A deputada Iracema Portella (PP-PI) pronuncia o seguinte discurso: Senhor presidente, senhoras deputadas e senhores deputados, Durante toda a semana passada, de 18 a 22 de março de 2013, estive na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, com um grupo de parlamentares, participando de um curso sobre o desenvolvimento na primeira infância. Foi, sem dúvida, uma das mais interessantes e enriquecedoras experiências que tive. Voltei com a convicção de que precisamos, urgentemente, investir nas nossas crianças desde muito cedo: a infância é uma questão de Estado. Os seis primeiros anos de vida são cruciais para o desenvolvimento intelectual, emocional e comportamental. É uma fase da existência humana única, que representa uma grande janela de 1 oportunidades para a família, para a escola, para a comunidade e para o Poder Público. Investir na primeira infância, com políticas públicas ousadas e criativas em várias áreas, é investir no desenvolvimento do Brasil, é criar as condições para que nossas crianças sejam adultos felizes, equilibrados, realizados e preparados para enfrentar os desafios do mundo contemporâneo. Nestes dias em Harvard, tivemos a oportunidade de ouvir especialistas de várias partes do mundo, que trouxeram sua visão sobre a importância dos primeiros anos de vida, sempre tendo como base as últimas pesquisas científicas sobre o tema. É na primeira infância, por exemplo, que ocorrem as principais sinapses, que são as ligações entre os neurônios. Nascemos com cerca de 1 bilhão de neurônios, que, no entanto, não estão conectados. Essas conexões se formam a partir dos estímulos que as crianças recebem. 2 Daí a importância do investimento nessa fase. Os especialistas afirmam que quanto melhor a atenção nos primeiros anos de vida, maior será a capacidade da criança no aproveitamento das oportunidades educacionais futuras e menores serão os custos envolvidos na garantia dessas chances. O economista brasileiro Ricardo Paes de Barros, um dos palestrantes do curso, diz que “a qualidade do atendimento na primeira infância é capaz de afetar a renda nacional, os níveis de pobreza e a necessidade de programas sociais compensatórios para jovens e adultos”. Segundo ele, investir na primeira infância é uma decisão acertada para os governantes, na medida em que é uma forma de combater a desigualdade futura. “Afinal, nas idades mais avançadas, quando já existem notáveis diferenças de resultados entre os indivíduos, o ideal em termos de eficiência é investir preferencialmente naqueles com melhor desempenho e maior talento (investimento meritocrático), o que acaba reforçando as desigualdades. Durante a primeira infância, no entanto, todas as crianças são potencialmente iguais 3 e o atendimento equitativo não compromete a eficiência”, sustenta o economista. Os especialistas defendem uma mudança de paradigma nas políticas públicas voltadas para a primeira infância. O estudioso Jack Shonkoff, outro palestrante do curso em Harvard, disse que as experiências precoces e as influências ambientais afetam a saúde em longo prazo. Por isso, ele acredita que é um equívoco centrar as políticas para a primeira infância apenas na questão educacional. De acordo com Shonkoff, há uma necessidade clara de adotar estratégias mais eficazes para proteger as crianças das consequências biológicas que surgem de situações adversas que elas enfrentam. “Um ambiente de relações estáveis, estimulantes e protetoras constrói uma base forte para uma vida de aprendizado efetivo. Em contraste, quando crianças são sobrecarregadas por adversidades significativas, estresse e sistemas de respostas são superativados, circuitos cerebrais em desenvolvimento podem ser prejudicados, sistemas metabólicos de regulação e o desenvolvimento de órgãos podem ser interrompidos e a probabilidade de problemas no aprendizado, 4 comportamento e saúde mental e física crescem”, explica o especialista. Diante dessas evidências, os especialistas propõem um novo plano de intervenção na primeira infância. Esse programa deve incluir, por exemplo, estratégias para reduzir barreiras no aprendizado, melhorando esse aprendizado; ações para aprimorar a capacidade da família, dos cuidadores e dos professores em suavizar os efeitos do estresse tóxico; construção de bases para a saúde da criança; construção de habilidades funcionais e fortalecimento da saúde mental. Já existe consenso entre os estudiosos de que os fundamentos da arquitetura cerebral são formados desde cedo. As condições do ambiente e as experiências pessoais têm um significativo impacto nessa construção. “Um ambiente que proporciona o crescimento, com nutrientes adequados, livre de toxinas e cheio de interações sociais com uma pessoa que cuida deles com carinho, prepara a arquitetura do desenvolvimento do cérebro para um ótimo funcionamento quando num ambiente saudável. Em contrapartida, um primeiro ambiente 5 adverso, aquele que é carente de nutrientes, que contém toxinas, ou é privado de estimulação sensorial, social e emocional apropriadas, resulta em um circuito cerebral defeituoso”, diz o estudioso Charles Nelson, que também proferiu palestra no curso. Segundo os novos achados da neurociência, as habilidades que nos permitem controlar nossos impulsos, fazer planos e permanecer focados são desenvolvidas, principalmente, na primeira infância, a partir dos estímulos que as crianças recebem e das condições do ambiente em que elas vivem. Por isso, dizem os especialistas, é fundamental proporcionar o suporte que as crianças necessitam para desenvolver essas habilidades em casa, na creche, na pré-escola e em outros ambientes que elas frequentam. É uma missão de toda a sociedade. Os estudiosos afirmam também que as políticas que dão ênfase apenas à alfabetização de crianças estão perdendo uma grande oportunidade de aumentar sua efetividade ao incluir o foco nessas habilidades, chamadas de função executiva. “Profissionais de cuidado e educação precoce – bem como professores 6 de jardim de infância e ensino elementar – poderiam estar mais bem equipados para compreender e enfrentar desafios de comportamento e aprendizagem em suas salas de aula se eles tivessem formação profissional em desenvolvimento de habilidades de função executiva”, destaca a especialista Bette Hyde. Durante estes dias na Universidade de Harvard, pudemos aprofundar a discussão sobre os novos caminhos das políticas públicas na área da primeira infância. Vimos que os programas de primeira infância efetivos geram benefícios para a sociedade que em muito superam os custos dessas ações. Análises feitas por economistas demonstraram que investimentos em educação e desenvolvimento nos primeiros anos de vida produzem os melhores resultados. A maior parte desses resultados, que variam de $3 a $16 por dólar investido, beneficiam a comunidade com redução da criminalidade, bem-estar e 7 remediação educacional, aumento dos impostos coletados de rendas mais altas dos participantes de programas de primeira infância quando atingem a vida adulta. No entanto, se por um lado, temos cada vez mais evidências científicas da necessidade premente do investimento nos primeiros anos de vida; por outro, ainda não alcançamos a excelência nessas políticas. Também não atingimos a escala necessária para que todas as crianças pequenas sejam beneficiadas por programas capazes de protegê-las e ajudá-las a desenvolver todas as potencialidades. As políticas voltadas para a primeira infância devem levar em consideração os achados científicos sobre a importância dessa fase da vida e devem ser capazes de aliar ações em várias áreas: saúde, educação, apoio à família, apoio à comunidade, moradia, saneamento básico, entre outras. Somente programas coordenados, que tenham o viés da intersetorialidade, serão capazes de oferecer às nossas crianças as ferramentas necessárias para que 8 elas tenham uma sólida formação educacional e possam crescer com muito mais saúde e equilíbrio. Era o que tinha a dizer. Muito obrigada. 9