deixa de ser mais
uma faceta do egoísmo do ser humano, manifestação de falta de solidariedade e até
desumanidade, em alguns casos. Poder-se-ia até comparar a aversão ao estrangeiro ao
crime de racismo.
.O tratamento que os povos concediam aos estrangeiros residentes em seu
território figura entre os aspectos mais importantes na determinação de seu grau de
civilização e de humanitarismo.
Os povos antigos, discriminavam o estrangeiro, até que, inspirados por seus
próprios interesses, foram introduzindo, paulatinamente, alterações para permitir a
participação dos alienígenas no desenvolvimento econômico das sociedades em que
viviam.
As velhas sociedades européias não apresentaram substancial progresso
nesta matéria, mantendo regras discriminatórias contra o estrangeiro.
No continente americano, onde se criaram novas sociedades, resultantes de
composições populacionais mistas, desenvolveu-se nova mentalidade. O princípio de
igualdade de todos perante a lei, tanto no campo político como no plano das atividades
7
econômicas, fixado nas legislações americanas, acabou influenciando os povos
europeus.
Todo estrangeiro, legalmente presente em um país, goza dos mesmos
direitos humanos e civis dos nacionais, tem as mesmas garantias de proteção das leis,
mas, por outro lado, é sujeito aos mesmos deveres, obrigado a respeitar a legislação do
país.
Não é justo impedir arbitrariamente a entrada de estrangeiros, cuja presença
não só contribui muitas vezes para o enriquecimento nacional, mas propicia um mais
profundo entendimento entre os povos.
As proibições arbitrárias são contra o direito natural de liberdade de
locomoção. Qualquer proibição só se pode fundar nos imperativos do bem publico, por
exemplo: um país pode proibir a entrada de um estrangeiro portador de moléstia
contagiosa, ou condenado por algum crime em seu país de origem.
O direito do Estado de negar o ingresso de estrangeiro em sua comunidade é
inegável, e aos indivíduos que um Estado não deseja receber foi dado o qualificativo de
indesejáveis. E entre esta categoria de pessoas, certos Estados às vezes são levados a
incluir todos os indivíduos de uma raça determinada, por exemplo, judeus, por
apresentar diferenças acentuadas em relação à raça do país.
Às vezes certos Estados, para se defenderem de imigração excessiva,
estabelecem restrições baseadas num sistema de quotas, e outros exigem taxa de
entrada, e outros adotam a exigência de que os passaportes sejam vistados pelas
autoridades do estado de imigração.
Modernamente, verifica-se um movimento muito forte no mundo, com
política restritiva adotada pela maioria dos países quanto ao ingresso de estrangeiros em
seu território, mesmo a titulo temporário, como turistas, em razão de em muitos casos o
objetivo é de burlar as leis do país no que concerne à concessão da permanência.
O Estado que acolhe estrangeiros em seu território deve reconhecer-lhes
certos direitos e deve exigir deles certas obrigações.
A nacionalidade é um vínculo político entre o Estado soberano e o
indivíduo, que faz deste um membro da comunidade constitutiva da dimensão pessoal
do Estado. A partir deste entendimento pode-se dizer que nenhum Estado soberano é
obrigado a aceitar o ingresso de pessoas em seu território que com ele não possuam
nenhum vínculo político. Entretanto, no momento em que ele aceita este ingresso, passa
a ter com este indivíduo deveres, oriundos do direito internacional, e que acarretam
8
ainda no compromisso por parte do Estado em que se concedeu o ingresso, de garantia
dos direitos elementares da pessoa humana, mesmo que o estrangeiro encontre-se no
aeroporto, por exemplo, cabe ao Estado soberano proporcionar a garantia desses direitos
para com aquele cidadão.
No Brasil a situação jurídica do estrangeiro é regida pelo Lei 6.815 de 19 de
Agosto de 1980 que logo em seu artigo primeiro garante o que foi dito anteriormente:
“Art. 1º: Em tempo de paz, qualquer estrangeiro poderá, satisfeitas as condições desta
Lei, entrar e permanecer no Brasil e dele sair, resguardados os interesses nacionais”.
9
CAPÍTULO 1 – A PROTEÇÃO DA PESSOA HUMANA E A
NACIONALIDADE
Os atos internacionais realizados com o fim de proteger a pessoa humana
vêm para proteger o homem contra qualquer restrição que se faça à sua liberdade. Devese conceituar a escravidão como a forma mais violenta de atentado à liberdade humana.
A primeira preocupação do mundo jurídico internacional para terminar com
a escravidão foi, a abolição do tráfico de escravos. Porém, infelizmente, ainda existe
escravidão em alguns Estados mulçumanos, na África, e outros, o que demonstra não
ser um problema tão ultrapassado como muitas pessoas podem pensar.1
O tráfico de escravos através da História se apresentou em duas
modalidades: o de escravos brancos e o de escravos negros.
O tráfico de escravos brancos foi exercido, acima de tudo, pelos Estados do
norte da África, que faziam o comércio dos europeus prisioneiros. Ele foi praticado, por
exemplo, nas três primeiras décadas do século XIX e teve fim quando, em 1830, a
Argélia foi conquistada pela França. A Rússia, ao dominar a Região do Mar Negro,
terminou com a escravidão de brancos ali existentes.
O tráfico de negros foi praticado durante séculos e perdura ainda hoje em
certas regiões. Nos séculos XVI e XVII, ele foi um monopólio dos portugueses. A
França, posteriormente, também passou a realizar o tráfico. A Inglaterra também o fez,
com a E proteção do governo, durante um longo período, e obtém, em tratados
internacionais, o direito de colocar certa quota de escravos no Novo Mundo.
No século XVIII tem início, dentro dos grandes Estados europeus, a luta em
favor da abolição do tráfico. Era a resultante do pensamento filosófico da época. Os
1
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público.15ª Edição Revista
Ampliada Volume II. Rio de Janeiro, Editora RENOVAR, 2004. págs. 943 e 944;
10
Estados passam a revogar as leis que davam proteção ao tráfico. Tal fenômeno ocorre
na Inglaterra, na França, nos EUA, etc.
O primeiro país a abolir o tráfico de escravos foi a Dinamarca, que, pelo
edito Rei Cristiano VII, de 16-3-1792, proibiu que seus súditos tomassem parte no
tráfico de escravos. A Constituição dos EUA, em 1787, estabelecia a extinção do tráfico
a partir de 1808. A lei britânica proibindo o tráfico é de 1807. A luta da Inglaterra
contra o tráfico fez com que ela conquistasse novas colônias para servir de base para a
sua luta; Serra Leoa (1808), Gâmbia (1816) e Costa do Ouro (1821). Em conseqüência,
ela passou a ter uma situação dominante na África Ocidental.
No início do século XIX (Tratado de Paris, 1814) afirma-se que a abolição
do tráfico de escravos deverá ser feita de modo internacional. Dentro desta orientação,
no Congresso de Viena é feita uma declaração (2-2-1815) em que o tráfico é condenado.
O 2º Tratado de Paris (20-10-1815) contém uma condenação semelhante. Essas
condenações vão sendo repetidas nos grandes congressos da época: Aquisgrana (1818) e
Verona (1822).
Os Estados passam a concluir, durante o século XIX, uma série de tratados
em que eles admitiam o direito de visita a seus navios em alto-mar por navios de guerra
de outro Estado. É a origem do direito de visita e tinha por finalidade reprimir o tráfico
de escravos.
O Ato Geral da Conferência de Berlim (1885) proibia qualquer tráfico ou
trânsito de escravos na região da bacia do Congo. Diante da falta de resultados do Ato
de 1885, foi reunida em Bruxelas (1889- 1890) uma nova conferência com maior
número de Estados participantes do que a anterior (inclusive a Pérsia, Zanzibar, etc.),
que concluiu uma nova convenção interditando o tráfico e permitindo o direito de visita
aos navios em alto-mar.2
A Convenção de Saint-Germain (1919) revoga as anteriores e os Estados se
obrigaram a pôr fim à escravidão e ao tráfico de escravos. Em 1926, uma nova
convenção, concluída sob os auspícios da SDN, proibia qualquer forma de escravidão.
O Código Bustamante (1928) colocou o tráfico de escravos como sendo um delito
internacional e punível pelo Estado que capturasse o navio infrator. A OIT, em uma
convenção, declara que trabalho forçado é todo trabalho ou serviço exigido de um
indivíduo sob a ameaça de uma pena e para o qual o indivíduo não se ofereça
2
MELLO. Op. Cit., nota 01, p. 945 e 946.
11
espontaneamente. Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 23)
afirma que o trabalho deve ser livre e remunerado, bem como a remuneração deve dar
ao trabalhador e à sua família uma existência que seja compatível com a dignidade
humana.
Os mesmos princípios figura no Pacto Internacional de Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais e no pacto Internacional dos Direitos Civis e políticos.
A Convenção de Genebra sobre alto-mar (1958) estabelece, no seu art.13,
que todo escravo que se refugiar em qualquer navio está livre. Os Estados se obrigam
ainda a combater o tráfico. O art. 22 da mesma convenção admite que um navio de
guerra exerça o direito de “visita” em um navio de comércio em alto-mar, quando
houver suspeita de que este navio se dedica ao tráfico de escravos. A convenção da Baía
de Montego sobre o D. do Mar (1982), no art.99, estabelece que todos Estado deve
impedir o tráfico de escravos, bem como todo escravo que se refugiar em um navio
ficará livre. No art.110 consagra o direito de visita no alto-mar ao navio que se suspeitar
faça o tráfico de escravos.
A Sociedade Antiescravidão afirmava, em 1966, que havia evidência de
escravidão de várias formas em 26 países, por exemplo, no Iêmen, na Arábia Saudita
(apesar da proibição de Faiçal em 1962), etc. A Mauritânia aboliu a escravidão em
1980.
O tráfico de mulheres é aquele que se destina a colocar as mulheres na
prostituição. Durante muito tempo, ele foi denominado de tráfico de brancas, mas desde
a Convenção de 1921 esta expressão é substituída pela de tráfico de mulheres, com o
que se demonstra que a ordem jurídica internacional protege a mulher, independente de
sua cor.
A luta contra o tráfico de armas foi praticamente infrutífera. No final do
século passado, ele foi proibido em determinada zona da África e criado em Bruxelas
em Bureau internacional para a sua repressão. Em 1919, a Convenção de Saint-Germain
proibiu o tráfico na Ásia e na África. A SDN procurou, por meio de uma convenção
(1925), criar um controle ao comércio internacional de armas.
Na verdade, essas tentativas fracassaram, uma vez que as duas convenções
citadas não entraram em vigor. Pode-se acrescentar que os tratados concluídos após a 1ª.
Guerra Mundial proibiram a importação e exportação de armas para a Alemanha e para
a Áustria.
12
A proteção da vida humana3 no mar sempre foi objeto de preocupação do
mundo jurídico internacional. Sempre se considerou que a assistência no mar, aos
navios ou pessoas em desgraça, era um dever humanitário. Desde o século XII que a
Igreja se preocupa com os náufragos (Concílio de Latrão), solicitando que as
populações costeiras lhes dessem assistência.
Em 1910, a Convenção de Bruxelas sobre assistência e salvamento
transforma o dever moral acima citado em dever jurídico para os navios privados. A
partir desta, inúmeras convenções sobre salvaguarda da vida humana no mar foram
concluídas: 1914, 1929. 1948, 1960 e 1974 (todas realizadas em Londres) e 1938
(concluída em Bruxelas). Em 1978 foi concluído na IMCO um protocolo à convenção
de 1974.
A Organização Intergovernamental Marítima Consultiva tem entre as suas
funções a de desenvolver a proteção da vida humana no mar através da segurança da
navegação.
Na Convenção de Genebra (1958) sobre alto-mar, os Estados se
comprometem a obrigar os capitães dos navios nacionais (10) a prestarem assistência às
pessoas que se encontrem em desgraça no mar (art. 12 e art. 98 da convenção de
Montego Bay – 1982).
A Conferência de Hamburgo, que em 1979 aprovou uma convenção sobre
busca e salvamento marítimos, dividiu o mundo em zonas de salvamento que não
correspondem aos espaços marítimos dos Estados, mas levando em consideração
critérios operacionais.
A OIT já foi mencionada e ali foi mostrado que ela se preocupa diretamente
com o homem. A própria representação nos seus órgãos (representantes de patrões,
empregados e governos) visa atender os interesses dos indivíduos diretamente. Assim
sendo, ao contrário da grande maioria das organizações internacionais, ela possui
representantes que não são dos Estados, mas de “verdadeiras” classes sociais (patrões e
empregados).
Ela já tratou de inúmeros aspectos da vida social relativos ao trabalho que
interessam diretamente ao homem: emprego de crianças, repouso dos trabalhadores,
higiene industrial, desemprego, acidentes do trabalho, organização sindical, etc.
3
MELLO. Op. Cit., nota 01. p. 950 e 951.
13
Podemos apresentar um maior desenvolvimento sobre a liberdade sindical
assegurada pelas convenções da OIT 4 de 1948 e 1949. A liberdade sindical é garantida a
todos os empregadores e empregados que podem constituir livremente sindicatos. A
ordem jurídica interna pode fixar os casos de suspensão e dissolução de sindicatos. Em
1950 o Conselho de Administração da OIT criou a Comissão de investigação e
Conciliação sobre liberdade sindical. Os membros da Comissão são indicados pelo
citado Conselho. Ela é permanente e é um órgão comum à ONU e ã OIT, tendo em vista
que a liberdade sindical interessa aos direitos do homem. A Comissão tem nove
membros que atendem às diferentes regiões geográficas, sendo que é formada por
indivíduos independentes de Estado e de organizações sindicais. Os nacionais das partes
em litígio não participam do procedimento. A Comissão tem função de investigação e
de conciliação. As reclamações podem ser apresentadas pelos governos e organizações
de empregados e de empregadores. O CES e a Assembléia-Geral da ONU podem
transmitir reclamações. Para existir a conciliação é necessário que o governo interessado
dê o seu consentimento. Existe um Comitê de Liberdade Sindical formado por nove
membros do Conselho de Administração (três de cada grupo social representado na
OIT) que diz se a reclamação merece ou não um exame aprofundado. A investigação
tem três fases: a) escrita; b) oral e c) visita ao Estado. Ela é secreta, e as partes
participam. O procedimento termina por um relatório. Considera-se que o ideal seria a
conciliação não depender do consentimento do Estado.
A proteção5 internacional do trabalho é feita também nos pactos de Direitos
do Homem.
Já se fala atualmente em DI da Seguridade Social, que teria a sua origem em
um tratado de cooperação sobre a matéria concluído entre a França e a Itália, em que se
consagrava a igualdade de tratamento (1904).
Em 1925 a convenção nº 19 da OIT consagrava a igualdade de tratamento.
A ação da OIT nesta matéria tem sido sintetizada do seguinte modo: a) entre 1919 e
1936 gira em torno da noção de seguridade e protege certas categorias de trabalhadores;
b) a partir de 1944 visa estabelecer um rendimento mínimo e assegurar a proteção
médica; c) em 1952 estabelece normas gerais sobre seguridade.
4
5
MELLO. Op. Cit., nota 01. p. 954 e 955.
Idem, p. 957.
14
Jenks6 afirmava que o progresso social não é obstáculo ao progresso
econômico. O próprio preâmbulo da OIT afirma que a paz universal se baseia na justiça
social.
As convenções da OIT não podem ser ratificadas com reserva devido a sua
estrutura (governo, patrão e empregados).
O art.427 do Tratado de Versalhes relaciona os princípios fundamentais do
DI do Trabalho: a) bem-estar físico, moral e intelectual do trabalhador; b) a
uniformidade absoluta só pode ser alcançada paulatinamente; c) salário igual por
trabalho igual; d0 jornada de 8 horas; e0 direito a associação, etc.
O art. 23 do pacto da Liga das Nações coloca como seus objetivos assegurar
condições de trabalho justos e humanos.
Os estados podem se retirar da OIT, mas o prazo de aviso prévio é de dois
anos.
O tratado não admite a suspensão de um membro. As convenções e
recomendações são submetidas ao Legislativo. Contudo se versasse matéria de
competência do Executivo só será submetida a este. A convenção da OIT fala em
“autoridade competente”e esta é quem pode legislar sobre a matéria. O estado ao aceitar
em parte a convenção pode fazer uma lei regulamentando o que ele aceitou.
