Discurso do Deputado Miguel de Souza (PL-RO) no grande expediente de 12,03.2004 Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados Ocupo esta tribuna para manifestar minha preocupação com os rumos da economia do País. O desemprego e o desestímulo à produção não colaboram para o crescimento e muito menos para a distribuição dos benefícios sociais que pretende o Governo Lula. Em 2003, a economia brasileira foi palco de conquistas importantes, mas também apresentou resultados deprimentes. Pelo lado positivo, devemos mencionar a reversão da trajetória de alta da inflação e o excepcional desempenho das exportações. A taxa de inflação medida pelo IPCA, acumulada em 12 meses, caiu de 14,5% em janeiro para 9,3% em dezembro. Já as exportações cresceram 21,1%, gerando um superávit comercial de quase US$ 25 bilhões. Com isso, a conta de transações correntes do balanço de pagamentos voltou a ser superavitária, o que não ocorria desde 1992. 1 No entanto, a luta contra a inflação não se fez sem custos. Mais uma vez, o controle da inflação recaiu sobre a política monetária. A forte elevação das taxas de juros causaram danos significativos ao setor produtivo e à sociedade brasileira como um todo. A atividade econômica parou, intensificando a queda do rendimento real das famílias e o desemprego. A taxa de desemprego manteve-se elevada. A taxa média do ano foi de 12,3% contra 11,7% de 2002. O consumo das famílias caiu 3%. O investimento privado apresentou uma queda de 6,6%, após já ter caído 4,2% em 2002. Apenas os setores voltados para a exportação apresentaram resultados positivos. Mas isso não foi suficiente para manter a economia em crescimento. Após 10 anos, o produto interno bruto do Brasil voltou a cair. Como conseqüência, a renda per capita caiu 1,5%. Assim, nos últimos seis anos a renda per capita registrou um crescimento pífio de 0,3%. Ao fim do ano passado, a grande expectativa da sociedade era pela volta do crescimento em 2004. No entanto, os primeiros resultados desse ano não são muito animadores. 2 Nesta semana, a Fundação IBGE e a Confederação Nacional da Indústria divulgaram as estatísticas referentes à evolução da atividade industrial em janeiro de 2004. Os resultados confirmam a manutenção da recuperação da atividade iniciada no segundo semestre do ano passado. No entanto, o crescimento ainda é moderado, não mostrando sinais de que a economia brasileira já tenha iniciado um processo de crescimento sustentado. O principal motor do crescimento continua sendo as exportações. A demanda doméstica continua deprimida em razão do baixo nível de renda das famílias e das elevadas taxas de juros. A transformação do crescimento moderado em sustentado dependerá da continuidade do processo de recuperação da renda e do emprego, que depende do retorno sustentado do investimento. O investimento, ao movimentar o mercado de trabalho e gerar nova renda gera um círculo virtuoso cujo desfecho é o crescimento tão almejado. Neste cenário a variável crucial é o investimento privado. O crescimento não virá naturalmente sem que os obstáculos estruturais do passado, que entravaram o crescimento, sejam eliminados. A agenda do crescimento está por ser construída. Não podemos perder o sentimento de urgência nesta tarefa. 3 É crucial assegurar o ambiente indispensável ao estímulo ao investimento privado. Definição de regras claras e amigáveis ao mercado, desoneração tributária da produção e do investimento, aprofundamento das reformas microeconômicas – aquelas que afetam o cotidiano das empresas – e disponibilidade de financiamento a custos razoáveis são, certamente, pontos importantes da agenda atual. O financiamento ao setor produtivo no Brasil é inadequado e insuficiente. Ainda que a taxa de juros Selic tenha caído de 26,5%, em fevereiro de 2003, para 16,5% em dezembro e assim permanecendo até hoje, as taxas de juros reais a que estão sujeitas as empresas e as famílias brasileiras estão entre as mais elevadas do mundo. Além de caro, o crédito é escasso, principalmente quando os prazos requeridos são mais longos, como no caso de financiamento para investimento. Conseqüentemente, as empresas brasileiras só podem contar com seus próprios recursos para investir. Para a maioria das empresas, especialmente as emergentes e de menor porte, isso representa um sério constrangimento financeiro ao crescimento. 