do linear ao hipertextual: as modificações no texto matemático e

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DO LINEAR AO HIPERTEXTUAL: AS MODIFICAÇÕES NO TEXTO
MATEMÁTICO E SUAS IMPLICAÇÕES À COGNIÇÃO.
Silvana Faria de Melo
Faculdade de Educação – USP
[email protected]
Introdução
O processo de humanização, ou seja, a diferenciação do comportamento humano
para o dos outros animais, iniciou-se, tal como indica Kenski (2003), a partir do
momento em que os homens começaram a utilizar os recursos existentes na natureza em
benefício próprio. Assim, passaram a desenvolver instrumentos e artefatos que
possibilitaram a superação de suas fragilidades físicas e a satisfação de suas
necessidades básicas de conforto corporal, segurança, alimentação, saúde e
desenvolvimento cultural.
Abrigos, roupas, armas, entre outros artefatos foram criados, descobertos,
utilizados e transformados em grupo, tornando-se um precioso acervo que vem sendo
transmitido de geração para geração ao longo de toda a história da humanidade, de tal
forma que “o homem transita culturalmente mediado pelas tecnologias que lhe são
contemporâneas. Elas transformam suas maneiras de pensar, sentir, agir. Mudam
também suas formas de se comunicar e adquirir conhecimentos”. (KENSKI, 2003, p.
21).
A contemporaneidade, por sua vez, está marcada pela presença de uma nova
sociedade tecnológica, baseada nos avanços das tecnologias digitais de comunicação e
informação, pela microeletrônica e pelas telecomunicações. Tais tecnologias,
caracterizadas como midiáticas, geram produtos que têm como principais características
a linguagem digital hipertextual, a ampliação da possibilidade de interação
comunicativa, a acelerada multiplicação da quantidade de informação e a capacidade de
deslocar o homem de sua espacialidade física para um mundo virtual, para o
ciberespaço.
Lévy (1993) indica que estamos vivendo sob uma nova tecnologia da
inteligência que, tal como a oralidade, a escrita e o texto impresso, tem o potencial de
condicionar o pensamento humano. Pois,
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As tecnologias intelectuais situam-se fora dos sujeitos
cognitivos, como este computador sobre minha mesa ou este
livro em minhas mãos. Mas elas estão entre os sujeitos como
códigos compartilhados, textos que circulam, programas que
copiamos, imagens que imprimimos e transmitimos por via
hertziana. Ao conectar os sujeitos, interporem-se entre eles, as
técnicas de comunicação e de representação estruturam a rede
coletiva e contribuem para determinar suas propriedades. As
tecnologias intelectuais estão ainda nos sujeitos, através da
imaginação e da aprendizagem. Mesmo com as mãos vazias e
sem mexermos, pensamos com escritas, métodos, regras,
compassos, quadros, oposições lógicas, cantigas algorítmicas,
modos de representação e visualização diversos. (LÉVY, 1993,
p.173-174)
Nesse sentido, este artigo pretende relatar alguns dos caminhos que vêm sendo
perseguidos pela pesquisa em desenvolvimento, que busca identificar algumas
diferenças entre as tecnologias tipográficas e as digitais de leitura e escrita do texto
matemático, para delas tentar inferir as mudanças que estão ocorrendo na cognição e
suas implicações para a aprendizagem da matemática. Pois, as tecnologias informáticas
vêm aos poucos tornando obsoleta a racionalidade e a exatidão do paradigma cartesiano,
que frequentemente se confundem com a própria matemática, para assumir uma
identidade baseada na idéia da rede e na metáfora do hipertexto.
Tecnologia Tipográfica
Paralelamente às tecnologias ligadas à mecânica, que têm por objetivo a
substituição ou a ampliação das capacidades físicas humanas, o homem sempre
desenvolveu sofisticadas tecnologias da inteligência. Para Lévy (1993), elas
representam construções intelectuais das sociedades humanas, criadas para garantir a
possibilidade de o homem avançar em seu conhecimento e aprender mais.
São vários os autores que consideram a linguagem oral como a primeira tecnologia da
inteligência utilizada pelos homens para a apreensão e uso dos conhecimentos. Nos
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períodos mais afastados da humanidade, o homem se utilizou de algumas formas de
comunicação para demonstrar sentimentos, necessidades, conhecimentos: a linguagem
dos gestos, os desenhos em cavernas e as primeiras manifestações da linguagem oral.