No curso da 1ª. Guerra Mundial a idéia de concorrência internacional estava
presente tanto nos governos, como nas organizações dos trabalhadores. Ela não foi
estranha à admissão da Áustria e Alemanha na OIT em 1919. Era um argumento que
tinha certo peso. Esta idéia de igualização dos custos da produção desaparece. Os
economistas haviam mostrado que a situação dos países é muito diferente. A igualdade
das normas em vez de ser um fator de equilíbrio era uma desvantagem para os países
menos desenvolvidos. A legislação internacional do trabalho não visa a igualdade de
custos, mas a sua equivalência.
As convenções internacionais de trabalho apresentam as seguintes
características: a) são adotadas em uma instituição. Elas não são precedidas de
negociações diplomáticas, mas de uma discussão no meio da assembléia que é
semelhante aos parlamentos; b) a Conferência Internacional7 tem uma representação
tripartite; c) as convenções e recomendações são aprovadas por 2/3 e devem ser
6
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público.15ª Edição Revista
Ampliada Volume II. Rio de Janeiro, Editora RENOVAR, 2004. pág. 957, sobre C. Wilfred Jenks –
Human Rights and International Labour Standards, 1960;
7
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 958, 959 e 960.
15
submetidas às autoridades nacionais competentes no prazo de 12 a 18 meses; d) as
convenções não tinham aspecto contratual. As convenções são textos “quaselegislativos” ou “pré-legislativos”, como tem sido afirmado; e) as convenções e
recomendações formam o Código Internacional do Trabalho; f) as normas são
elaboradas com flexibilidade e podem levar em consideração as diferenças de condições
econômicas; g) há variedade nos métodos de aplicação; h) às vezes as convenções têm
alternativas; i) às vezes permitem derrogações temporárias; j) a recomendação é feita
quando não há condições para convenção; k) as línguas das convenções são o francês e
o inglês.
Existem também tratados bilaterais, como os da seguridade social
O maior problema de representantes de empregadores foi dos países
comunistas e se alegou que não se exigia que o empregador fosse pessoa privada.
A data de entrada em vigor da convenção determina a data da denúncia e ela
pode ser denunciada no ano seguinte ao que completa 10 anos.
Quando a convenção não entrou em vigor e um estado a ratificou ela pode
pedir a anulação do registro da ratificação. No caso de convenções e recomendações não
ratificadas os estados permanecem com a obrigação de fazer relatórios sobre elas.
Algumas convenções criam procedimentos especiais para assegurarem a sua
execução, como é o caso da convenção sobre liberdade sindical. Ela criou o Comitê da
Liberdade Sindical com 9 membros (e representantes do governo, 3 dos empregadores e
3 dos empregados).
A ONU concluiu em 1990 a convenção internacional sobre a Proteção do
Direito de Todos os Trabalhadores Migrantes e seus familiares, onde, por exemplo, é
proibida a discriminação de direitos. Cria um Comitê de Proteção aos direitos de Todos
os Trabalhadores Migrantes e seus familiares. Ele recebe comunicações de um estado
sobre outro estado.
O estudo das minorias8 voltou a ser tema importante no DIP, na década de
90 do século XX. No período entre a primeira e a segunda Guerra Mundial foi um dos
assuntos mais tormentosos das relações internacionais. Após a segunda Guerra Mundial,
pensou-se que a proteção internacional dos direitos humanos seria suficiente e quase
não se falou mais m minorias. Contudo, precisamente a partir de 1991, ou seja, do
8
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 960 e 961.
16
desmoronamento da URSS, volta-se a falar em nacionalidades ou princípio da
autodeterminação dos povos, e vai surgir também a questão das minorias.
Na Europa Oriental, vários Estados, após um longo período de “unificação”,
vão se desmembrar, como a Tchecoslováquia, a URSS e a Iugoslávia. Surge o problema
das minorias, vez que durante o período de unificação elas haviam migrado de uma
região para a outra. Talvez o problema mais grave, devido à guerra que ocorreu, tenha
sido o dos sérvios na Bósnia-Herzegovina.
Tem sido assinalado em diferentes obras que a globalização provoca
dialeticamente o “localismo”, ou, se quisermos, o etnocentrismo. Os diferentes povos,
com receio de perderem a sua identidade diante da globalização, “exacerbam” os seus
traços culturais próprios. Há hoje uma globalização que encontra como força contrária o
“localismo”.
As minorias penetram na Idade Moderna, no DIP, na Paz de Westfalia,
através das denominadas minorias religiosas e as étnicas no Tratado de Varsóvia (1773)
que fez a primeira partilha da Polônia. O que não nos parece muito correto, vez que a
palavra minoria é utilizada em relação a indivíduos (nacionais e estrangeiros) em uma
situação determinada. Ora, o que vamos encontrar na Antiguidade e na Idade Média é
uma regulamentação da situação dos estrangeiros em geral, e não a referida “situação
determinada”.
Após a Reforma, que quebra a unidade religiosa européia, é que se vai
colocar a questão das minorias. As disputas religiosas são imensas. Em 1555, na Paz de
Augsburgo é consagrado o princípio “Cujus regio ejus religio”, que vai se espalhar pela
Europa afirmando que a religião dos súditos é a religião do monarca. Um dos princípios
tratado protegendo minorias foi em 1606, Tratado de Paz de Viena entre o Imperador
Rodolfo II e o Príncipe da Transilvânia Stephen Bockay que previa a proteção para
minorias religiosas. A evolução para o sistema de minorias é encontrado no Tratado de
Oliva (1660), entre a Polônia e o Grande Eleitor; em que este cedeu a Pomerânia e a
Livônia à Suécia, garantindo aos seus moradores a liberdade de religião. Em 1881, uma
convenção sobre estabelecimento de fronteira entre o Império Otomano e a Grécia
determina que as localidades cedidas à Grécia terão respeitados a religião, os costumes,
etc. e terão os mesmos direitos civis e políticos que os gregos. Em 1872, a Convenção
de Constantinopla assinada entre a Áustria-Hungria e a Turquia sobre a ocupação da
Bósnia-Herzegovina, estatuía que a Áustria-Hungria garantiria neste território liberdade
para todas as religiões.
17
Em 1699, o Tratado de Carlowitz9 estabelece que a Sublime Porta respeitará
a religião católica romana onde os seus seguidores tiverem igrejas, e é dado ao
embaixador da Polônia o direito de expor junto ao “trono imperial” todas as suas
reivindicações . No Tratado de Koutchouk-Kainardji (1774), a Rússia obteve o direito
de representar os cristãos ortodoxos junto ao Império Otomano. Em 1765, no Tratado de
Paris, o rei da Grã-Bretanha se compromete a respeitar a liberdade de religião dos
católicos. Os autores têm salientado a relevância da Paz de Westfalia (1648) ao
consagrar a liberdade do protestantismo na Alemanha.
O que se pode salientar é que a proteção das minorias religiosas vai no
século XIX se confundir com a denominada “intervenção humanitária” como esta
expressão era entendida nesta época : garantir a liberdade de religião.
No tocante às minorias étnicas, estas só surgem no Congresso de Viena, em
1815, quando, a respeito da Polônia, é estabelecido que Rússia, Prússia e Áustria
garantirão aos poloneses “uma representação e instituições nacionais”.
A Grécia ao ficar independente em 1830 garantiu liberdades civis e políticas
a todos os súditos independentemente de religião.
Na Convenção de Paris, de 1858, a Turquia se comprometeu a dar aos
habitantes dos principados de Valáquia e Moldávia determinados direitos.
O Congresso de Berlim (1855), ao reconhecer os Estados dos Bálcãs,
estabeleceu, em relação a Bulgária, no art.4, que esta deveria levar em consideração os
interesses das populações turcas, romenas, gregas e outras.
Balogh10 assinala que a partir de 1850 surgem as reivindicações de
nacionalidades que ganham amplitude. Assim, no Império Austríaco, em 1848 já é
assegurado aos tchecos “igualdade no direito com a nacionalidade alemã” em todos “os
ramos da administração e na vida pública”. Em 1867, o Império baixa uma lei que
“todas as unidades étnicas do Estado gozam dos mesmos direitos e têm, em particular,
um direito absoluto a conservar e a desenvolver a sua nacionalidade e a sua língua”.
Todos os idiomas utilizados pelas autoridades judiciárias nas províncias são
reconhecidos pelos Estados como tendo direitos iguais.
Na Hungria, lei datada de 1868 afirma a igualdade perante a lei de todos os
cidadãos pertencentes a diferentes nacionalidades e permite o uso oficial de diferentes
línguas.
9
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 962 e 963.
Idem, p. 964.
10
18
Durante
a
Primeira Guerra Mundial reuniram-se
congressos das
nacionalidades oprimidas (Paris, 1915, e Lausanne, 1916). O mesmo ocorre na
Filadélfia em 1918. Em 1915 é criada, na cidade de Haia, a “Organização Central para
uma Paz Durável”, em cujo programa “os Estados garantirão as nacionalidades
compreendidas em seus territórios: igualdade civil, liberdade religiosa e o livre uso da
língua”.
O primeiro tratado consagrando a Proteção das minorias foi concluído com
a Polônia em 28 de junho de 1919. Daí alguns autores considerarem que as minorias
foram uma criação do Direito Internacional Público ou, mais precisamente, do princípio
das nacionalidades que penetrou neste ramo do Direito. Esta situação é considerada
pelos citados autores um verdadeiro “paradoxo”, vez que o mencionado princípio visava
“a identificação da nação e do Estado”. No referido tratado com a Polônia, esta aceita
“as disposições que potências (aliadas e associadas) julgarão necessárias para proteger
na Polônia os interesses dos habitantes que diferem da maioria da população pela raça,
língua ou religião”. Esta situação, denominada “servitude minoritária”, só foi imposta às
pequenas potências. Assim, as grandes potências, como a própria Alemanha, não
tiveram esta servidão, por exemplo, em relação à Alta Silésia, onde havia alemães de
origem polonesa. O mesmo também ocorreu com a Itália, que tinha eslavos na Istria e
Trieste, bem como alemães no Tirol.
N. Rouland “et alii” agrupam os diferentes tratados visando a proteção das
minorias.
- tratados dos aliados com os países vencidos que tiveram perda territorial:
com a Áustria (Tratado de Saint Germain, de 1919, arts. 62 a 69), com a Bulgária
(Tratado de Neuilly, de 1919, arts. 49 a 57), com a Hungria (Tratado de Sèvres, 1920,
arts. 54 a 60), com a Turquia (Tratado de Sèvres de 1920, arts. 140 a 151, substituído
pelo Tratado de Lausanne, de 1923, arts. 37 a 45);
- o tratado com os Estados Aliados que obtiveram ganho territorial: Grécia,
Romênia (devido à minoria judaica), etc.
- tratados com os novos Estados ( Tchecoslováquia, Polônia e Romênia).
Houve ainda uma séria de atos internacionais11 relativos às minorias como,
por exemplo Tratado de Praga (1920), entre a Polônia e a Tchecoslováquia; tratado
11
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 964 e 965.
19
alemão-polonês (1922) sobre a Alta Silésia; convenção de Varsóvia (1922), entre
Polônia, Estônia, Finlândia e Letônia, etc.
Pode-se afirmar que com grande número de tratados, bem como o sistema
de proteção desenvolvido pela SdN, as minorias teriam penetrado no DI positivo.
Após a Primeira Guerra Mundial foram realizados 17 atos internacionais
visando a proteção das minorias, sendo que 16 versavam sobre a Europa e um com o
Iraque para a proteção dos curdos e assírios-caldeus.
Os tratados utilizavam expressões como “minorias nacionais” e “minorias
de raça, língua e religião”.
A Corte Permanente de Justiça Internacional, em um parecer datado de 1930
sobre as “Comunidades Greco-Búlgaras”, versava sobre a definição de “comunidade”
que era “assimilada” à de minoria pela convenção entre a Grécia e a Bulgária, de 1920.
O parecer afirma que é uma “coletividade de pessoas vivendo em um país ou localidade,
tendo uma raça, uma religião, uma língua e tradições próprias, e unidas pela identidade
desta raça, desta religião, desta língua e destas tradições
com um sentimento de
solidariedade, visando a conservar suas tradições, manter seu culto, assegurar a
instrução e a educação de seus filhos conforme o ‘Genie’ de sua raça e se assistir
mutuamente”.
Em 1938 na Conferência Pan-americana de Lima, foi aprovada uma
declaração de que não existiam minorias no continente americano.
Historicamente poder-se-ia afirmar que a minoria católica e francófona do
Canadá seria uma minoria. Contudo, ela nunca teve este tratamento perante a Liga das
Nações.
Tudo isto mostra que minoria era um instituto aplicado em uma região do
globo a Estados vencidos, novos Estados e a alguns Estados vencedores (nos fracos) que
tiveram acréscimo territorial.
Pode-se realmente observar que não se pode considerar minorias os
imigrantes. Elas estão vinculadas a populações localizadas em territórios cedidos por
razões políticas a outros Estados. O Tratado entre as Principais Potências Aliadas e
Associadas e a Polônia (28 de junho de 1919) refere-se em diversos dispositivos a
súditos alemães, austríacos, húngaros e russos. Na verdade, o sistema de minorias
ingressa a partir de 1919 no DI Positivo, porém não como um instituto universal, mas
apenas como existente onde houver tratado específico. Esta é uma restrição que precisa
ser acrescentada à definição acima da CPJI.
20
No Continente americano a questão vai ser colocada apenas recentemente,
com a noção de “povos autóctenes”, que na Bolívia é a maioria da população, ou, ainda,
no Equador é uma das etnias dominantes. Estes casos são mencionados a título de
exemplo.
Na ONU12 a definição de minoria foi bastante discutida. Em 1949 afirmava
que a minoria poderia ter se formado das seguintes maneiras: a)”anteriormente (era)
uma nação independente organizada em Estado distinto (ou uma Organização ) tribal
mais ou menos independente”; b) “ela podia fazer parte anteriormente de uma nação
organizada em Estado distinto e ter em seguida se separado deste Estado e se anexado a
um outro”; c) “um grupo regional ou disperso unido por alguns sentimentos de
solidariedade ao grupo predominante e que não tenha sido assimilado por este, mesmo
em um fraco grau”.
Em 1952 é estabelecida uma lista de fatores13 para caracterizar as minorias:
a) a existência entre os súditos de numerosos Estados de grupos de
populações distintas (...) apresentando tradições ou características
étnicas, religiosas ou lingüísticas diferentes das do resto da
população e que deveriam ser protegidas do resto da população, e
que deveriam ser protegidas por medidas especiais, no plano
nacional ou internacional, a fim de que possam conservar e
desenvolver as tradições ou características em questão;
b) a existência de um fator especial, a saber que alguns grupos
minoritários não têm necessidade de proteção. Tais grupos
compreendem notadamente aqueles que, mesmo sendo
numericamente interiores ao resto da população, constituem o
elemento dominante (...);
c) o risco de adotar as medidas podendo conduzir a abusos no meio
das minorias, cujas aspirações espontâneas a uma vida tranqüila de
cidadãos satisfeitos, súditos de um Estado dado, poderiam ser
perturbadas por elementos tendo interesse de suscitar entre os
membros destas minorias a deslealdade em relação a este Estado;
d) o fato que não poderia ser indicado de assegurar o respeito de
usos que seriam incompatíveis com os direitos do homem que
proclama a Declaração Universal dos Direitos do Homem;
e) as dificuldades que engendrariam as pretensões ao estatuto de
minoria, que poderiam criar grupos tão pouco importantes que a
outorga a estes grupos de um tratamento especial poderia, por
exemplo, onerar os recursos do Estado de uma carga sem proporção
com o seu objeto”.
Finalmente, se recomenda que minorias são ‘grupos de população nãodominantes que possuem e desejam conservar tradições ou características étnicas,
religiosas ou lingüísticas estáveis se diferenciando claramente daquelas do resto da
população”. Sugere-se que elas devem ser “numericamente bastante importantes para
12
13
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 966, 967 e 968.
Idem p. 968 e 969.
21
serem capazes de conservar por elas próprias tais tradições ou características”. Por fim,
se recomenda que “os membros das minorias devem lealdade ao Estado de que são
súditos”.
O Pacto14 de Direitos Civis e Políticos da ONU (1966) menciona no artigo
27 as ‘minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas”e os seus direitos, mas no documento
não há uma caracterização de quando surgem tais minorias. Na verdade, a existência de
uma minoria e a aplicação de um sistema de proteção é uma questão eminentemente
política e que depende do “sistema internacional”.
A Assembléia Parlamentar do Conselho da Europa em uma recomendação,
considera como minorias: a) um grupo de pessoas que reside no Estado; b) mantém
vínculos antigos e duráveis; c) tem características étnicas, culturais, religiosas ou
lingüísticas; d) tem vontade de manter a sua identidade. As diferenças assinaladas fazem
com que os costumes e ideais das minorias sejam outros que não os possuídos pela
população do estado onde se localizam, Estes grupos encontram-se instalados em
determinadas regiões dos territórios estatais.