4 Adicionalmente, a convivência com taxas de juros elevadas vem enfraquecendo cada vez mais as empresas brasileiras, reduzindo ainda mais sua capacidade de investir. A situação financeira das empresas se deteriorou significativamente nos últimos anos e grande parte desse processo deve-se aos encargos financeiros elevados. Outro reflexo do alto custo de financiamento a que nossas empresas estão expostas é a redução da competitividade no comércio internacional. Imaginem o valor que nossas exportações teriam atingido caso as empresas brasileiras não estivessem sujeitas a taxas de juros bem acima das praticadas pela maioria de nossos competidores no mercado internacional. Pior, ao se manter essa situação, todo o esforço recente de conquista de novos mercados poderá ser jogado fora. Por tudo isso, causou-nos surpresa a suspensão da distensão da política monetária em janeiro deste ano. A decisão do Conselho de Política Monetária do Banco Central – o Copom – de interromper a trajetória de queda da taxa Selic com receio do recrudescimento do processo inflacionário foi de uma precaução excessiva. A retomada da trajetória de redução das taxas de juros é fundamental para a recuperação do dinamismo do mercado interno. E isto precisa ser feito logo, sob o risco do país passar mais um ano perdido. 5 Cabe lembrar, ainda, que o retorno à trajetória descendente da taxa Selic estimula o crescimento econômico não só pela redução no custo do investimento, mas, também, por seu efeito positivo nas expectativas dos empresários e dos consumidores. A interrupção da queda dos juros frustou as expectativas dos empresários e consumidores com relação à evolução futura da economia. Um dos principais estímulos ao investimento e ao consumo são as expectativas de crescimento futuro da demanda e do emprego. Os empresários só irão aumentar seus investimentos se acreditarem que a economia voltará a crescer. Os consumidores só aumentarão suas compras se acreditarem que a economia vai crescer, que a renda vai aumentar e que as chances de ficar desempregado cairão. A perda da confiança leva à postergação de investimento e consumo, realimentando o círculo vicioso da recessão. A retomada da trajetória de diminuição da taxa Selic é importante para aumentar a confiança e a volta do crescimento em 2004. Este é um sinal importante de que a política monetária não entravará o crescimento. 6 Infelizmente, o Comitê de Política Monetária do Banco Central tem se mostrado demasiadamente cauteloso na fixação da taxa de juros básica Selic. Se quisermos ver esse país voltar a crescer, é imperativo retomar o caminho da redução da taxa de juros. Se a cada elevação da taxa de inflação optar-se por conter o crescimento, repito, o Brasil corre o sério risco de passar mais um ano sem crescimento. É importante ressaltar, no entanto, que a redução da taxa Selic é necessária mas não o suficiente. Isto porque as taxas de juros reais elevadas não são apenas o resultado da política monetária. Elas refletem, também, ineficiências e desfuncionalidades que persistem há anos na economia brasileira. Essas ineficiências se evidenciam no custo da intermediação financeira ou o spread bancário. O spread bancário é a diferença entre o custo ao qual os bancos captam recursos junto ao público e o quanto cobram dos tomadores de empréstimo. Nele se embute a cunha fiscal, incluindo os depósitos compulsórios, as despesas operacionais – como as decorrentes da inadimplência – além da margem de lucro dos bancos. 7 Para a redução do spread bancário, portanto, deve-se privilegiar a redução dos depósitos compulsórios, que estão embutidos na chamada cunha fiscal, e adotar medidas que aumentem a concorrência na concessão de crédito, como, por exemplo, desenvolver instrumentos de crédito e financiamento alternativos com o desenvolvimento do mercado de capitais e aumentar a competição bancária. Também é preciso reconhecer a necessidade de avanços institucionais que contribuam para a redução das despesas com inadimplência, diminuindo o risco de crédito e o próprio spread. A solução para o problema das taxas de juros elevadas requer, assim, um conjunto amplo de respostas, que merecem discussão e reflexão de toda a sociedade. A questão chave é fazê-lo com o máximo sentido de urgência, sem o que poderemos ficar condenados à taxas de crescimento econômico medíocres, que mal têm sido suficientes para acompanhar o crescimento da população. Essa preocupação, Senhor Presidente, estou seguro, é de toda a nação. Muito Obrigado, 8 9