Porém, foi a linguagem oral que permitiu ao homem a transmissão de sua cultura para
as gerações posteriores. A essa oralidade, Lévy (1993) chama de primária,
diferenciando-a da oralidade secundária, na qual coexiste a escrita.
O advento da escrita fez surgir um novo momento para a civilização. Anteriormente a
ela, a palavra oral e suas mensagens só podiam ser armazenadas na memória dos
indivíduos e, a cada repetição, essas mensagens podiam ser alteradas, perder emoções
ou ganhar recriações. A linguagem escrita permitiu um avanço no processo
comunicativo, uma vez que permitiu que o comunicador e o informando não mais
precisassem estar inseridos num mesmo contexto de espaço e tempo, permitindo que as
informações fossem preservadas e divulgadas com maior facilidade.
Kenski (2003, p.36) avalia que “a partir da escrita se dá a autonomia do pensamento”,
pois os conhecimentos passam a ser apreendidos, “não na forma como foram
enunciados, mas no contexto em que o escrito é lido e analisado”, o que permite que a
razão e os aspectos cognitivos da personalidade do receptor predominem no processo de
leitura da mensagem.
A invenção da imprensa por Gutenberg, em 1945, possibilitou um novo espaço para a
escrita – os livros. Além de terem permitido a difusão do conhecimento e das práticas de
escrita e leitura, a tecnologia da impressão também proporcionou novas formas de ler e
escrever, novas formas de cognição.
A impressão, por exemplo, à primeira vista é sem dúvida um
operador quantitativo, pois multiplica as cópias. Mas representa
também a invenção, em algumas décadas, de uma interface
padronizada
extremamente
original:
página
de
título,
cabeçalhos, numeração regular, sumários, notas, referências
cruzadas. Todos esses dispositivos lógicos, classificatórios e
espaciais sustentam-se uns aos outros no interior de uma
estrutura admiravelmente sistemática: não há sumário sem que
haja capítulos nitidamente destacados e apresentados; não há
sumários, índice, remissão ou outras partes do texto, e nem
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referências precisas a outros livros sem que haja páginas
uniformemente numeradas. (LÉVY, 1993, p. 34).
A extensa e contínua superfície do rolo de papiro ou pergaminho, que impunha uma
escrita sem retornos ou retomadas, foi substituída pelo texto impresso em páginas com
limites claramente identificados, permitindo tanto ao autor quanto ao leitor o controle e
a retomada da escrita e da leitura, avanços e a fácil localização de trechos.
Kenski (2003) também considera que o processo seqüencial da escrita alfabética e, em
especial do texto impresso, afetou não apenas a linguagem e a organização do
pensamento, mas também a própria percepção. A partir do momento que aprendemos a
ler e a escrever, da esquerda para a direita e de cima para baixo, nossas orientações
espaciais passam a seguir esse mesmo critério como, por exemplo, o passado se orienta
sempre a nossa esquerda, enquanto cabe ao futuro a posição da direta.
O processo seqüencial, espacial e numericamente organizado da escrita no livro levou
Galileu a definir o universo por meio da imagem metafórica de um livro expresso na
linguagem matemática.
A Ciência está escrita nesse imenso livro que continuamente se
abre sobre os olhos (refiro-me ao Universo), livro que só pode
ser entendido, entretanto, se aprendermos a entender sua língua
e conhecer os caracteres nos quais está escrito. Ele está escrito
em linguagem matemática e os caracteres são triângulos,
círculos e outras formas geométricas sem cujos meios é
humanamente impossível entender-se uma só palavra; sem eles
é um vagar inútil por um obscuro labirinto. (GALILEU apud
MACHADO, 2005, p. 142).
Assim, o texto impresso caracteriza-se por sua ordenação e linearidade, idéias
que também estão associadas à matemática. Historicamente, a natureza e especificidade
do conhecimento matemático levaram-no a determinar as regras de exatidão e
formalização de todas as outras ciências e, por meio das idéias de Descartes, expressas
em 1637, em Discurso do Método, a organização linear passou a se tornar o princípio
para a organização não só das ciências, mas também do próprio conhecimento.
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Concepção Cartesiana do Conhecimento
Em sua obra Geometria, ao tratar das progressões geométricas, Descartes conclui que
não é difícil encontrar qualquer um de seus termos a partir do momento em que são
conhecidos os dois ou três primeiros termos. Assume-se, desta forma, a idéia de uma
ordem natural, inerente à progressão do conhecimento. O desconhecido, o ignorado,
passou a ser considerado como algo que será necessariamente descoberto, à medida que
é construída uma cadeia de razões que parte daquilo que já conhecemos.