A proteção das minorias na ordem jurídica internacional surgiu, como
vimos, com os primeiros tratados referentes a elas. Contudo, só vai se desenvolver com
a Liga das Nações e os tratados concluídos após a 1ª. Guerra Mundial.
Os tratados sobre minorias consagraram os seguintes direitos: a) à vida e à
liberdade; b) à nacionalidade e à opção; c) à igualdade (isto significa; igualdade perante
a lei-igualdade dos direitos civis e políticos, de admissão nos empregos públicos,
capacidade de exercer todas as profissões e “tratamento igual e garantias iguais de
direito e de fato”); d) liberdade religiosa; e) livre exercício de religião; f) liberdade de
ensino; g) livre uso da língua; h) “direito de gozar de facilidades do ponto de vista da
língua perante os tribunais”; i) direito a uma parte justa dos orçamentos, do Estado ou
município, que seja dedicada à educação, à religião ou à caridade; j) direito de
autonomia.
Uma questão interessante é que os tratados internacionais não dêem às
minorias a qualidade de pessoas internacionais. Assim elas não podem representar e não
são partes perante o Conselho da Liga das Nações. O mesmo ocorre em relação aos
indivíduos que integram as minorias. O que se concedeu às minorias foi o direito de dar
14
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 969 e 970.
22
informação ao Conselho sobre a infração ou o perigo de infração em relação aos
tratados que as protegem.
Mas isto não é um direito, é somente uma possibilidade sem efeito jurídico,
suscetível de provocar a intervenção do Conselho. E ainda: “a faculdade de chamar a
atenção do Conselho sobre as violações ou os riscos de violação dos tratados de
minorias é reservado apenas aos membros do Conselho da Sociedade das Nações”. Em
consequência, a proteção das minorias é privilégio dos Estados representados no
Conselho.
Consagrar a personalidade internacional das minorias é minar o poder do
Estado territorial, sobre o qual está fundamentado o DIP nos últimos 500 anos. As
minorias são sempre vistas pelo Estado territorial15 como o enclave que ameaça a sua
integridade territorial. A intenção do Estado é sempre de assimilá-la o mais possível,
enquanto a minoria luta para defender as suas características.
Não se pode negar que a proteção das minorias entra nos direitos humanos,
que são o maior objetivo do DIP se nos lembrarmos que entre eles estão os direitos à
vocação comunitária, como o direito à autodeterminação e o direito à paz.
O DIP está em vias de sofrer transformações que atingirão a sua própria
estrutura básica e, provavelmente, será substituído por um novo ramo do Direito, ainda
a ser construído.
1.1 NACIONALIDADE
A nacionalidade, no sentido sociológico, corresponde ao número de
indivíduos que possuem a mesma língua, raça, religião, e possuem um “querer viver em
comum”. Já a nacionalidade em sentido jurídico o preponderante não é a figura da
nação, mas a do Estado (que pode abranger diversas nações). A nacionalidade, neste
caso, é a de vínculo jurídico-político, que une o indivíduo ao Estado. Esta noção é a
aceita por grande parte da doutrina.
A natureza jurídica de nacionalidade16 tem sido objeto de inúmeras
discussões doutrinárias.
15
MELLO. Op. Cit., nota 01 p. 970.
Dolinger, Jacob – Direito Internacional privado: parte geral, 8. Ed. Atualizada e ampliada – Rio de
Janeiro: Editora Renovar, 2005, pág. 153.
16
23
A corrente contratualista sustenta ser a nacionalidade um contrato entre o
indivíduo e o Estado. Deste contrato bilateral resultariam direitos e deveres para os
contratantes. Esta teoria é insuficiente para explicar o fenômeno da nacionalidade, uma
vez que o recém-nascido também a possui. Ora, não podemos admitir que ele conclua
um contrato, e este pressupõe manifestação de vontade, que o recém-nascido não
possui.
Na verdade, ela é ao mesmo tempo um vínculo jurídico e político que une o
indivíduo ao Estado.
A nacionalidade17 é assunto que durante longo tempo pertenceu
exclusivamente ao domínio da jurisdição doméstica dos Estados. Entretanto, a partir de
1930, as convenções sobre os assuntos relativos à nacionalidade se têm sucedido. O que
não acarretou, contudo, a internacionalização deste instituto, mas apenas alguns dos
seus aspectos passaram a ser regulamentados pelo DI. A nacionalidade é assunto que o
Estado regulamenta pelas suas próprias leis. A ordem jurídica internacional apenas
exerce um controle sobre estas leis quando surge um litígio internacional; aprecia, por
exemplo, se a outorga de uma nacionalidade a um indivíduo foi feita conforme os
princípios e normas internacionais.
Este instituto é da maior importância para o DI, uma vez que a
nacionalidade faz com que determinadas normas internacionais sejam ou não aplicadas
ao indivíduo (ex.: tratado de imigração que isenta indivíduos de um Estado de certas
exigências). A nacionalidade vai determinar a qual Estado cabe a proteção diplomática
do indivíduo,
Para o direito interno o instituto também apresenta importância porque só o
nacional: a) tem direitos políticos e acesso às funções públicas; b) tem obrigação de
prestar o serviço militar; c) tem plenitude dos direitos privados e profissionais; d) não
pode ser expulso ou extraditado.
A ordem jurídica internacional se interessa diretamente por esta questão,
tanto assim que a Declaração Universal dos Direitos do Homem estabelece no seu art.
XV os seguintes princípios: “1. Todo homem tem direito a uma nacionalidade. 2.
Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de
nacionalidade.”
17
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público.15ª Edição Revista
Ampliada Volume II. Rio de Janeiro, Editora RENOVAR, 2004. pág. 992.
24
O art. 24 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos determina que
“toda criança tem direito a adquirir uma nacionalidade”.
A convenção interamericana de direitos do homem estabelece: a) toda
pessoa tem direitos a uma nacionalidade; b) toda pessoa tem direito à nacionalidade do
Estado em cujo território nasceu se não tem direito a outra nacionalidade; c) ninguém
será privado arbitrariamente de sua nacionalidade, nem do direito de mudá-la.
Diante das observações acima, podemos concluir que a nacionalidade tem
dois aspectos: o interno e o internacional.
É de se assinalar no tocante à tendência à internacionalização deste tema,
que foi concluída em 1997 uma convenção européia sobre nacionalidade, em
Estrasburgo. Ela determina, entre outras coisas, o seguinte: a) legislação sobre
nacionalidade é de competência do estado. Os demais estados devem respeitar a
legislação; b) cada indivíduo tem direito a uma nacionalidade; c) o casamento não é
modo de aquisição e nem de perda de nacionalidade; d) o estado deve dar a sua
nacionalidade aos recém-nascidos no seu território que de outro modo seriam apátridas.
A nacionalidade possui alguns princípios18 gerais que a regem apesar de não
serem alguns deles absolutos. Podem ser resumidos nos seguintes: a) todo indivíduo
deve ser uma nacionalidade e não mais que uma. Foi enunciado pelo Instituto de DI, na
sessão de Cambridge, em 1895. Este, na prática, não é respeitado, constituindo-se em
um ideal da sociedade internacional; b) a nacionalidade é individual. Tem-se
abandonado as “nacionalizações” e desnacionalizações coletivas. Ela atinge apenas o
indivíduo e não se estende a seus dependentes ou parentes. c) a nacionalidade não é
permanente, tendo o indivíduo, em conseqüência, o direito de mudar de nacionalidade.
d) é assunto, de um modo geral, da competência do Estado, sujeito em certos casos ao
“controle” e às normas internacionais.
Na Antiguidade Oriental e Clássica o critério atributivo de nacionalidade era
o “jus sanguinis”, isto é, a nacionalidade era dada em virtude da filiação. Nestes
períodos da História, a família era a verdadeira base de toda a organização social. O
Estado, em Roma e na Grécia, era o prolongamento da família. Deste modo, o indivíduo
pertencia primeiro à família e depois ao Estado.
No Egito, em Israel, na Assíria e na Índia (Código de Manu), o “jus
sanguinis” era o sistema atributivo da nacionalidade. Na Grécia, o indivíduo, para poder
18
MELLO. Op. Cit., nota 17 p. 992 e 993.
25
naturalizar-se, deveria primeiro ingressar em uma família do Estado cuja nacionalidade
ele pretendia adquirir. Em Roma, o indivíduo só era considerado romano se o pai fosse
romano. O “jus sanguinis”ter-se-ía espalhado
pelo resto da Europa através das
conquistas de Roma.
No período medieval vai predominar outro sistema atributivo de
nacionalidade, o “jus soli: o indivíduo é nacional do Estado onde nasceu.
Esta predominância tem as suas raízes na organização econômica e social do
feudalismo medieval. A terra era considerada a maior riqueza e símbolo do poder.
Diversas normas e institutos (“jus albinagi”, “jus naufragi”, etc.) surgiram desta posição
em relação à terra. A nacionalidade apenas acompanhou a orientação geral.
A Revolução Francesa, reagindo contra tudo que fosse remanescente do
feudalismo, abandonou o “jus soli”e fez ressurgir o “jus sanguinis”, que é consagrado
no Código de Napoleão”.
A independência dos Estados da América faz com que o “jus soli”seja
novamente adotado. Os países do Novo Mundo, sendo regiões de imigração, têm
interesse em tornar os estrangeiros membros da comunidade nacional o mais rápido
possível. Daí a adoção do “jus soli”. Por outro lado, se este sistema não fosse o adotado,
haveria no nosso continente grandes quistos sociais que estariam sujeitos à proteção
diplomática dos seus Estados nacionais.
A Europa, ao contrário, sendo zona de emigração, teve interesse em manter
o “jus sanguinis”, uma vez que deste modo ela mantém um certo controle sobre os que
tenham emigrado e seus descendentes.
A nacionalidade pode ser; originária ou adquirida19.
A nacionalidade originária é aquela que o indivíduo tem em virtude do
nascimento. Existem três sistemas legislativos atributivos de nacionalidade originária;
“jus soli”, “jus sanguinis”e o sistema misto.
A “jus soli”é o sistema que dá ao indivíduo a nacionalidade do Estado em
cujo território ele tenha nascido. É um sistema adotado na Argentina, Austrália, etc.
O “jus sanguinis”é o sistema que dá ao indivíduo a nacionalidade dos seus
pais, independentemente do local em que tenha nascido. A denominação desse sistema
não é correta, uma vez que não é o sangue que dá a nacionalidade, mas a filiação.
19
MELLO. Op. Cit., nota 17 p. 994.
26
Niboyet propôs que fosse denominado direito de filiação. É o sistema adotado na Arábia
Saudita, Áustria, Bélgica, etc.
O sistema misto combina os dois sistemas enunciados acima. É o adotado na
Colômbia, EUA, etc.
Na verdade, o que se pode concluir é que praticamente nenhum Estado
adota o “jus soli”ou o “jus sanguinis”de modo exclusivo. Todos abrem exceções ao
sistema que adotam como regra geral.
O Brasil adota o “jus soli”tradicionalmente, mas atualmente são tantas as
exceções em favor do “jus sanguinis” que se pode dizer que adotamos o sistema misto.
A legislação nacional (art. 145 da Constituição de 1969 e a Lei nº 818, de 18-9-1949)
estabelece que são brasileiros os nascidos no Brasil. Entretanto, nós abrimos algumas
exceções aos “jus sanguinis”: a) os filhos de brasileiro ou brasileira, nascidos no
estrangeiro se os pais estiverem a serviço do Brasil; b) quando não o estão e vêm residir
no Brasil antes de atingir a maioridade; ou ainda os nascidos no estrangeiro de pai ou
mãe brasileiro e registrados em “repartição brasileira competente no Exterior”; c) não
são brasileiros os que nasceram no Brasil de pais estrangeiros que aqui estejam a serviço
do seu país. Como se pode observar, o Brasil adota o sistema misto.
A Constituição de 1988 mantém, no seu art. 12, os mesmos princípios.
Alguns comentários podem ser formulados. O primeiro é o que nascido de
pais estrangeiros em aeronave estrangeira sobrevoando o território brasileiro é brasileiro
nato. A mesma hipótese pode ser aplicada ao navio que exerce o direito de passagem
inocente no mar territorial brasileiro. O que nos parece um exagero, vez que uma
criança estrangeira entrando no território brasileiro com um m6es de idade será sempre
um naturalizado. J. Dolinger20 aponta um outro caso: o filho de brasileiro registrado em
consulado será sempre brasileiro, sem precisar entrar em nenhum momento da sua vida
no Brasil.
A nacionalidade prova-se por meio de certidão de nascimento do registro
público, onde são registrados os nascimentos, nos termos do art. 12, I, do Código Civil.
Entretanto, o registro não atribui a nacionalidade. E a própria prova da nacionalidade
brasileira pode ser feita por outra certidão que não seja a de nascimento (ex.: certidão de
casamento). A finalidade do registro é apenas a de “dar publicidade do estado civil da
pessoa”.
20
MELLO. Op. Cit., nota 17 p. 995.
27
A nacionalidade adquirida é aquela que o indivíduo passa a possuir
posteriormente ao seu nascimento ou, ainda, quando para conservar a nacionalidade ele
precisa manifestar a sua vontade.
O indivíduo pode adquirir uma nacionalidade diferente daquela que tem
pelo nascimento por diversos modos: benefício da lei; casamentos; naturalização; “jus
laboris”; nos casos de mutações territoriais (cessão, anexação); o “jus domicilii”.
1.1.1
AQUISIÇÃO POR BENEFÍCIO DA LEI
Na verdade, esta denominação não é inteiramente correta, uma vez que nem
sempre a concessão da nacionalidade por meio de um texto legislativo é considerada
pelo indivíduo como sendo um “benefício” e ele a declina.
A aquisição de nacionalidade por benefício da lei se apresenta de duas
formas: 1) pela vontade da lei e 2) pela permissão da lei.
A aquisição de nacionalidade pela vontade da lei é aquela em que os
indivíduos a que a lei se dirige passam a ter a nacionalidade que lhes é dada
independentemente de qualquer manifestação de vontade de sua parte. Ela pode ocorrer
na legitimação (França), na adoção (Japão, anteriormente à Lei de 1950).
No Brasil21, apenas em raros casos existiu esta forma de concessão de
nacionalidade. Todos eles ocorreram na Constituição de 1891 e na época estipulou que
todos os estrangeiros que estivessem no Brasil quando a República foi proclamada,
seriam brasileiros, a não ser que no prazo de seis meses após a vigência da Carta Magna
declarassem, expressamente, que queriam ficar com a nacionalidade que já possuíam; b)
art. 69, alínea 5ª. , determinou que seriam brasileiros: “os estrangeiros que possuem
bens imóveis no Brasil e forem casados com brasileiras ou tiverem filhos brasileiros,
contanto que residam no Brasil, salvo se manifestarem a intenção de não mudar de
nacionalidade.
A aquisição por permissão da lei é aquela em que o indivíduo , para adquirir
ou conservar uma nacionalidade, necessita de manifestar a sua vontade. Ela se distingue
da anterior no seguinte; na por vontade da lei o indivíduo passa a ter uma nacionalidade
sem manifestar a sua vontade; esta, entretanto, pode existir para recusar a nacionalidade
que já lhe foi dada; na por permissão da lei, ao contrário, a nacionalidade, mesmo que
21
Dolinger, Jacob. Direito Internacional privado: parte geral, 8. Ed. Atualizada e ampliada – Rio de
Janeiro: Editora Renovar, 2005, pág. 162.
28
ela já seja do indivíduo, ele só a conserva após ter manifestado a sua vontade. A
Constituição brasileira de 1969, na letra c do seu inciso I, do art. 145, prevê caso de
nacionalidade adquirida por permissão da lei, ao estabelecer: a) que são brasileiros os
filhos de brasileiro ou brasileira que nasceram no estrangeiro e vierem a residir no
Brasil antes de atingir a maioridade. Entretanto, o indivíduo para conservar a
nacionalidade brasileira deverá “optar por ela, dentro de quatro anos” após a
nacionalidade; b) outro caso é o do art. 145, b, nº 1, da Constituição de 1969, que
estipula: “os nascidos no estrangeiro, que hajam sido admitidos no Brasil durante os
primeiros cinco anos de vida, radicados definitivamente no território nacional. Para
preservar a nacionalidade brasileira, deverão manifestar-se por ela, inequivocamente,
até dois anos após atingir a maioridade”. A Constituição de 1988 alterou profundamente
esta norma ao eliminar o prazo de quatro anos para a opção, estabelecendo que a opção
pode ser feita “em qualquer tempo’. Na verdade, surge um problema: qual a
nacionalidade até que seja feita a opção? A meu ver ele é brasileiro, como o era na
vigência da Constituição anterior. Contudo, reconhecemos que esta interpretação tira
todo e qualquer valor à opção. Entretanto, há uma norma de hermenêutica que afirma ter
toda palavra em uma lei efeito útil. Neste caso a nossa interpretação poderia produzir
este efeito quando se tratasse de tributação após a morte do indivíduo, vez que há países
que tributam os bens de estrangeiros de maneira diversa. Entretanto, se ele é brasileiro
durante a vida não poderá mudar de status após a morte. Acresce após a maioridade,
mas a jurisprudência derrubava este prazo considerando-o meramente formal, sendo
essencial a proteção do brasileiro. Assim sendo, vamos violar a norma de hermenêutica
e considerar a opção como não produzindo qualquer efeito.
A revisão constitucional22 de 1994 alterou esta matéria eliminando o
registro em repartição consular, bem como que a residência no Brasil seja antes da
maioridade. Ela estabelece que são brasileiros natos: “os nascidos no estrangeiro, de pai
ou de mãe brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil e
optem em qualquer tempo pela nacionalidade brasileira.”.
Corre no Congresso Nacional emenda constitucional restaurando o registro
em repartição consular dispensando a opção.
22
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público.15ª Edição Revista
Ampliada Volume II. Rio de Janeiro, Editora RENOVAR, 2004. pág. 996.
29
1.1.2
- CASAMENTO
Em algumas legislações a mulher adquire pelo casamento a nacionalidade
do marido. Alegava-se em seu favor a unidade da família.
Sobre este modo de aquisição de nacionalidade, as legislações podem ser
classificadas em diversos grupos. Como exemplos podemos citar: a) a mulher passava a
ter automaticamente a nacionalidade do marido (Alemanha); b) o marido ou a mulher
podem adquirir a nacionalidade pelo casamento desde que assim declarem (Bulgária na
lei de 1948); etc.
A legislação brasileira23 não conhece este modo de aquisição de
nacionalidade. Esta é a tendência mais moderna que está consagrada no art. 6º da
Convenção sobre Nacionalidade de Montevidéu de 1933.
A Convenção sobre a nacionalidade da mulher casada (1957), concluída sob
os auspícios da ONU, estabelece os seguinte princípios: a) o casamento ou a sua
dissolução não deve afetar automaticamente a nacionalidade da mulher; b) a mulher
estrangeira casada com nacional pode adquirir a nacionalidade do marido se a solicitar
através de um processo especial de naturalização; c) a renúncia ou aquisição de
nacionalidade pelo marido não altera a da mulher.
1.2 – MUTAÇÕES TERRITORIAIS
Nos casos de cessão ou anexação de território a um Estado estrangeiro, os
indivíduos podem mudar de nacionalidade.
É dado aos habitantes deste território o direito de opção, que lhes permite
declarar a nacionalidade que pretendem ter: a antiga nacionalidade ou a do anexante.
É interessante observar que nos tratados em que o Brasil permutou
territórios como o Tratado de Petrópolis, nada se dispôs sobre “aquisição de
nacionalidade”, e não houve para os habitantes mudança de nacionalidade, continuando
de pé o princípio latino-americano de inexistência de nacionalização coletiva automática
em caso de cessão de territórios.
23
MELLO. Op. Cit., nota 22 p. 997 e 998.
30
1.2.1 – “JUS LABORIS”
Em algumas legislações se prevê que o indivíduo adquire a nacionalidade
por exercer função pública (Haiti – Lei de 1907); ou mesmo por exercer quaisquer
funções, mesmo de natureza particular, no Estado (Panamá – Constituição de 1904). A
nacionalidade do Vaticano é em princípio adquirida pelos que ali desempenham funções
(nacionalidade funcional).
1.2.2 - NATURALIZAÇÃO
É a concessão, pelo Estado, de sua nacionalidade a um estrangeiro, quando
este a requer.
A naturalização24 é um ato de soberania interna do Estado e, portanto,
assunto regulamentado pela legislação interna. No DI existem poucos princípios sobre
ela. O primeiro a que devemos nos referir é o fixado no caso Nottebohm pela CIJ, de
que a nacionalidade deve ser efetiva, aplicando-se, evidentemente, esta regra à
naturalização. O segundo princípio é que um indivíduo não pode adquirir a
nacionalidade de um Estado estrangeiro por naturalização, se residir no Estado de que já
é nacional. O terceiro princípio é que a naturalização não tem efeito retroativo, isto é,
ela produz efeitos a partir da sua concessão.
A naturalização tem como efeito mais importante o de dar a nacionalidade a
um indivíduo que, em conseqüência, perde a sua nacionalidade anterior. Este princípio
está consagrado nos arts. 1º. e 2º. Da Convenção de Montevidéu de 1933.
Este modo de aquisição de nacionalidade não tem a natureza jurídica de um
contrato, apesar de ela se revestir de um aspecto bilateral. Na verdade, ela é um ato de
soberania do Estado que a concebe. Ela é um ato de soberania do Estado que a concebe.
Ela é um ato que o Estado pratica no seu próprio interesse. A vontade do indivíduo só
tem importância para iniciar o procedimento da sua concessão. Não existe um acordo de
vontades entre o indivíduo e o Estado.
No Brasil, a concessão de naturalização é ato do Executivo. Em outros
países, é ato do Legislativo (Bélgica) ou do Judiciário (EUA, Argentina).
24
MELLO. Op. Cit., nota 22 p. 998 e 999.
31
A naturalização como regra geral somente atinge o naturalizado, isto é, ela
obedece ao princípio de que a nacionalidade é individual.
No Di não tem sentido a distinção entre nato e naturalizado.
No Brasil a naturalização está regulamentada na Lei nº 8.815 de 18-8-80
(Estatuto do Estrangeiro) no art. 110 e segs.
A Lei nº 6.192, de 19-12-1974, eliminou toda a distinção entre brasileiro
nato e naturalizado. Nas leis e decretos passa a ser apenas brasileiro. Entretanto,
permanecem as restrições consagradas no texto constitucional.
A apatrídia25 é um dos aspectos do DI que se procura eliminar, uma vez que
esta situação viola um dos direitos do homem, que é o de todo indivíduo ter uma
nacionalidade. Ela, entretanto, não é um “ilícito” internacional, ao contrário, é admitida
e reconhecida pelo DI (Lauter-pacht). Esta observação decorre do fato de que o DI
proíbe aos Estados elaborarem leis que ocasionem a apatrídia. A luta para se eliminar a
figura do apátrida tem também um aspecto social: é que entre tais indivíduos eram
recrutados os anarco-terroristas, uma vez que eram geralmente homens sem nenhum
sentimento ou noção de pátria.
Em Roma já existia a figura do apátrida, havia uma categoria de
estrangeiros que entrava nela, a dos “peregrini sine civitate”. Por outro lado, a dos
“dediticii”, sem gozar do “jus civile” e da proteção de uma lei nacional, muito se
aproximava do apátrida moderno.
No período medieval e na Idade Moderna o apátrida desapareceu.
Foi no século XIX que a apatrídia passou a existir com as inúmeras
legislações de nacionalidade no império alemão. No nosso século, o fenômeno se
agravou com as guerras mundiais, ocasionando o deslocamento de pessoas; a revolução
comunista na URSS, o nazismo na Alemanha e o fascismo na Itália, uma vez que todos
que fugiram a estes sistemas políticos perderam a sua nacionalidade.
O apátrida é o indivíduo que não tem nacionalidade: a) os que nunca
tiveram nacionalidade e b) os que já tiveram nacionalidade, mas a perderam. Diversos
fatores podem ocasionar a apatrídia: 0 conflito de legislações consagrando “jus soli”e
“jus sanguinis; b) o indivíduo se naturaliza nacional de um Estado, perde a sua
nacionalidade originária e, posteriormente, a naturalização que lhe foi concedida é
25
MELLO. Op. Cit., nota 22 p. 1000.
32
retirada; c) fatores políticos, como a legislação da revolução comunista, que retirava a
nacionalidade russa dos emigrados, etc.
O mundo jurídico internacional tem procurado eliminar a apatrídia, pelas
razões a que já aludimos, e tem dentro desta orientação concluído convenções
internacionais. Em 1930 foi fixado em Haia um protocolo sobre “um caso de apatrídia”,
em cujo art. 1º se determinava que nos países que adotassem o “jus sanguinis”o
indivíduo com mãe nacional do Estado onde nasceu e pai sem nacionalidade terá a
nacionalidade da mãe. Em 1961, em Nova Iorque, foi concluída, sob os auspícios da
ONU, uma “convenção para a redução dos casos de apatrídia no futuro”. Ela afirma,
como um princípio na matéria, que o indivíduo só perde a sua nacionalidade originária
quando tiver adquirido outra e, ainda, que o indivíduo adquirirá “a nacionalidade do
Estado em cujo território haja nascido”; nos casos em que se não for adotado o “jus
soli”ele será considerado apátrida. Entretanto, a convenção ainda admite a exist6encia
de certos casos de retirada de nacionalidade por parte do Estado que pode ocasionar a
apatrídia, por exemplo, a residência de um naturalizado por longo tempo no estrangeiro
e quando o naturalizado tem uma atitude de deslealdade com o Estado. A doutrina tem
acrescentado ainda como sendo possível a retirada da nacionalidade por parte do Estado
quando a naturalização foi obtida por fraude. O que se pode assinalar é que os Estados
renunciam muito pouco do seu direito quase absoluto de legislar sobre nacionalidade. A
melhor solução para se acabar com a apatrídia seria de se adotar o critério do domicílio
para se atribuir a nacionalidade.
O apátrida26 está submetido à legislação do Estado onde ele se encontra. Ele
é regido pela lei do domicílio; em falta deste, pela da residência. Em 1954, sob os
auspícios da ONU, foi concluída uma convenção, em Nova Iorque, que deu aos
apátridas os mesmos direitos e tratamento que recebem os estrangeiros no território do
Estado.
O conflito das leis de nacionalidade pode provocar o aparecimento da
polipatrídia, que sempre existiu na História: Grécia, Roma, e perdura até hoje.
Polipátrida é o indivíduo que possui mais de uma nacionalidade.
A palavra polipátrida é passível da mesma crítica que fizemos à de apátrida,
isto é, pátria é um conceito subjetivo; em conseqüência, o indivíduo pode ter mais de
uma nacionalidade, mas apenas uma pátria.
26
MELLO. Op. Cit., nota 22 p. 1001.
33
A polipatrídia pode ser ocasionada por diversas causas, como o conflito
entre o “jus sanguinis” e o “jus soli”aquisição de nacionalidade pelo casamento, etc.
Inúmeros problemas surgem com a polipatrídia, como no serviço militar, na proteção
diplomática, etc. Em 1930, na Conferência de Haia, foi concluída uma convenção
“concernente a certas questões relativas aos conflitos de leis sobre a nacionalidade”,
onde se fixaram certos princípios sobre a polipatrídia: a) a proteção diplomática não
pode ser exercida por um Estado de que o indivíduo é nacional em relação a outro
Estado de que ele também seja nacional; b) cada Estado tem o direito de considerar o
polipátrida como seu nacional; c) em um terceiro Estado o polipátrida deverá ser tratado
como tendo apenas uma nacionalidade; d) o polipátrida pode renunciar a uma
nacionalidade que ele tenha adquirido sem manifestar a sua vontade, se o Estado
permitir, e esta autorização deve ser dada quando ele tiver a sua residência habitual no
exterior.
De um modo geral, se deverá considerar o polipátrida como nacional do
Estado onde ele tem o seu domicílio, e se ele não tiver domicílio ou resid6encia em
nenhum dos Estados de que ele é nacional, ele deverá ser considerado nacional do
Estado que figura em seus documentos.
A China não reconhece a polipatrídia e em um tratado com a Indonésia
(1955) consagrou que a pessoa com dupla nacionalidade pode escolher.
Em 1963 o Conselho da Europa concluiu uma convenção sobre a redução
dos casos de pluralidade de nacionalidade e sobre a obrigação militar em caso de
pluralidade de nacionalidades, estabelecendo, entre outras coisas, que todo indivíduo
que possuir a nacionalidade de dois ou mais Estados só é obrigado a prestar o serviço
militar em um Estado.
O Brasil27 deu a sua adesão ao protocolo relativo às obrigações militares,
concluído em Haia, em 1930, que estabelece que o indivíduo com duas nacionalidades
que prestar serviço militar em um Estado fica isento de fazê-lo no outro.
O melhor sistema para se terminar com a polipatrídia seria o de obrigar os
polipátrida seria de obrigar os polipátridas a optarem por uma nacionalidade, e esta
opção teria efeito obrigatório para os Estados. Na Espanha é admitida a renúncia à
nacionalidade espanhola quando o indivíduo tem outra nacionalidade.
27
MELLO. Op. Cit., nota 22 p. 1001 e 1002.
34
O indivíduo pode perder a nacionalidade por diversas razões, aprimeira é ao
adquirir outra por benefício da lei, outra razão é a naturalização, por cessões ou
anexações territoriais, pela renúncia e por punição.
A Constituição28 de 1988 consagra apenas dois casos de perda da
nacionalidade brasileira: O primeiro é o cancelamento da “naturalização, por sentença
judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional”; O segundo é “adquirir
outra nacionalidade por naturalização voluntária”.
Nesta parte revisão constitucional de 1994 realizou substancial modificação.
A perda da nacionalidade brasileira ocorre quando o indivíduo adquire nacionalidade de
outro Estado. Entretanto, não haverá a perda se a naturalização tiver sido imposta por lei
estrangeira para que o brasileiro aí residente possa permanecer em seu território ou para
que possa ter “o exercício dos direitos civis”. Não perderá a nacionalidade brasileira
quando houver o “reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira”.
A perda da nacionalidade é individual; ela não atinge os filhos, a esposa, etc.
É o que está consagrado no artigo 5 da Convenção de Montevidéu de 1933.
É permitido que o indivíduo que tenha perdido a sua nacionalidade que a
readquira. A Lei número 818 regulamenta o assunto nos seus arts. 36 e 37. A
reaquisição não tem efeito retroativo. O indivíduo readquire a nacionalidade no mesmo
status que possuía antes de perdê-la.
28
MELLO. Op. Cit., nota 22 p. 1002.
35
CAPÍTULO 2 – O DIREITO DE IR E VIR DO ESTRANGEIRO
Nenhum Estado soberano é obrigado a receber um estrangeiro em seu
território, mesmo que seja de forma legal. Apesar desta prerrogativa, não se tem notícias
de que Estados fechem suas portas para estrangeiros de forma aleatória.29
No Brasil, em tempo de paz, é permitida a entrada, permanência e saída de
estrangeiros, desde que os interesses nacionais estejam resguardados.
2.1 – O INGRESSO DO ESTRANGEIRO NO BRASIL
Consideram-se de interesse nacional para a legislação vigente: a segurança
nacional; a organização institucional; os interesses políticos (imigratórios), sócioeconômicos e culturais do Brasil e a defesa do trabalhador nacional. (art. 2º da Lei
6.815/80): Ao receber estrangeiros em seu território, o Brasil assume deveres resultantes
do direito internacional costumeiro, que variam conforme a natureza do ingresso.
O ingresso de forma legal, por sua vez, é em regra feito por meio do visto.
Desta forma, visto é o título de ingresso do estrangeiro em um país.
Estrangeiro é todo aquele que não tem nacionalidade do Estado em cujo território se
encontra. É o vocábulo derivado do latim extraneus, de extra, que quer dizer de fora.
Quer como adjetivo, quer como substantivo, significa a coisa ou a pessoa, que procede
ou pertence a um país de fora ou a outro país, ou outra nação.
Segundo o Dicionário Aurélio: Adj. 1. De nação diferente daquela a que se
pertence, ou próprio dela. 2. Diz-se de país que não é o nosso. SM. 3. A(s) terras(s)
29
Disponível em : http://www.jurisway.org.br/v2/cursosentrar.asp?id_curso=557 Acessado em
10/11/2009.
36
estrangeira(s); o exterior. [Sin., pop.: estranja,] 4. Indivíduo estrangeiro; forasteiro.
[Sin.: estranja ( pop.) e gringo ( gir.).].
Para ingressar legalmente no território brasileiro, o estrangeiro precisa, em
regra, que lhe seja concedido o visto. A exceção fica a cargo dos estrangeiros que
pertencem a países que possuem com o Brasil um Acordo de Reciprocidade. Cada
Estado estabelece os tipos de títulos sob os quais pode admitir o estrangeiro em seu
território e no Brasil, os tipos de vistos que são concedidos encontram-se dispostos no
Estatuto do Estrangeiro - Lei nº 6.815/80:
Art. 4º. Lei 6.815/80 - Ao estrangeiro que pretenda entrar no território
nacional poderá ser concedido visto:
I - de trânsito;
II - de turista;
III - temporário;
IV - permanente;
V - de cortesia;
VI - oficial; e
VII - diplomático.