Portanto, inspirado no rigor da matemática, em Discurso do Método, Descartes
generaliza o procedimento matemático que faz do desconhecido um termo relativo ao
conhecimento existente e apresenta uma seqüência de atitudes que devem ser levadas a
cabo para que nos encaminhemos em direção à verdade:
O primeiro era o de nunca aceitar algo como verdadeiro o que
eu não conhecesse claramente como tal; ou seja, de evitar
cuidadosamente a pressa e a prevenção, e de nada fazer constar
de meus juízos que não se apresentasse tão clara e distintamente
a meu espírito que eu não tivesse motivo algum de duvidar dele.
O segundo, de repartir cada uma das dificuldades que eu
analisasse em tantas parcelas quanta fossem possíveis e
necessárias a fim de melhor solucioná-las.
O terceiro, o de conduzir por ordem meus pensamentos,
iniciando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer,
para elevar-me, pouco a pouco, como galgando degraus, até o
conhecimento dos mais compostos, e presumindo até mesmo
uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos
outros.
E o último, o de efetuar em toda a parte relações metódicas tão
completas e revisões tão gerais nas quais eu tivesse a certeza de
nada omitir. (DESCARTES, 1999, p. 49-50).
Seu método propõe, portanto, uma cadeia de raciocínio que tem profundos reflexos nas
ciências, nos desenhos dos processos industriais e principalmente na educação atuais,
onde predominam idéias como a seriação, a divisão do conhecimento em disciplinas
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independentes, os pré-requisitos, entre outras. A imagem do conhecimento passa a ser
comparada a uma cadeia em que caminhamos linearmente, tendo que percorrê-la elo por
elo, a partir do simples em direção ao complexo.
Machado (2005) afirma que a organização linear está amplamente presente na
organização escolar, porém é na matemática em que ela se encontra de forma mais
acentuada.
Aqui, talvez em conseqüência de uma associação direta entre a
linearidade e o formalismo, entendido como a organização dos
conteúdos curriculares sob a forma explícita ou disfarçada de
teorias formais, parece certo e indiscutível que existe uma
ordem necessária para a apresentação dos assuntos, sendo a
ruptura da cadeia fatal para a aprendizagem. (MACHADO,
2005, p. 188-189).
Porém, as tecnologias digitais têm permitido uma nova forma de conceber o texto, o
conhecimento e a matemática, isto é, uma ecologia cognitiva que não mais se baseia na
imagem de uma cadeia, porém numa imagem mais complexa, que se aproxima muito
mais do pensamento humano – a rede.
Conhecimento como Rede
Tal como a World Wide Web (WWW), a rede que nos conecta com os outros indivíduos
e com o mundo, a concepção atual do conhecimento também se utiliza da metáfora da
rede para descrever suas particularidades. Machado (2004, 2005) faz importantes
considerações acerca da dinâmica dos processos cognitivos sob ótica da imagem da
rede, partindo da idéia que conhecer é aprender o significado. Nesse sentido, é preciso
observar um objeto ou acontecimento, não isoladamente, mas em suas relações com
outros objetos e acontecimentos, que se articulam como teias ou redes.
Segundo Machado (2004):
O conhecimento é como uma grande teia, uma grande rede de
significações. Os nós são os conceitos, as noções, as idéias, os
significados; os fios que compõem os nós são as relações que
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estabelecemos entre algo – ou um significado que se constrói – e
o resto do mundo. (MACHADO, 2004, p. 17).
Portanto, o conhecimento que era compreendido, anteriormente, como um
encadeamento a ser perseguido de forma linear, a partir do simples ao complexo; passa
a ser considerado como um feixe de relações que o indivíduo estabelece entre aquilo
que pretende conhecer, enredando-o ao já conhecido, construindo novos significados.
Machado (2005) assim sintetiza a dinâmica da construção dos significados:
- compreender é apreender o significado;
- apreender o significado de um objeto ou acontecimento é vê-lo
em suas relações com outros objetos e acontecimentos;
- os significados constituem, pois, feixes de relações;
- as relações entretecem-se, articulam-se em teias, em redes,
construídas social e individualmente, e em permanente estado de
atualização;
- em ambos os níveis – individual e social – a idéia de conhecer
assemelha-se a de enredar. (MACHADO, 2005, p.138).