O visto (título de ingresso do estrangeiro no território nacional) é individual
e sua concessão pode estender-se a dependentes legais, observado o disposto no art. 7º
da Lei 6.815/80.
O art. 7º da mencionada lei preceitua as condições em que não se concede o
visto ao estrangeiro, não permitindo a entrada deste no Brasil. São as seguintes
hipóteses: Quando o estrangeiro é menor de 18 (dezoito) anos e encontra-se
desacompanhado do responsável legal ou sem a sua autorização expressa; Quando o
estrangeiro é considerado nocivo à ordem pública ou aos interesses nacionais; Quando o
estrangeiro foi anteriormente expulso do Brasil, salvo se a expulsão tiver sido revogada;
Quando o estrangeiro foi condenado ou processado em outro país por crime doloso,
passível de extradição segundo a lei brasileira; ou quando o estrangeiro não satisfaz às
condições de saúde estabelecidas pelo Ministério da Saúde.
2.2 – VARIEDADE DOS VISTOS
Existe uma pequena variedade de vistos que irá corresponder a necessidade
de cada pessoa que deseja entrar em um certo Estado. Esta é a forma que muitos países
encontraram de se organizarem e se certificarem de que seus visitantes viajarão com um
propósito determinado.
37
2.2.1- VISTO DE TRÂNSITO
Quando o estrangeiro não tem destino final no Brasil e entra em nosso
território apenas para alcançar seu país de destino, é concedido a ele o visto de trânsito.
O visto de trânsito possui validade de até 10(dez) dias improrrogáveis e é
concedido para apenas uma entrada.
Os documentos necessários para obter o visto de trânsito, podendo haver
eventualmente a necessidade de outros, são:- passaporte ou documento equivalente;bilhete de viagem para país de destino; se a origem do estrangeiro for de área infectada,
costuma-se exigir o certificado internacional de imunização.
Estando o estrangeiro em viagem contínua, que só se interrompa para as
escalas obrigatórias do meio de transporte utilizado, não se exige ao mesmo o visto de
trânsito.
2.2.2 – VISTO DE TURISTA
Tal visto encontra-se definido nos arts. 9º ao 12° da Lei 6.815/80:
Art. 9º. Lei 6.815/80 - O visto de turista poderá ser concedido ao
estrangeiro que venha ao Brasil em caráter recreativo ou de visita, assim
considerado aquele que não tenha finalidade imigratória, nem intuito de
exercício de atividade remunerada.
Percebe-se pela leitura do dispositivo legal acima que, para que
"possivelmente" seja concedido o visto de turista, o estrangeiro deve vir ao Brasil como
"turista" e não pode ter a finalidade imigratória, nem o intuito de exercer alguma
atividade remunerada.. Diz-se possivelmente porque mesmo estando como turista no
Brasil, pode ser negado ao estrangeiro este visto, devido à discricionalidade
caracterizada pela palavra "poderá" do art. 9º.
O estrangeiro imigrante é aquele que se instala no país com o intuito de
permanência definitiva e o tipo de visto em comento não pode ser dado ao mesmo, sob
pena de que sua entrada seja considerada irregular. Este visto tem validade de 05(cinco)
anos e permite que o estrangeiro entre várias vezes no país. Entretanto, o turista pode
permanecer no Brasil por no máximo 90 dias em cada estada, prorrogáveis por igual
período, totalizando 180(cento e oitenta) dias por ano.
38
Os documentos necessários para obter o visto de turista, podendo haver
eventualmente a necessidade de outros, são: passaporte ou documento equivalente;
bilhete de viagem que habilite o estrangeiro a entrar do Brasil e daqui sair ou alguma
prova de posse de recursos financeiros; se a procedência do estrangeiro for de área
infectada, costuma-se exigir o certificado internacional de imunização.
2.2.3 – CRITÉRIO DA RECIPROCIDADE
Ocorre a reciprocidade quando dois Estados soberanos firmam um acordo
internacional pelo qual estabelecem tratamentos idênticos aos seus súditos.
Isso significa que, existindo o Critério da Reciprocidade entre o Brasil e
outro país, o visto de turista do estrangeiro originário deste país, é dispensado:
Art. 10. Lei 6.815/80 - Poderá ser dispensada a exigência de visto, prevista
no artigo anterior, ao turista nacional de país que dispense ao brasileiro
idêntico tratamento.
Parágrafo único. A reciprocidade prevista neste artigo será, em todos os
casos, estabelecida mediante acordo internacional, que observará o prazo de
estada do turista fixado nesta Lei.
O Brasil não exige visto de turista para franceses, argentinos e espanhóis
devido ao Critério da Reciprocidade.
Cumpre ressaltar que é o Presidente da República quem decide pelo critério
da reciprocidade e não o juiz, conforme preceitua o art. 84, VII e VIII da CR/88.
No caso do turista ser isento de visto, o mesmo deve apresentar quando de
sua entrada no Brasil: passaporte ou documento equivalente ou carteira de identidade; se
a procedência do estrangeiro for de área infectada, costuma-se exigir o certificado
internacional de imunização.
2.2.4 – VISTO TEMPORÁRIO
O visto temporário é concedido ao chamado "forasteiro temporário". Nesta
categoria se incluem os estudantes, missionários, homens de negócios, desportistas,
artistas, ministros religiosos e outros mais (art. 13 da Lei 6.815/80).
A estadia destas pessoas em nosso país é por um período longo (mas não
definitivo) e determinado. Vêm com um objetivo certo e específico.
39
Art. 13. Lei 6.815/80 - O visto temporário poderá ser concedido ao
estrangeiro que pretenda vir ao Brasil:
I - em viagem cultural ou em missão de estudos;
II - em viagem de negócios;
III - na condição de artista ou desportista;
IV - na condição de estudante;
V - na condição de cientista, professor, técnico ou profissional de outra
categoria, sob regime de contrato ou a serviço do Governo brasileiro;
VI - na condição de correspondente de jornal, revista, rádio, televisão ou
agência noticiosa estrangeira.
VII - na condição de ministro de confissão religiosa ou membro de instituto
de vida consagrada e de congregação ou ordem religiosa.
A cada "forasteiro temporário" é dado um prazo diferente de permanência
no Brasil. Por exemplo: o homem de negócios, artista e desportista podem permanecer
no país por até 90 (noventa) dias. Já o estudante tem prazo de estada de até 01 (um) ano,
podendo tal prazo ser prorrogado. Quando for o caso de prorrogação, o estudante deve
comprovar rendimento escolar e a matrícula. Quem analisa a prorrogação da estada do
estudante no Brasil é o Ministro da Justiça.
Os documentos necessários para obter o visto de temporário, podendo haver
eventualmente a necessidade de outros, são: passaporte ou documento equivalente; se a
procedência do estrangeiro for de área infectada, costuma-se exigir o certificado
internacional de imunização; atestado de boa saúde; prova de seus meios de
subsistência; atestados de antecedentes criminais ou documento equivalente; nos casos
de artistas, cientistas, professores, etc., o contrato de trabalho.
2.2.5 –VISTO PERMANENTE
O visto permanente é concedido à figura do estrangeiro imigrante (aquele
que se instala no Brasil com o intuito de se fixar definitivamente). Art. 18. Lei 6.815/80
- A concessão do visto permanente poderá ficar condicionada, por prazo não-superior a
5 (cinco) anos, ao exercício de atividade certa e à fixação em região determinada do
território nacional.
A Lei 6.964/81 estabeleceu como objetivo primordial da imigração no
Brasil propiciar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional,
visando à Política Nacional de Desenvolvimento em todos os aspectos e, em especial,
ao aumento da produtividade, à assimilação de tecnologia e à captação de recursos para
setores específicos. Assim foi estabelecido com um fim único: resguardar os interesses
nacionais.
40
O art. 17 está disposto da seguinte forma:: Art. 17. Lei 6.815/80 - Para obter
visto permanente o estrangeiro deverá satisfazer, além dos requisitos referidos no artigo
5º, as exigências de caráter especial previstas nas normas de seleção de imigrantes
estabelecidas pelo Conselho Nacional de Imigração. O art. 5º do mesmo diploma legal,
por sua vez, determina que serão fixados em regulamento as exigências previstas para a
obtenção de visto permanente ensejando para tanto uma duplicidade de pensamentos.
2.2.6 -VISTO OFICIAL, VISTO DE CORTESIA, VISTO DIPLOMÁTICO
O Estatuto do Estrangeiro não estabelece normas para a concessão,
prorrogação ou dispensa dos vistos oficiais, de cortesia e diplomático. Apenas
estabelece que cada um é concedido, conforme o caso, pelo Ministério das Relações
Exteriores.
É o Ministério das Relações Exteriores que define mediante Portaria do
Titular da Pasta quando é possível conceder, prorrogar ou dispensar tais vistos, sempre
observando, é claro, os pressupostos para a concessão de vistos constantes no art. 7º da
Lei 6.815/80.
Cabe a este Ministério tal tarefa, pois é o único órgão que possui repartições
no exterior.
2.3 – IGUALDADE DE DIREITOS
Os evangelhos (MT. 26, 11; Mc 14, 5; Jó. 12, 8) narram um episódio, no
mínimo, intrigante. Estando Jesus em Betânia, aproximou-se dele uma mulher trazendo
um frasco de alabastro de perfume precioso e pôs-se a derramá-lo sobre sua cabeça,
enquanto ele estava na mesa. Ao verem isso, os discípulos ficaram indignados e diziam:
"A troco de que esse desperdício? Pois isso poderia ser vendido bem caro e distribuído
aos pobres." Mas Jesus, ao perceber essas palavras, disse-lhes: "Por que aborreceis a
mulher? Ela,de fato, praticou uma boa ação para comigo. Na verdade, sempre tereis os
pobres convosco, mas a mim nem sempre tereis."
Será verdade que a humanidade está condenada à desigualdade da má
distribuição de renda, alguns tendo tanto e a maioria não tendo nada? Onde está o
direito de igualdade?
41
Os textos bíblicos não nos ajudam muito, pois suas páginas nos mostram
grandes homens, grandes santos, que eram ricos. Abraão, o homem justo, o santo, era
muito rico em rebanhos, em prata e em ouro (Gn 13, 2). Ló, que acompanhava Abraão,
tinha igualmente ovelhas, bois e tendas (Gn, 13, 5). Isaac, filho de Abraão, também era
muito rico. Semeou naquela terra e, naquele ano, colheu o cêntuplo. Iahweh o abençoou,
e o homem se enriqueceu, enriqueceu-se cada vez mais, até tornar-se extremamente
rico. Ele tinha rebanhos de bois e ovelhas e numerosos servos (Gn 26, 12-14). Jacó
adquiriu propriedades. O homem se enriqueceu enormemente e teve rebanhos em
quantidade, servas e servos, camelos e jumentos (Gn 30, 43). José, filho de Jacó, que fez
a política agrária no Egito (Gn 47, 13-26), era riquíssimo.
E nós, como ficamos: ricos ou pobres para sempre?
A igualdade30 é o signo fundamental da democracia. Não aceita privilégios e
distinções consagrados por um regime
simplesmente liberal.
A
burguesia,
cônscia de seu privilégio de classe, jamais postulou um regime de igualdade tanto
quanto reivindicara o de liberdade.
Aristóteles (384-322 a.C.), na Ética a Nicômaco, livro quinto, vinculou a
idéia de igualdade à idéia de justiça: A justiça nas transações entre os homens é uma
espécie de igualdade, e a injustiça, desigualdade. A lei deve considerar apenas o caráter
do delito e tratar as partes como iguais. Se uma comete, a outra sofre a injustiça: uma é
autora, a outra, a vítima. A justiça corretiva será o intermediário entre a perda e o dano.
O justo é um meio termo, pois é o juiz que restabelece a igualdade. O igual é
intermediário
entre a linha
Sua igualdade de justiça
relativa
maior e a
é a
menor pela proporção aritmética.
que dá
a
cada um o
que é
seu,
uma igualdade impensável sem a desigualdade complementar.
Alguns pensadores sustentam que a desigualdade é a característica do
universo. Os seres humanos nascem e perduram desiguais. Para eles, nominalistas,
essa igualdade não passaria de um simples nome, sem significação no mundo real.
Rousseau
(1712-1778)
tinha
essa
posição,
mas
admitia
duas
espécies de desigualdade entre os homens: uma, natural ou física, estabelecida pela
natureza, consistente na diferença das idades, da saúde, das forças do corpo e das
qualidades do espírito e da alma; outra, moral ou política, que depende de uma
espécie de convenção e é estabelecida pelo consentimento dos homens, consistindo nos
30
Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9344 Acessado em 11/11/2009.
42
diferentes privilégios que uns gozam em detrimento dos outros, como ser mais ricos,
mais nobres, mais poderosos.
A posição realista reconhece que os homens são desiguais sob múltiplos
aspectos,
mas
são
criaturas iguais,
pois a igualdade se
revela
na
própria
identidade de essência dos membros da espécie.
O artigo 1º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão cunhou o
princípio de que os homens nascem e permanecem iguais em direito (Déclaration des
droits de l’Homme et du citoyen. Article premier – Les hommes naissent et demeurent
libres et égaux en droits. Les distinctions sociales ne peuvent être fondées que sur
l´utilité commune). Mas aí firmara aigualdade no plano político, de caráter puramente
negativo, visando a abolir os privilégios, isenções econômicas, porque fundada numa
visão individualista do homem.
Nossas
constituições,
desde
o
Império,
inscreveram
o
princípio
da igualdade como igualdade perante a lei, no sentido de que a lei e a sua aplicação
tratam a todos igualmente, sem levar em conta as distinções de grupos. O art. 5º, caput,
da atual Constituição – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, (...) – deve ser aferido com outras normas constitucionais, buscando a
igualização dos desiguais pela outorga de direitos sociais substanciais, nos ensinando
com Rui Barbosa (1849-1923) a regra da igualdade não consiste senão em quinhoar
desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade
social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade
(Oração aos Moços).
A Constituição procura aproximar os dois tipos de isonomia, não se
limitando ao simples enunciado da igualdade entre homens e mulheres, e acrescenta
vedações a distinção de qualquer natureza e a qualquer forma de discriminação (arts. 5º,
I, e 7º, XXX a XXXII).
O
artigo
1º
da
Declaração
dos Direitos do
Homem
e
do
Cidadão, de 26/08/1789, cunhou o princípio de que os homens nascem e permanecem
iguais em direito (Déclaration des droitsde l’Homme et du citoyen. Article premier –
Les hommes naissent et demeurent libres et égaux en droits. Les distinctions sociales ne
peuvent être fondées que sur l’utilité commune).
Igualdade (égalité) é um dos lemas da Revolução Francesa, de 1789,
considerada a mais importante realização da história contemporânea. Com base nos
43
ideais iluministas, igualdade ecoou em todo o mundo, derrubando os regimes
absolutistas.
A palavra de ordem igualdade (égalité) atende aos ideais dos direitos
sociais, econômicos e culturais. É um fazer do Estado em prol dos menos favorecidos,
pela ordem social e econômica. Esses direitos surgiram em um segundo momento do
capitalismo, com o aprofundamento das relações entre capital e trabalho.
A igualdade de homens e mulheres está expressa no artigo 5º, I (homens e
mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição), pondo fim
a qualquer resquício da autoridade marital, de prevalência ou preferência do sexo
masculino sobre o feminino. É uma regra que resume décadas de lutas das mulheres
contra discriminações, abrangendo também a igualdade no lar e na família (art. 226, §
5º).
A igualdade perante a lei e jurisdicional ou perante o juiz é voltada para o
legislador, proibindo-o de elaborar dispositivos que estabeleçam desigualdade entre as
pessoas, privilegiando ou perseguindo algumas. Igualmente é dirigida para o juiz, como
interdição de fazer distinção entre situações iguais, ao aplicar a lei.
Essa igualdade de justiça
condena
os
tribunais de exceção
(art.
5º,
XXXVII), pois a Declaração Universal dos Direitos Humanos, art. 10, estabelece que
todo o homem tem direito a um tribunal independente e imparcial, para decidir
seus direitos e deveres (Universal Declaration of Human Rights. Article 10 – Everyone
is entitled in full equality to a fair and public hearing by an independent and impartial
tribunal, in the determination of his rights and obligations and of any criminal charge
against him).
A igualdade tributária estabelece tratamento igual entre iguais e desigual
entre os desiguais: quem ganha mais paga mais; quem ganha menos paga menos; quem
não ganha nada não paga nada. Veda assim a instituição de "tratamento desigual entre
contribuintes que se encontrem em situação equivalente" (art. 150, II), relacionando-se
com a justiça distributiva em matéria fiscal (art. 145, § 1º).
A igualdade perante a lei penal significa que a mesma lei penal e seus
sistemas de sanções hão de se aplicar a todos quantos pratiquem o fato típico nela
definido como crime.
A igualdade "sem distinção de qualquer natureza" (art. 5º, caput), ou
seja, de sexo,
raça,
trabalho,
credo
religioso
e
convicções
políticas,
é
consectária de tratamento igual a situações iguais e tratamento desigual a situações
44
desiguais. Os fatores de discrime continuam como fontes de discriminações odiosas e,
por isso, proibidas expressamente (art. 3º, IV).
A vigente Constituição é veemente na condenação da falta de equiparação
entre pessoas, exemplificando situações concretas, decorrentes desse princípio, por
exemplo: Pirmeiro, igualdade "sem distinção de sexo e de orientação sexual", pois o
sexo sempre foi um fator de discriminação, uma vez que o sexo feminino esteve sempre
inferiorizado na ordem jurídica. Só recentemente vem conquistando posição paritária
igual à do homem; Segundo, igualdade "sem distinção de origem, cor e raça" é uma
condenação das discriminações com base nesses fatores, repúdio à barbárie nazista. É
abrangente, pois dirige-se contra o preconceito à cor negra, aos nordestinos e às
pessoas de origem social humilde (arts.4º, VIII, e 12, § 2º); Terceiro, igualdade sem
distinção de idade", mormente nas relações de trabalho, recusando-se emprego a
pessoas mais idosas e pagando-se menos a jovens (arts.7º, XXX e XXXIII, e 227,§3º,I);
Quarto,
igualdade
sem
distinção de trabalho,
significando
a
liberdade
de exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5º, XIII), vedando distinção
entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos (art. 7º,
XXXII); Quinto, igualdade sem distinção de credo religioso, sem que sua religião possa
ser levada em conta (art. 5º, VI, VIII); Sexto, igualdade sem distinção de convicções
filosóficas ou políticas que foi tão desrespeitada, negando-se às pessoas a
possibilidade de exercício de funções
públicas
e de realizar
concursos
públicos
em igualdade de condições com outros candidatos, o que é uma violência sem nome.
2.4 – REFUGIADOS
São tidas como refugiadas31 aquelas pessoas que são forçadas a fugirem de
seus países, individualmente ou parte de evasão em massa, devido a questões políticas,
religiosas, militares ou quaisquer outros problemas. A definição de refugiado pode
variar de acordo o tempo e o lugar, mas a crescente preocupação internacional com a
difícil situação dos refugiados levou a um consenso geral sobre o termo. Como definido
na Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados das Nações Unidas - 1951 (A
Convenção dos Refugiados), um refugiado é toda pessoa que:
31
Disponível em: http://www.hrea.org/index.php?doc_id=511 Acessado em: 11/11/2009.
45
Devido a fundados temores de ser perseguida por motivos de raça,
religião, nacionalidade, por pertencer a determinado grupo social e por suas
opiniões políticas, se encontre fora do país de sua nacionalidade e não possa
ou, por causa dos ditos temores, não queira recorrer a proteção de tal país; ou
que, carecendo de nacionalidade e estando, em conseqüência de tais
acontecimentos, fora do país onde tivera sua residência habitual, não possa
ou, por causa dos ditos temores, não queira a ele regressar.
Embora a definição encontrada na Convenção dos Refugiados tem sido
utilizada pelas organizações internacionais, como as Nações Unidas, o termo continua a
ser mal empregado e erroneamente utilizado na linguagem comum do dia-a-dia. Os
meios de comunicação, por exemplo, freqüentemente confundem os refugiados com as
pessoas que migram por razões econômicas (“imigrantes econômicos”) ou com grupos
de perseguidos que se mantém dentro de seus próprios países e não cruzam nenhuma
fronteira internacional (“deslocados internos”).
As causas da perseguição devem ser fundamentadas naquelas cinco áreas
apontadas no Artigo 1 A (2) da Convenção dos Refugiados: raça, religião,
nacionalidade, pertencimento a um grupo social particular ou opinião política. A
perseguição fundamentada em qualquer outro motivo não será considerada.
Raça: é utilizada no mais amplo sentido e inclui grupos étnicos e grupos
sociais de descendência comum.
Religião: também possui um amplo sentido, inclui a identificação com um
grupo que compartilha tradições e crenças comuns, assim como práticas religiosas
específicas.
Nacionalidade: inclui a cidadania dos indivíduos. Perseguição contra grupos
étnicos, lingüísticos e culturais segregados do resto da população também pode ser
entendida como perseguição com base na nacionalidade.
Um Grupo Social específico se refere a um grupo de pessoas que
compartilham uma mesma história, hábitos ou estatutos sociais. Essa categoria
freqüentemente sofre alguma perseguição com base em uma ou outra das demais
categorias aqui apontadas. Também pode ser aplicada às famílias capitalistas, aos
proprietários de terra, aos homossexuais, aos negociantes e aos membros das forças
militares.
Opinião política refere-se às idéias que não são toleradas pelas autoridades,
incluindo opinião crítica com relação aos métodos e às políticas governamentais.
Incluem-se as opiniões individuais (isto é, autoridades podem considerar que uma
pessoa possui determinada opinião política particular), ainda que o indivíduo não
46
defenda de fato nenhuma opinião. Indivíduos que não expressam suas opiniões políticas
até conseguirem fugir de seus países podem ser considerados refugiados uma vez que
demonstrem que serão perseguidos por suas idéias se retornarem à sua pátria.
Essas definições são importantes a partir do momento em que os países e as
organizações tentam determinar quem é ou quem não é um refugiado. Quem solicita
asilo - isto é, aqueles que requerem a condição de refugiados em outros países –
normalmente necessitam provar pessoalmente que seu receio de perseguição está bem
fundamentado e dentro dos parâmetros legais do país que o hospeda para concorrer ou
não ao status de refugiado. No entanto, em caso de evasão em massa, não é possível que
um país de asilo possa considerar cada caso individualmente. Nessas circunstâncias,
especialmente quando os indivíduos estão fugindo por razões semelhantes, a
determinação do status de refugiados pode ser declarada com base no “grupo social”
que, na falta de evidência contrária, cada indivíduo passa a ser considerado como um
refugiado.
A legislação internacional reconhece o direito ao asilo, mas não obriga os
países a aceitá-lo. Nações de quando em vez oferecem “proteção temporária” quando
expostos a um repentino e massivo fluxo de pessoas, superando sua capacidade regular
de asilo. Em tais circunstâncias, as pessoas podem ser rapidamente admitidas em países
seguros, mas sem nenhuma garantia de asilo permanente. A “proteção temporária” é
conveniente para os governos e refugiados em determinadas circunstâncias.
Ainda assim é apenas um complemento temporário e não substitui as medidas de
proteção mais amplas oferecidas pela Convenção dos Refugiados.
Geralmente, os organismos de assistência e os mecanismos de proteção aos
refugiados propõem três “soluções permanentes” a favor dos refugiados: A repatriação
voluntária: os refugiados podem, posteriormente, retornar aos seus países de origem
uma vez que suas vidas e liberdade não sofram mais nenhuma ameaça; A integração
local: os países de asilo permitem que os refugiados se integrem ao país, sendo este seu
primeiro asilo; e a reinstalação num terceiro país: quando a repatriação é perigosa e o
primeiro país se negar em dar a integração local.
A maior parte dos refugiados no mundo espera por soluções permanentes
para suas condições. Embora muitos consigam asilo provisório ou temporário em países
vizinhos, poucos conseguem regularizar suas situações ou conseguem ser integrados. Os
direitos de ir e vir e de trabalhar são altamente restringidos e as oportunidades de lazer
geralmente inexistem ou são pouco oferecidas. Esses refugiados também podem ser
47
alvos de ataques, tanto por forças de segurança local como por incursões de grupos
rivais que cruzam a fronteira.
Uma outra categoria especial de refugiados é formada por pessoas que,
forçadas a fugirem de seus países por razões semelhantes, não conseguem cruzar
nenhuma fronteira internacional. Essas pessoas são conhecidas como deslocados
internos. No final de 2000, existiam aproximadamente 11,5 milhões de refugiados
espalhados pelo mundo devido a múltiplas razões e um número ainda maior de
deslocados internos, algo entre 20 a 25 milhões, se vê forçado a abandonar seus lares
por razões similares. Muito mais do que guerras entre países, a maior razão dos
crescentes conflitos, no mundo, envolve disputas internas entre grupos étnicos ou
políticos. Dessa forma, o número de pessoas atingidas por conflitos em seus próprios
países e obrigadas a saírem de suas casas tende a aumentar cada vez mais.
2.5 – DIREITO DE ASILO
O direito de asilo 32 visa dar uma proteção ao indivíduo. Ele pode apresentarse de duas maneiras: primeiro, o asilo territorial ou externo, ou internacional; e segundo,
o asilo diplomático, ou interno, ou político, ou internacional, ou extraterritorial.
O asilo territorial é admitido em toda a sociedade internacional e está
consagrado no art. XIV da Declaração Universal dos Direitos do Homem:
1 - Todo homem, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar
asilo em outros países.
2 - Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente
motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e
princípios das Nações Unidas.
O asilo territorial é aquele que o Estado concede aos indivíduos perseguidos
dentro de seu próprio território.
O direito de asilo, apesar de ter por finalidade proteger a pessoa humana, é
ainda considerado um direito do Estado e não do indivíduo. Significa isto que o Estado
não é obrigado a conceder o asilo, mas apenas o faz se assim o quiser.Algumas
legislações estatais, como a do México e a da Itália, consagraram o direito de asilo. A
32
Silva, Roberto Luiz - Direito Internacional Público, Primeira Edição, Segunda Tiragem,
Editora Del Rey – Belo Horizonte – 2000 pág. 45.
48
Constituição brasileira de 1969, ao proibir a extradição de estrangeiro acusado de crime
político e de opinião (art. 153, § 19), dá proteção ao criminoso político. Entretanto, a
interpretação sobre o alcance destes dispositivos não é uniforme. Uns consideram que a
sua finalidade é apenas dar maior precisão à ação da autoridade nacional, mas sem dar
um direito ao indivíduo de ser asilado. Outros declaram que o indivíduo passa a ter um
direito ao asilo. Na verdade, a interpretação33 não pode ser genérica, uma vez que
alguns países (Guatemala) reconhecem ao indivíduo direito ao asilo. No Brasil já não se
pode afirmar isto, porque a nossa Constituição de 1969 apenas proíbe a extradição do
criminoso político, mas não significa isto que estejamos obrigados a conceder o asilo,
tanto assim que ele pode vir a ser expulso do território nacional sem que haja qualquer
proibição constitucional. Por outro lado, nada impede que não concedamos asilo a
determinado criminoso político.
Entretanto, a Constituição de 1988, no seu art. 4º., estabelece entre os
princípios das relações internacionais do Brasil o de “concessão de asilo político”. A
primeira observação que deve ser feita é que ela abrange o asilo diplomático e o asilo
territorial. A segunda observação é que, apesar de tudo, não surge uma obrigatoriedade
de concessão do asilo, vez que a qualificação do indivíduo como perseguido político é
da competência do Poder Executivo, que se trata de matéria de política externa. Por
outro lado, art. 4º. é uma mesma programática.
A Convenção Interamericana sobre asilo territorial (Caracas, 1954) também
se encontra nesta orientação ao estabelecer no art. 1º.que o asilo é um direito do Estado
e que ele admitirá “dentro do seu território as pessoas que julgar conveniente”.
São denominadas de refugiadas as pessoas que gozam de asilo territorial. A
Convenção de 1951, que estabeleceu o estatuto dos refugiados, define-os como sendo
aquele que “temendo ser perseguido por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo
social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não
pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que se
não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha a sua residência habitual
em conseqüência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não
quer voltar a ele”. Ela tem sido criticada, porque não abrange os indivíduos perseguidos
por participarem de greves e manifestações políticas. Tem sido assinalado que há uma
como os curdos e os palestinos.
33
SILVA. Op. Cit., nota 32 p. 45 e 46.
49
A definição mais ampla de refugiados34 é a da OUA, vez que abrange os
deslocamentos maciços de população que não estavam incluídos na definição da
convenção de 1951, por exemplo, as pessoas que necessitam abandonar os seus países
sem que haja perseguição. A definição da OUA vem sendo adotada de fato em inúmeras
regiões do mundo. A citada convenção, concluída em 1969, além de incluir os casos da
definição da ONU, também considera refugiada: qualquer pessoa que, devido a agressão
externa, ocupação, domínio estrangeiro ou eventos que perturbem seriamente a ordem
pública em parte ou em todo o seu país de origem ou nacionalidade, é obrigado a deixar
seu local de residência habitual para buscar refúgio em outro local fora de seu país de
origem ou nacionalidade. Dentro desta orientação de se ampliar o conceito de refugiado,
foi aprovada uma Declaração, em Cartagena das Índias, sob a égide do ACNUR, em
1984, recomendando que se adote na América Central não apenas o conceito de 1951, e
de seu protocolo de 1967, mas também (sejam consideradas) refugiadas as pessoas que
têm fugido de seus países porque suas vidas, segurança ou liberdade têm sido
ameaçadas pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os conflitos internos, a
violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado
gravemente a ordem pública. A regulamentação dos refugiados tem se regionalizado
para se atender as peculiaridades das diferentes partes do globo. O termo refugiado não
é definido “a priori”, com fundamento em considerações teóricas, mas de modo
funcional para resolver problemas concretos.
O asilo é concedido ao criminoso político, incluindo-se os que lutam contra
o colonialismo. Não se dá asilo aos que cometeram crime de guerra, crime contra a paz
e crime contra a humanidade.
A qualificação de tais indivíduos como refugiados, isto é, pessoas que não
são criminosos comuns, é ato soberano do Estado que concede o asilo. Cabe somente a
ele a qualificação. É com ela que terá início ou não o asilo.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 14) proíbe a concessão
do asilo aos criminosos de direito comum e aos responsáveis por “atos contrários aos
objetivos e princípios das Nações Unidas.
O DI Humanitário e o DI dos Refugiados são formados por normas que se
complementam.
34
SILVA. Op. Cit., nota 32 p. 47 e 48.
50
Pode-se acrescentar que no continente americano o conceito de refugiado é
mais amplo do que o de asilado territorial. Assim sendo, todo asilado territorial, quando
é concedido, é comunicado pelo Estado a aquele de onde saiu o indivíduo. Esta
obrigação não existe para os demais refugiados. Há atualmente a tendência de se
distinguir o asilado territorial do refugiado.
É de se acrescentar 35 que não há definição jurídica para pessoas deslocadas.
Pessoas deslocadas são aquelas que têm refúgio dentro do seu próprio território, ou são
impedidas de transpor uma fronteira internacional que foi fechada. São aqueles que não
atravessam a fronteira internacional.
As pessoas deslocadas têm os mesmos direitos humanos das demais
pessoas. Elas têm o direito de pedir e receber assistência humanitária.
O ACNUR tem cuidado das pessoas deslocadas.
Na ONU, em 1967, foi aprovada apenas uma declaração sobre asila
territorial, mas que não é obrigatória e permite ao Estado recusar a entrada de pessoas
perseguidas se tal fato ameaçar a sua segurança nacional, a sua população ou em caso de
afluxo em massa de perseguidos, o que lhe dá quase nenhum alcance.
O fundamento de asilo, conforme se depreende, da Convenção
Interamericana de Caracas, reside em dois princípios: Primeiro, o Estado tem, o direito
de permitir que entrem no seu território os indivíduos que quiser e, segundo, no seu
território a sua jurisdição é exclusiva.
O Estado que concede o asilo não pode permitir que o asilado pratique atos
contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Por outro lado, o Estado não
pode impedir a entrada de alguém que procure asilo no seu território, nem obrigá-lo a
voltar para o Estado de onde ele é perseguido.
No Brasil, o Decreto-Lei número 941 se 1969, trata da condição do asilado
(arts. 111 e segs.) e entre outras determinações estabelece que ele não poderá se retirar
do Brasil sem prévia comunicação e “obtenção do respectivo visto”, e se encontra tal
matéria regulamentada ainda nos arts. 138 e segs. Do Decreto número 66.689, de 11-61970.