A idéia do conhecimento como uma rede de relações associa-se, portanto, a de
hipertexto e à própria história da WWW. Isso porque a rede de informações da web
nasceu e cresceu baseada num modelo hipertextual, que organiza um conjunto de
informações multimídia – textos, imagens e sons – de forma a permitir uma leitura, ou
melhor, uma navegação não linear, baseada em associações e relações – links.
Levy (1993, p. 25) avalia a importância da estrutura hipertextual e sua conexão com a
cognição ao afirmar que “o hipertexto é talvez uma metáfora válida para todas as esferas
da realidade em que significações estejam presentes”.
Tecnologias Digitais de Leitura e Escrita
Machado (2005) indica que a palavra texto se aproxima, etimologicamente, das
idéias de textura, de tecer; pois em latim, textus significa tecido. Assim, podemos
compreender um texto como sendo um entrelaçamento de palavras que se dá por meio
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de associações por contigüidades, metonímias, analogias – idéia esta que pode estenderse naturalmente à linguagem, à ciência e também ao pensamento.
Nos tempos atuais, marcados pela presença massiva das tecnologias digitais, a
linguagem é marcada pela presença das diversas mídias (textos, sons, imagens e
movimento) e pelos links, que representam nós que interligam textos ou partes de um
texto. Com os links se constroem os hipertextos, que são textos organizados de forma
não linear, permitindo vários percursos de leitura, conforme associação de idéias e
interesses.
Lévy (1993) compara o texto na página impressa com o hipertexto:
Na interface da escrita [...] a página é a unidade de dobra
elementar do texto. A dobradura do códex é uniforme, calibrada,
numerada. Os sinais de pontuação, as separações de capítulos e
de parágrafos, estes pequenos amarrotados ou marcas de dobras,
não têm, por assim dizer, nada além de uma existência lógica, já
que não são talhados na própria matéria do livro. O hipertexto
informatizado, em compensação, permite todas as dobras
inimagináveis: dez mil signos ou somente cinqüenta redobrados
atrás de uma palavra ou ícone, encaixes complicados e variáveis,
adaptáveis pelo leitor. [...] Ao ritmo regular da página se sucede o
movimento perpétuo de dobramento e desdobramento de um
texto caleidoscópico. (LÉVY, 1993, p. 41).
Assim, enquanto a dimensão do texto no papel é definida, onde se identificam
claramente o começo e o fim; o hipertexto, ao contrário, tem a dimensão que o leitor lhe
der, o começo é indicado pelo primeiro clique na tela do computador e seu final
dependerá da iniciativa do leitor, quando este já se sentir suficientemente informado.
Neste processo, a leitura do hipertexto se torna também um ato de escrita, na medida em
que permite ao leitor organizar suas próprias conexões e caminhos de leitura.
Para alguns autores, dentre os quais Lévy (1993) e Ramal (2002), os processos
cognitivos inerentes à linguagem digital trazem uma mutação em relação ao saber, uma
vez que o hipertexto possui uma complexidade muito mais próxima aos esquemas
mentais humanos, que não são lineares:
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Estamos chegando à forma de leitura e escrita mais próxima do
nosso esquema mental: assim como pensamos em hipertexto, sem
limites para a imaginação a cada novo sentido dado a uma
palavra, também navegamos nas múltiplas vias que o novo texto
nos abre, não mais em páginas, mas em dimensões superpostas
que se interpenetram e que podemos compor e recompor a cada
leitura. (RAMAL, 2002, p. 84).
Pode-se perceber que a tela do computador como espaço de escrita e de leitura traz não
apenas novas formas de acesso à informação, mas também novos processos cognitivos,
novas formas de conhecimento, novas formas de ler e de escrever que aproximam o
leitor do objeto do conhecimento. Abre-se, portanto, uma nova possibilidade para o
conhecimento matemático, onde as habilidades de visualização, dedução e raciocínio
são favorecidas pela multimídia e pelo hipertexto.
A Matemática Navegada pela WWW – Algumas Considerações
Como indica Barufi (1999), ao analisar os livros didáticos de Cálculo
Diferencial e Integral, existem bons livros de matemática que possibilitam uma
aprendizagem significativa por meio da articulação entre problemas motivadores, dados
históricos que fundamentaram o desenvolvimento do conhecimento matemático,
figuras, gráficos, textos matemáticos e textos na linguagem corrente.