O asilo pode terminar por inúmeras causas: a sua naturalização no Estado de
refúgio; quando o refugiado parte do Estado de refúgio; a sua expulsão do Estado de
35
SILVA. Op. Cit., nota 32 p. 48 e 49.
51
refúgio, o que só pode ocorrer em casos excepcionais; quando cessa a causa que
motivou o asilo; e pela morte do refugiado.
O asilo diplomático é uma forma provisória de asilo político, que nasceu e
somente prevalece na América Latina. Não há reciprocidade de tratamento dos Estados.
Esta forma de asilo é uma exceção à plenitude que o Estado oferece sobre o seu
território. Ocorre uma ficção jurídica de extraterritorialidade, pela qual há objetos
móveis e imóveis que representam um Estado estrangeiro. Tais objetos, na verdade,
representariam a jurisdição do Estado e uma invasão a estas áreas, seria uma invasão a
este Estado. Assim, surgiu o asilo diplomático nas missões diplomáticas, inclusive
imóveis residenciais, acampamentos militares e navios de guerra.
São pressupostos do asilo diplomático36 os mesmos do asilo territorial a
natureza política do delito, o estado de urgência (atualidade da perseguição) e o não
auxílio dos representantes diplomáticos para que a pessoa adentre em sua embaixada.
Uma vez adentrado o limite jurídico do Estado, o embaixador requer o
salvo-conduto (licença pedida ao Estado para que o asilado possa se retirar em
condições de segurança do seu território).
O asilo diplomático, é, portanto, forma preliminar de asilo territorial, pois a
pessoa terá de se deslocar a um porto ou aeroporto, para embarcar para o Estado que lhe
concedeu asilo.
36
SILVA. Op. Cit., nota 32 p. 49.
52
CAPÍTULO 3 – MEDIDAS COMPULSÓRIAS DE SAÍDA
O Estatuto do Estrangeiro prevê três distintos institutos, de diferentes
características, razões e modalidades, para regular a retirada compulsória do estrangeiro
do País: deportação; expulsão; extradição.
3.1 - DEPORTAÇÃO
Entre as formas coercitivas de retirada do estrangeiro do Brasil, temos a
deportação, regulada nos artigos 57 a 64 da Lei 6815/80 e artigos 98 e 99, do respectivo
Decreto de regulamentação.
A deportação consiste em fazer sair do território brasileiro o estrangeiro que
nele tenha entrado clandestinamente ou nele permaneça em situação de irregularidade
legal, se do País não se retirar voluntariamente dentro do prazo que lhe for fixado (art.
57). Segundo estabelece o art. 98, do Decreto 86.715/81, o estrangeiro que entrou ou se
encontra em situação irregular no país, será notificado pela Polícia Federal, que lhe
concederá um prazo variável entre um mínimo de três e máximo de 8 dias, conforme o
caso, para retirar-se do território nacional. Se descumprido o prazo, o Departamento de
Polícia Federal promoverá a imediata deportação.
Vale ressaltar que a deportação só ocorrerá se o estrangeiro não se retirar
voluntariamente depois de haver recebido a notificação da autoridade competente. A
retirada voluntária é, pois, o elemento que diferencia, fundamentalmente, a deportação
dos outros dois meios de afastamento compulsório, a expulsão e a extradição.
A previsão legal de que ao estrangeiro será dado um prazo para que se retire
do país não é absoluta. Se for conveniente aos interesses nacionais, a deportação será
53
efetivada independentemente de ser concedido ao estrangeiro o prazo fixado no Decreto
86.715/81 (art.98, 2º).
A deportação afasta o estrangeiro do país, mas não impede seu regresso, de
forma regular. Exige-se-lhe a Lei 6815/80 que para retornar ao Brasil, o deportado
deverá ressarcir ao Governo brasileiro as despesas efetuadas com sua deportação.
Segundo Guimarães37 estendem-se a uma vasta relação os casos específicos
de Deportação. Incluem-se entre as causas todas as situações em que haja
descumprimento das restrições ou condições impostas ao estrangeiro, quais sejam, por
exemplo: exercer atividade remunerada nos casos em que esta não é permitida;
deslocar-se para regiões além do âmbito estabelecido; afastar-se do local de entrada no
país sem o documento de viagem e o cartão de entrada e saída devidamente visados pelo
Órgão competente; exercer atividade diversa da que foi solicitada e autorizada em
contrato de trabalho; serviçal, com visto de cortesia, que exerça atividade remunerada
para outro que não seja o titular do visto que o chamou; a mudança de empresa a quem
presta serviço o estrangeiro, sem permissão do Ministério do Trabalho; estrangeiro em
trânsito, estudante ou turista que exerça atividade remunerada, entre outras. No rigor da
lei, a estada irregular do estrangeiro, não se refere apenas à permanência no território
nacional por período superior ao permitido, mas, sim, a todas as circunstâncias que
representam qualquer desrespeito aos deveres, restrições ou limites impostos ao
estrangeiro. Estes e outros casos de desobediência às normas fixadas em lei, como causa
de deportação, estão previstas no art. 57, parágrafo 1º, da Lei 6815/80.
Uma legislação que apresenta tais características e, sobretudo, o extremo
rigor com que esta é aplicada, merece ser revista não apenas em aspectos ou disposições
isoladas. Comporta que se repense a convivência da sociedade como um espaço de
horizontes universais, onde vivem seres humanos portadores de valores, de contributos,
de riquezas e de dignidade que ultrapassam as fronteiras da nacionalidade e dos limites
geográficos de um país.
No que tange ao país de destino, a Lei 6815/80, art. 58, parágrafo único: “A
deportação far-se-á para o país de nacionalidade ou de procedência do estrangeiro, ou
para outro que consinta em recebê-lo”. Dá-se direito de opção ao deportando.
37
Francisco Xavier da Silva Guimarães, ex-subsecretário de Estrangeiros do Ministério da Justiça, In:
Revista de Doutrina e Jurisprudência, Brasília, 36(1):9-34,maio /ago 1991.
54
Finalmente, assegura o Estatuto do Estrangeiro que não se procederá a
deportação se esta medida implicar em extradição não admitida pela Lei brasileira (art.
63, Lei 6815/80).
3.2 – EXPULSÃO
A expulsão do estrangeiro que se encontre em território brasileiro está
disciplinada na Lei 6815/80, nos artigos 65 a 75 e no Decreto 86.715/81, art. 100 a 109.
Sem nos determos à análise e discussão, no campo doutrinal, sobre o
instituto da expulsão, buscaremos explicitar o seu tratamento e aplicação nos termos em
que o estabelece o Estatuto do Estrangeiro e o correspondente Decreto de
Regulamentação.
O artigo 65 (Lei 6815/80) determina: “É passível de expulsão o estrangeiro
que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política ou social,
a tranqüilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o
torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais”.
Mas, não se esgotam ali as causas de expulsão, sendo igualmente passível
de deportação, o estrangeiro que (parágrafo único do art. 65):
Praticar fraude a fim de obter sua entrada ou permanência no Brasil, e
havendo entrado no território nacional com infração à lei, dele não se retirar
no prazo que lhe for determinado, não sendo aconselhável a deportação,
entregar-se à vadiagem ou à mendicância ou desrespeitar proibição
especialmente prevista em lei para estrangeiro.
A expulsão é formalizada através de Decreto de competência exclusiva do
Presidente da República, a quem cabe resolver sobre a conveniência e a oportunidade da
expulsão e de sua revogação (art. 66). Uma vez decretada e efetivada a expulsão, uma
de suas graves conseqüências é a impossibilidade do estrangeiro retornar ao Brasil. O
retorno é crime, tipificado no Código Penal brasileiro38, no Capítulo dos Crimes contra
a Administração da Justiça, cujo art. 338 estabelece: “Reingressar no território nacional
o estrangeiro que dele foi expulso: Pena - reclusão, de um a quatro anos, sem prejuízo
de nova expulsão após o cumprimento da pena”. Somente a revogação, de competência
exclusiva do Presidente da República, permitirá seu regresso.
38
Lei 2848, de 07 de dezembro de 1940.
55
Ao Ministro da Justiça compete instaurar o inquérito, que na maior parte das
39
infrações , será sumário, não excedendo ao prazo de 15 dias. É assegurado o direito de
defesa, mas não cabe pedido de reconsideração. O Ministro da Justiça poderá, a
qualquer tempo, determinar a prisão, por noventa dias, do estrangeiro em processo de
expulsão, podendo, igualmente, prorrogar tal medida por outro igual período. Caso o
processo não se conclua no prazo de até 6 meses, o estrangeiro será posto em liberdade
vigiada e, se vier a descumprir as condições de conduta impostas, pode ter sua prisão
decretada novamente. Conforme já referido em capítulo anterior, é inexpulsável o
estrangeiro que tenha cônjuge brasileiro, de quem não esteja separado de direito ou de
fato, ou filho brasileiro sob sua guarda e manutenção econômica (art. 75). Contudo, o
parágrafo 1º do mesmo artigo, ressalva que não impedem a expulsão, a adoção ou
reconhecimento de filho brasileiro superveniente ao fato que a motivar. Igualmente, em
se configurando o abandono do filho, o divórcio ou a separação do casal, a expulsão
poderá ocorrer a qualquer tempo (Parágrafo 2º). Ainda com base no art. 75, da lei
6815//80, não se procederá a expulsão se esta implicar em extradição inadmitida pela lei
brasileira. Expulsão e Refúgio: especificação introduzida no direito nacional,
relativamente à expulsão é o disposto na Lei 9474, de 22 de julho de 1997, a chamada
Lei de Refugiados, que, na verdade, se ocupa da implantação do Estatuto dos
Refugiados de 1951, em nosso país.
A matéria afirma, no direito interno, os
compromissos do Brasil como signatário da Convenção de Genebra, de 1951,
especificamente os artigos 32 e 33, daquela Convenção das Nações Unidas. Assim, a
Lei nº 9474/97, em seu art. 36, é peremptória ao afirmar que não será expulso o
refugiado que esteja regularmente registrado, exceto em caso de existirem motivos de
segurança nacional ou ordem pública. E esclarece, no artigo 37 que, em caso de
decretar-se a expulsão de um refugiado, esta não resultará em sua retirada para país
onde sua vida, liberdade ou integridade física possam estar em risco, e apenas será
efetivada quando houver certeza de que o mesmo irá para um país onde não haja riscos
de perseguição.
Para ultimar, uma referência a respeitáveis juristas brasileiros que,
comentando o direito vigente no Brasil, ao analisar a natureza punitiva da expulsão,
classificam-na como um provimento sancionatório da autoridade administrativa, embora
39
Incluem-se os casos de infração contra a segurança nacional, a ordem política ou social e a
economia popular, assim como os casos de comércio, posse ou facilitação de uso indevido de
substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, bem como o
desrespeito a proibição especialmente prevista me lei para estrangeiros.
56
não se constitua em pena, no sentido específico de sanção à conduta criminosa, imposta
por sentença judicial.
“Assim, pelas características de que se reveste, implicando restrição à
liberdade de locomoção do ser humano no que afasta compulsoriamente o
estrangeiro do território nacional, impõe-se a sua interpretação restrita, com
observância dos princípios publicísticos da legalidade e da amplitude do
direito de defesa” 40.
Com igual precaução e humanidade, manifesta-se Carvalho, face às
conseqüências de que se reveste a expulsão, particularmente no direito brasileiro que a
torna medida em caráter definitivo contra o estrangeiro, restringindo sua revogação a
ato privativo do Presidente da República.
A expulsão, pelo caráter discriminatório de que se reveste, é medida
intrinsecamente odiosa. É preciso, pois, restringi-la aos casos reais e
provadamente atentatórios da ordem pública, cujos limites devem ser
precisamente determinados, quer através a jurisprudência administrativa, quer
através da doutrina. A eficácia da expulsão, como medida de preservação da
ordem pública, não vai a ponto de justificar-lhe decretação sem o mínimo de
observância dos princípios de defesa dos direitos humanos41.
3.3 - EXTRADIÇÃO
A extradição é o ato pelo qual um Estado faz a entrega, para fins de ser
processado ou para a execução de uma pena, de um indivíduo acusado ou reconhecido
culpável de uma infração cometida fora de seu território, a outro Estado que o reclama e
que é competente para julgá-lo e puni-lo.
O Ministério da Justiça, no Guia42 para estrangeiros no Brasil, expressa que
a extradição é ato de defesa internacional, forma de colaboração na repressão do crime.
Objetiva a entrega de um infrator da lei penal, que, no momento, se encontra em nosso
país, para que possa ser julgado e punido por juiz ou tribunal competente do país
requerente, onde o crime foi cometido. Trata-se, pois, de um ato com fundamento na
cooperação internacional no combate e repressão à criminalidade.
A extradição está definida nos artigos 76 a 94 do Estatuto do Estrangeiro, e
constitui uma faculdade do País concedê-la (“poderá ser”), como se depreende do
art.76: “A extradição poderá ser concedida quando o governo requerente se fundamentar
40
CAHALI, Yussef Said, Estatuto do Estrangeiro, Editora Saraiva, 1983, p. 236-237.
41
CARVALHO, Dardeau, A situação Jurídica do Estrangeiro no Brasil. São Paulo, Sugestões
Literárias S.A., 1976, p. 113.
42
Ministério da Justiça: Guia para Orientação a estrangeiros no Brasil, Departamento de
Estrangeiros da Secretaria de Justiça , Brasília-DF, 1997.
57
em tratado, ou quando prometer ao Brasil a reciprocidade”. Baseia-se, pois, em pedido
de governo estrangeiro, fundamentado em tratado existente com o Brasil ou em
compromisso de reciprocidade.
A legislação brasileira é taxativa quanto às situações em que a extradição
não será concedida (art. 77):
I – se tratar de brasileiro, salvo se a aquisição dessa nacionalidade se verificar
após o fato que motivar o pedido;
II – quando o fato que está à base do pedido não for crime no Brasil ou no
Estado requerente;
III – nos casos em que o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar
o crime imputado ao extraditando;
IV – se a pena imposta pela lei brasileira para o crime for igual ou inferior a
um ano;
V – no caso em que o extraditando estiver respondendo processo ou já
houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se
funda o pedido de extradição;
VI – quando estiver a extinta a punibilidade pela prescrição de acordo com a
lei brasileira ou a do Estado requerente;
VII – se o for pedida com base em crime político; mas essa exceção não
impedirá a extradição, quando o crime comum, conexo ao delito político,
constituir o fato principal;
VIII – se o extraditando tiver que responder, no Estado requerente, perante
um Tribunal ou Juízo de Exceção.
A apreciação do caráter da infração alegada pelo Estado requerente é de
competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal (Art. 77, parágrafo 2º).
Ainda segundo a Lei 6815/80, a extradição será requerida por via
diplomática, ou na falta de agente diplomático, diretamente de governo a governo.
Recebido o pedido, o Ministério das Relações Exteriores o enviará ao Ministério da
Justiça, que o remeterá ao Supremo Tribunal Federal (STF). Assinalamos aqui mais
uma disposição do Estatuto do Estrangeiro derrogada pela Constituição Federal de
1988. Senão vejamos: Dispõe a Lei 6815/80 que “o Ministério da Justiça ordenará a
prisão do extraditando, colocando-o à disposição do Supremo Tribunal Federal” (art.
81). Promulgada em 1988, a Constituição Federal ao tratar dos Direitos e Garantias
Fundamentais, assegura “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei” (CF, art. 5º, inciso
LXI).
A Jurisprudência do STF confirma a revogação do dispositivo da Lei
6815/80. Vejamos decisão unânime do Tribunal Pleno, em pedido de Habeas Corpus de
extraditando:
58
Ementa: - Prisão de Extraditando: artigos 80 e 81 da Lei nº 6815/80, de
19.08.980, alterada pela Lei 6.964, de 09 de 12.1981. Alegações de
ilegalidade da prisão porque: 1ª) – não solicitada pelo Juiz processante, do
Estado requerente da extradição (art. 80); 2ª) – decretada por Ministro do
Supremo Tribunal Federal, quando deveria ter sido pelo Ministro da Justiça
(art. 81); 3ª) – não apresentada legislação do Estado requerente, relativa à
prescrição (art. 80, “caput”); 4ª) – inválido o decreto de prisão, emitido pelo
Juiz processante, por não conter a descrição dos fatos delituosos, nem indicar
a data da ocorrência, sua natureza e circunstâncias. 1. Tendo sido a prisão
preventiva decretada pelo Juiz processante, no Estado estrangeiro, e a ordem
de captura encaminhada às autoridades brasileiras competentes, por via
diplomática, com pedido de extradição, é de ser rejeitada a alegação de que
não foi solicitada (a prisão) pelo referido Juiz. 2. O art. 81 da Lei 6815, de
19.08.1980, alterada pela Lei 6964, de 09.12.1981, atribuía ao Ministro da
Justiça o poder de decretar a prisão do extraditando. Tal norma ficou, nesse
ponto, revogada pelo inciso LXI do art. 5º da Constituição Federal de 1988,
em razão do qual, excetuadas as hipóteses referidas, “ninguém será preso
senão por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente”. 3. Tal competência passou, então, para o Ministro do Supremo
Tribunal Federal, a quem caberá, também, relatar o pedido de Extradição,
conforme decidiu o S.T.F. (RTJ 127/18). 4. Sendo minuciosa, na decisão do
Juiz processante, no Estado estrangeiro, a descrição dos fatos delituosos, a
indicação do período em que ocorridos, assim como a sua natureza e
circunstâncias, repele-se a alegação em contrário, contida na impetração do
“writ”. 5. Embora não encaminhados, pelo Governo requerente da
Extradição, os textos legislativos sobre prescrição, nada impedia que o
Relator desta convertesse o julgamento em diligência, fixando prazo de
sessenta dias para tal fim, como aconteceu no caso, cabendo invocar o
precedente, no mesmo sentido, da Extradição nº 457. 6. Não caracterizado,
até o momento, qualquer constrangimento ilegal à liberdade do paciente, é de
se indeferir o pedido de “habeas corpus”. 7. “H.C.” indeferido. Votação
unânime43.
Importante ressaltar ainda que “nenhuma extradição será concedida sem o
prévio pronunciamento do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre sua legalidade e
procedência, não cabendo recurso da decisão” (art. 83).
Aspecto que vem sendo mantido com pleno rigor pelo Supremo Tribunal
Federal é a prisão do extraditando ao longo de todo o processo, em cumprimento ao
estabelecido no parágrafo único, do art. 84: “A prisão perdurará até o julgamento final
do Supremo Tribunal Federal, não sendo admitidas a liberdade vigiada, a prisão
domiciliar, nem a prisão-albergue”.
Extradição e Refúgio: O Brasil aprovou, em 1997, a Lei 9474, que define
mecanismos para implantação do Estatuto dos Refugiados de 1951 e determina outras
providências. Dispõe, tal diploma legal, em capítulo específico sobre a Extradição que
“O reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido
43
SANCHES, Sydney (Ministro Relator): Habeas Corpus 73256/SP – São Paulo, DJ 13-12-1996, pp
50161
59
de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio” (art. 33,
Lei 9474/97).
Assegura, também, a Lei de Refugiados a suspensão do processo de
Extradição pendente, se o extraditando apresentar solicitação de refúgio baseado nos
mesmos fatos. Independe, neste caso, esteja o processo em fase administrativa ou
judicial (art. 34, Lei 9474/97).
60
CAPÍTULO 4 – EXTRADIÇÃO NO CASO CONCRETO
(CASO
BATTISTI)
Battisti44 era filho e neto de comunistas e, quando adolescente, cometeu
alguns roubos, razão pela qual foi preso. Na prisão de Udine conheceu a Cavallina, que
estava lá por um delito relacionado com seu grupo político, PAC. Ele convenceu a
Battisti de que devia entrar nos PAC.
A primeira vez que Battisti foi julgado como preso político, em 1979, os
crimes dos quais foi acusado eram: possuir armas não registradas e associação para
cometer atos subversivos.
Depois da morte de Torregiani a polícia fez uma blitz completa em toda a
cidade. Um dos lugares mais vasculhados foi o prédio popular onde morava Battisti.
Ele foi detido no começo de junho de 1979, por ter sido encontrado numa
das guaridas do PAC na Barona (bairro de Milão), mas até essa data ninguém tinha
manifestado receio de que ele estivesse envolvido nas 4 mortes recentes.
Sua condenação foi exclusivamente por ter armas e formação de quadrilha
com finalidade subversiva. A pena (12 anos e 10 meses de prisão) foi exagerada porque
as leis da época puniam o máximo possível os delitos políticos (Um criminoso comum
não teria levado mais de 3 anos pelos mesmos delitos).
No apartamento em que Battisti morava foram encontradas algumas armas.
A polícia fez perícia de todas elas, e comprovou que nenhuma tinha sido usada.
Um fato muito importante é que, quando Battisti foi detido e julgado em
seguida da blitz em junho de 79, em nenhum momento se cogitou que ele tivesse
alguma participação na morte de Torregiani. Nessa data, já tinham sido cometidos todos
44
Disponível em: http://sites.google.com/site/lungarbattisti/resumo-do-livr Acessado em 13/11/2009.
61
os assassinatos do PAC, e o assunto estava à flor de pele, não só na sociedade milanesa,
mas em toda Itália.
A blitz em que Battisti e outros foram presos foi realizada para indagar
sobre os 4 assassinatos. Portanto, era de esperar que todos os detentos fossem
interrogados sobre isso. Mas Battisti nunca foi interrogado, o que mostra que a polícia
não suspeitava dele. Houve durante esse julgamento, que se estendeu durante vários
meses, 13 denúncias de casos de torturas.
Vale enfatizar que, mesmo sob tormentos, nenhum dos torturados
mencionou a Battisti como possível suspeito. Alguns dos torturados acusaram outros
companheiros, mas o nome de Battisti nunca foi mencionado. Aliás, tanto os outros
guerrilheiros como a polícia sabiam que Battisti era um membro recente no grupo, e que
não possuía nenhuma posição hierárquica importante dentro dele.
Se ele realmente tivesse cometido aqueles crimes deveria haver pelo menos
duas ou três pessoas que o soubessem, já que nenhum deles foi praticado por uma
pessoa sozinha.
Durante o tempo que durou aquele processo, que foi coletivo, Battisti foi
enviado com os outros a uma prisão da província de Cuneo (Piemonte), custodiada pelo
exército. Apesar disso, tudo indica que a escolha não foi seletiva contra Battisti, porque
era usual internar nesse lugar membros de grupos armados.
Em maio de 1980, uma juíza se empenhou em tirar a Battisti dessa prisão,
porque sabia que ele não tinha cometido nenhuma morte. Ela tinha acesso a toda sua
informação e saberia se Battisti era acusado de assassinato.
Nesse mesmo mês, a magistrada conseguiu que Cesare fosse transferido à
prisão de Frosinone, uma velha fortaleza com segurança não muito boa. Na Itália,
ninguém colocaria um suspeito de assassinar dois agentes do estado e dois abastados
fascistas num cárcere de média ou baixa segurança.
4.1 - CRONOLOGIA
1976: Surgia o grupo guerrilheiro radical de esquerda Proletários Armados
Pelo Comunismo (PAC). Fundado em oposição às Brigadas Vermelhas, conta com
62
inúmeros dissidentes das brigadas. Seus principais líderes e idealizadores são
Sebastiano Masala e Arrigo Cavallina45.
1978: Sequestro e assassinato (9/5/1978) do líder democrata-cristão Aldo
Moro pelo grupo guerrilheiro Brigadas Vermelhas. Nesta época, Cesare Battisti integra
o Proletários Armados Pelo Comunismo (PAC). Após o assassinato de Aldo Moro a
opinião pública italiana volta-se em peso contra os grupos armados.
1979: Cesare Battisti é preso em Milão pela morte de um joalheiro
1981: Condenado na Itália a 12 anos e 10 meses de prisão por "participação
em bando armado" e "ocultação de armas". No mesmo ano, ele foge para França.
1982: Fuga para o México. Durante sua estadia no país é colaborador de
diversos jornais, funda a revista literária Via Libre, e organiza a primeira Bienal de
Artes Gráficas no México.
1985: Doutrina Miterrand: o presidente francês François Mitterrand se
compromete a não extraditar os ex-ativistas de extrema esquerda italiana sob a condição
de que abandonem a luta armada.
1991: A França nega o pedido italiano de extradição.
1993: Battisti é condenado à prisão perpétua pela Justiça de Milão por
quatro "homicídios hediondos", contra um guarda carcerário, um agente de polícia, um
militante neofascista e um joalheiro.
2001: Battisti pede naturalização francesa
2002: A Itália pede a extradição de Battisti ao governo francês.
2004: - Justiça francesa decide pela extradição, o que desencadeia protestos
de intelectuais, artistas e políticos franceses de esquerda. A sentença tem apoio do
presidente Jacques Chirac. Inicia-se uma longa discussão jurídica sobre a extradição,
alimentada por recursos de advogados. - Battisti é libertado e mantido sob vigilância. Ao não se apresentar à polícia, Battisti cai na clandestinidade. Seu novo esconderijo
será o Brasil. - Recurso de Battisti é rejeitado e a ordem de extradição para a Itália
torna-se definitiva.
2005: O Conselho de Estado da França dá sinal verde à extradição. No
início de agosto, os advogados dele recorrem à Corte Europeia de Direitos Humanos.
2006: A anulação feita em 2004 do pedido de naturalização francesa, que
havia recebido uma decisão favorável ainda em 2003, é cancelada.
45
Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,confira-a-cronologia-e-entenda-o-casobattisti,341730,0.htm Acessado em 15/11/2009.
63
2007: Battisti é preso no calçadão de Copacabana, no Rio de Janeiro.
2008: Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) rejeita por 3 votos a 2
o pedido de refúgio de Battisti. A defesa do italiano recorre ao ministro da Justiça,
Tarso Genro, para tentar obter o status de refugiado, o que lhe garantiria o direito de
viver livremente no Brasil
2009- Janeiro:- Dia 13: Tarso concede refúgio político a Battisti.
Autoridades italianas reagem com indignação - Dia 16: Gilmar Mendes pede parecer ao
procurador-geral sobre o caso - Dia 17: Presidente da Itália, Giorgio Napolitano, envia
carta a Lula dizendo-se 'espantado' - Dia 22- Lula é alvo de protesto na Itália. "Bin
Laden, peça asilo no Brasil", dizia um dos cartazes - Dia 23: Em carta, Lula diz ao
presidente italiano que decisão está amparada na Constituição - Dia 26: Procurador
opina e recomenda que pedido de extradição seja arquivado - Dia 27: Itália chama
embaixador de volta a Roma para discutir o caso.
4.2 – DECISÕES
Na última quarta-feira, dia 18/11/2009, o STF46 aprovou a extradição do exativista do grupo Proletários Armados pelo Comunismo (PAC). Posteriormente, os
magistrados entenderam que a decisão final sobre o caso cabe ao presidente Lula, que
poderá ou não seguir a indicação. O chanceler italiano, Franco Frattini, afirmou neste
sábado, segundo a agência Ansa, que a decisão do Supremo em favor da extradição
impôs uma "derrota política" ao ministro Tarso, que em janeiro concedeu refúgio
político ao italiano.
Segundo Tarso, essa questão já poderia ter terminado com o seu despacho.
"O Supremo resolveu analisar o despacho, mesmo contra a lei, porque ela é
absolutamente clara - dizendo que o despacho do ministro interromperia o processo de
extradição. O STF tem o direito de fazer essa análise porque é o órgão supremo que faz
a interpretação das normas. Na minha opinião, interpretou de maneira equivocada. Mas
tem o direito de fazer e a posição tem de ser respeitada."
O presidente Lula não tem prazo para resolver se extradita ou não Battisti.
E, segundo Tarso, ele vai decidir a questão quando achar mais conveniente para os
46
Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI4115605-EI306,00Tarso+nega+derrota+politica+em+decisao+do+STF+sobre+Battisti.html Acessado em: 23/11/2009.
64
interesses do País e para manter a coerência com o sistema legal e constitucional do
Brasil.
O presidente pode decidir na hora que quiser, mas ele já disse
que vai esperar a publicação do Supremo. O Battisti tem um processo que é
de falsidade ideológica - entrou com documentos falsificados no Brasil - e a
lei não permite qualquer decisão de extradição quando o réu está
respondendo a outro processo, disse Tarso.
Nosso papel já terminou nesse processo. A não ser que o advogado
dele queira, em face dos últimos acontecimentos e das últimas manifestações
de alguns ministros italianos, comprovando inclusive que o caso é político e
que uma parte do governo italiano tem interesse especial em tê-lo sem seu
território, que ele queira fazer um outro pedido de refúgio com novos
fundamentos. Aí volta para o Ministério da Justiça. Por enquanto isso não é
mais uma questão nossa.
O processo sobre a extradição de Battisti agora é um assunto da AdvocaciaGeral da União (AGU) e do Supremo.
65
CONCLUSÃO
Para concluir este trabalho, é preciso destacar que, como ponto fundamental
de soberania (artigo 1º, inciso I, da Constituição Federal), da independência nacional e
da autodeterminação dos povos (artigo 4º, incisos I e III, da Constituição Federal), a
República Federativa do Brasil, através da União (artigo 22, inciso XV, da Constituição
Federal), possui plena liberdade para escolher e modificar sua política de tratamento aos
estrangeiros em seu território, estabelecendo as regras conforme os interesses nacionais
e as conveniências políticas, sociais e econômicas do país. Porém, é importante que
cada vez mais os países se encontram necessariamente interdependentes na tutela de
interesses mundiais, considerando a vida e a dignidade do ser humano como valores
universais. A própria Declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu artigo 1º,
pontifica que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos, e que
devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade. Ao regulamentar e
aplicar os institutos do visto, asilo político, deportação, expulsão e extradição, não
apenas o Brasil, mas todos os Estados, devem considerar que a soberania não é um
conceito absoluto, encontrando limitações na preservação dos direitos fundamentais e
supra-estatais dos indivíduos, devendo ser balizada pela solidariedade internacional e
cooperação entre os povos para o progresso da humanidade, buscando uma
harmonização diplomática entre os países e, principalmente, a prevalência dos direitos
humanos.
Não devemos dar ao estrangeiro tratamento que não gostaríamos de receber
longe de nossa partia, nem alimentar ou fomentar sentimentos de ódio ou de hostilidade
66
contra nenhuma nação, povo ou raça. Além disso, todo estrangeiro deve portar-se de
modo digno da hospitalidade recebida, e o mesmo vale para nós, quando nos
encontrarmos em outro país.
O estrangeiro legalmente presente num país goza dos mesmos direitos
humanos e civis dos nacionais, tem as mesmas garantias de proteção das leis, mas, por
outro lado, é sujeito aos mesmos deveres, sendo obrigado a respeitar a legislação do país
e submeter-se à mesma burocracia legal para sua tranqüilidade, estabilidade ou
legalização.
Para finalizar, ainda foi abordado com mais ênfase o tema sobre a
extradição que é o processo oficial onde um Estado solicita e obtém de outro a entrega
de uma pessoa condenada por, ou suspeita de infração criminal.
O direito internacional expõe que nenhum Estado é obrigado a extraditar
uma pessoa presente em seu território, devido ao princípio da soberania estatal. Por este
motivo, o tema costuma ser regulado por tratados bilaterais que podem gerar, a
depender da redação, este tipo de obrigação.
A pessoa em processo de extradição chama-se extraditando. O Estado que
solicita a extradição denomina-se "Estado requerente" e o que recebe o pedido, "Estado
requerido".
67
REDERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público.15ª
Edição Revista Ampliada Volume II. Rio de Janeiro, Editora RENOVAR, 2004.
Dolinger, Jacob – Direito Internacional privado: parte geral, 8. Ed. Atualizada
e ampliada – Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2005.
Silva, Roberto Luiz – Direito Internacional Público, Primeira Edição, Segunda
Tiragem, Editora Del Rey – Belo Horizonte – 2000.
CAHALI, Yussef Said, Estatuto do Estrangeiro, Editora Saraiva, 1983.
CARVALHO, Dardeau, A situação Jurídica do Estrangeiro no Brasil. São
Paulo, Sugestões Literárias S.A., 1976,
Ministério da Justiça: Guia para Orientação a estrangeiros no Brasil,
Departamento de Estrangeiros da Secretaria de Justiça , Brasília-DF, 1997.
SANCHES, Sydney (Ministro Relator): Habeas Corpus 73256/SP – São Paulo,
DJ 13-12-1996, pp 50161.
LUNGARZO, Carlos Alberto, Battisti no Brasil - São Paulo, outubro de 2009.
Disponível em: http://sites.google.com/site/lungarbattisti/resumo-do-livr Acessado em
13/11/2009.
68
Estadão.com.br - Disponível em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,confira-a-cronologia-e-entenda-o-casobattisti,341730,0.htm Acessado em 15/11/2009.
LEAL,
Fabiana,
Redação
Terra
–
Porto
Alegre.
Disponível
em:
http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI4115605-EI306,00Tarso+nega+derrota+politica+em+decisao+do+STF+sobre+Battisti.html Acessado em:
23/11/2009.
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