No entanto, a linguagem hipertextual disponível na web, assim como temos
buscado apresentar neste artigo, possui o potencial de aproximar os indivíduos do
conhecimento matemático, uma vez que permitem, entre outras coisas, a manipulação
de gráficos por meio de um simples clicar do mouse.
O caráter abstrato e estático do conhecimento matemático ganha uma nova
instância física na tela do computador. O computador permite criar o que Hebenstreint
(apud GRAVINA; SANTOROSA, 1999) define como objetos “concreto-abstratos”.
Concretos porque estão representados graficamente na tela do computador e abstratos
por se tratarem de realizações feitas a partir de construções mentais e de definições
imateriais. Por exemplo, uma rotação, na tela do computador, não é mais apenas um
objeto matemático abstrato, dado por uma definição e por uma linguagem formal e,
10
eventualmente, representado por um desenho estático, mas um objeto manipulável e
entendido a partir de suas invariâncias.
Barufi (1999) descreve algumas interações possíveis entre os indivíduos e o
conhecimento matemático na nova interface digital:
O estudante escolhe no menu a opção “explicação”. Um filme
didático, em câmera lenta, passa a mostrar várias propriedades
de um ponto de inflexão. Ao mesmo tempo, uma voz vai
fornecendo explicações, relacionando a derivada segunda da
função com a concavidade do gráfico.
No menu, há uma opção “mais...”, e ao clicar do mouse, aparece
um nova tela onde a questão do ponto de inflexão é mais
explorada, com outros exemplos, inferências verdadeiras ou
falsas, questionando o estudante. (BARUFI, 1999, p. 168).
Como um exemplo dessa nova realidade para o texto matemático, encontramos o
site e-cálculo1, criado com o objetivo de apoiar as disciplinas de Cálculo Diferencial e
Integral e Laboratório de Matemática, ambas pertencentes ao currículo do primeiro ano
de curso de Licenciatura em Matemática do Instituto de Matemática e Estatística da
Universidade de São Paulo. Ele se caracteriza por ser um ambiente interativo
multimídia que apresenta, por meio de uma linguagem hipertextual, conceitos,
exercícios e históricos do Cálculo. Além disso, conta também com applets que
possibilitam a simulação e a interação do estudante/usuário com os diversos conceitos
referentes a essa disciplina, que de outra forma só poderiam ser visualizados
estaticamente nos livros didáticos.
O site conta ainda com um fórum onde alunos, professores e usuários podem
levantar questionamentos, trocar informações; viabilizando a criação de uma
comunidade virtual de aprendizagem.
Nessa perspectiva, o ciberespaço apresenta seu potencial para o aprimoramento
dos processos de ensino e aprendizagem atuais; atuando não apenas como um espaço de
integração no processo de ensino-aprendizagem, análogo a tradicional sala de aula, mas
como espaço de interação entre pares, de mediação e de desenvolvimento da autonomia
1
Disponível em: <http://www.cepa.if.usp.br/e-calculo/index.htm>.
11
cognitiva. Assim, as diferenças encontradas entre as interfaces do texto impresso e do
texto matemático digital vêm colaborar para os processos cognitivos, possibilitando que
a concepção do conhecimento como uma rede de significados também seja estendida à
matemática.
Referências
BARUFI, Maria Cristina Bonomi. A construção/negociação de significados no curso
universitário inicial de cálculo diferencial e integral. 1999. 195 f. Tese (Doutorado) –
Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999.
DESCARTES, René. Discurso do Método. In: DESCARTES. Trad. Enrico Corvisieri.
São Paulo: Nova Cultural. 1999. (Os Pensadores).
GRAVINA, Maria Alice; SANTAROSA, Lucila Maria. Aprendizagem da matemática
em ambientes informatizados. Revista Informática na Educação Teoria e Prática,
v.1, n.2. Porto Alegre, 1999.
KENSKI, V. M. Tecnologias e ensino presencial e a distância. 2. ed. Campinas, SP:
Papirus, 2003.
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da
informática. Trad. Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993.
MACHADO, Nilson José. Conhecimento e valor. São Paulo: Moderna, 2004.
______. Epistemologia e didática: as concepções de conhecimento e inteligência e a
prática docente. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2005.
RAMAL, A. C. Educação na cibercultura: hipertextualidade, leitura, escrita e
aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED, 2002.
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